SALAS DE AULA ELETRÔNICAS - Informática
Veteranos nas escolas, onde não provocaram a revolução prometida, os microcomputadores se unem agora à televisão e ao disco laser, apontando novos caminhos para o ensino do futuro.
Com um simples clique no mouse do computador, o estudante escala uma montanha, explora ruínas, conversa com arqueólogos e ouve sons emitidos por animais. Pode também investigar as harmonias de uma sinfonia de Beethoven, estudar detalhadamente as obras de Michelangelo e até se aprofundar na estrutura dos poemas de Edgar Allan Poe. Tudo isso sem arredar os pés da sala de aula. Realidade nos Estados Unidos, futuro ainda no Brasil, o embarque para essas viagens no tempo e espaço acontece nas estações multimídia, tecnologia que une o microcomputador à televisão e aos discos laser para acessar um banco de imagens, textos e sons. Os alunos vêem, ouvem e - mais importante - manipulam informações, tornando o processo educativo mais divertido e interativo.
Já desde o início dos anos 70 os computadores freqüentam as carteiras escolares. Enquanto instrumentos didáticos, trabalhavam a princípio como meros informadores de respostas certas ou erradas. Conforme a indústria crescia na direção de máquinas cada vez menores, com mais capacidade de memória e de processamento mais rápido, os microcomputadores foram gradativamente incorporados ao cotidiano das escolas para de lá não mais saírem. Hoje, nos Estados Unidos, há cerca de 2,7 milhões de computadores distribuídos pelas 100 000 escolas do país. Alimentados com programas . sofisticados, já fazem muito mais do que dizer sim ou não e resolver problemas matemáticos. Por mais que ainda pareçam um deslumbre tecnológico, porém, não se mostraram a solução para todos os problemas do ensino. Dez anos de experiência americana demonstraram que os computadores, por si sós, não foram capazes nem mesmo de deter a contínua queda de rendimento dos estudantes em relação a gerações passadas, quanto mais de promover uma revolução. A melhor receita para o insucesso é fazer do computador uma simples ferramenta, jogando-o numa sala de aula sem que os professores tenham passado por um treinamento prévio e sem ter idéia de como aproveitar seu potencial. "Se o computador é utilizado apenas como substituto do papel e lápis, fica sem sentido", avalia Almir Brandão, diretor do Centro de Pesquisa e Tecnologia do Centro Educacional Objetivo. Nessa rede de colégios com mais de 150 unidades pelo Brasil, as crianças têm contato com a informática desde a pré escola ao 2.° grau.
O programa preferido para iniciar crianças nos computadores é o Logo, criado pelo psicólogo americano Seymour Papert, usado no Objetivo e em várias escolas das grandes cidades brasileiras. Com a linguagem Logo, a criança, através de uma "tartaruga" eletrônica, aprende a lidar de forma amigável com o computador. A tartaruga, conforme explica Papert, é um objeto criado para a criança "pensar com". Ordenando à tartaruga que se movimente na tela, a criança faz desenhos geométricos e mapas, e Ihe ensina palavras enquanto aprende noções de programação. Outras aplicações podem ser durante a alfabetização, neste caso com uma cartilha eletrônica, em que cada letra corresponde a um desenho na tela, ou quando a criança já começa a redigir algo, sendo estimulada por um programa que Ihe dá o começo de uma história e Ihe faz uma série de perguntas.
Aos adolescentes, o Objetivo ensina trabalhar em programas comuns, como o editor de texto, e tem uma disciplina somente para que os alunos prendam a desenvolver aparelhos e compreendam seu funcionamento. "É preciso preparar as crianças que vão entrar no mercado de trabalho no próximo século para entender a tecnologia, e não decorá-la",", argumenta Brandão. No Brasil, é comum as próprias escolas desenvolverem seus programas. Nos Estados Unidos, a concorrência pelo mercado da Informática faz com que as empresas invistam pesado em educação por computador. O mercado educativo nos Estados Unidos hoje está estimado em 750 milhões de dólares por ano. Embora a Apple ainda seja a líder, com seus Macintosh de uso amigável tomando mais de 60 % do mercado. a IBM quer aumentar sua fatia dos atuais 11 % até suplantar a Apple, tradicional fornecedora de equipamentos e software para escolas e universidades.
Por isso, a IBM desenvolve programas como o Writing to Write, para ajudar crianças dos primeiros anos de escola a adquirir técnicas de bem escrever. Outro programa, o LinkWay, é o equivalente ao HyperCard, que roda nos Macintosh da Apple. Estes são os software que permitem a integração de texto, imagens, sons e fotos, comandados por um microcomputador, o que caracteriza a estação multimídia. Criadores desses software educativos afirmam que os programas não vão de forma alguma substituir as experiências tradicionais de ensino, mas sim oferecer material suplementar para uma geração de alunos acostumados com o ritmo acelerado dos videogames e videoclips. "Estamos tentando abordar a linguagem que os seres humanos querem ouvir nos anos 90", explica Morgan Newman, vice-presidente da AND Communications, uma editora de multimídia sediada na Califórnia.
É sobre esta inovadora forma de uso de computadores que trabalham os pesquisadores do Projeto Escola do Futuro, dentro do Laboratório de Tecnologia da Comunicação, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. "Escola do Futuro não é tecnologia de ponta dentro da sala de aula, e sim preparar a criança para viver no futuro", explica o pesquisados José Wagner Garcia, há dois anos trabalhando no Media Lab do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) Tem-se nesse projeto a noção bem clara de que o computador por si só vale pouco; interessa mesmo o uso que se pode dar a uma ferramenta capaz de permitir a manipulação de muita informação com grande velocidade.
