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segunda-feira, 30 de abril de 2012
A TERRA VIVE - Ecologia
Sempre se soube que o ambiente influi decisivamente sobre a vida na Terra. Agora, os cientistas sugerem o contrário: a Terra seria aquilo que a vida quer que ela seja. É a hipótese Gaia.
Desde 2 bilhões dos seus 4,5 bilhões de anos, a Terra contém um coquetel de água, gases, calor e minerais nas doses necessárias e suficientes para que a vida floresça em toda a sua esplêndida variedade. Isso pode ser considerado apenas uma felicíssima coincidência: a vida teria surgido e se desenvolvido neste relativamente pequeno planeta-o quinto em tamanho do sistema solar-e não em qualquer outro pela simples e boa razão de que aqui se encontra o mais confortável ambiente, se não do Universo inteiro, pelo menos deste canto do Cosmo. Mas pode ter acontecido também que, tendo se formado fortuitamente, os organismos vivos, com o passar dos milênios, acabaram tomando conta da casa terrestre, adaptando-a com tanta perfeição que ela se moldou à vontade de seus hóspedes.
Hoje, as dependências desta habitação chamada Terra abrigam seres tão diversos como bactérias e baleias, plânctons e pinheiros-além, é claro, dos presunçosos seres humanos, que se consideram o supra-sumo da criação e, por isso, os donos da casa. A idéia de que a vida é aquilo que a Terra Ihe permite ser é a versão convencional, que soa bem ao senso comum. Já a idéia de que a Terra é aquilo que a vida faz com ela parece uma extravagância. Mas tem sido ouvida com muita atenção por quem se interessa por esse tipo de assunto. "A Terra está viva", afirma o biólogo inglês James Lovelock, o primeiro a defender esse ponto de vista heterodoxo há quase vinte anos.
Cientista de muitos talentos, Lovelock acredita que cada componente da Terra funciona de forma tão integrada em relação aos demais e ao conjunto todo como os instrumentos de uma orquestra bem afinada. Ou, como ele gosta de dizer, citando o escocês James Hutton (1726 - 1797), considerado um dos países da moderna Geologia, "a Terra é um superorganismo que deveria ser estudado como um sistema completo, assim como os fisiologistas estudam todas as funções orgânicas do corpo humano". A soma total das partes vivas e inanimadas da Terra, Lovelock chamou Gaia, em homenagem à deusa grega cujo nome quer dizer Terra e da qual derivaram palavras como geografia e geologia.
Na realidade, não é nova a idéia da integração entre os organismos vivos e o meio ambiente. Afinal, a própria palavra ecologia foi criada já lá se vão 120 anos pelo zoólogo alemão Ernst Haeckel (1834 - 1919). Ela vem do grego oikos (casa) e significa "saber da casa". Mas até recentemente essa integração era mal compreendida por causa da imprecisão dos conceitos e dos métodos de análise. Hoje se sabe que os mecanismos que agem sobre a Terra não podem ser alterados sem que se pague por isso um preço provavelmente muito alto em termos da própria continuidade da vida.
Por exemplo, pesquisa conjunta da agência espacial NASA com universidades americanas e instituições científicas brasileiras, realizada na Amazônia no ano passado, comprovou que o equilíbrio climático da região depende basicamente da floresta. Daí, a crescente e indiscriminada derrubada de árvores para a formação de pastagens tende a alterar o ciclo de renovação da água, ameaçando tornar caótico o regime de chuvas.
O pior é que as conseqüências desse processo de desertificação não deverão se limitar, a longo prazo, à área desmatada. A poluição, de seu lado. também pode estar destruindo as moléculas de ozônio da atmosfera, rompendo uma complexa teia de interdependências que existe há pelo menos 600 milhões de anos.
Formado por três átomos de oxigênio (O3), o ozônio começou a existir em quantidades consideráveis graças ao aparecimento dos organismos vivos que liberavam, através da fotossíntese, grandes quantidades de oxigênio na atmosfera. Desde então, a camada de ozônio a 15 mil metros acima da superfície terrestre não só ajuda a estabilizar a temperatura como impede a exposição direta dos seres vivos à radiação solar. Lovelock tem o privilégio de ter sido o primeiro cientista a detectar, em 1971, o acúmulo de moléculas do gás artificial clorofluorcarbono, que corrói o ozônio, na atmosfera. Inventor de numerosos equipamentos científicos, ele já aperfeiçoara, em 1957, um detector de elétrons que permitiria a identificação das moléculas.
Não foi a primeira vez que esse invento teve um papel importante na história da Ecologia. Em 1962, ele tinha servido para medir os dramáticos efeitos dos pesticidas sobre o solo, mostrados pela americana Rachel Carson no livro A primavera silenciosa, considerado um marco dos movimentos ambientais. Com esse currículo, não é de estranhar que Lovelock, aos 69 anos, seja um cientista diferente da maioria dos colegas. Biólogo de formação, prefere ser tratado como um estudioso de várias disciplinas-foi professor de Química e Cibernética em universidades inglesas e americanas. Atualmente, estabeleceu seu laboratório numa tranqüila vila no noroeste da Inglaterra, cercado de árvores que ele e sua família plantaram.
No final da década de 60, Lovelock foi convidado pela NASA para fazer parte do projeto que enviaria a sonda automática Viking a Marte. Ele deveria dizer como os pesquisadores poderiam identificar eventuais formas de vida naquele planeta. Lovelock comparou a atmosfera de Marte - equilibrada e quase toda composta de carbono-com a turbulenta e instável mistura gasosa da Terra. Concluiu dai que os organismos terrestres usam a atmosfera ao mesmo tempo como fonte de matéria-prima e depósito de elementos de que não necessitam.
Nem sempre foi assim. Ao se formar, há cerca de 4 bilhões e meio de anos, a atmosfera da Terra continha basicamente hidrogênio, amoníaco e metano. Não havia oxigênio livre. A temperatura do planeta exposto à radiação ultravioleta do Sol era extremamente elevada. Em suma, um ambiente incompatível com qualquer forma de vida. À medida que a Terra foi se resfriando, nos primeiros 2 bilhões de anos, o hidrogênio, muito leve, escapava da atmosfera, enquanto o dióxido de carbono e a água iam lentamente sendo liberados para a crosta terrestre pelos vulcões. Nessa fase, o carbono funcionou como um manto protetor que retinha o calor do Sol, sem o qual o planeta ficaria congelado Foi quando apareceram os seres vivos - e a aparência da Terra começou a mudar.
Outros planetas do sistema solar, como Marte ou Vênus, são mundos cuja base é muito semelhante à da Terra. Vênus, porém, está envolta numa densa atmosfera de dióxido de carbono, que eleva a temperatura na sua superfície a 400 graus centígrados. Marte, por sua vez, é um deserto gelado, tumultuado por tempestades de areia e coberto por uma fina camada de dióxido de carbono. Já a Terra tem um revestimento variado e - segundo a hipótese Gaia, de Lovelock - derivado das incontáveis formas de vida que abriga.
Toda essa vida é capaz de atividades fantásticas. O professor Walter Shearer, da Universidade das Nações Unidas, em Tóquio, calcula por exemplo que 100 bilhões de formigas na Amazônia liberam 55 mil toneladas de ácido fórmico por ano, que respondem por 25 por cento da acidez das chuvas que caem sobre a região. Gaia sugere outros raciocínios tão imaginativos como esse. O mesmo Shearer afirma que um inofensivo fungo que cresce nas raízes das árvores da Amazônia libera nada menos de 5 milhões de toneladas de clorocarbono por ano para a atmosfera.
A descoberta de que há mil e uma maneiras pelas quais a vida mexe com o ambiente não transforma automaticamente qualquer cientista em adepto das idéias de Lovelock. James Kirchner, da Universidade da Califórnia, por exemplo, não aceita a noção da Terra como um organismo vivo e auto-regulador. Para ele, isso é mais poesia do que ciência. Seu colega James Kasting, da NASA, acredita que a biosfera, o conjunto dos seres vivos, é um dos fatores que afetam a composição da atmosfera, dos continentes e oceanos. Mas não existe, segundo ele, nenhuma razão para acreditar que a biosfera controla todo o sistema terrestre.
No Brasil, essa polêmica praticamente ainda não chegou ao conhecimento da maioria dos pesquisadores. Mas existem aqui idéias que têm muito a ver com a questão. O geofísico nuclear Ênio Bueno Pereira, especialista do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) em radiatividade atmosférica, acredita que a Terra poderia semear vida em outros planetas. E pergunta: "Não seria aconselhável começarmos a estudar essa possibilidade antes de a Terra esgotar seus recursos?" Sua proposta envolve questões bem mais delicadas do que à primeira vista os admiradores de aventuras espaciais poderiam esperar.
Existem microorganismos terrestres, encontrados no continente gelado da Antártida. que talvez pudessem sobreviver em Marte. Será que, como admite a hipótese Gaia, eles poderiam se espalhar, absorver a luz solar, aquecer o gelo e mudar a composição química da atmosfera marciana? Nem Lovelock tem uma resposta segura para isso. Mas o astrônomo Enos Picazzio, do grupo de Astrofísica do Sistema Solar da Universidade de São Paulo, é categórico: "Levar qualquer tipo de vida para fora só terá validade se for reproduzido um habitat semelhante ao da Terra. Caso contrário, o resultado é imprevisível".
A idéia da interdependência dos organismos vivos com o meio ambiente tem partidários de peso. Uma adepta é a bióloga Lynn Margulis, da Universidade de Boston, nos Estados Unidos, co - autora, com Lovelock, do livro Gaia-uma nova visão da vida na Terra, ainda não traduzido para o português. Ela escreveu também Microcosmos, em co - autoria com o filho Dorian Sagan, de seu casamento com o astrônomo Carl Sagan. A hipótese Gaia também agradou aos movimentos verdes e foi apropriada pela moda da New Age, uma mistura de propostas místicas com retorno à natureza, que tem se manifestado nos Estados Unidos.
Quando Lovelock formulou sua teoria pela primeira vez, foi ignorado pelas universidades. Mas isso já é história antiga. Recentemente, ele participou no Estado americano do Colorado de uma conferência da Associação Geofísica Americana, organizada especialmente para discutir a hipótese Gaia. Ali, Lovelock, junto com o climatologista Robert Charlsom da Universidade de Washington, apresentou um novo exemplo dessa ciranda vida-ambiente. Segundo afirmou, alguns tipos de plânctons sintetizam um composto químico chamado sulfeto de dimetila. O contato com o oxigênio do ar libera sulfato, uma partícula aerossol que serve como núcleo de condensação de nuvens sobre os oceanos. Como as nuvens são do tipo estratos - baixas e rasas -, não provocam chuvas, mas têm impacto sobre a temperatura da água ao refletir a radiação solar. Esse é um exemplo importante da influência dos organismos vivos sobre as nuvens. Mas daí a inferir que eles afetam a temperatura dos oceanos vai uma distância muito grande", afirma, cauteloso, o meteorologista da USP, Oswaldo Massambani, também especialista em nuvens.
Lovelock pode se orgulhar de ter conseguido uma proeza. Especialistas de várias áreas concordam em debater uma visão mais integrada e até mesmo ecológica do mundo. "A solução da crise ambiental requer um raciocínio científico diferente do que vínhamos seguindo até agora" propõe o professor José Galizia Tundizi, da Faculdade de Engenharia da USP em São Carlos, um entusiasta da nova tendência.
Tundizi procurou colocar em prática suas idéias. Naturalista de formação, mas com mestrado em Oceanografia, doutorado em Botânica e livre-docência em Ecologia de Reservatórios, está atualmente empenhado em criar o primeiro curso no Brasil de Ciências Ambientais, em nível de pós-graduação, para diplomados de áreas diferentes. Segundo Tundizi, "o uso que os seres humanos fazem da água, ar, terra e florestas está conduzindo esses sistemas a um limite além do qual sofrerão prejuízos irreversíveis .
É possível, como pensam os mais otimistas, que, se a hipótese Gaia estiver correta, os organismos vivos acabarão ajudando a Terra a suportar, mediante uma lenta sucessão de ajustes, os efeitos da crise ambiental. Resta saber se, quando a Terra finalmente se recuperar, os seres humanos ainda estarão aqui para apreciar os resultados. "Gaia não é uma mãe cegamente apaixonada por seus filhos", adverte Lovelock. "Se algum deles lhe fizer mal, ela o eliminará sem dó nem piedade.'
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Da Flecha a Bola - O Esporte
DA FLECHA À BOLA - O Esporte
A paixão mundial pelos esportes tem origem nos tempos pré-históricos em que o homem era caçador e coletor.
A cena se repete a cada outono nos Estados Unidos: nas tardes de domingo assim como nas noites de segunda-feira, abandonamos tudo que estamos fazendo para olhar as pequenas imagens de 22 homens em movimento - precipitando-se uns sobre os outros, caindo, erguendo-se e chutando um objeto alongado feito da pele de um animal. De vez em quando, tanto os jogadores quanto os espectadores passivos são levados à exaltação ou ao desespero pelo desenvolvimento do jogo. Por todo o país, hipnotizados diante das telas de vidro, pessoas (na maioria homens) gritam e resmungam em coro. Dito assim, parece um comportamento estúpido, mas quando você pega o jeito é difícil resistir-e eu falo por experiência própria.
Atletas correm, pulam, batem, escorregam e é emocionante vê-los fazer tudo isso com tanta habilidade. Eles se atracam no solo. São precisos ao golpear ou arremessar um objeto marrom ou branco em rápido movimento. Em alguns jogos, tentam conduzir a coisa em direção ao que se convencionou chamar "meta". Em outros, os jogadores fogem e depois voltam à "base". Quase tudo é trabalho em equipe-e é admirável como as partes se encaixam formando um conjunto magnífico. Mas não são essas as habilidades que a maioria de nós usa para ganhar o pão de cada dia. Então, por que nos sentimos compelidos a ver pessoas correndo ou golpeando? Por que essa necessidade existe em todas as culturas? (Antigos egípcios, persas, gregos, romanos, maias e astecas também jogavam bola; o pólo é tibetano).
Alguns astros do esporte ganham por ano dez vezes mais que o presidente dos Estados Unidos. Depois de aposentados, ainda são eleitos para altos cargos. Em suma, são heróis nacionais. Mas por que isso acontece? Existe aí alguma coisa que está acima da diversidade dos sistemas políticos, sociais e econômicos. É um apelo que vem de muito longe. A maioria dos principais esportes é associada a uma nação ou cidade e contém elementos de patriotismo e orgulho cívico. Nosso time nos representa-nosso lugar, nossa gente-contra aqueles outros caras vindos de algum lugar diferente, povoado por pessoas estranhas, talvez hostis. (Na verdade, a maioria dos "nossos" jogadores não é realmenle daqui. São mercenários que freqüentemente se transferem de alma limpa para cidades adversárias em troca de uma paga adequada. Às vezes um time inteiro muda de cidade.)
Competições esportivas são confrontos simbólicos mal disfarçados. Essa não é exatamente uma idéia nova. Os índios Cherokee, por exemplo, chamavam sua antiga forma de jogar lacrosse (uma espécie de hóquei) de "o irmãozinho da guerra". Max Rafferty, antigo superintendente de Instrução Pública da Califórnia, depois de xingar os críticos do futebol universitário de "vagabundos, comunas, beatnicks cabeludos", proclamava: "Futebol é guerra sem mortes. Os jogadores possuem um brilhante espírito combativo que traduz o próprio espírito da América". (Isso até que merece uma reflexão) Já o falecido treinador Vince Lombardi sempre dizia que a única coisa que importa é vencer. E George Allen, ex-treinador dos Redskins (time de futebol americano) de Washington não deixava por menos: "Perder é como morrer".
De fato, falamos em ganhar ou perder uma guerra com a mesma naturalidade com que falamos em ganhar ou perder um jogo. Num comercial de recrutamento do Exército americano, feito para a TV, um tanque de guerra destrói outro numa manobra de blindados. Ao final do exercício, o comandante vitorioso diz: "Quando vencemos, todo o time vence, o tanque inteiro vence-não uma só pessoa". Isso torna muito clara a relação entre esporte e combate. Fãs (abreviatura de fanáticos) do esporte agridem, espancam, às vezes até matam, atormentados pela derrota de seu time, ou quando são impedidos de comemorar uma vitória, ou ainda quando se sentem injustiçados pelos juízes.
Em 1985, a primeira-ministra britânica se viu obrigada a denunciar o comportamento brutal de embriagados torcedores ingleses que, num jogo em Bruxelas, na Bélgica, atacaram um grupo de italianos pelo simples fato de eles torcerem pelo seu próprio time. Dezenas de pessoas morreram quando as arquibancadas despencaram. Em 1969, após três disputadas partidas de futebol, tanques de El Salvador cruzaram a fronteira de Honduras, enquanto bombardeiros salvadorenhos atacavam portos e bases militares hondurenhas. Essa "guerra do futebol" fez milhares de vítimas. Tribos afegãs, no passado, jogavam pólo com as cabeças decepadas de antigos adversários. E há seiscentos anos, onde hoje é a Cidade do México, havia um campo de jogos onde nobres suntuosamente vestidos assistiam a competições entre times uniformizados. O capitão da equipe perdedora era decapitado e seu crânio colocado numa prateleira, ao lado dos de.outros companheiros de desgraça-um incentivo possivelmente mais estimulante que a própria vitória.
Vamos supor que, como quem não quer nada, você está mexendo no seletor de canais da TV e sintoniza um jogo que não Ihe diz nada de especial -por exemplo, um amistoso de vôlei entre a Birmânia e a Tailândia. Como você decide por qual time torcer? Mas espere um pouco: por que torcer por qualquer deles? Por que simplesmente não apreciar a partida? Muitos de nós não conseguem manter essa atitude imparcial. Queremos participar da disputa, nos sentirmos membros de um time. Esse sentimento nos domina e quando menos percebemos lá estamos nós: "Vai, Birmânia".
No começo, nossa lealdade pode oscilar fazendo-nos incentivar primeiro um time, depois outro. Às vezes torcemos pelo mais fraco. Outras vezes, vergonhosamente, viramos bandeira: do perdedor para o - ganhador, quando o placar já parece definido. (Quando um time sofre sucessivas derrotas numa temporada, a lealdade de alguns de seus torcedores pode balançar.) O que buscamos é vitória sem esforço. Queremos ser arrebatados por algo como uma pequena, segura e vitoriosa guerra.
O mais antigo evento atlético organizado de que se tem notícia remonta à Grécia pré-clássica, há 3 500 anos. Durante aqueles primeiros Jogos Olímpicos, uma trégua suspendia todas as guerras entre as cidades-estado gregas. Os jogos eram mais importantes que as batalhas. Nessas competições os homens participavam nus e não era permitida a entrada de mulheres na platéia. Por volta do século VIII a.C., as Olimpíadas consistiam em corridas (muitas modalidades), saltos, arremesso de objetos (inclusive dardos) e lutas (às vezes até a morte). Embora nenhuma dessas competições fosse praticada em equipe, elas foram fundamentais para o desenvolvimento dos modernos esportes coletivos e também para a caça esportiva.
A caça é tradicionalmente considerada um esporte, quando não se come o que se captura - uma condição muito mais fácil de ser cumprida pelos ricos do que pelos pobres. Desde os primeiros faraós, a caça esteve associada à aristocracia militar. O aforismo do escritor Oscar Wilde sobre a caça à raposa na Inglaterra-"o indizível em busca do incomível" - alusão ao elitismo dessa prática. Já os precursores do futebol, hóquei e esportes afins eram chamados "jogos do populacho", reconhecidos como substitutos da caça, que não podia ser praticada por jovens que precisavam trabalhar para viver.
Então talvez os jogos de equipe não sejam apenas ecos estilizados das antigas guerras; talvez eles também satisfaçam um desejo quase esquecido de caçar. Mas, se nossa paixão pelo esporte é tão profunda e tão difundida, é possível que esteja arraigada em nós-não em nosso cérebro, mas em nossos genes. Os 10 mil anos decorridos da invenção da agricultura não são tempo suficiente para que tais predisposições tenham evoluído. Se quisermos entendê-las, precisamos retroceder ainda mais. A espécie humana tem centenas de milhares de anos. No entanto, somente nos últimos 3 por cento desse período, que engloba toda a nossa história, levamos uma existência sedentária, baseada no cultivo do solo e na criação de animais. Nos primeiros 97 por cento de nossa estada na Terra, adquirimos tudo o que é caracteristicamente humano. Podemos aprender algo sobre esses tempos com as raras comunidades caçadoras / coletoras ainda não corrompidas pela civilização.
Perambulamos com nossos filhos e nossos pertences nas costas, seguindo a caça e buscando fontes de água. Acampamos por um tempo, logo prosseguimos a marcha. Para proporcionar alimento ao grupo, os homens passam a maior parte do tempo caçando, enquanto as mulheres colhem. Um típico bando itinerante, uma família extensa composta de parentes e consangüíneos, soma algumas dúzias de indivíduos-embora centenas de nós, com a mesma língua e cultura, nos reunamos anualmente para cerimônias religiosas; trocas, casamentos, narrações de histórias. E muitas são as histórias de caça.
Estou me detendo principalmente nos caçadores, que são homens. Mas as mulheres têm um significativo poder social, econômico e cultural. Elas coletam os alimentos essenciais-nozes, frutos, tubérculos, raízes, assim como ervas medicinais, além de caçarem pequenos animais e informarem os homens dos movimentos dos grandes animais. Os homens também se dedicam à coleta e a uma parte considerável dos afazeres domésticos (embora não tenham casas). Mas caçar- apenas para comer, nunca por esporte -é a mais duradoura ocupação de qualquer homem que se preze.
Os meninos aprendem a abater pássaros e pequenos mamíferos com arcos e flechas. Adultos, sabem perfeitamente como fabricar armas, espreitar a presa, matá-la e cortá-la em pedaços que serão levados ao acampamento. Quando capturam o primeiro grande mamífero, passam a ser considerados adultos. Na cerimônia de iniciação, incisões rituais são feitas no seu peito ou nos braços; depois, uma erva é esfregada nos cortes, de modo que a cicatriz forme uma tatuagem. Esta significará uma espécie de condecoração; bastará um olhar para que se conheça a experiência de combate de cada um.
A integração com a natureza é tanta que, das muitas pegadas deixadas por um bando de animais, podemos dizer com certeza quantos são, distinguir as espécies, os machos e as fêmeas e até descobrir se algum era manco ou há quanto tempo passaram. Alguns filhotes podem ser capturados por meio de armadilhas espalhadas pelo campo; outros, com estilingues e bumerangues ou apenas com pedras jogadas com força e precisão. O homem pode aproximar-se e matar a golpes de borduna os animais que ainda não aprenderam a temê-lo. Para agarrar presas mais espertas, que se mantêm distantes, arremessamos lanças ou flechas envenenadas. Às vezes temos sorte e encurralamos um bando inteiro à beira de um penhasco.
O trabalho em equipe entre os caçadores é fundamental. Se não quisermos espantar a caça, devemos nos comunicar por mímica. Pelo mesmo motivo, devemos controlar nossas emoções-tanto o medo como o júbilo são perigosos. Somos ambivalentes em relação aos animais. Nós os respeitamos, reconhecemos que eles e nós temos algum parentesco, chegamos até a nos identificar com eles. Mas, se paramos para pensar na sua inteligência, no cuidado com que tratam os filhotes, se sentimos pena deles, a caça vai ser prejudicada; vamos trazer menos comida para casa e novamente nosso bando vai ficar em perigo. Ou seja, precisamos manter uma distância emocional entre nós e eles.
Por 1 milhão de anos nossos ancestrais masculinos correram de cá para lá, atirando pedras em pássaros, perseguindo filhotes de antílopes, derrubando-os no chão e, aos gritos, aterrorizando bandos de animais selvagens. Suas vidas dependiam da habilidade na caça e do trabalho em equipe; não só eram bons caçadores como bons guerreiros. Então, depois de muito tempo-digamos, alguns milhares de séculos -, uma predisposição natural para caçar e trabalhar em equipe estará incorporada em muitos recém-nascidos. Por quê? Porque os caçadores incompetentes ou frouxos tendem a deixar menos descendentes. Não estou querendo dizer com isso que nossa herança contém informações do tipo como confeccionar uma ponta de lança afiada a partir de um pedaço de pedra ou como emplumar uma flecha: essas coisas são ensinadas ou deduzidas. Mas o prazer de caçar, isso eu aposto que está arraigado.
A seleção natural ajudou a moldar nossos ancestrais como soberbos caçadores. A evidência mais clara do sucesso do estilo de vida caçador / coletor é o simples fato de ter-se propagado por cinco continentes e durado 1 milhão de anos. Após 40 mil gerações, em que a matança de animais era nossa defesa contra a inanição, tais inclinações ainda devem estar conosco. Ansiamos por extravasá-las. Os esportes de equipe nos proporcionam essa possibilidade. Uma parte de nós sonha fazer parte de um pequeno bando de semelhantes em busca de uma intrépida, ousada conquista. As tradicionais virtudes masculinas-seriedade, inventividade, modéstia, coerência, conhecimento profundo dos animais, amor pela vida ao ar livre - eram todos comportamentos adaptativos na época da caça / coleta. Até hoje admiramos essas características, embora quase tenhamos esquecido por quê.
Além dos esportes, há poucas válvulas de escape disponíveis. Podemos reconhecer nos adolescentes o jovem caçador, o aspirante a guerreiro, saltando pelos telhados, dirigindo motocicletas sem capacete, arranjando encrencas para o time vencedor na celebração depois do jogo. Se esses ímpetos não forem submetidos a alguma forma de controle, podem se transformar em algo mais grave (embora nossos índices de homicídios sejam equivalentes aos dos !Kung, uma tribo do sul da África). Tentamos assegurar que esse gosto ritual pelo ato de matar não se volte contra os humanos. Nem sempre conseguimos.
Ao pensar como são poderosos esses instintos de caçador, fico preocupado. Temo que o futebol de segunda-feira à noite seja uma saída insuficiente para esses modernos caçadores / coletores, enfiados em seus macacões, aventais, uniformes ou ternos. Penso naquele antigo legado de não expressarmos nossos sentimentos e mantermos distância daqueles que matamos-e isso tira um pouco do prazer do jogo. Os caçadores / coletores geralmente não apresentavam perigo para si mesmos: primeiro, porque sua economia era relativamente saudável (muitos tinham mais tempo livre do que nós); segundo, porque, como nômades, tinham poucas posses, quase nenhum roubo e pouca inveja; porque, também, a arrogância e a cobiça não eram apenas considerados males sociais mas ainda; algo muito próximo a uma doença mental; porque as mulheres tinham poder político real e tendiam a exercer influência estabilizadora antes que os garotos se lançassem a suas flechas envenenadas; e porque, enfim, quando sérios crimes eram cometidos-assassínios, por exemplo-o bando em conjunto passava a sentença e o castigo.
Os caçadores / coletores organizavam democracias igualitárias. Eles não tinham chefes nem hierarquias políticas ou empresariais que valessem a pena galgar. Não havia contra quem se revoltar. Assim, se estamos encalhados a algumas centenas de séculos de quando deveríamos estar, se-embora não por falha nossa-nos encontramos na era das armas nucleares, com emoções do Plistoceno mas sem as salvaguardas sociais do Plistoceno -, talvez possamos ser desculpados pelo futebol das segunda - à noite.
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100 Anos do Titanic - Naufrágio do Século
100 Anos do Titanic - Naufrágio do Século
O RMS Titanic foi um navio transatlântico da Classe Olympic operado pela White Star Line e construído nos estaleiros da Harland and Wolff em Belfast, na Irlanda do Norte. Na noite de 14 de abril de 1912, durante sua viagem inaugural, entre Southampton, na Inglaterra, e Nova York, nos Estados Unidos, chocou-se com um iceberg no Oceano Atlântico e afundou duas horas e quarenta minutos depois, já na madrugada do dia 15 de abril. Até o seu lançamento em 1912, ele fora o maior navio de passageiros do mundo.
Construção: Harland and Wolff (Belfast)
Batimento de quilha: 22 de março de 1909
Lançamento: 31 de maio de 1911
Porto de registo: Liverpool
Indicativo de chamada: MGY
Armador: White Star Line
Viagem inaugural: 10 de abril de 1912 - Southampton - Nova York
Período de serviço: 1912
Estado: Afundou após colisão com um iceberg no meio do Oceano Atlântico
Fatalidade: 15 de abril de 1912 (100 anos)
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Googlemania - Jogo da Palavras
Googlemania - Jogo das Palavras
Aqui está um jogo "MODERNO" que não precisa de nada, somente um dispositivo conectado na INTERNET (por exemplo, um notebook ou celular)e uma maneira de poder conectar no GOOGLE.
O objetivo é criar a maior frase que o Google pode encontrar por alternadamente a adição de uma palavra até o fim da busca do outro jogador. A primeira pessoa começa com "sentimentos". Agora, a segunda pessoa adiciona uma palavra, "são", então temos "sentimentos são" ... (Observe o uso de aspas na consulta de pesquisa.) Agora toda vez que uma palavra é adicionada, a frase é procurado no Google, ea contagem de páginas resultante é anunciado para o grupo.
A pessoa que cria uma frase com zero resultados perde e tem que fazer algo bobo(ou se você quiser jogar com pontos, ele perde um
ponto, e a última pessoa que criou uma frase com resultados ganha um ponto).
Para evitar a fraude, não deixe o próximo jogador olhar o resultado das buscas.
Vamos dar o nosso exemplo, e ver o que temos:
Pedro: "Sentimentos" (53,200,000 resultados no Google)
Maria: "Os sentimentos são" (2.100.000 resultados)
Jake: "Os sentimentos não são nada" (1.090 resultados)
Susan: "Os sentimentos não são nada e" (19 resultados)
Peter: "Os sentimentos não são nada e nós" (0 Resultados)
Susan recebe 1 ponto, e Peter recebe menos 1 pontos (ou tem que fazer algo bobo).
Se você criar uma frase que não tenha resultados vai perder, mas se ela tem muitos resultados vai ser fácil que o adversário também invente uma sequencia que apareça resultados também, a estratégia básica e tentar frases tão tolas que tem alguns resultados mas não tão tolas que não tenha nenhum resultado, o equilíbrio é a chave do jogo.
Jogo bem simples mas tem se tornado uma febre em rodas de Chats pelo mundo, espero que gostem, o que pode ensinar muito como obter resultados nas pesquisas do GOOGLE.
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quarta-feira, 18 de abril de 2012
As mais famosas Casas Mal Assombradas
Casas Mal Assombradas
Casa assombrada ou Casa mal-assombrada é o nome dado a uma casa onde supostamente acontecem eventos insólitos sem que se encontre uma causa física para os mesmos. Tais eventos podem ir desde ruídos ou movimentação de objetos até alegadas aparições de vultos mais ou menos distintos aos quais se chama de assombrações ou fantasmas.
A Doutrina Espírita explica que esses fenômenos são produzidos por espíritos desencarnados que, para produzirem efeitos físicos como ruídos, movimento de objetos e sua própria aparição, se valem do ectoplasma produzido por um ou mais dos moradores que, geralmente sem o saber, possuem mediunidade extensiva.
Esses espíritos, ainda segundo a Doutrina Espírita, podem produzir tais efeitos com mais de um objetivo. Podem ser espíritos levianos querendo se divertir provocando o medo dos moradores, podem ser espíritos desejosos de se comunicarem, podem ser os espíritos de antigos moradores que ainda se julgam donos da casa, podem ser desafetos dos moradores atuais que querem perturbá-los emocionalmente ou, ainda, estarem ali por outros motivos.
O conhecimento da Doutrina Espírita e, particularmente, dos mecanismos da mediunidade é dito essencial para que quem mora em uma casa assombrada saiba como lidar com a questão. O Capítulo IX de O Livro dos Médiuns trata especificamente dos lugares assombrados, se bem que, para compreendê-lo, é recomendável a leitura de toda a obra.
As 12 casas mais mal assombradas
Sabe onde fica esse castelinho assustador? Na cidade de São Paulo! Localizado na Rua Apa, no bairro Campos Elísios, foi cenário de um crime em 1937. Dois irmãos estariam discutindo e acabaram trocando tiros. A mãe deles entrou e levou um tiro. Os três morreram! Só uma curiosidade: na mitologia grega, Campos Elísios é o mundo dos mortos!
Essa casa virou até filme de terror. A casa está localizada em Amityville, uma espécie de bairro localizado na cidade de Babylon, nos Estados Unidos. O lugar foi palco de um verdadeiro massacre. Um dos filhos da família que morava lá em 1974 matou os pais e os quatro irmãos. No ano seguinte, uma outra família comprou a casa, mas eles fugiram por medo, alegando que o local estava mal assombrado.
A casa foi vendida novamente em 2010 por cerca de R$ 1,7 milhões (US$ 950 mil).
Essa mansão assombrada foi colocada à venda no ano de 2009 pelo valor de R$ 18 milhões (US$ 10 milhões). Chamada de The Abbey, está localizada no bairro de Annandale, em Sidney, na Austrália. A mansão tem 50 quartos e dizem que todos esses cômodos escondem coisas assustadoras, pois uma loira de branco vaga por lá
Sabe de quem é esse prédio mal assombrado? Do ator Nicolas Cage! Chamada de LaLaurie Mansion, o local, que fica no Estado americano da Louisina foi comprado pelo ator em 2009. Dizem que a família que construiu o prédio gostava de torturar pessoas!
A mansão de Pickfair, construída em Beverly Hills, no Estado americano da Califórnia, pertenceu aos astros do cinema mudo Douglas Fairbanks e Mary Pickford. O fantasma da Mary ainda estaria na casa, que sofreu com a invasão de milhares de insetos assustadores anos atrás. O lugar está à venda por cerca de R$ 109 milhões (US$ 60 milhões)
O fórum Pickens, em Carrollton, no Estado americano do Alabama, é famoso por ter um fantasma que sempre aparece em uma das janelas. O fantasma seria de Henry Wells, que teria sido falsamente acusado de queimar o fórum e linchado até a morte em 1878
Essa seria a casa mais mal assombrada da Inglaterra. Várias pessoas que já moraram ali relataram presenças estranhas.
Thomas Whaley e sua família moraram nessa casa, em San Diego, nos Estados Unidos. Agora o local é um museu, mas continua com fama de mal assombrado. Um homem teria sido enforcado ali!
Essa mansão em Norfolk, na Inglaterra, pertence a uma mesma família há 400 anos. Dizem que o primeiro dono da casa, o Lorde Charles Townshend era cruel com sua mulher, Lady Dorothy. Ele a teria aprisionado na mansão depois de descobrir que ela teve um romance antes do casamento. Alguns dizem que ela foi empurrada das escadas da mansão!
A lenda diz que essa mansão, que fica em Yorkshire, no Reino Unido, é amaldiçoada por ter sido construída com pedras retiradas de outro local que já era assombrado! Bizarro, não é?
Essa casa foi construída em 1857 por Alexander Harris, como um presente para sua mulher. Ela morreu de febre amarela assim que a casa ficou pronta. Dizem que o homem não aguentou a pressão de perder a amada e se matou. Já viu tudo, não é?
É claro que o fantasminha que isso é uma montagem, mas ela serve para contar uma bizarra história. Os donos dessa casa em South Wales, na Inglaterra, a colocaram à venda, mas com uma condição curiosa. Quem comprasse a casa teria que ficar com o fantasma que a assombra. Sério! A pessoa teria até que assinar um contrato alegando exatamente isso!
Na ficção
Lendas acerca de casas mal-assombradas têm uma longa história na literatura, tendo autores da época da República Romana e do Império Romano como Plauto, Plínio o Novo e Luciano de Samósata escrito histórias sobre casas assombradas. Escritores modernos, desde Henry James a Stephen King, continuam a utilizá-las na sua escrita.
A casa assombrada é um elemento comum na literatura gótica e, em geral, no género de terror ou, mais recentemente, na ficção paranormal.
A estrutura de uma casa assombrada pode variar entre um antigo castelo feudal europeu e uma casa de subúrbio de construção recente. No entanto, muitos autores e cineastas preferem a arquitectura do século XIX ou anterior, particularmente mansões obscuras.
A chave do mistério é, muitas vezes, a presença de um ou mais fantasmas, usualmente devido a um assassinato ou outra morte trágica ocorrida naquele lugar no passado.
Casas assombradas na literatura
"The Castle of Otranto" (1764) de Horace Walpole
"The Mysteries of Udolpho" (1794) de Anne Radcliffe
"The Fall of the House of Usher" (1845) de Edgar Allan Poe
"The Haunted and the Haunters" (1857) de Edward Bulwer-Lytton
"The Turn of the Screw" (1898) de Henry James
"The House That Was" (1907) de Jacques Futrelle
"The Beckoning Fair One" (1911) de Oliver Onions
"The Rats in the Walls" (1924) de H. P. Lovecraft
"The Haunting of Hill House" (1959) de Shirley Jackson
"The Hell House" (A Casa Infernal) (1971) de Richard Matheson
"The Shining" (O Iluminado) (1977) de Stephen King
"From the Dust Returned" (2001) de Ray Bradbury
Casas assombradas no cinema
The Ghost House (1917)
The Haunted House (1921)
The Cat and the Canary (1927 & 1939)
The Cat Creeps (1930)
The Ghost Goes West (1936)
Lonesome Ghosts (1937)
Hold That Ghost (1941)
The Uninvited (1944)
The Ghost and Mrs. Muir (1947)
Scared Stiff (1953)
House on Haunted Hill (1958)
The Innocents (1961)
The Haunting (1963 & 1999)
The House That Dripped Blood (1970)
The Legend of Hell House (1973)
Burnt Offerings (1976)
The Amityville Horror (1979 & 2005)
The Shining (1980)
The Changeling (1980)
Poltergeist (1982)
The Nightstalker Murder (1986)
Beetlejuice (1988)
Casper (1995)
House on Haunted Hill (remake) (1999)
The Haunting (1999)
The Blair Witch Project (1999)
Thirteen Ghosts (remake) (2001)
The Others (2001)
Session 9 (2001)
Rose Red (2002)
Darkness (2002)
The Haunted Mansion (2003)
The Grudge (2004)
The Grudge 2 (2006)
Monster house (2006)
An American Haunting (2006)
Stay Alive (2006)
The Return (2006)
Return To House On Haunted Hill (2006)
Poltergeist - O Fenômeno (1982)
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C=115430
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Casa assombrada ou Casa mal-assombrada é o nome dado a uma casa onde supostamente acontecem eventos insólitos sem que se encontre uma causa física para os mesmos. Tais eventos podem ir desde ruídos ou movimentação de objetos até alegadas aparições de vultos mais ou menos distintos aos quais se chama de assombrações ou fantasmas.
A Doutrina Espírita explica que esses fenômenos são produzidos por espíritos desencarnados que, para produzirem efeitos físicos como ruídos, movimento de objetos e sua própria aparição, se valem do ectoplasma produzido por um ou mais dos moradores que, geralmente sem o saber, possuem mediunidade extensiva.
Esses espíritos, ainda segundo a Doutrina Espírita, podem produzir tais efeitos com mais de um objetivo. Podem ser espíritos levianos querendo se divertir provocando o medo dos moradores, podem ser espíritos desejosos de se comunicarem, podem ser os espíritos de antigos moradores que ainda se julgam donos da casa, podem ser desafetos dos moradores atuais que querem perturbá-los emocionalmente ou, ainda, estarem ali por outros motivos.
O conhecimento da Doutrina Espírita e, particularmente, dos mecanismos da mediunidade é dito essencial para que quem mora em uma casa assombrada saiba como lidar com a questão. O Capítulo IX de O Livro dos Médiuns trata especificamente dos lugares assombrados, se bem que, para compreendê-lo, é recomendável a leitura de toda a obra.
As 12 casas mais mal assombradas
Sabe onde fica esse castelinho assustador? Na cidade de São Paulo! Localizado na Rua Apa, no bairro Campos Elísios, foi cenário de um crime em 1937. Dois irmãos estariam discutindo e acabaram trocando tiros. A mãe deles entrou e levou um tiro. Os três morreram! Só uma curiosidade: na mitologia grega, Campos Elísios é o mundo dos mortos!
Essa casa virou até filme de terror. A casa está localizada em Amityville, uma espécie de bairro localizado na cidade de Babylon, nos Estados Unidos. O lugar foi palco de um verdadeiro massacre. Um dos filhos da família que morava lá em 1974 matou os pais e os quatro irmãos. No ano seguinte, uma outra família comprou a casa, mas eles fugiram por medo, alegando que o local estava mal assombrado.
A casa foi vendida novamente em 2010 por cerca de R$ 1,7 milhões (US$ 950 mil).
Essa mansão assombrada foi colocada à venda no ano de 2009 pelo valor de R$ 18 milhões (US$ 10 milhões). Chamada de The Abbey, está localizada no bairro de Annandale, em Sidney, na Austrália. A mansão tem 50 quartos e dizem que todos esses cômodos escondem coisas assustadoras, pois uma loira de branco vaga por lá
Sabe de quem é esse prédio mal assombrado? Do ator Nicolas Cage! Chamada de LaLaurie Mansion, o local, que fica no Estado americano da Louisina foi comprado pelo ator em 2009. Dizem que a família que construiu o prédio gostava de torturar pessoas!
A mansão de Pickfair, construída em Beverly Hills, no Estado americano da Califórnia, pertenceu aos astros do cinema mudo Douglas Fairbanks e Mary Pickford. O fantasma da Mary ainda estaria na casa, que sofreu com a invasão de milhares de insetos assustadores anos atrás. O lugar está à venda por cerca de R$ 109 milhões (US$ 60 milhões)
O fórum Pickens, em Carrollton, no Estado americano do Alabama, é famoso por ter um fantasma que sempre aparece em uma das janelas. O fantasma seria de Henry Wells, que teria sido falsamente acusado de queimar o fórum e linchado até a morte em 1878
Essa seria a casa mais mal assombrada da Inglaterra. Várias pessoas que já moraram ali relataram presenças estranhas.
Thomas Whaley e sua família moraram nessa casa, em San Diego, nos Estados Unidos. Agora o local é um museu, mas continua com fama de mal assombrado. Um homem teria sido enforcado ali!
Essa mansão em Norfolk, na Inglaterra, pertence a uma mesma família há 400 anos. Dizem que o primeiro dono da casa, o Lorde Charles Townshend era cruel com sua mulher, Lady Dorothy. Ele a teria aprisionado na mansão depois de descobrir que ela teve um romance antes do casamento. Alguns dizem que ela foi empurrada das escadas da mansão!
A lenda diz que essa mansão, que fica em Yorkshire, no Reino Unido, é amaldiçoada por ter sido construída com pedras retiradas de outro local que já era assombrado! Bizarro, não é?
Essa casa foi construída em 1857 por Alexander Harris, como um presente para sua mulher. Ela morreu de febre amarela assim que a casa ficou pronta. Dizem que o homem não aguentou a pressão de perder a amada e se matou. Já viu tudo, não é?
É claro que o fantasminha que isso é uma montagem, mas ela serve para contar uma bizarra história. Os donos dessa casa em South Wales, na Inglaterra, a colocaram à venda, mas com uma condição curiosa. Quem comprasse a casa teria que ficar com o fantasma que a assombra. Sério! A pessoa teria até que assinar um contrato alegando exatamente isso!
Na ficção
Lendas acerca de casas mal-assombradas têm uma longa história na literatura, tendo autores da época da República Romana e do Império Romano como Plauto, Plínio o Novo e Luciano de Samósata escrito histórias sobre casas assombradas. Escritores modernos, desde Henry James a Stephen King, continuam a utilizá-las na sua escrita.
A casa assombrada é um elemento comum na literatura gótica e, em geral, no género de terror ou, mais recentemente, na ficção paranormal.
A estrutura de uma casa assombrada pode variar entre um antigo castelo feudal europeu e uma casa de subúrbio de construção recente. No entanto, muitos autores e cineastas preferem a arquitectura do século XIX ou anterior, particularmente mansões obscuras.
A chave do mistério é, muitas vezes, a presença de um ou mais fantasmas, usualmente devido a um assassinato ou outra morte trágica ocorrida naquele lugar no passado.
Casas assombradas na literatura
"The Castle of Otranto" (1764) de Horace Walpole
"The Mysteries of Udolpho" (1794) de Anne Radcliffe
"The Fall of the House of Usher" (1845) de Edgar Allan Poe
"The Haunted and the Haunters" (1857) de Edward Bulwer-Lytton
"The Turn of the Screw" (1898) de Henry James
"The House That Was" (1907) de Jacques Futrelle
"The Beckoning Fair One" (1911) de Oliver Onions
"The Rats in the Walls" (1924) de H. P. Lovecraft
"The Haunting of Hill House" (1959) de Shirley Jackson
"The Hell House" (A Casa Infernal) (1971) de Richard Matheson
"The Shining" (O Iluminado) (1977) de Stephen King
"From the Dust Returned" (2001) de Ray Bradbury
Casas assombradas no cinema
The Ghost House (1917)
The Haunted House (1921)
The Cat and the Canary (1927 & 1939)
The Cat Creeps (1930)
The Ghost Goes West (1936)
Lonesome Ghosts (1937)
Hold That Ghost (1941)
The Uninvited (1944)
The Ghost and Mrs. Muir (1947)
Scared Stiff (1953)
House on Haunted Hill (1958)
The Innocents (1961)
The Haunting (1963 & 1999)
The House That Dripped Blood (1970)
The Legend of Hell House (1973)
Burnt Offerings (1976)
The Amityville Horror (1979 & 2005)
The Shining (1980)
The Changeling (1980)
Poltergeist (1982)
The Nightstalker Murder (1986)
Beetlejuice (1988)
Casper (1995)
House on Haunted Hill (remake) (1999)
The Haunting (1999)
The Blair Witch Project (1999)
Thirteen Ghosts (remake) (2001)
The Others (2001)
Session 9 (2001)
Rose Red (2002)
Darkness (2002)
The Haunted Mansion (2003)
The Grudge (2004)
The Grudge 2 (2006)
Monster house (2006)
An American Haunting (2006)
Stay Alive (2006)
The Return (2006)
Return To House On Haunted Hill (2006)
Poltergeist - O Fenômeno (1982)
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sexta-feira, 13 de abril de 2012
O Casal Curie - Radium
O CASAL CURIE - Radium
Operários da ciência, Pierre e Marie construíram as bases do conhecimento moderno do átomo. Famosos, premiados, reclamavam que não podiam trabalhar tanto quanto queriam.
Quando se fala em átomo, urânio, radioatividade, a primeira idéia que vem à cabeça é a de uma imensa usina recheada de aparelhos sofisticados. Mas foi num pequeno galpão improvisado em laboratório, mais parecido com um celeiro ou uma estrebaria, que, em dezembro de 1898, o casal francês Pierre e Marie Curie fez uma descoberta que está na base da ciência moderna: o elemento químico a que chamaram radium. Eles trabalhavam com duas panelas em um fogão que esquentava mal e escreviam suas anotações sobre mesas ordinárias de madeira. O lugar, nos fundos da modesta Escola Municipal de Física e Química, em Paris, onde Pierre era professor, tinha sido emprestado pela diretoria. Foi desse trabalho quase primitivo que brotaram dois prêmios Nobel, atribuídos, um, ao casal e, outro, a Marie Curie, já viúva.
Não que, naquela época, a França fosse um país pobre. Mas os Curie eram. Marie Sklodowska, imigrante polonesa, chegara a Paris em 1891 tendo como diploma apenas o de professora. Voluntariosa, calada, forte, dona de uma rara curiosidade científica, memória prodigiosa e acentuado gosto pela Matemática, ela entrou para a Sorbonne. Em quatro anos, formou-se em Física e em Matemática. Estudante, vivia com os parcos recursos de uma bolsa e o pouco dinheiro que a sua irmã Bronia lhe enviava da Polônia. Essa renda mínima permitia a Marie apenas alugar um quartinho minúsculo e comer o estritamente necessário para sobreviver-e é certo que durante um bom período viveu praticamente de pão, manteiga e chá, a ponto de os colegas temerem por sua saúde.
Em abril de 1894, aos 26 anos, ela se dedicava a uma pesquisa sobre as propriedades de certos metais e, para tanto, procurava um lugar onde pudesse fazer suas experiências. Foi quando um amigo polonês fez, para ajudá-la, algo que mudaria o curso da vida de Marie e da própria ciência. Ele a apresenta a um conhecido, chefe de pesquisa na Escola de Física, chamado Pierre Curie. Pierre era alto, usava os cabelos castanhos cortados a escovinha, tinha barbicha e doces olhos castanho-claros. Era imensamente inteligente e, como ela, adorava a Física e a Matemática. Enfim, essas qualidades, além de uma enorme ternura, conquistaram a estudante.
Como ela, Pierre era tímido e introvertido. Como ela também, preocupava-se com problemas sociais. Filho de médico, aos 35 anos ainda morava na casa dos pais, na periferia de Paris. Anos antes de conhecer Marie, em 1880, Pierre e seu irmão Jacques tinham feito uma descoberta importante: a piezeletricidade, ou seja, a produção de corrente elétrica em conseqüência da compressão ou dilatação de cristais cuja estrutura molecular não é simétrica. As antigas cápsulas de cerâmica dos toca- discos, o acendedor elétrico de fogão e o relógio a quartzo, por exemplo, seriam conseqüências a longo prazo desse trabalho.
Na época, o físico já era conhecido na comunidade científica francesa e preparava sua tese de doutorado. Pierre, naturalmente, encantou-se com aquela mulher com a qual podia conversar sobre ciência-e ser compreendido, coisa rara naquele tempo. O resto foi decorrência. Pouco mais de um ano depois do primeiro encontro, em setembro de 1895 os dois se casaram. Ao voltarem da lua-de-mel, passada esportivamente numa viagem pelo interior da França a bordo de duas bicicletas, foram morar num pequeno apartamento perto da escola.
A essa altura, Pierre tinha sido promovido a professor e ganhava um pouco mais. Marie, por seu lado, se preparava para o concurso de mestrado e procurava um trabalho de pesquisa remunerado.
Os dois primeiros anos do casamento, conforme ela escreveu em autobiografia, foram "os melhores de minha vida". Eles passavam o dia na escola, cujo diretor havia permitido que Marie usasse ali um laboratório. Enquanto Pierre se dedicava às aulas e pesquisas sobre cristais, ela mergulhava num trabalho sobre variações das propriedades magnéticas de diversos tipos de aço em função de suas propriedades químicas (proporção de ferro na composição). "Nossa vida é sempre a mesma", escreveu ela numa carta ao irmão, na Polônia. Essa rotina foi alterada quando Marie engravidou. Ela teve uma gravidez difícil, a ponto de muitas vezes nem conseguir trabalhar.
Em setembro de 1896, Irène nasceu. Marie não permitiu que a condição de mãe a afastasse da Física. Assim, ao mesmo tempo que preparava sua monografia sobre os aços, ela procurava uma tese para seu doutorado-um ato surpreendente, já que havia, em toda a Europa, uma única mulher com o título de doutora: a alemã Elsa Neumann, autora de uma tese sobre eletroquímica. Marie seria a segunda. Eram tempos prodigiosos aqueles. No mundo científico pontificavam figuras gigantescas como Sigmund Freud e Louis Pasteur, este falecido em 1985. Faziam-se espantosos progressos no conhecimento e no uso da eletricidade, media-se com precisão a velocidade da luz.
Pesquisadores ousados subiam em balões a 10 mil metros para fazer a previsão do tempo, enquanto nos Estados Unidos cartões perfurados ajudavam a coletar e interpretar os dados do recenseamento. Foi no ano em que Irène nasceu que o francês Antoine-Henri Becquerel (1852- 1908) descobriu que os sais de urânio emitiam raios que, como os raios X, penetram a matéria. Interessada, Marie resolveu tirar daí sua tese: medir esses raios e verificar se, além do urânio, havia outros elementos capazes de produzir radiações. Logo nas primeiras semanas fez uma descoberta animadora: o tório e seus compostos tinham as mesmas propriedades do urânio. Marie passou a outra série de experiências. Com um aparelho inventado por Pierre, mediu a intensidade da corrente provocada pelos compostos de urânio e tório. O primeiro resultado foi a descoberta de que a atividade dos compostos de urânio dependia apenas da quantidade de urânio neles presente-e de nada mais. Do ponto de vista científico, foi essa descoberta-e não as posteriores, às quais ela iria dever sua celebridade - que constitui a obra-mestra de Marie Curie.
Afinal, ela tinha provado que, ao contrário do que se poderia supor na época, a radiação não era conseqüência nem da interação entre as moléculas, nem da formação de novas moléculas, nem ainda da reorganização de moléculas em novos esquemas-como ocorre numa reação química normal.
A nova energia só podia se originar dos átomos propriamente ditos: a radiação é obrigatoriamente uma propriedade dos átomos de certos elementos químicos. A partir dessa descoberta, a ciência adquiria as primeiras condições de decifrar os mistérios atômicos.
Entre as substâncias manipuladas por Marie Curie estavam dois minerais que, segundo ela desconfiava continham forte proporção de urânio a pechblenda e a chalcolita. Ela intuía que esses minerais continham, na verdade, pequenas quantidades de outra substância-então ainda desconhecida-consideravelmente mais ativa que o próprio urânio. Ao ser colocado diante da hipótese, Pierre ficou intrigadíssimo e resolveu interromper seus trabalhos com os cristais e dedicar-se aos átomos. Era 14 de abril de 1898.
Marie tinha a mania de anotar tudo que fosse quantificável. Em cadernos meticulosamente organizados, marcava o preço dos sapatos do marido, a conta da lavanderia, da eletricidade ou dos queijos. Essa obsessão foi muito útil para sua atividade científica, já que as notas continham sempre observações objetivas. Se ela tivesse que registrar que estava cansada, diria "subi 25 degraus e tive de parar". Os cadernos de Marie revelam que o casal trabalhava até altas horas. As únicas distrações que se permitiam eram uma rara peça de teatro ou um passeio de bicicleta ou ainda uma reunião com os colegas cientistas, nas tardes de domingo. Nenhum dos dois gastava muito: comiam pouco e se vestiam modestamente.
Uma das marcas registradas de Marie, por exemplo, eram seus vestidos, sempre compridos e pretos, cinza ou marinho. Em junho de 1898, apenas dois meses depois de iniciada a pesquisa com a pechblenda, algo extraordinário aconteceu. No dia 6, sabe-se pelas anotações, Marie pegou uma solução de nitrato de bismuto e misturou-a a sulfato de hidrogênio. Depois, recolheu o sólido assim precipitado e mediu sua atividade. O resultado está sublinhado: " 150 vezes mais ativo que o urânio". No mesmo dia, depois de colocar sulfato de bismuto numa proveta e aquecê-lo a 300 graus, Pierre percebeu que um fino pó negro se depositara no vidro. Em dado momento, a proveta estourou, mas a atividade do pó negro foi medida: 330 vezes superior à do urânio. À medida que purificavam a substância, com a retirada do bismuto, mais ela se revelava radioativa.
Como suspeitava Marie, estavam diante de um novo elemento-e, em homenagem a seu país natal, chamaram- no polonium (polônio, em português). De julho a novembro de 1898, o casal se afastou do laboratório para cuidar da saúde. Ambos sentiam um cansaço inexplicável e dores leves mas preocupantes. Estavam frágeis e ficavam doentes continuamente. Pierre achava que estava com reumatismo. As pontas dos dedos de Marie doíam muito e rachavam à medida que ela manipulava as soluções purificadas. Eram já conseqüências da radioatividade-mas, à época, não se conheciam seus efeitos nocivos para o organismo.
De volta à pesquisa, obtiveram uma substância novecentas vezes mais radioativa que o urânio. Ao novo elemento deram o nome de radium (rádio). A 26 de dezembro, a descoberta é comunicada à Academia de Ciências numa nota assinada por Pierre, Marie e ainda pelo químico Georges Bémont-chefe da equipe de pesquisas da escola. Só faltava provar que o rádio era um elemento da natureza e não uma substância produzida em laboratório. Foi a isso que, de 1899 a 1902, o casal se dedicou. Pierre mergulhou no estudo das propriedades da radiação, enquanto Marie tentava isolar a substância e obter um frasco de sal de rádio. Para consegui-lo, ela trabalhou sobre toneladas de resíduos de pechblenda.
"Eu passava às vezes o dia inteiro a mexer uma massa em ebulição com um bastão de ferro quase tão grande quanto eu. A noite, estava quebrada de cansaço", escreveu Marie. Apesar disso, esse trabalho era sua paixão. À noite, depois de voltar para casa e cuidar da filha, eles retornavam ao laboratório. "Para dar uma olhada", dizia Marie. "Nossos preciosos produtos, para os quais não tínhamos abrigo, estavam colocados sobre mesas e prateleiras; de todos os lados víamos suas silhuetas fracamente luminosas, e essas luzes que pareciam suspensas na escuridão eram um motivo sempre novo de emoção e encantamento." O rádio purificado é uma substância luminosa e fluorescente.
Em 1900, Pierre foi finalmente convidado para professor da Sorbonne, enquanto Marie assumia o posto de professora de Ciências Físicas na Escola Normal Superior da cidade de Sèvres, perto de Paris, só para moças. Os novos empregos roubam tempo às pesquisas. Mas, em março de 1902, Marie escreve: "Ra = 225,92". Ou seja, ela havia chegado ao peso de um átomo de rádio. As experiências sobre as propriedades do rádio pareciam indicar que ele poderia ser útil no combate ao câncer.
A notícia correu mundo e o casal foi propelido à celebridade. Pierre é convidado a pronunciar uma conferência na respeitadíssima Royal Society de Londres, o templo supremo da ciência européia. Marie recebe menção honrosa ao apresentar sua tese de doutorado em Física, na Sorbonne. Em dezembro de 1903, enfim, a Academia Sueca concede o Prêmio Nobel de Física ao casal Curie e a Antoine-Henri Becquerel. A fama chegou para atrapalhar o casal. Acostumados a uma vida quieta, eles não conseguem se livrar dos inúmeros convites para entrevistas, recepções, jantares ou espetáculos ao lado dos grandes nomes da sociedade. Um ano depois do Prêmio Nobel, sua filha Eve nasce-e isso complica ainda mais as coisas.
Pierre se incomoda profundamente com o novo ritmo. Numa carta enviada a um amigo de infância, em julho de 1905, desabafa: "Há mais de um ano não faço nenhum trabalho e não tenho um minuto para mim. Esta é uma questão de vida ou de morte do ponto de vista intelectual". Mesmo assim, pressionado pelo reitor da Universidade de Paris, no mesmo ano Pierre aceita disputar uma cadeira na Academia de Ciências-na primeira tentativa, anos antes, ele fora derrotado e sofrera com isso. Desta vez, ganha. Em abril de 1906, Pierre acabara de abandonar os trabalhos com a radioatividade e se preparava para voltar a seus velhos cristais. Na tarde do dia 5, depois do almoço dos professores da Faculdade de Ciências, foi a pé até a editora que publicava seus artigos. A porta estava fechada: gráficos em greve. Pierre. Então, decidiu caminhar até o cais do Sena, em direção à Academia.
No meio do caminho, foi atropelado: a roda de uma charrete passou por cima de sua cabeça. Tinha apenas 47 anos. Arrasada com a notícia, Marie se abandonou a uma dor profunda. Sete meses mais tarde, depois de muita insistência, aceitou ocupar a cadeira que pertencera ao marido na Sorbonne. Sua aula inaugural reuniu mais de uma centena de pessoas dos mais diferentes meios. Ela não fez por menos: começou o curso retomando a última aula de Pierre, exatamente onde ele havia terminado. Nos quatro anos seguintes, além de lecionar, dedicou-se a extrair rádio puro, numa tarefa penosa.
Taciturna, reservada, preocupada em preservar sua privacidade, Marie viu-se em 1911 no centro de um escândalo. A mulher do físico Paul Langevin -que freqüentou a roda dos Curie por longos anos-tornou pública a correspondência amorosa entre Marie e seu marido. O escândalo foi tal que, por alguns meses, com a saúde abalada, ela viveu escondida fora de Paris, com o nome de solteira. No meio desse furacão, a Academia Sueca Ihe concede seu segundo Prêmio Nobel-desta vez de Química, pela descoberta do rádio e do polônio.
Em 1914, graças à doação do milionário americano Andrew Carnegie, é construído em Paris o Instituto do Radium-e um dos prédios é o Pavilhão Curie, onde ela instalará seu laboratório. Mas o trabalho científico teria que esperar: a Primeira Guerra Mundial mobiliza as energias da cientista. Ela cria uma rede de postos volantes de raios X em todo o front francês.
No fim da guerra, retoma suas pesquisas e, desde então, passa os dias trabalhando doze, catorze horas por dia no laboratório. Em 1921, um giro de conferências a leva a vários países, entre eles o Brasil. Nos Estados Unidos teve uma acolhida triunfal-as mulheres se cotizaram para doar-lhe um grama de rádio, que ela utilizaria nas pesquisas sobre aplicações da radioatividade em Medicina.
A essa altura, Marie era amiga de todos os grandes nomes da ciência, Albert Einstein, por exemplo, chegou a passar férias com ela, na sua casa no sul da França. O curie tornou-se a unidade de medida da radioatividade. Com a saúde minada e quase cega, Marie morreria aos 66 anos, em 1934, vítima de leucemia-provável conseqüência de anos de manipulação de substâncias radioativas. Um ano a mais de vida e ela teria tido a alegria de ver a filha Irène e o genro Frédéric Joliot-ambos físicos e formados à sombra da velha dama-receberem o terceiro Prêmio Nobel (de Química) da família Curie.
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Operários da ciência, Pierre e Marie construíram as bases do conhecimento moderno do átomo. Famosos, premiados, reclamavam que não podiam trabalhar tanto quanto queriam.
Quando se fala em átomo, urânio, radioatividade, a primeira idéia que vem à cabeça é a de uma imensa usina recheada de aparelhos sofisticados. Mas foi num pequeno galpão improvisado em laboratório, mais parecido com um celeiro ou uma estrebaria, que, em dezembro de 1898, o casal francês Pierre e Marie Curie fez uma descoberta que está na base da ciência moderna: o elemento químico a que chamaram radium. Eles trabalhavam com duas panelas em um fogão que esquentava mal e escreviam suas anotações sobre mesas ordinárias de madeira. O lugar, nos fundos da modesta Escola Municipal de Física e Química, em Paris, onde Pierre era professor, tinha sido emprestado pela diretoria. Foi desse trabalho quase primitivo que brotaram dois prêmios Nobel, atribuídos, um, ao casal e, outro, a Marie Curie, já viúva.
Não que, naquela época, a França fosse um país pobre. Mas os Curie eram. Marie Sklodowska, imigrante polonesa, chegara a Paris em 1891 tendo como diploma apenas o de professora. Voluntariosa, calada, forte, dona de uma rara curiosidade científica, memória prodigiosa e acentuado gosto pela Matemática, ela entrou para a Sorbonne. Em quatro anos, formou-se em Física e em Matemática. Estudante, vivia com os parcos recursos de uma bolsa e o pouco dinheiro que a sua irmã Bronia lhe enviava da Polônia. Essa renda mínima permitia a Marie apenas alugar um quartinho minúsculo e comer o estritamente necessário para sobreviver-e é certo que durante um bom período viveu praticamente de pão, manteiga e chá, a ponto de os colegas temerem por sua saúde.
Em abril de 1894, aos 26 anos, ela se dedicava a uma pesquisa sobre as propriedades de certos metais e, para tanto, procurava um lugar onde pudesse fazer suas experiências. Foi quando um amigo polonês fez, para ajudá-la, algo que mudaria o curso da vida de Marie e da própria ciência. Ele a apresenta a um conhecido, chefe de pesquisa na Escola de Física, chamado Pierre Curie. Pierre era alto, usava os cabelos castanhos cortados a escovinha, tinha barbicha e doces olhos castanho-claros. Era imensamente inteligente e, como ela, adorava a Física e a Matemática. Enfim, essas qualidades, além de uma enorme ternura, conquistaram a estudante.
Como ela, Pierre era tímido e introvertido. Como ela também, preocupava-se com problemas sociais. Filho de médico, aos 35 anos ainda morava na casa dos pais, na periferia de Paris. Anos antes de conhecer Marie, em 1880, Pierre e seu irmão Jacques tinham feito uma descoberta importante: a piezeletricidade, ou seja, a produção de corrente elétrica em conseqüência da compressão ou dilatação de cristais cuja estrutura molecular não é simétrica. As antigas cápsulas de cerâmica dos toca- discos, o acendedor elétrico de fogão e o relógio a quartzo, por exemplo, seriam conseqüências a longo prazo desse trabalho.
Na época, o físico já era conhecido na comunidade científica francesa e preparava sua tese de doutorado. Pierre, naturalmente, encantou-se com aquela mulher com a qual podia conversar sobre ciência-e ser compreendido, coisa rara naquele tempo. O resto foi decorrência. Pouco mais de um ano depois do primeiro encontro, em setembro de 1895 os dois se casaram. Ao voltarem da lua-de-mel, passada esportivamente numa viagem pelo interior da França a bordo de duas bicicletas, foram morar num pequeno apartamento perto da escola.
A essa altura, Pierre tinha sido promovido a professor e ganhava um pouco mais. Marie, por seu lado, se preparava para o concurso de mestrado e procurava um trabalho de pesquisa remunerado.
Os dois primeiros anos do casamento, conforme ela escreveu em autobiografia, foram "os melhores de minha vida". Eles passavam o dia na escola, cujo diretor havia permitido que Marie usasse ali um laboratório. Enquanto Pierre se dedicava às aulas e pesquisas sobre cristais, ela mergulhava num trabalho sobre variações das propriedades magnéticas de diversos tipos de aço em função de suas propriedades químicas (proporção de ferro na composição). "Nossa vida é sempre a mesma", escreveu ela numa carta ao irmão, na Polônia. Essa rotina foi alterada quando Marie engravidou. Ela teve uma gravidez difícil, a ponto de muitas vezes nem conseguir trabalhar.
Em setembro de 1896, Irène nasceu. Marie não permitiu que a condição de mãe a afastasse da Física. Assim, ao mesmo tempo que preparava sua monografia sobre os aços, ela procurava uma tese para seu doutorado-um ato surpreendente, já que havia, em toda a Europa, uma única mulher com o título de doutora: a alemã Elsa Neumann, autora de uma tese sobre eletroquímica. Marie seria a segunda. Eram tempos prodigiosos aqueles. No mundo científico pontificavam figuras gigantescas como Sigmund Freud e Louis Pasteur, este falecido em 1985. Faziam-se espantosos progressos no conhecimento e no uso da eletricidade, media-se com precisão a velocidade da luz.
Pesquisadores ousados subiam em balões a 10 mil metros para fazer a previsão do tempo, enquanto nos Estados Unidos cartões perfurados ajudavam a coletar e interpretar os dados do recenseamento. Foi no ano em que Irène nasceu que o francês Antoine-Henri Becquerel (1852- 1908) descobriu que os sais de urânio emitiam raios que, como os raios X, penetram a matéria. Interessada, Marie resolveu tirar daí sua tese: medir esses raios e verificar se, além do urânio, havia outros elementos capazes de produzir radiações. Logo nas primeiras semanas fez uma descoberta animadora: o tório e seus compostos tinham as mesmas propriedades do urânio. Marie passou a outra série de experiências. Com um aparelho inventado por Pierre, mediu a intensidade da corrente provocada pelos compostos de urânio e tório. O primeiro resultado foi a descoberta de que a atividade dos compostos de urânio dependia apenas da quantidade de urânio neles presente-e de nada mais. Do ponto de vista científico, foi essa descoberta-e não as posteriores, às quais ela iria dever sua celebridade - que constitui a obra-mestra de Marie Curie.
Afinal, ela tinha provado que, ao contrário do que se poderia supor na época, a radiação não era conseqüência nem da interação entre as moléculas, nem da formação de novas moléculas, nem ainda da reorganização de moléculas em novos esquemas-como ocorre numa reação química normal.
A nova energia só podia se originar dos átomos propriamente ditos: a radiação é obrigatoriamente uma propriedade dos átomos de certos elementos químicos. A partir dessa descoberta, a ciência adquiria as primeiras condições de decifrar os mistérios atômicos.
Entre as substâncias manipuladas por Marie Curie estavam dois minerais que, segundo ela desconfiava continham forte proporção de urânio a pechblenda e a chalcolita. Ela intuía que esses minerais continham, na verdade, pequenas quantidades de outra substância-então ainda desconhecida-consideravelmente mais ativa que o próprio urânio. Ao ser colocado diante da hipótese, Pierre ficou intrigadíssimo e resolveu interromper seus trabalhos com os cristais e dedicar-se aos átomos. Era 14 de abril de 1898.
Marie tinha a mania de anotar tudo que fosse quantificável. Em cadernos meticulosamente organizados, marcava o preço dos sapatos do marido, a conta da lavanderia, da eletricidade ou dos queijos. Essa obsessão foi muito útil para sua atividade científica, já que as notas continham sempre observações objetivas. Se ela tivesse que registrar que estava cansada, diria "subi 25 degraus e tive de parar". Os cadernos de Marie revelam que o casal trabalhava até altas horas. As únicas distrações que se permitiam eram uma rara peça de teatro ou um passeio de bicicleta ou ainda uma reunião com os colegas cientistas, nas tardes de domingo. Nenhum dos dois gastava muito: comiam pouco e se vestiam modestamente.
Uma das marcas registradas de Marie, por exemplo, eram seus vestidos, sempre compridos e pretos, cinza ou marinho. Em junho de 1898, apenas dois meses depois de iniciada a pesquisa com a pechblenda, algo extraordinário aconteceu. No dia 6, sabe-se pelas anotações, Marie pegou uma solução de nitrato de bismuto e misturou-a a sulfato de hidrogênio. Depois, recolheu o sólido assim precipitado e mediu sua atividade. O resultado está sublinhado: " 150 vezes mais ativo que o urânio". No mesmo dia, depois de colocar sulfato de bismuto numa proveta e aquecê-lo a 300 graus, Pierre percebeu que um fino pó negro se depositara no vidro. Em dado momento, a proveta estourou, mas a atividade do pó negro foi medida: 330 vezes superior à do urânio. À medida que purificavam a substância, com a retirada do bismuto, mais ela se revelava radioativa.
Como suspeitava Marie, estavam diante de um novo elemento-e, em homenagem a seu país natal, chamaram- no polonium (polônio, em português). De julho a novembro de 1898, o casal se afastou do laboratório para cuidar da saúde. Ambos sentiam um cansaço inexplicável e dores leves mas preocupantes. Estavam frágeis e ficavam doentes continuamente. Pierre achava que estava com reumatismo. As pontas dos dedos de Marie doíam muito e rachavam à medida que ela manipulava as soluções purificadas. Eram já conseqüências da radioatividade-mas, à época, não se conheciam seus efeitos nocivos para o organismo.
De volta à pesquisa, obtiveram uma substância novecentas vezes mais radioativa que o urânio. Ao novo elemento deram o nome de radium (rádio). A 26 de dezembro, a descoberta é comunicada à Academia de Ciências numa nota assinada por Pierre, Marie e ainda pelo químico Georges Bémont-chefe da equipe de pesquisas da escola. Só faltava provar que o rádio era um elemento da natureza e não uma substância produzida em laboratório. Foi a isso que, de 1899 a 1902, o casal se dedicou. Pierre mergulhou no estudo das propriedades da radiação, enquanto Marie tentava isolar a substância e obter um frasco de sal de rádio. Para consegui-lo, ela trabalhou sobre toneladas de resíduos de pechblenda.
"Eu passava às vezes o dia inteiro a mexer uma massa em ebulição com um bastão de ferro quase tão grande quanto eu. A noite, estava quebrada de cansaço", escreveu Marie. Apesar disso, esse trabalho era sua paixão. À noite, depois de voltar para casa e cuidar da filha, eles retornavam ao laboratório. "Para dar uma olhada", dizia Marie. "Nossos preciosos produtos, para os quais não tínhamos abrigo, estavam colocados sobre mesas e prateleiras; de todos os lados víamos suas silhuetas fracamente luminosas, e essas luzes que pareciam suspensas na escuridão eram um motivo sempre novo de emoção e encantamento." O rádio purificado é uma substância luminosa e fluorescente.
Em 1900, Pierre foi finalmente convidado para professor da Sorbonne, enquanto Marie assumia o posto de professora de Ciências Físicas na Escola Normal Superior da cidade de Sèvres, perto de Paris, só para moças. Os novos empregos roubam tempo às pesquisas. Mas, em março de 1902, Marie escreve: "Ra = 225,92". Ou seja, ela havia chegado ao peso de um átomo de rádio. As experiências sobre as propriedades do rádio pareciam indicar que ele poderia ser útil no combate ao câncer.
A notícia correu mundo e o casal foi propelido à celebridade. Pierre é convidado a pronunciar uma conferência na respeitadíssima Royal Society de Londres, o templo supremo da ciência européia. Marie recebe menção honrosa ao apresentar sua tese de doutorado em Física, na Sorbonne. Em dezembro de 1903, enfim, a Academia Sueca concede o Prêmio Nobel de Física ao casal Curie e a Antoine-Henri Becquerel. A fama chegou para atrapalhar o casal. Acostumados a uma vida quieta, eles não conseguem se livrar dos inúmeros convites para entrevistas, recepções, jantares ou espetáculos ao lado dos grandes nomes da sociedade. Um ano depois do Prêmio Nobel, sua filha Eve nasce-e isso complica ainda mais as coisas.
Pierre se incomoda profundamente com o novo ritmo. Numa carta enviada a um amigo de infância, em julho de 1905, desabafa: "Há mais de um ano não faço nenhum trabalho e não tenho um minuto para mim. Esta é uma questão de vida ou de morte do ponto de vista intelectual". Mesmo assim, pressionado pelo reitor da Universidade de Paris, no mesmo ano Pierre aceita disputar uma cadeira na Academia de Ciências-na primeira tentativa, anos antes, ele fora derrotado e sofrera com isso. Desta vez, ganha. Em abril de 1906, Pierre acabara de abandonar os trabalhos com a radioatividade e se preparava para voltar a seus velhos cristais. Na tarde do dia 5, depois do almoço dos professores da Faculdade de Ciências, foi a pé até a editora que publicava seus artigos. A porta estava fechada: gráficos em greve. Pierre. Então, decidiu caminhar até o cais do Sena, em direção à Academia.
No meio do caminho, foi atropelado: a roda de uma charrete passou por cima de sua cabeça. Tinha apenas 47 anos. Arrasada com a notícia, Marie se abandonou a uma dor profunda. Sete meses mais tarde, depois de muita insistência, aceitou ocupar a cadeira que pertencera ao marido na Sorbonne. Sua aula inaugural reuniu mais de uma centena de pessoas dos mais diferentes meios. Ela não fez por menos: começou o curso retomando a última aula de Pierre, exatamente onde ele havia terminado. Nos quatro anos seguintes, além de lecionar, dedicou-se a extrair rádio puro, numa tarefa penosa.
Taciturna, reservada, preocupada em preservar sua privacidade, Marie viu-se em 1911 no centro de um escândalo. A mulher do físico Paul Langevin -que freqüentou a roda dos Curie por longos anos-tornou pública a correspondência amorosa entre Marie e seu marido. O escândalo foi tal que, por alguns meses, com a saúde abalada, ela viveu escondida fora de Paris, com o nome de solteira. No meio desse furacão, a Academia Sueca Ihe concede seu segundo Prêmio Nobel-desta vez de Química, pela descoberta do rádio e do polônio.
Em 1914, graças à doação do milionário americano Andrew Carnegie, é construído em Paris o Instituto do Radium-e um dos prédios é o Pavilhão Curie, onde ela instalará seu laboratório. Mas o trabalho científico teria que esperar: a Primeira Guerra Mundial mobiliza as energias da cientista. Ela cria uma rede de postos volantes de raios X em todo o front francês.
No fim da guerra, retoma suas pesquisas e, desde então, passa os dias trabalhando doze, catorze horas por dia no laboratório. Em 1921, um giro de conferências a leva a vários países, entre eles o Brasil. Nos Estados Unidos teve uma acolhida triunfal-as mulheres se cotizaram para doar-lhe um grama de rádio, que ela utilizaria nas pesquisas sobre aplicações da radioatividade em Medicina.
A essa altura, Marie era amiga de todos os grandes nomes da ciência, Albert Einstein, por exemplo, chegou a passar férias com ela, na sua casa no sul da França. O curie tornou-se a unidade de medida da radioatividade. Com a saúde minada e quase cega, Marie morreria aos 66 anos, em 1934, vítima de leucemia-provável conseqüência de anos de manipulação de substâncias radioativas. Um ano a mais de vida e ela teria tido a alegria de ver a filha Irène e o genro Frédéric Joliot-ambos físicos e formados à sombra da velha dama-receberem o terceiro Prêmio Nobel (de Química) da família Curie.
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Caraguatás: Beleza e Perigo
CARAGUATÁS: BELEZA E PERIGO
Eles formam um verdadeiro pântano no alto das árvores e abrigam muitas espécies de seres vivos, entre eles os mosquitos que transmitem muitas doenças perigosas. Por isso os sanitaristas repetem: lugar de caraguatá é na floresta.
Diariamente chegam às cidades, sobretudo nos Estados do Sul, grandes quantidades de caraguatás, ou bromélias, trazidas por vendedores de plantas ornamentais que as arrancam na mata. Eles entraram na moda porque produzem flores de forte colorido e são, sem dúvida, muito bonitos. Mas convém ter cuidado com os caraguatás - sobretudo os de origem silvestre. Eles possuem a original capacidade de viver sobre outras plantas- daí seu nome científico epífitas-e podem ser hospedeiros de larvas de mosquitos capazes de transmitir inúmeras moléstias, desde a malária às viroses responsáveis por alguns tipos de encefalites.
Isso deixa bem claro que lugar de caraguatá é no mato - lá, ele é imprescindível para garantir o equilíbrio ecológico de toda a região. E no desempenho desse papel eles são, realmente, fantásticos. "Nas florestas tropicais da América existem verdadeiros pântanos suspensos sobre as árvores", escreveu um biólogo francês depois da descoberta para ele surpreendente: uma variedade enorme de animais aquáticos, típicos habitantes de pântanos e lagoas, consegue viver a 30 metros de altura, junto às copas das árvores. Desde microscópicos protozoários e larvas de insetos até pequenos vertebrados, como os sapinhos arborícolas, sobrevivem naquela altura graças a pequenas quantidades de água de chuva ou de orvalho acumuladas pelos caraguatás.
São poucos os litros de água que uma planta dessas pode reter, mas existem centenas de milhões (isso mesmo: centenas de milhões) de caraguatás povoando os galhos das árvores em grandes extensões de florestas. Na Mata Atlântica, em apenas uma árvore é possível encontrar até quinhentos caraguatás, cada qual com enorme quantidade de seres abrigados entre as folhas. Somando todas essas unidades obtém- se o que muito apropriadamente aquele biólogo chamou "um pântano suspenso?".
É grande a variedade de plantas que servem de criadouro para pequenos animais, mas poucas conseguem hospedar uma fauna tão abundante e diversificada como os caraguatás. Suspensos nas árvores, eles não abrigam apenas seres aquáticos. Em suas folhas podem ser encontrados também inesperados habitantes ao solo e até do subsolo da floresta.
É que, além da água, uma boa quantidade de folhas caídas fica retida pelo caraguatá e todo esse material se decompõe lentamente, transformando- se num húmus muito semelhante ao do solo. Ele serve de residência para aranhas, besouros, centopéias, lesmas e até mesmo minhocas. Assim, não foi apenas o pântano que ficou suspenso com os caraguatás: eles levaram para o telhado da floresta um pouco de seu chão e outro pouco do seu porão. Do ponto de vista ecológico, os caraguatás conseguiram, literalmente, virar a mata de cabeça para baixo.
É claro que isso tudo não aconteceu de uma hora para outra. Foram necessários alguns milhões de anos para que a família botânica das bromeliáceas-que engloba as bromélias e os ananases, ou abacaxis - produzisse espécies capazes de viver sobre as árvores. Distanciando - se do solo, essas pioneiras ficaram impossibilitadas de absorver, pelas raízes, a água e os sais minerais, como faziam suas ancestrais terrestres. E, se realizaram a façanha de conquistar o topo da floresta, foi porque já contavam com algum mecanismo capaz de solucionar esse problema vital.
Pelo menos um grupo de bromeliáceas primitivas já dispunha de uma "inovação' evolutiva para substituir a convencional raiz absorvente. Entre elas, a coleta dos nutrientes passou a ser feita por células altamente especializadas, agrupadas nas bases das folhas. Com o acúmulo de água e de restos vegetais em suas cavidades interfoliares, a bromélia absorve diariamente, através dessas células, uma rica sopa de matéria orgânica. Uma vez independente do solo, a planta utiliza as raízes como elemento de fixação, fazendo-as abraçar os galhos das árvores. Por isso muitos acreditam, erradamente, que elas são parasitas das outras plantas.
As bromeliáceas formam o que se pode chamar uma grande família. Pelo menos metade dos seus membros são epifíticos, ou seja, vivem aferrados aos troncos e galhos das árvores. Algumas mais abaixo, no tronco, outras mais acima, na copa, conforme as exigências de luz e umidade de cada espécie. Exatamente por ocuparem diversos níveis- ou patamares-no meio da floresta, elas oferecem muitas opções de hospedagem. Nos pequenos reservatórios de água das folhas centrais podem ser encontradas muitas espécies de algas, desde que a bromélia pertença a uma espécie habitante dos galhos mais altos, onde a luz é mais intensa.
A proliferação das algas proporciona uma rica fonte de alimento para inúmeras espécies de insetos cuja primeira fase de vida é essencialmente aquática. Não fosse pela presença dos caraguatás, essa fauna jamais poderia viver no interior das florestas, principalmente as que cobrem as encostas das serras, onde o solo íngreme raramente permite que a água se acumule. O significado ecológico disso é assombroso. Essas plantas assumem o papel de verdadeira ponte entre dois ambientes que, sem elas, ficariam separados por uma barreira que esses pequenos animais não conseguiriam atravessar.
Isso acontece especialmente na Mata Atlântica (do Rio Grande do Sul ao Espírito Santo), que recobre a encosta das serras entre o litoral e o planalto atlântico e as planícies costeiras. Para as espécies capazes de suportar as severas variações de temperatura das regiões serranas, os caraguatás abriram uma excelente estrada de ligação entre o planalto e as baixadas litorâneas.
Entre os incontáveis seres vivos que podem ser encontrados nos caraguatás há alguns que representam um grande perigo potencial: mosquitos capazes de transmitir a malária. Isso chegou a constituir um problema muito sério, em alguns lugares, e acabou provocando a destruição maciça dos caraguatás em uma enorme região. Hoje, essa solução é considerada mais um grande crime contra o meio ambiente, por uma razão muito simples: os caraguatás são plantas indispensáveis à manutenção do equilíbrio ecológico da Mata Atlântica.
E não apenas porque servem de abrigo para uma infinidade de seres minúsculos e de bebedouro natural para muitos animais da floresta. As pesquisas revelaram que os macacos da Mata Atlântica obtêm uma indispensável dieta de proteínas comendo insetos, aracnídeos, lesmas, caracóis, minhocas e girinos (larvas de sapos). E é entre as folhas dos caraguatás que eles capturam suas refeições. Da mesma forma que os pássaros insetívoros e os beija-flores, que neles encontram o seu suprimento diário de néctar.
Deve-se observar ainda que a erradicação dos caraguatás para combater a malária em uma determinada região não garante resultados a longo prazo. Pois tanto as plantas quanto os mosquitos possuem um elevado poder de recuperação, mesmo depois de terem sido dizimados. Por maior e mais perfeita que tenha sido a erradicação, depois de alguns anos o trabalho deverá ser repetido em toda a extensão da floresta, porque plantas e mosquitos já terão retornado ao seu ambiente natural. E se é verdade que alguns locais, no Sul do Brasil, livraram-se definitivamente da chamada bromélia- malária, isso não se deveu à simples erradicação das plantas mas ao fato de que eles sofreram um quase total desmatamento. Sem árvores onde possam enrolar suas raízes, os caraguatás não conseguem recuperar- se. Em compensação, lentamente eles vão conquistando espaços nas grandes cidades. Em São Paulo, por exemplo, existem bairros onde a febre de decorar os jardins com caraguatás já se espalhou. Se fosse possível reunir todas aquelas plantas ornamentais dentro de um único parque faríamos, sem dúvida, um considerável "pântano urbano".
Nosso Vietnã ecológico
Mais de 400 milhões de caraguatás foram destruídos em Santa Catarina, no final da década de 40, a fim de controlar a malária naquele Estado. A informação foi publicada pelo padre Raulino Reitz, um especialista em bromélias, na revista Ciência Hoje, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Esse verdadeiro "massacre botânico" foi classificado pelo professor Mário Guimarães Ferri, da Universidade de São Paulo, como "fruto de despreparo ou de enfoque unilateral do problema (saúde pública) por uma distorção profissional perfeitamente compreensível e difícil de corrigir". Mas talvez a incrível denúncia de Reitz seja apenas a ponta do iceberg numa controvertida e lamentável investida contra a Mata Atlântica.
Na guerra contra os caraguatás não foram usadas apenas as armas convencionais - desmatamento e coleta manual-como informou o articulista. Saíram a campo aviões e helicópteros, despejando produtos químicos sobre as selvas litorâneas numa empreitada sem precedentes na história da saúde pública no Brasil. Havia um "modelo importado" inspirando aquela articulação. Uma experiência bem-sucedida fora realizada pelos americanos em Trinidad (Venezuela), que ali exterminaram os caraguatás nas plantações de cacau. Acontece que se tratava de Plantas criadas em matas artificiais que ali estavam apenas para sombrear as plantações de cacau. Os trabalhadores estavam em contato direto com elas e assim se exigiam drásticas e rápidas medidas de saneamento. No Brasil, ao contrário, o veneno foi lançado sobre matas nativas e restingas de pouca ou nenhuma ocupação humana.
Outro trabalho, publicado em 1956 na Revista Brasileira de Malariologia e Doenças Tropicais, apresenta o resultado de apenas um ano de borrifações: mais de 100 milhões de caraguatás destruídos. Ignorando a tese de que naquelas circunstâncias uma eficiente campanha de saúde pública poderia ser conduzida pelo fornecimento de telas, mosquiteiros, pequenos desmatamentos em torno das habitações e, principalmente, pelo emprego do inseticida DDT, os devastadores ataques aéreos cumpriram sua terrível missão.
Teria sido apenas uma questão de despreparo e distorção profissional dos sanitaristas, como sugere o professor Ferri? Talvez. Mas na mesma revista há uma estarrecedora explicação para o emprego do veneno conhecido como verde-paris: "Era um inseticida básico na época do combate às formas aquáticas dos anofelinos transmissores de malária. Com o advento do DDT, o combate a esses mosquitos passou a ser feito quase exclusivamente contra a fase alada. Ao se proceder a essa mudança, as entidades empenhadas em campanhas antipalúdicas possuíam grandes estoques de verde-paris. Em nosso serviço, só no almoxarifado da diretoria existiam 30 toneladas, fora o que estava distribuído pelos setores. Nessas condições, não é justo que se pense em outro herbicida, enquanto não terminar todo esse estoque".
Tal como acontece nas grandes guerras, jamais saberemos a verdadeira extensão do desastre ecológico causado pela guerra aos caraguatás. A única certeza é que milhares de pássaros e animais mamíferos silvestres adoeceram e morreram em conseqüência da ingestão de insetos e águas envenenadas. O que restou das florestas ficou privado do seu componente fundamental: alguns agentes polinizadores específicos, responsáveis pela reprodução de uma enorme variedade de plantas. Como saldo positivo restou apenas uma lição simples, amarga e antiga: a extinção é para sempre.
Eles formam um verdadeiro pântano no alto das árvores e abrigam muitas espécies de seres vivos, entre eles os mosquitos que transmitem muitas doenças perigosas. Por isso os sanitaristas repetem: lugar de caraguatá é na floresta.
Diariamente chegam às cidades, sobretudo nos Estados do Sul, grandes quantidades de caraguatás, ou bromélias, trazidas por vendedores de plantas ornamentais que as arrancam na mata. Eles entraram na moda porque produzem flores de forte colorido e são, sem dúvida, muito bonitos. Mas convém ter cuidado com os caraguatás - sobretudo os de origem silvestre. Eles possuem a original capacidade de viver sobre outras plantas- daí seu nome científico epífitas-e podem ser hospedeiros de larvas de mosquitos capazes de transmitir inúmeras moléstias, desde a malária às viroses responsáveis por alguns tipos de encefalites.
Isso deixa bem claro que lugar de caraguatá é no mato - lá, ele é imprescindível para garantir o equilíbrio ecológico de toda a região. E no desempenho desse papel eles são, realmente, fantásticos. "Nas florestas tropicais da América existem verdadeiros pântanos suspensos sobre as árvores", escreveu um biólogo francês depois da descoberta para ele surpreendente: uma variedade enorme de animais aquáticos, típicos habitantes de pântanos e lagoas, consegue viver a 30 metros de altura, junto às copas das árvores. Desde microscópicos protozoários e larvas de insetos até pequenos vertebrados, como os sapinhos arborícolas, sobrevivem naquela altura graças a pequenas quantidades de água de chuva ou de orvalho acumuladas pelos caraguatás.
São poucos os litros de água que uma planta dessas pode reter, mas existem centenas de milhões (isso mesmo: centenas de milhões) de caraguatás povoando os galhos das árvores em grandes extensões de florestas. Na Mata Atlântica, em apenas uma árvore é possível encontrar até quinhentos caraguatás, cada qual com enorme quantidade de seres abrigados entre as folhas. Somando todas essas unidades obtém- se o que muito apropriadamente aquele biólogo chamou "um pântano suspenso?".
É grande a variedade de plantas que servem de criadouro para pequenos animais, mas poucas conseguem hospedar uma fauna tão abundante e diversificada como os caraguatás. Suspensos nas árvores, eles não abrigam apenas seres aquáticos. Em suas folhas podem ser encontrados também inesperados habitantes ao solo e até do subsolo da floresta.
É que, além da água, uma boa quantidade de folhas caídas fica retida pelo caraguatá e todo esse material se decompõe lentamente, transformando- se num húmus muito semelhante ao do solo. Ele serve de residência para aranhas, besouros, centopéias, lesmas e até mesmo minhocas. Assim, não foi apenas o pântano que ficou suspenso com os caraguatás: eles levaram para o telhado da floresta um pouco de seu chão e outro pouco do seu porão. Do ponto de vista ecológico, os caraguatás conseguiram, literalmente, virar a mata de cabeça para baixo.
É claro que isso tudo não aconteceu de uma hora para outra. Foram necessários alguns milhões de anos para que a família botânica das bromeliáceas-que engloba as bromélias e os ananases, ou abacaxis - produzisse espécies capazes de viver sobre as árvores. Distanciando - se do solo, essas pioneiras ficaram impossibilitadas de absorver, pelas raízes, a água e os sais minerais, como faziam suas ancestrais terrestres. E, se realizaram a façanha de conquistar o topo da floresta, foi porque já contavam com algum mecanismo capaz de solucionar esse problema vital.
Pelo menos um grupo de bromeliáceas primitivas já dispunha de uma "inovação' evolutiva para substituir a convencional raiz absorvente. Entre elas, a coleta dos nutrientes passou a ser feita por células altamente especializadas, agrupadas nas bases das folhas. Com o acúmulo de água e de restos vegetais em suas cavidades interfoliares, a bromélia absorve diariamente, através dessas células, uma rica sopa de matéria orgânica. Uma vez independente do solo, a planta utiliza as raízes como elemento de fixação, fazendo-as abraçar os galhos das árvores. Por isso muitos acreditam, erradamente, que elas são parasitas das outras plantas.
As bromeliáceas formam o que se pode chamar uma grande família. Pelo menos metade dos seus membros são epifíticos, ou seja, vivem aferrados aos troncos e galhos das árvores. Algumas mais abaixo, no tronco, outras mais acima, na copa, conforme as exigências de luz e umidade de cada espécie. Exatamente por ocuparem diversos níveis- ou patamares-no meio da floresta, elas oferecem muitas opções de hospedagem. Nos pequenos reservatórios de água das folhas centrais podem ser encontradas muitas espécies de algas, desde que a bromélia pertença a uma espécie habitante dos galhos mais altos, onde a luz é mais intensa.
A proliferação das algas proporciona uma rica fonte de alimento para inúmeras espécies de insetos cuja primeira fase de vida é essencialmente aquática. Não fosse pela presença dos caraguatás, essa fauna jamais poderia viver no interior das florestas, principalmente as que cobrem as encostas das serras, onde o solo íngreme raramente permite que a água se acumule. O significado ecológico disso é assombroso. Essas plantas assumem o papel de verdadeira ponte entre dois ambientes que, sem elas, ficariam separados por uma barreira que esses pequenos animais não conseguiriam atravessar.
Isso acontece especialmente na Mata Atlântica (do Rio Grande do Sul ao Espírito Santo), que recobre a encosta das serras entre o litoral e o planalto atlântico e as planícies costeiras. Para as espécies capazes de suportar as severas variações de temperatura das regiões serranas, os caraguatás abriram uma excelente estrada de ligação entre o planalto e as baixadas litorâneas.
Entre os incontáveis seres vivos que podem ser encontrados nos caraguatás há alguns que representam um grande perigo potencial: mosquitos capazes de transmitir a malária. Isso chegou a constituir um problema muito sério, em alguns lugares, e acabou provocando a destruição maciça dos caraguatás em uma enorme região. Hoje, essa solução é considerada mais um grande crime contra o meio ambiente, por uma razão muito simples: os caraguatás são plantas indispensáveis à manutenção do equilíbrio ecológico da Mata Atlântica.
E não apenas porque servem de abrigo para uma infinidade de seres minúsculos e de bebedouro natural para muitos animais da floresta. As pesquisas revelaram que os macacos da Mata Atlântica obtêm uma indispensável dieta de proteínas comendo insetos, aracnídeos, lesmas, caracóis, minhocas e girinos (larvas de sapos). E é entre as folhas dos caraguatás que eles capturam suas refeições. Da mesma forma que os pássaros insetívoros e os beija-flores, que neles encontram o seu suprimento diário de néctar.
Deve-se observar ainda que a erradicação dos caraguatás para combater a malária em uma determinada região não garante resultados a longo prazo. Pois tanto as plantas quanto os mosquitos possuem um elevado poder de recuperação, mesmo depois de terem sido dizimados. Por maior e mais perfeita que tenha sido a erradicação, depois de alguns anos o trabalho deverá ser repetido em toda a extensão da floresta, porque plantas e mosquitos já terão retornado ao seu ambiente natural. E se é verdade que alguns locais, no Sul do Brasil, livraram-se definitivamente da chamada bromélia- malária, isso não se deveu à simples erradicação das plantas mas ao fato de que eles sofreram um quase total desmatamento. Sem árvores onde possam enrolar suas raízes, os caraguatás não conseguem recuperar- se. Em compensação, lentamente eles vão conquistando espaços nas grandes cidades. Em São Paulo, por exemplo, existem bairros onde a febre de decorar os jardins com caraguatás já se espalhou. Se fosse possível reunir todas aquelas plantas ornamentais dentro de um único parque faríamos, sem dúvida, um considerável "pântano urbano".
Nosso Vietnã ecológico
Mais de 400 milhões de caraguatás foram destruídos em Santa Catarina, no final da década de 40, a fim de controlar a malária naquele Estado. A informação foi publicada pelo padre Raulino Reitz, um especialista em bromélias, na revista Ciência Hoje, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Esse verdadeiro "massacre botânico" foi classificado pelo professor Mário Guimarães Ferri, da Universidade de São Paulo, como "fruto de despreparo ou de enfoque unilateral do problema (saúde pública) por uma distorção profissional perfeitamente compreensível e difícil de corrigir". Mas talvez a incrível denúncia de Reitz seja apenas a ponta do iceberg numa controvertida e lamentável investida contra a Mata Atlântica.
Na guerra contra os caraguatás não foram usadas apenas as armas convencionais - desmatamento e coleta manual-como informou o articulista. Saíram a campo aviões e helicópteros, despejando produtos químicos sobre as selvas litorâneas numa empreitada sem precedentes na história da saúde pública no Brasil. Havia um "modelo importado" inspirando aquela articulação. Uma experiência bem-sucedida fora realizada pelos americanos em Trinidad (Venezuela), que ali exterminaram os caraguatás nas plantações de cacau. Acontece que se tratava de Plantas criadas em matas artificiais que ali estavam apenas para sombrear as plantações de cacau. Os trabalhadores estavam em contato direto com elas e assim se exigiam drásticas e rápidas medidas de saneamento. No Brasil, ao contrário, o veneno foi lançado sobre matas nativas e restingas de pouca ou nenhuma ocupação humana.
Outro trabalho, publicado em 1956 na Revista Brasileira de Malariologia e Doenças Tropicais, apresenta o resultado de apenas um ano de borrifações: mais de 100 milhões de caraguatás destruídos. Ignorando a tese de que naquelas circunstâncias uma eficiente campanha de saúde pública poderia ser conduzida pelo fornecimento de telas, mosquiteiros, pequenos desmatamentos em torno das habitações e, principalmente, pelo emprego do inseticida DDT, os devastadores ataques aéreos cumpriram sua terrível missão.
Teria sido apenas uma questão de despreparo e distorção profissional dos sanitaristas, como sugere o professor Ferri? Talvez. Mas na mesma revista há uma estarrecedora explicação para o emprego do veneno conhecido como verde-paris: "Era um inseticida básico na época do combate às formas aquáticas dos anofelinos transmissores de malária. Com o advento do DDT, o combate a esses mosquitos passou a ser feito quase exclusivamente contra a fase alada. Ao se proceder a essa mudança, as entidades empenhadas em campanhas antipalúdicas possuíam grandes estoques de verde-paris. Em nosso serviço, só no almoxarifado da diretoria existiam 30 toneladas, fora o que estava distribuído pelos setores. Nessas condições, não é justo que se pense em outro herbicida, enquanto não terminar todo esse estoque".
Tal como acontece nas grandes guerras, jamais saberemos a verdadeira extensão do desastre ecológico causado pela guerra aos caraguatás. A única certeza é que milhares de pássaros e animais mamíferos silvestres adoeceram e morreram em conseqüência da ingestão de insetos e águas envenenadas. O que restou das florestas ficou privado do seu componente fundamental: alguns agentes polinizadores específicos, responsáveis pela reprodução de uma enorme variedade de plantas. Como saldo positivo restou apenas uma lição simples, amarga e antiga: a extinção é para sempre.
Lembre-se: Recordar é viver
LEMBRE-SE: RECORDAR É VIVER
A massa de informações que a memória humana grava equivale a 20 bilhões de livros. Mas é preciso que um fato mexa com as emoções para ser encontrado depois com facilidade nesse fantástico arquivo do cérebro.
Já pensou se, cada vez que fosse assinar o nome, você tivesse de recordar as primeiras letras, aprendidas na infância? Pois é exatamente isso que acontece, embora não se perceba: escrever é como pressionar no cérebro a mesma tecla da cartilha do curso primário, desenhar novamente as palavras do jeito que a professora ensinou. A rigor, fazer qualquer coisa-qualquer coisa mesmo-é voltar inconscientemente à primeira experiência de aprendizado. A memória está presente em tudo. Graças a ela somos capazes não só de fazer algo como também de relacionar as coisas entre si, de estabelecer toda sorte de associações, sem as quais a própria sobrevivência seria impossível. Todos nós, enfim, vivemos de recordações.
O dia de sol evoca a praia, o céu cinzento adverte que pode chover, a música reanima um antigo sentimento. Dito desse modo, é como se os responsáveis pelas lembranças-ou pelas memorizações - sempre estivessem fora da pessoa, no sol, no céu, no som, por exemplo. Faz sentido: a memória é uma interação entre o ambiente e o organismo. Essa interação altera o sistema nervoso de tal modo que lhe permite reviver uma experiência. Naturalmente, todos os sentidos-tato, paladar, olfato, audição e visão-são instrumentos da memória. Mas a sede das lembranças é uma massa gelatinosa, com cerca de 1 quilo e meio que mal se acomodaria na palma da mão. Ou seja, o cérebro.
Comparáveis ao número de estreIas na Via Láctea, existem no cérebro 100 bilhões de neurônios, acinzentadas células nervosas com centésimos de milímetro de diâmetro, que possuem prolongamentos, chamados axônios.
Aparentemente, o cérebro é revestido por uma camada cinza, o córtex, que deve sua cor ao fato de ser formado quase só por corpos de neurônios. Dentro está a chamada substância branca. Trata-se de uma rede de axônios, feito fios encapados. O revestimento é a mielina, componente químico que lhe confere a cor clara.
Neurônios e axônios formam conexões: não chegam propriamente a se tocar, mas se aproximam tanto, que basta um neurônio liberar a substância química chamada neurotransmissor para que outro neurônio a capte e se estabeleça a comunicação entre eles. Calcula-se que no cérebro humano existam 100 trilhões dessas conexões. Chamadas sinapses. Um pensamento, por mais simples que seja, ativa centenas de sinapses. A capacidade de memorizar que todas as sinapses dão ao homem é incrível: aproximadamente 1014 bits (unidades de informação), ou o número 1 seguido de catorze zeros. Esse oceano de bits daria para escrever 20 bilhões de livros. Difícil é imaginar que cada um de nós carrega essa megabiblioteca na cabeça.
Já se nasce sabendo. É o que os cientistas chamam de memória biológica do cérebro, herdada geneticamente, que tem a ver com o instinto de sobrevivência de cada indivíduo de uma espécie. Assim, não se precisa ensinar o recém-nascido a mamar. O bebê também já nasce com todo o potencial para arquivar o que for aprendendo pela vida afora e formar, dessa maneira, a memória cerebral- que é, aliás, 10 mil vezes mais ampla que a memória dos genes das células do organismo.
Recentemente, cientistas italianos levantaram a hipótese de que a potencialidade da memória cerebral é hereditária. Eles fizeram uma experiência muito sugestiva: cruzaram ratos de laboratório dotados de boa capacidade de memorização; verificaram depois que a geração seguinte de ratinhos se distinguia pela facilidade com que aprendia a buscar comida num labirinto, em comparação com filhotes de outros ratos. Mas nada prova por enquanto que filhos de pais com boa memória também nasçam com boa memória.
Mas onde será que a memória se localiza? Todas as partes do cérebro são capazes de armazenar memórias; mas isso não impede que existam vagas demarcadas especialmente para certos tipos de memória. O grande desacordo entre os cientistas diz respeito a outra questão: os mecanismos que o cérebro usa para gravar os eventos. São duas correntes: de um lado a dos que acham que são as sinapses (conexões entre os neurônios) as responsáveis pela memorização, de outro, a dos que acreditam que a chave da memória está na síntese de proteínas feita pelo cérebro. "A explicação mais lógica é que a cada evento o cérebro ou forma novas sinapses ou amplia a área de contato nas sinapses já existentes", raciocina o neurologista Paulo Bertolucci, da Escola Paulista de Medicina.
Ele dá um exemplo: "Quando me lembro de que fui a um baile, ativo várias sinapses, uma para cada detalhe: o lugar, a cor do vestido da moça com quem dancei, as pessoas presentes etc. Com o passar do tempo, a não ser que esteja sempre me recordando da festa e mantendo as sinapses em atividade, como correntes elétricas, elas irão se desfazendo. Eis por que a gente se lembra minuciosamente do que aconteceu no dia anterior e depois os detalhes vão fugindo. Na verdade, são as sinapses que estão se desativando aos poucos".
"A idéia de novas sinapses é absurda", contesta o neurologista João Radvany, do Hospital Albert Einstein de São Paulo, ferrenho partidário da síntese de proteínas. "As pessoas não formam sinapses após a adolescência." A teoria da síntese de proteínas sugere que a memória é transmissível. Na década de 60, cientistas americanos ensinaram um rato a ter medo do escuro: quando ele entrava num quarto sem luz, onde sabia estar a comida, levava um choque elétrico. Depois de um certo número de descargas, o animal associou a dor à ausência de luz.
Os cientistas - por incrível que pareça-liquefizeram então o cérebro do ratinho condicionado a temer a treva e injetaram o líquido obtido em outro rato. Resultado: este passou a manifestar sintomas de pânico do escuro. O problema é que nunca se conseguiu repetir essa experiência. "Todos sabem que se inibirmos a produção de proteínas pelo cérebro, um animal de laboratório perderá a capacidade de aprender", observa Radvany. Os neurologistas - seja qual for sua opinião sobre o papel de sinapses e proteínas-dividem a memória em três tipos.
A imediata é aquela que entra em ação quando se acha um número na lista telefônica: ela é eterna enquanto dura; o problema é que dura pouquíssimo. Se, por exemplo, a pessoa que acabou de localizar o número desejado no catálogo ouvir um ruído intenso antes de começar a discar, é bem possível que o número Ihe fuja, porque a memória imediata, de tão frágil, não resiste a interferências. Elas interrompem a sinapse ou a síntese (conforme a teoria).
O segundo tipo, a memória evocativa, menos sujeita a esses percalços, dura de algumas horas a alguns dias. Frustrada pelo primeiro esquecimento, a pessoa volta à lista, dessa vez com a firme intenção de decorar o número. A concentração necessária - mesmo quando inconsciente - transporta a informação da memória imediata para a evocativa. Enfim existe a memória de longo prazo, que pode durar a vida inteira. Se houver um motivo muito forte, o número daquele telefone não sumirá jamais.
Normalmente, o esquecimento é um recurso do cérebro para não ficar entulhado de informações inúteis. Trata- se, portanto, de uma limpeza de arquivos. Ocorre que nem sempre -alguns diriam, raramente-os critérios dessa seleção do que deve ser guardado passam pelo racional. Se já não bastassem as teorias de Freud e a prática da psicanálise, a experiência pessoal de cada um demonstra que aquilo que mexe com as emoções fica guardado no cérebro por mais tempo e com uma riqueza maior de detalhes. Ficar guardado não quer dizer necessariamente que se consiga evocar certas memórias com facilidade. Ao contrário: lembranças associadas a emoções básicas ou poderosas demais tendem a permanecer bloqueadas.
A terapia analítica busca desbloquear tais fatos, que seriam a causa oculta de neuroses e outros distúrbios de personalidade. Os neurologistas, de seu lado, já descobriram que os sentimentos influem na formação de neurotransmissores. "Parece que nada melhor do que uma novidade para ajudar a memorizar algo", revela Esper Cavalheiro, do Laboratório de Neurologia Experimental da Escola Paulista de Medicina. Trabalhos com animais têm demonstrado que o cérebro reage à novidade liberando a substância endorfina, um eficiente fixador de memórias.
"Algo semelhante deve acontecer aos seres humanos", imagina Cavalheiro. Se isso é verdade, após estudar para uma prova, um aluno bem que poderia fazer em seguida algo novo, como andar de roda- gigante, caso nunca tenha feito isso. Provavelmente, Ihe será mais fácil recordar a matéria na hora do exame. Com animais, pelo menos, essas coisas funcionam.
Emoções demais, porém, podem ser prejudiciais. Quem será que nunca sentiu um "branco" num momento de nervoso? A razão é conhecida: o estresse libera grandes quantidades de hormônios, principalmente adrenalina, que atingem o cérebro e interferem na capacidade de evocar informações.
Várias pesquisas têm demonstrado que as substâncias do estresse desempenham papel importante na memorização: animais em que se injetaram aquelas substâncias em pouquíssima quantidade tinham dificuldade em memorizar; com doses maiores; alcançavam- o auge da capacidade de memorização; com grandes quantidades, porém, os animais esqueciam tudo o que haviam aprendido-exatamente como uma pessoa estressada. Tudo indica que, quando alguém se concentra para memorizar algo, está produzindo substâncias do estresse nas quantidades intermediárias, como as cobaias de boa memória.
Um dos trabalhos mais interessantes sobre a produção dos neurotransmissores que influenciam a memória foi realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pelo neurologista Ivan Izquierdo, que estuda há vinte anos os processos da memória. Izquierdo provou que existe o que chama de "dependência de estado":aquilo que um animal aprende sob estresse só será recordado em outra situação semelhante. "Talvez seja um mecanismo instintivo". supõe o professor, "pois a comparação de situações parecidas pode ajudar o animal a se sair-melhor."
Segundo especialistas, os maiores inimigos da memória são os acidentes automobilísticos-a principal causa de amnésia. "mais do que qualquer doença do sistema nervoso", garante o neurocirurgião Reynaldo Brandt, do Hospital Albert Eisntein Mas ele faz questão de deixar claro: "Aquela amnésia do cinema e de novelas de televisão, na qual a pessoa pergunta "quem sou eu?" é pura ficção. De fato, como a memória se espalha por todo o cérebro, não existe acidente que possa apagar todo o arquivo sem ser fatal. A pessoa pode se esquecer do momento do acidente, pode perder a capacidade de recordar determinadas coisas. Mas jamais se esquecerá de tudo, vagando pelas ruas.
A idade está deixando de ser associada à perda de memória, embora essa seja uma idéia tão recente que muitos especialistas ainda argumentem que, com o passar dos anos, diminui o número de neurônios. "Talvez os idosos apenas sejam mais lentos para formar sinapses"; especula o neurologista Paulo Bertolucci, de São Paulo. "A mocinha, por exemplo, precisa repetir o nome do novo namorado à avó, até que ela o guarde." O fato de pessoas idosas se lembrarem mais do passado do que de episódios recentes também tem sido explicado como uma questão de prática: a vida inteira elas ficaram com aquelas lembranças, que por isso acabam vindo à tona com mais facilidade. "Manter a memória acesa depende de usá-la sempre, o que significa atividade- mental e interesse pelo mundo", diz: Bertolucci. Nesse sentido, recordar não é só viver-é viver bem.
Não esqueça de conhecer a sua memória
O cérebro está sempre gravando tudo o que a pessoa vê, ouve, sente ou toca. Mas o que dá o foco àquilo que se grava, tornando as lembranças mais nítidas ou menos, é a concentração-cuja falta é a principal responsável pelos problemas de memória. Por isso, o primeiro passo para se avaliar a memória de alguém é testar a sua atenção: pedir, por exemplo, que conte até cem de três em três números-1, 4, 7, 10, etc. "Quem não consegue cumprir a meta não tem atenção suficiente para fixar informações', interpreta a neuropsicóloga Cândida Pires de Camargo, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Se está tudo bem com a atenção, testa-se a capacidade de reter eventos mais remotos, com perguntas sobre fatos históricos conhecidos, enredos de filmes antigos e ainda mostrando fofos de personalidades para serem identificadas. "Finalmente. peço ao paciente que me conte fatos importantes de sua vida em ordem cronológica; depois, confiro essa ordem com seus familiares", diz Cândida. Já os testes de memória imediata ou recente, são mais específicos, conforme a modalidade- memória para números, rostos, nomes etc. "O importante é dar o estímulo uma única vez; por exemplo, mostrar um desenho e logo escondê-lo, para a pessoa reproduzir o que se lembrar dali a 5 minutos, meia hora, um dia, uma semana", descreve a neuropsicóloga.
Ela aplica um método semelhante para testar a memória verbal, pedindo que o paciente repita uma história breve, de quatro ou cinco linhas, também em prazos diferentes. É natural esquecer um ou outro detalhe. Mas se após uma semana a pessoa só se recorda de 60 por cento da história, então é preciso diagnosticar se a dificuldade é de evocação - o equivalente a buscar a ficha correta nos arquivos do cérebro-ou de fixação. Problemas de evocação costumam estar relacionados a estados de ansiedade e de depressão, que comprovadamente atrapalham o processo de trazer as lembranças à tona. Esse tipo de problema pode ser tratado com auxilio de um psicoterapeuta. "Casos em que a dificuldade é realmente de memória, quando o cérebro perde a capacidade de gravar, são raríssimos", informa Cândida. "Isso é seguramente sinal de que alguma doença orgânica está em andamento.'
A massa de informações que a memória humana grava equivale a 20 bilhões de livros. Mas é preciso que um fato mexa com as emoções para ser encontrado depois com facilidade nesse fantástico arquivo do cérebro.
Já pensou se, cada vez que fosse assinar o nome, você tivesse de recordar as primeiras letras, aprendidas na infância? Pois é exatamente isso que acontece, embora não se perceba: escrever é como pressionar no cérebro a mesma tecla da cartilha do curso primário, desenhar novamente as palavras do jeito que a professora ensinou. A rigor, fazer qualquer coisa-qualquer coisa mesmo-é voltar inconscientemente à primeira experiência de aprendizado. A memória está presente em tudo. Graças a ela somos capazes não só de fazer algo como também de relacionar as coisas entre si, de estabelecer toda sorte de associações, sem as quais a própria sobrevivência seria impossível. Todos nós, enfim, vivemos de recordações.
O dia de sol evoca a praia, o céu cinzento adverte que pode chover, a música reanima um antigo sentimento. Dito desse modo, é como se os responsáveis pelas lembranças-ou pelas memorizações - sempre estivessem fora da pessoa, no sol, no céu, no som, por exemplo. Faz sentido: a memória é uma interação entre o ambiente e o organismo. Essa interação altera o sistema nervoso de tal modo que lhe permite reviver uma experiência. Naturalmente, todos os sentidos-tato, paladar, olfato, audição e visão-são instrumentos da memória. Mas a sede das lembranças é uma massa gelatinosa, com cerca de 1 quilo e meio que mal se acomodaria na palma da mão. Ou seja, o cérebro.
Comparáveis ao número de estreIas na Via Láctea, existem no cérebro 100 bilhões de neurônios, acinzentadas células nervosas com centésimos de milímetro de diâmetro, que possuem prolongamentos, chamados axônios.
Aparentemente, o cérebro é revestido por uma camada cinza, o córtex, que deve sua cor ao fato de ser formado quase só por corpos de neurônios. Dentro está a chamada substância branca. Trata-se de uma rede de axônios, feito fios encapados. O revestimento é a mielina, componente químico que lhe confere a cor clara.
Neurônios e axônios formam conexões: não chegam propriamente a se tocar, mas se aproximam tanto, que basta um neurônio liberar a substância química chamada neurotransmissor para que outro neurônio a capte e se estabeleça a comunicação entre eles. Calcula-se que no cérebro humano existam 100 trilhões dessas conexões. Chamadas sinapses. Um pensamento, por mais simples que seja, ativa centenas de sinapses. A capacidade de memorizar que todas as sinapses dão ao homem é incrível: aproximadamente 1014 bits (unidades de informação), ou o número 1 seguido de catorze zeros. Esse oceano de bits daria para escrever 20 bilhões de livros. Difícil é imaginar que cada um de nós carrega essa megabiblioteca na cabeça.
Já se nasce sabendo. É o que os cientistas chamam de memória biológica do cérebro, herdada geneticamente, que tem a ver com o instinto de sobrevivência de cada indivíduo de uma espécie. Assim, não se precisa ensinar o recém-nascido a mamar. O bebê também já nasce com todo o potencial para arquivar o que for aprendendo pela vida afora e formar, dessa maneira, a memória cerebral- que é, aliás, 10 mil vezes mais ampla que a memória dos genes das células do organismo.
Recentemente, cientistas italianos levantaram a hipótese de que a potencialidade da memória cerebral é hereditária. Eles fizeram uma experiência muito sugestiva: cruzaram ratos de laboratório dotados de boa capacidade de memorização; verificaram depois que a geração seguinte de ratinhos se distinguia pela facilidade com que aprendia a buscar comida num labirinto, em comparação com filhotes de outros ratos. Mas nada prova por enquanto que filhos de pais com boa memória também nasçam com boa memória.
Mas onde será que a memória se localiza? Todas as partes do cérebro são capazes de armazenar memórias; mas isso não impede que existam vagas demarcadas especialmente para certos tipos de memória. O grande desacordo entre os cientistas diz respeito a outra questão: os mecanismos que o cérebro usa para gravar os eventos. São duas correntes: de um lado a dos que acham que são as sinapses (conexões entre os neurônios) as responsáveis pela memorização, de outro, a dos que acreditam que a chave da memória está na síntese de proteínas feita pelo cérebro. "A explicação mais lógica é que a cada evento o cérebro ou forma novas sinapses ou amplia a área de contato nas sinapses já existentes", raciocina o neurologista Paulo Bertolucci, da Escola Paulista de Medicina.
Ele dá um exemplo: "Quando me lembro de que fui a um baile, ativo várias sinapses, uma para cada detalhe: o lugar, a cor do vestido da moça com quem dancei, as pessoas presentes etc. Com o passar do tempo, a não ser que esteja sempre me recordando da festa e mantendo as sinapses em atividade, como correntes elétricas, elas irão se desfazendo. Eis por que a gente se lembra minuciosamente do que aconteceu no dia anterior e depois os detalhes vão fugindo. Na verdade, são as sinapses que estão se desativando aos poucos".
"A idéia de novas sinapses é absurda", contesta o neurologista João Radvany, do Hospital Albert Einstein de São Paulo, ferrenho partidário da síntese de proteínas. "As pessoas não formam sinapses após a adolescência." A teoria da síntese de proteínas sugere que a memória é transmissível. Na década de 60, cientistas americanos ensinaram um rato a ter medo do escuro: quando ele entrava num quarto sem luz, onde sabia estar a comida, levava um choque elétrico. Depois de um certo número de descargas, o animal associou a dor à ausência de luz.
Os cientistas - por incrível que pareça-liquefizeram então o cérebro do ratinho condicionado a temer a treva e injetaram o líquido obtido em outro rato. Resultado: este passou a manifestar sintomas de pânico do escuro. O problema é que nunca se conseguiu repetir essa experiência. "Todos sabem que se inibirmos a produção de proteínas pelo cérebro, um animal de laboratório perderá a capacidade de aprender", observa Radvany. Os neurologistas - seja qual for sua opinião sobre o papel de sinapses e proteínas-dividem a memória em três tipos.
A imediata é aquela que entra em ação quando se acha um número na lista telefônica: ela é eterna enquanto dura; o problema é que dura pouquíssimo. Se, por exemplo, a pessoa que acabou de localizar o número desejado no catálogo ouvir um ruído intenso antes de começar a discar, é bem possível que o número Ihe fuja, porque a memória imediata, de tão frágil, não resiste a interferências. Elas interrompem a sinapse ou a síntese (conforme a teoria).
O segundo tipo, a memória evocativa, menos sujeita a esses percalços, dura de algumas horas a alguns dias. Frustrada pelo primeiro esquecimento, a pessoa volta à lista, dessa vez com a firme intenção de decorar o número. A concentração necessária - mesmo quando inconsciente - transporta a informação da memória imediata para a evocativa. Enfim existe a memória de longo prazo, que pode durar a vida inteira. Se houver um motivo muito forte, o número daquele telefone não sumirá jamais.
Normalmente, o esquecimento é um recurso do cérebro para não ficar entulhado de informações inúteis. Trata- se, portanto, de uma limpeza de arquivos. Ocorre que nem sempre -alguns diriam, raramente-os critérios dessa seleção do que deve ser guardado passam pelo racional. Se já não bastassem as teorias de Freud e a prática da psicanálise, a experiência pessoal de cada um demonstra que aquilo que mexe com as emoções fica guardado no cérebro por mais tempo e com uma riqueza maior de detalhes. Ficar guardado não quer dizer necessariamente que se consiga evocar certas memórias com facilidade. Ao contrário: lembranças associadas a emoções básicas ou poderosas demais tendem a permanecer bloqueadas.
A terapia analítica busca desbloquear tais fatos, que seriam a causa oculta de neuroses e outros distúrbios de personalidade. Os neurologistas, de seu lado, já descobriram que os sentimentos influem na formação de neurotransmissores. "Parece que nada melhor do que uma novidade para ajudar a memorizar algo", revela Esper Cavalheiro, do Laboratório de Neurologia Experimental da Escola Paulista de Medicina. Trabalhos com animais têm demonstrado que o cérebro reage à novidade liberando a substância endorfina, um eficiente fixador de memórias.
"Algo semelhante deve acontecer aos seres humanos", imagina Cavalheiro. Se isso é verdade, após estudar para uma prova, um aluno bem que poderia fazer em seguida algo novo, como andar de roda- gigante, caso nunca tenha feito isso. Provavelmente, Ihe será mais fácil recordar a matéria na hora do exame. Com animais, pelo menos, essas coisas funcionam.
Emoções demais, porém, podem ser prejudiciais. Quem será que nunca sentiu um "branco" num momento de nervoso? A razão é conhecida: o estresse libera grandes quantidades de hormônios, principalmente adrenalina, que atingem o cérebro e interferem na capacidade de evocar informações.
Várias pesquisas têm demonstrado que as substâncias do estresse desempenham papel importante na memorização: animais em que se injetaram aquelas substâncias em pouquíssima quantidade tinham dificuldade em memorizar; com doses maiores; alcançavam- o auge da capacidade de memorização; com grandes quantidades, porém, os animais esqueciam tudo o que haviam aprendido-exatamente como uma pessoa estressada. Tudo indica que, quando alguém se concentra para memorizar algo, está produzindo substâncias do estresse nas quantidades intermediárias, como as cobaias de boa memória.
Um dos trabalhos mais interessantes sobre a produção dos neurotransmissores que influenciam a memória foi realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pelo neurologista Ivan Izquierdo, que estuda há vinte anos os processos da memória. Izquierdo provou que existe o que chama de "dependência de estado":aquilo que um animal aprende sob estresse só será recordado em outra situação semelhante. "Talvez seja um mecanismo instintivo". supõe o professor, "pois a comparação de situações parecidas pode ajudar o animal a se sair-melhor."
Segundo especialistas, os maiores inimigos da memória são os acidentes automobilísticos-a principal causa de amnésia. "mais do que qualquer doença do sistema nervoso", garante o neurocirurgião Reynaldo Brandt, do Hospital Albert Eisntein Mas ele faz questão de deixar claro: "Aquela amnésia do cinema e de novelas de televisão, na qual a pessoa pergunta "quem sou eu?" é pura ficção. De fato, como a memória se espalha por todo o cérebro, não existe acidente que possa apagar todo o arquivo sem ser fatal. A pessoa pode se esquecer do momento do acidente, pode perder a capacidade de recordar determinadas coisas. Mas jamais se esquecerá de tudo, vagando pelas ruas.
A idade está deixando de ser associada à perda de memória, embora essa seja uma idéia tão recente que muitos especialistas ainda argumentem que, com o passar dos anos, diminui o número de neurônios. "Talvez os idosos apenas sejam mais lentos para formar sinapses"; especula o neurologista Paulo Bertolucci, de São Paulo. "A mocinha, por exemplo, precisa repetir o nome do novo namorado à avó, até que ela o guarde." O fato de pessoas idosas se lembrarem mais do passado do que de episódios recentes também tem sido explicado como uma questão de prática: a vida inteira elas ficaram com aquelas lembranças, que por isso acabam vindo à tona com mais facilidade. "Manter a memória acesa depende de usá-la sempre, o que significa atividade- mental e interesse pelo mundo", diz: Bertolucci. Nesse sentido, recordar não é só viver-é viver bem.
Não esqueça de conhecer a sua memória
O cérebro está sempre gravando tudo o que a pessoa vê, ouve, sente ou toca. Mas o que dá o foco àquilo que se grava, tornando as lembranças mais nítidas ou menos, é a concentração-cuja falta é a principal responsável pelos problemas de memória. Por isso, o primeiro passo para se avaliar a memória de alguém é testar a sua atenção: pedir, por exemplo, que conte até cem de três em três números-1, 4, 7, 10, etc. "Quem não consegue cumprir a meta não tem atenção suficiente para fixar informações', interpreta a neuropsicóloga Cândida Pires de Camargo, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Se está tudo bem com a atenção, testa-se a capacidade de reter eventos mais remotos, com perguntas sobre fatos históricos conhecidos, enredos de filmes antigos e ainda mostrando fofos de personalidades para serem identificadas. "Finalmente. peço ao paciente que me conte fatos importantes de sua vida em ordem cronológica; depois, confiro essa ordem com seus familiares", diz Cândida. Já os testes de memória imediata ou recente, são mais específicos, conforme a modalidade- memória para números, rostos, nomes etc. "O importante é dar o estímulo uma única vez; por exemplo, mostrar um desenho e logo escondê-lo, para a pessoa reproduzir o que se lembrar dali a 5 minutos, meia hora, um dia, uma semana", descreve a neuropsicóloga.
Ela aplica um método semelhante para testar a memória verbal, pedindo que o paciente repita uma história breve, de quatro ou cinco linhas, também em prazos diferentes. É natural esquecer um ou outro detalhe. Mas se após uma semana a pessoa só se recorda de 60 por cento da história, então é preciso diagnosticar se a dificuldade é de evocação - o equivalente a buscar a ficha correta nos arquivos do cérebro-ou de fixação. Problemas de evocação costumam estar relacionados a estados de ansiedade e de depressão, que comprovadamente atrapalham o processo de trazer as lembranças à tona. Esse tipo de problema pode ser tratado com auxilio de um psicoterapeuta. "Casos em que a dificuldade é realmente de memória, quando o cérebro perde a capacidade de gravar, são raríssimos", informa Cândida. "Isso é seguramente sinal de que alguma doença orgânica está em andamento.'
O Micromundo dos Chips - Eletrônica
O MICROMUNDO DOS CHIPS - Eletrônica
Milimétricos condutores de energia são a alma da eletrônica e um dos motores do mundo moderno. Do quartzo ao circuito integrado, sua fabricação exige até trinta etapas, além de extremos cuidados.
São peças dignas de ser apreciadas pelo microscópio: as menores têm 0,3 milímetro de espessura e as maiores medem 0,5 milímetro. As áreas nunca excedem 1 centímetro quadrado. Apesar de tão minúsculas, têm embutidos milhões de transistores por onde se movimentam sem parar sinais elétricos-como carros trafegando em alta velocidade pelas ruas e avenidas de uma cidade bem planejada. Esses ínfimos circuitos incrustados nos faladíssimos chips chegam a medir 1,5 mícron-1,5 milésimo de milímetro-, ou seja, são cinqüenta vezes mais finos do que um fio de cabelo. No entanto, guardam milhões de informações-os chips utilizados nos supercomputadores IBM 3090, por bits. (O bit é a menor unidade de informação de um computador.)
Nas últimas três décadas, o chip - palavra que em inglês significa lasca, fatia ou pedaço - tornou-se a ferramenta mais preciosa da indústria eletroeletrônica mundial. E um pequeno retângulo feito de silício-substância a meio caminho entre os condutores de eletricidade, como os metais, e os isolantes, como a cerâmica usada nas linhas de alta tensão. Por isso é chamado semicondutor. O irrisório tamanho do chip é muito bem aproveitado: ali coabitam componentes de nomes exóticos, como resistores, capacitores, diodos e até os conhecidos transistores. Todos eles, quando conectados entre si, podem provocar resistência, armazenar, amplificar ou interromper a corrente elétrica. Essas possibilidades, devidamente combinadas e traduzidas em números, são a chave de qualquer sistema eletrônico moderno.
Se os chips não fossem capazes de armazenar tantos componentes num espaço tão limitado, não haveria supercomputadores, satélites de comunicação, naves espaciais nem mísseis de guerra. Aliás, não é preciso ir tão longe. Os chips estão presentes nos televisores, equipamentos de som, telefones, calculadoras, relógios, brinquedos e eletrodomésticos. Eles fazem parte de tudo o que se fabrica com um componente eletrônico em seu bojo, seja um autorama ou um liquidificador, o mecanismo de partida de um carro ou as caixas registradoras de um supermercado.
A carreira dessa micropeça é recente, mas meteórica. No final da década de 50, os engenheiros já sabiam que uma onda eletromagnética, produzida por circuitos elétricos poderia transportar milhares de informações através do espaço em poucos segundos. Teoricamente, as possibilidades eram ilimitadas. Naquela época, os transistores feitos de material semicondutor como o silício já tinham substituído as válvulas nos computadores mais rápidos. Mas o que na teoria funcionava perfeitamente, na prática dava errado. Como num jogo de armar, os transistores tinham de ser soldados quase manualmente aos outros componentes de um circuito eletrônico. Em casos mais complexos, podia-se obter até 1 milhão de conexões. Assim, embora já houvesse projetos de supercomputadores, eles esbarravam nesse problema: a tirania do número de conexões que crescia assustadoramente com a complexidade dos circuitos.
Foi quando, em 1958, um engenheiro da Texas Instruments, Jack Kilby, na época com 34 anos, descobriu uma maneira de juntar todos os componentes do circuito numa única pastilha de silício. Em vez de usar circuitos soldados um a um, Kilby percebeu que a adição de determinadas "impurezas", como fósforo ou boro, numa barra de silício altamente purificado afetaria a mobilidade dos elétrons. Se essas impurezas fossem colocadas em camadas, como num sanduíche, seria possível comprimir todos os componentes de um circuito integrado num único bloco de silício semicondutor. A tendência, com o tempo, foi manter a área do chip e diminuir o tamanho dos componentes, que, empilhados em dez camadas de material, podem medir 10 milionésimos de milímetro cada uma.
Mas, em 1958, não era apenas a Texas Instruments, empresa famosa por ter fabricado os primeiros rádios transistores, que estava interessada em circuitos integrados de silício. Outra companhia, a Fairchild Semiconductor, instalada num vale ao sul da baia de São Francisco, na Califórnia, então uma aprazível área agrícola, também fazia pesquisas semelhantes. Um de seus diretores, o físico Robert Noyce, então com 31 anos, tivera a mesma idéia de Kilby, com a diferença de alguns meses. Entre o tempo que durou a pesquisa e o aparecimento das primeiras peças, já na década de 60, Kilby e Noyce repartiram as honras de serem os inventores dos chips. O local onde funcionava a Fairchild acabaria invadido por gigantes da microeletrônica, tornando-se conhecido como Vale do Silício.
O nome pegou. Outras regiões dos Estados Unidos foram batizadas de Floresta do Silício, Pradaria da Silício, Colinas do Silício e assim por diante. O primeiro chip fabricado em 1958 tinha cinco peças fundidas numa barra de 1,5 centímetro quadrado-hoje, os chips podem ter até 5 milhões de componentes. Em trinta anos, eles diminuíram dez vezes de tamanho e multiplicaram por 1 milhão a capacidade. Isso não aconteceu por acaso.
Como subproduto do projeto espacial americano que levaria o homem à Lua, a microeletrônica foi premiada com grandes investimentos para pesquisa. Mas, nos últimos anos, com a disseminação do uso dos chips, o custo e, portanto, a competitividade das indústrias passou a fazer toda a diferença-e os japoneses tomaram a dianteira no ramo.
Nos próximos dois anos, eles prometem fabricar circuitos de 18 milhões de componentes e até o ano 2000, de 500 milhões-tudo isso no mesmo espaço minúsculo de 1 centímetro quadrado. Então, os supercomputadores já estarão superados, tendo cedido a vez aos chamados ultracomputadores. Se imaginar esses chips do futuro próximo já é difícil, que dirá construí-los. No mundo miniaturizado dos circuitos integrados, um simples grão de poeira pode adquirir as proporções de uma avalanche sobre uma rodovia movimentada. Não é de admirar, portanto, que instrumentos tão delicados exijam uma associação de paciência, capital e cérebro em níveis difíceis de serem igualados em qualquer outra atividade industrial.
Algumas universidades brasileiras já se atrevem a fazer o ciclo completo da fabricação do chip-um processo que envolve mais de trinta etapas-, mas isso não acontece ainda na indústria nacional. "Uma coisa é fazer a experiência em nível de pesquisa avançada", explica o engenheiro Armando Laganá, da Escola Politécnica da USP. "Outra coisa muito diferente é manter a competitividade industrial." Antes de pensar na fabricação dos chips, as empresas microeletrônicas devem conseguir silício puro, ou seja, tão limpo que entre 1 bilhão de átomos não haja mais do que uma dúzia de impurezas.
O Brasil possui uma das maiores jazidas de quartzo do mundo, mineral de onde é retirado o silício. Mas entre o quartzo-encontrado até no cascalho à beira dos rios do sul de Minas - e o silício monocristalino dos chips vai uma grande diferença. O quartzo é transformado em silício metálico, depois purificado até tornar-se cristal-mas ainda não está pronto para ser trabalhado. Esse cristal de silício deve ter todos os átomos em seus devidos lugares para que não haja nenhuma imperfeição no material e para que a corrente elétrica que circula pelo chip não sofra alterações. Portanto, ele é fundido em torno de uma "semente", ou núcleo monocristalino, sobre o qual vão se depositando, já então corretamente ordenados os átomos de silício. Formam-se assim os tarugos-"salames", de 1,50 metro de altura, fatiados por uma serra de diamante.
As bolachas, ou wafers, como são chamadas em inglês as finíssimas fatias de silício de 3 polegadas de diâmetro, são lapidadas ou polidas como barras de aço de uma usina siderúrgica. Essas lâminas são então divididas em centenas de chips, cujos circuitos, numa etapa posterior, serão gravados segundo um método semelhante ao da fotografia. Na curta história dos chips, esses circuitos já foram feitos a mão, embora atualmente sejam usados computadores gráficos. Curiosamente, são esses computadores que vão desenhar as memórias de outros computadores iguais a eles. Para que os circuitos sejam gravados na chapa de silício, ela é aquecida à temperatura de 1 200 graus centígrados, até que se forme uma finíssima camada protetora de óxido, com uma grande resistência elétrica. Em seguida, se cobre o wafer com material fotográfico, sobre o qual se colocam as máscaras- que se parecem às antigas chapas de vidro usadas em fotografia-onde os circuitos foram fotografados.
Ao submeter o conjunto a radiação ultravioleta, as áreas ocultas pelas máscaras ficam intactas, enquanto a luz atinge o material fotográfico, que se dissolve, deixando livre a camada de óxido de silício. Esse processo é repetido várias vezes, de acordo com o número de máscaras que forem necessárias. Em seguida, pode começar o processo de dopagem, como dizem os engenheiros. O método é o mesmo usado na gravação das máscaras, mas neste caso as áreas livres são bombardeadas ou dopadas com boro, fósforo ou arsênio, as chamadas "impurezas" que vão permitir a condutividade elétrica.
Depois, é preciso cobrir os chips com condutores de alumínio. Numa fábrica onde são feitos todo ano milhões de chips, esses processos ocorrem em salas onde o ar é mais limpo do que nos centros cirúrgicos dos hospitais. As pessoas ali só trabalham de uniformes imaculadamente brancos, com os pés, cabelos e mãos protegidos, pois a poeira trazida por elas pode prejudicar dezenas de chips incrustados numa lâmina.
No futuro, prevê-se que os chips serão confeccionados com materiais supercondutores que, por não oferecerem resistência à eletricidade, podem transmitir sinais ainda mais velozes do que se sonha com os circuitos atuais. Aliás, a preocupação dos fabricantes é conseguir chips que processem informações cada vez mais rapidamente. Para isso, já está sendo usado o arseneto de gálio como material semicondutor. O arseneto conduz elétrons até seis vezes mais depressa do que o silício, além de operar em temperaturas mais elevadas, reduzindo a necessidade de resfriar os computadores e outros sistemas eletrônicos. Como é muito caro, só é utilizado em pesquisas, como as que se desenvolvem na Unicamp, ou em supercomputadores militares americanos ou ainda na fabricação de circuitos para comunicações por microondas.
Independente do material de que são feitos -silício ou arseneto de gálio-, no final de todas as etapas de fabricação os chips ainda estão ligados às centenas num único wafer. Esse wafer então é serrado e os chips, enfim libertos, são soldados aos seus suportes mecânicos, os chamados lead-frames. É um trabalho que no Brasil ainda é mecânico na sua maior parte, além de ser executado. quase só por mulheres. São operárias que vão manusear, interligar, soldar os chips e depois implantar minúsculos fios de ouro que os manterão presos aos equipamentos eletrônicos. Encapsulado num invólucro de epóxi, o chip deixa de ter esse nome. Daí em diante, o retângulo milimétrico de silício passa a ser conhecido como circuito integrado.
O circuito brasileiro
A indústria micro eletrônica nacional tem prazo de dois anos para dominar o ciclo completo da fabricação do chip, conforme compromisso assumido com o Conin (Conselho Nacional de Informática e Automação). O objetivo é dominar a tecnologia tanto nos circuitos digitais, aqueles dos computadores, que lidam com memória, como a dos analógicos ou lineares, que processam dados contínuos, como nos televisores. Qualquer que seja o circuito, a base dos chips é sempre a mesma. Só muda a tecnologia, que permite que um número menor ou maior de componentes seja colocado num único chip.
A SID Microeletrônica, subsidiária da Sharp, com sede em Contagem, a 10 quilômetros de Belo Horizonte, é uma das três empresas brasileiras do setor mais avançadas em termos de tecnologia de chips. Mesmo assim, por enquanto, ela só trabalha com circuitos lineares. "No ano que vem", prevê seu diretor industrial, o engenheiro Wilson Leal, "começamos a fabricar circuitos para memórias." As outras duas empresas, Itautec Componentes e Elebra, desenham circuitos e realizam o estágio final de produção do chip-teste, montagem e encapsulamento. O restante é realizado por indústrias estrangeiras.
Só falta ao Brasil dominar duas etapas do ciclo de produção: a purificação do silício, do qual se obtém o cristal cilíndrico, e a elaboração de máscaras, que se segue ao projeto dos circuitos. Embora não seja capaz de transformar o silício metálico em policristal, a empresa paulista Heliodinâmica, especializada em células solares, fabrica o silício sob a forma de cristal puro. O CTI-Centro Tecnológico de Informática -, órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia que faz pesquisas em informática, se comprometeu a fazer ainda este ano as máscaras dos chips nacionais.
Imitação de cérebro
No futuro, os chips poderão ser feitos de organismos vivos, tornando- se bem mais parecidos com o cérebro humano do que as atuais microplaquetas de silício. Pelo menos desde 1974, pesquisadores americanos procuram desenvolver chips que copiem a maneira como os neurônios humanos processam uma colossal quantidade de informações. De acordo com esse modelo, os transistores seriam equivalentes às sinapses-ligações entre as células nervosas por onde se transmitem os impulsos. Mas enquanto os primeiros só permitem dois estados-ligado e desligado -, as sinapses têm uma enorme variedade de estados intermediários, que fazem com que as células nervosas tanto sirvam de memória como processem informações de maneira simultânea.
Outro motivo pelo qual os cientistas procuram substituir o silício por matéria orgânica é que o número de componentes existentes num circuito convencional está atingindo seu limite. Para substituir os transistores, pesquisadores da IBM americana, por exemplo, usaram moléculas orgânicas com cargas positiva e negativa. A montagem da experiência foi semelhante à dos circuitos integrados tradicionais, ou seja, foram usadas duas camadas separadas por um isolante, prensadas entre placas metálicas. No Japão, demonstrou-se que uma proteína extraída do coração do cavalo se comporta como material semicondutor.
Em outra pesquisa, dessa vez na Universidade da Califórnia, uma equipe de cientistas se propôs a produzir chips a partir de grandes moléculas de carbono, que possuem propriedades elétricas semelhantes às do silício. Essas moléculas seriam sintetizadas pela Escherichia coli, uma bactéria do intestino normalmente usada em engenharia genética. Os resultados dessa pesquisa vão demorar pelo menos vinte anos. De seu lado, pesquisadores da AT&T Bell Laboratories anunciaram recentemente, num seminário no Canadá, terem desenvolvido chips que imitam o cérebro humano, funcionando como neurônios eletrônicos. Esses chips de 7 milímetros quadrados de área teriam 75 mil transistores, o que equivale à memória de um micro tipo Apple. A idéia é usar esses chips como censores que reconstruiriam funções nervosas lesionadas.
Milimétricos condutores de energia são a alma da eletrônica e um dos motores do mundo moderno. Do quartzo ao circuito integrado, sua fabricação exige até trinta etapas, além de extremos cuidados.
São peças dignas de ser apreciadas pelo microscópio: as menores têm 0,3 milímetro de espessura e as maiores medem 0,5 milímetro. As áreas nunca excedem 1 centímetro quadrado. Apesar de tão minúsculas, têm embutidos milhões de transistores por onde se movimentam sem parar sinais elétricos-como carros trafegando em alta velocidade pelas ruas e avenidas de uma cidade bem planejada. Esses ínfimos circuitos incrustados nos faladíssimos chips chegam a medir 1,5 mícron-1,5 milésimo de milímetro-, ou seja, são cinqüenta vezes mais finos do que um fio de cabelo. No entanto, guardam milhões de informações-os chips utilizados nos supercomputadores IBM 3090, por bits. (O bit é a menor unidade de informação de um computador.)
Nas últimas três décadas, o chip - palavra que em inglês significa lasca, fatia ou pedaço - tornou-se a ferramenta mais preciosa da indústria eletroeletrônica mundial. E um pequeno retângulo feito de silício-substância a meio caminho entre os condutores de eletricidade, como os metais, e os isolantes, como a cerâmica usada nas linhas de alta tensão. Por isso é chamado semicondutor. O irrisório tamanho do chip é muito bem aproveitado: ali coabitam componentes de nomes exóticos, como resistores, capacitores, diodos e até os conhecidos transistores. Todos eles, quando conectados entre si, podem provocar resistência, armazenar, amplificar ou interromper a corrente elétrica. Essas possibilidades, devidamente combinadas e traduzidas em números, são a chave de qualquer sistema eletrônico moderno.
Se os chips não fossem capazes de armazenar tantos componentes num espaço tão limitado, não haveria supercomputadores, satélites de comunicação, naves espaciais nem mísseis de guerra. Aliás, não é preciso ir tão longe. Os chips estão presentes nos televisores, equipamentos de som, telefones, calculadoras, relógios, brinquedos e eletrodomésticos. Eles fazem parte de tudo o que se fabrica com um componente eletrônico em seu bojo, seja um autorama ou um liquidificador, o mecanismo de partida de um carro ou as caixas registradoras de um supermercado.
A carreira dessa micropeça é recente, mas meteórica. No final da década de 50, os engenheiros já sabiam que uma onda eletromagnética, produzida por circuitos elétricos poderia transportar milhares de informações através do espaço em poucos segundos. Teoricamente, as possibilidades eram ilimitadas. Naquela época, os transistores feitos de material semicondutor como o silício já tinham substituído as válvulas nos computadores mais rápidos. Mas o que na teoria funcionava perfeitamente, na prática dava errado. Como num jogo de armar, os transistores tinham de ser soldados quase manualmente aos outros componentes de um circuito eletrônico. Em casos mais complexos, podia-se obter até 1 milhão de conexões. Assim, embora já houvesse projetos de supercomputadores, eles esbarravam nesse problema: a tirania do número de conexões que crescia assustadoramente com a complexidade dos circuitos.
Foi quando, em 1958, um engenheiro da Texas Instruments, Jack Kilby, na época com 34 anos, descobriu uma maneira de juntar todos os componentes do circuito numa única pastilha de silício. Em vez de usar circuitos soldados um a um, Kilby percebeu que a adição de determinadas "impurezas", como fósforo ou boro, numa barra de silício altamente purificado afetaria a mobilidade dos elétrons. Se essas impurezas fossem colocadas em camadas, como num sanduíche, seria possível comprimir todos os componentes de um circuito integrado num único bloco de silício semicondutor. A tendência, com o tempo, foi manter a área do chip e diminuir o tamanho dos componentes, que, empilhados em dez camadas de material, podem medir 10 milionésimos de milímetro cada uma.
Mas, em 1958, não era apenas a Texas Instruments, empresa famosa por ter fabricado os primeiros rádios transistores, que estava interessada em circuitos integrados de silício. Outra companhia, a Fairchild Semiconductor, instalada num vale ao sul da baia de São Francisco, na Califórnia, então uma aprazível área agrícola, também fazia pesquisas semelhantes. Um de seus diretores, o físico Robert Noyce, então com 31 anos, tivera a mesma idéia de Kilby, com a diferença de alguns meses. Entre o tempo que durou a pesquisa e o aparecimento das primeiras peças, já na década de 60, Kilby e Noyce repartiram as honras de serem os inventores dos chips. O local onde funcionava a Fairchild acabaria invadido por gigantes da microeletrônica, tornando-se conhecido como Vale do Silício.
O nome pegou. Outras regiões dos Estados Unidos foram batizadas de Floresta do Silício, Pradaria da Silício, Colinas do Silício e assim por diante. O primeiro chip fabricado em 1958 tinha cinco peças fundidas numa barra de 1,5 centímetro quadrado-hoje, os chips podem ter até 5 milhões de componentes. Em trinta anos, eles diminuíram dez vezes de tamanho e multiplicaram por 1 milhão a capacidade. Isso não aconteceu por acaso.
Como subproduto do projeto espacial americano que levaria o homem à Lua, a microeletrônica foi premiada com grandes investimentos para pesquisa. Mas, nos últimos anos, com a disseminação do uso dos chips, o custo e, portanto, a competitividade das indústrias passou a fazer toda a diferença-e os japoneses tomaram a dianteira no ramo.
Nos próximos dois anos, eles prometem fabricar circuitos de 18 milhões de componentes e até o ano 2000, de 500 milhões-tudo isso no mesmo espaço minúsculo de 1 centímetro quadrado. Então, os supercomputadores já estarão superados, tendo cedido a vez aos chamados ultracomputadores. Se imaginar esses chips do futuro próximo já é difícil, que dirá construí-los. No mundo miniaturizado dos circuitos integrados, um simples grão de poeira pode adquirir as proporções de uma avalanche sobre uma rodovia movimentada. Não é de admirar, portanto, que instrumentos tão delicados exijam uma associação de paciência, capital e cérebro em níveis difíceis de serem igualados em qualquer outra atividade industrial.
Algumas universidades brasileiras já se atrevem a fazer o ciclo completo da fabricação do chip-um processo que envolve mais de trinta etapas-, mas isso não acontece ainda na indústria nacional. "Uma coisa é fazer a experiência em nível de pesquisa avançada", explica o engenheiro Armando Laganá, da Escola Politécnica da USP. "Outra coisa muito diferente é manter a competitividade industrial." Antes de pensar na fabricação dos chips, as empresas microeletrônicas devem conseguir silício puro, ou seja, tão limpo que entre 1 bilhão de átomos não haja mais do que uma dúzia de impurezas.
O Brasil possui uma das maiores jazidas de quartzo do mundo, mineral de onde é retirado o silício. Mas entre o quartzo-encontrado até no cascalho à beira dos rios do sul de Minas - e o silício monocristalino dos chips vai uma grande diferença. O quartzo é transformado em silício metálico, depois purificado até tornar-se cristal-mas ainda não está pronto para ser trabalhado. Esse cristal de silício deve ter todos os átomos em seus devidos lugares para que não haja nenhuma imperfeição no material e para que a corrente elétrica que circula pelo chip não sofra alterações. Portanto, ele é fundido em torno de uma "semente", ou núcleo monocristalino, sobre o qual vão se depositando, já então corretamente ordenados os átomos de silício. Formam-se assim os tarugos-"salames", de 1,50 metro de altura, fatiados por uma serra de diamante.
As bolachas, ou wafers, como são chamadas em inglês as finíssimas fatias de silício de 3 polegadas de diâmetro, são lapidadas ou polidas como barras de aço de uma usina siderúrgica. Essas lâminas são então divididas em centenas de chips, cujos circuitos, numa etapa posterior, serão gravados segundo um método semelhante ao da fotografia. Na curta história dos chips, esses circuitos já foram feitos a mão, embora atualmente sejam usados computadores gráficos. Curiosamente, são esses computadores que vão desenhar as memórias de outros computadores iguais a eles. Para que os circuitos sejam gravados na chapa de silício, ela é aquecida à temperatura de 1 200 graus centígrados, até que se forme uma finíssima camada protetora de óxido, com uma grande resistência elétrica. Em seguida, se cobre o wafer com material fotográfico, sobre o qual se colocam as máscaras- que se parecem às antigas chapas de vidro usadas em fotografia-onde os circuitos foram fotografados.
Ao submeter o conjunto a radiação ultravioleta, as áreas ocultas pelas máscaras ficam intactas, enquanto a luz atinge o material fotográfico, que se dissolve, deixando livre a camada de óxido de silício. Esse processo é repetido várias vezes, de acordo com o número de máscaras que forem necessárias. Em seguida, pode começar o processo de dopagem, como dizem os engenheiros. O método é o mesmo usado na gravação das máscaras, mas neste caso as áreas livres são bombardeadas ou dopadas com boro, fósforo ou arsênio, as chamadas "impurezas" que vão permitir a condutividade elétrica.
Depois, é preciso cobrir os chips com condutores de alumínio. Numa fábrica onde são feitos todo ano milhões de chips, esses processos ocorrem em salas onde o ar é mais limpo do que nos centros cirúrgicos dos hospitais. As pessoas ali só trabalham de uniformes imaculadamente brancos, com os pés, cabelos e mãos protegidos, pois a poeira trazida por elas pode prejudicar dezenas de chips incrustados numa lâmina.
No futuro, prevê-se que os chips serão confeccionados com materiais supercondutores que, por não oferecerem resistência à eletricidade, podem transmitir sinais ainda mais velozes do que se sonha com os circuitos atuais. Aliás, a preocupação dos fabricantes é conseguir chips que processem informações cada vez mais rapidamente. Para isso, já está sendo usado o arseneto de gálio como material semicondutor. O arseneto conduz elétrons até seis vezes mais depressa do que o silício, além de operar em temperaturas mais elevadas, reduzindo a necessidade de resfriar os computadores e outros sistemas eletrônicos. Como é muito caro, só é utilizado em pesquisas, como as que se desenvolvem na Unicamp, ou em supercomputadores militares americanos ou ainda na fabricação de circuitos para comunicações por microondas.
Independente do material de que são feitos -silício ou arseneto de gálio-, no final de todas as etapas de fabricação os chips ainda estão ligados às centenas num único wafer. Esse wafer então é serrado e os chips, enfim libertos, são soldados aos seus suportes mecânicos, os chamados lead-frames. É um trabalho que no Brasil ainda é mecânico na sua maior parte, além de ser executado. quase só por mulheres. São operárias que vão manusear, interligar, soldar os chips e depois implantar minúsculos fios de ouro que os manterão presos aos equipamentos eletrônicos. Encapsulado num invólucro de epóxi, o chip deixa de ter esse nome. Daí em diante, o retângulo milimétrico de silício passa a ser conhecido como circuito integrado.
O circuito brasileiro
A indústria micro eletrônica nacional tem prazo de dois anos para dominar o ciclo completo da fabricação do chip, conforme compromisso assumido com o Conin (Conselho Nacional de Informática e Automação). O objetivo é dominar a tecnologia tanto nos circuitos digitais, aqueles dos computadores, que lidam com memória, como a dos analógicos ou lineares, que processam dados contínuos, como nos televisores. Qualquer que seja o circuito, a base dos chips é sempre a mesma. Só muda a tecnologia, que permite que um número menor ou maior de componentes seja colocado num único chip.
A SID Microeletrônica, subsidiária da Sharp, com sede em Contagem, a 10 quilômetros de Belo Horizonte, é uma das três empresas brasileiras do setor mais avançadas em termos de tecnologia de chips. Mesmo assim, por enquanto, ela só trabalha com circuitos lineares. "No ano que vem", prevê seu diretor industrial, o engenheiro Wilson Leal, "começamos a fabricar circuitos para memórias." As outras duas empresas, Itautec Componentes e Elebra, desenham circuitos e realizam o estágio final de produção do chip-teste, montagem e encapsulamento. O restante é realizado por indústrias estrangeiras.
Só falta ao Brasil dominar duas etapas do ciclo de produção: a purificação do silício, do qual se obtém o cristal cilíndrico, e a elaboração de máscaras, que se segue ao projeto dos circuitos. Embora não seja capaz de transformar o silício metálico em policristal, a empresa paulista Heliodinâmica, especializada em células solares, fabrica o silício sob a forma de cristal puro. O CTI-Centro Tecnológico de Informática -, órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia que faz pesquisas em informática, se comprometeu a fazer ainda este ano as máscaras dos chips nacionais.
Imitação de cérebro
No futuro, os chips poderão ser feitos de organismos vivos, tornando- se bem mais parecidos com o cérebro humano do que as atuais microplaquetas de silício. Pelo menos desde 1974, pesquisadores americanos procuram desenvolver chips que copiem a maneira como os neurônios humanos processam uma colossal quantidade de informações. De acordo com esse modelo, os transistores seriam equivalentes às sinapses-ligações entre as células nervosas por onde se transmitem os impulsos. Mas enquanto os primeiros só permitem dois estados-ligado e desligado -, as sinapses têm uma enorme variedade de estados intermediários, que fazem com que as células nervosas tanto sirvam de memória como processem informações de maneira simultânea.
Outro motivo pelo qual os cientistas procuram substituir o silício por matéria orgânica é que o número de componentes existentes num circuito convencional está atingindo seu limite. Para substituir os transistores, pesquisadores da IBM americana, por exemplo, usaram moléculas orgânicas com cargas positiva e negativa. A montagem da experiência foi semelhante à dos circuitos integrados tradicionais, ou seja, foram usadas duas camadas separadas por um isolante, prensadas entre placas metálicas. No Japão, demonstrou-se que uma proteína extraída do coração do cavalo se comporta como material semicondutor.
Em outra pesquisa, dessa vez na Universidade da Califórnia, uma equipe de cientistas se propôs a produzir chips a partir de grandes moléculas de carbono, que possuem propriedades elétricas semelhantes às do silício. Essas moléculas seriam sintetizadas pela Escherichia coli, uma bactéria do intestino normalmente usada em engenharia genética. Os resultados dessa pesquisa vão demorar pelo menos vinte anos. De seu lado, pesquisadores da AT&T Bell Laboratories anunciaram recentemente, num seminário no Canadá, terem desenvolvido chips que imitam o cérebro humano, funcionando como neurônios eletrônicos. Esses chips de 7 milímetros quadrados de área teriam 75 mil transistores, o que equivale à memória de um micro tipo Apple. A idéia é usar esses chips como censores que reconstruiriam funções nervosas lesionadas.