Fredric Michael Litto, o coordenador do projeto, vê o computador e as estações multimídia como partes de uma nova mentalidade de ensino. "Temos que preparar nossos alunos para seu futuro, não para nosso passado", diz Litto, norte-americano naturalizado brasileiro. Esta idéia ele defende baseado em teorias recentes sobre a inteligência e a aprendizagem, como a da pesquisados Howard Gardner, da Universidade Harvard. Segundo Gardner, ter inteligência é mais do que possuir a capacidade de pensamento lingüístico e lógico-matemático, como se convencionara. Haveria também mais cinco capacidades-espacial, musical, intrapessoal, extrapessoal e corporal -, que se distribuem equilibradamente numa pessoa considerada "inteligente".
Ao contrário da escola padrão, dirigida à média das pessoas e normalmente pouco capaz de lidar com quem está acima ou abaixo dela, o ensino das próximas décadas tende a ser individualizado. Mais ainda, a imagem do professor como provedor de todo conhecimento, e da cabeça dos alunos como reservatórios a serem preenchidos, deve virar história. "O volume de informações produzidas hoje é excessivo, não se pode exigir que os alunos decorem tudo", esclarece Litto. E preciso, portanto, ensinar as crianças a entender em lugar de memorizar e a sobreviver numa sociedade onde a informação é um bem precioso e nem sempre ao alcance das mãos.
Para Fredric Litto, a escola do futuro deve ensinar ao estudante como pensar claramente, como se expressar claramente (seja no papel ou no computador), como procurar informação corretamente e como tomar decisões inteligentemente, ou seja, saber que já acumulou informações suficientes para tal. O cenário imaginado por Litto fica claro quando se pensa num estudante pesquisando numa enciclopédia do tamanho da Britânica, com 29 volumes. Se ele tomar o caminho errado já de início, não consultando o Índice para verificar em que volumes e páginas aparece o assunto procurado, ainda tem uma chance. Pode escolher um dos livros, por ordem alfabética, e virar páginas para lá e para cá até encontrar o verbete que lhe interessa.
Enquanto as informações ainda repousam sobre papel, há possibilidades de pesquisadores aleatórios encontrarem o que procuram, nem que seja com o acaso jogando-lhes as páginas sob os olhos. Na era do suporte digital, em que os textos da Britânica, estão armazenados em discos lidos por feixes de laser, esse método incerto se revela infrutífero. Num outro exemplo. a indecisão sobre a qualidade das informações adquiridas pode custar caro: ficar ligado pelo computador a um banco de dados qualquer via telefone, por muito tempo, custa muito caro.
No cenário da nova escola o computador é a pedra angular, mas não a única peça importante. " A escola do futuro terá mesa, quadro-negro, giz e computador dentro da sala, sem privilégio nenhum para a máquina", prevê Brasilina Passarelli, pesquisadora do Laboratório de Tecnologia da Comunicação da ECA. Nada de deslumbre com os computadores, que não devem ficar ligados o dia inteiro, com os olhos dos alunos grudados neles; quem escolhe o momento de usá-los é o professor, segundo sua estratégia de ensino. "Existem experiências de mundo que o computador não resolve", diz o pesquisador José Wagner Garcia. "No computador pode-se pintar uma linha, mas a criança não pode ser privada da experiência de passar um pincel com tinta sobre o papel."
Quando se pretende trocar o despejar de fatos por ensinar pessoas a pensar e a aprender, tendo o professor como guia, fica implícita a individualização do ensino. A multimídia, aqui, cai como uma luva. Munido de um disco laser onde está armazenado o tema que pretende estudar, uma televisão para ver as imagens e um microcomputador com um programa para gerenciar as informações, o estudante navega pelo tema, na seqüência e forma que preferir Na tela do micro aparece o "menu" ou as possíveis portas de entrada. Se o tema for a colonização norte-americana, por exemplo, e o aluno se interessar por transporte, pode começar sua navegação por aí, vendo fotos, filmes e texto do tempo das diligências. Se quiser ter noção da ocupação territorial em função do tempo, pode, chamar na tela um mapa animado.
De vários pontos de partida, segundo seu maior interesse, o estudante vai construindo seu próprio conhecimento, ligando um fato a outro, vendo imagens de época, fazendo perguntas e procurando as respostas-o chamado modo construtivista de aprendizado. O trabalho de Brasilina Passarelli é justamente desenvolver um protótipo para que se possa trabalhar com multimídia em Ciências Humanas no 1.° e 2.° graus. Seu tema é a Escravidão, mas ela espera que seu programa, uma vez pronto, possa servir de modelo para outros temas.
Também na universidade a multimídia tem espaço. Outro pesquisador da Escola do Futuro, Antonio Carlos Nogueira, pretende aplicar essa tecnologia no estudo de ciências agrárias. Trabalhando para a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Nogueira pretende montar um programa que mostre o campo ao estudante de Agronomia não sob uma ótica técnica, mas sob a perspectiva social. "Cada aluno poderá então elaborar seu roteiro de trabalho, investigando visões diversas sobre o mesmo tema, sem o conceito de certo e errado", explica Nogueira. "Posso montar uma base de textos e imagens que mostre temas como a reforma agrária, do ponto de vista da Antropologia, da Sociologia, da política."
Pesquisas eletrônicas
Alguns programas utilizados pelos estudantes nos Estados Unidos:
Ulysses-programa que permite aos alunos analisarem poemas em seu próprio ritmo. O software mostra na tela do computador a interpretação de vários atores e explica o contexto histórico de uma frase em particular. Requer equipamento de videodisco e um dispositivo que transforma o monitor de computador em uma tela de televisão.
Palenque-software desenvolvido pelo Centro para Crianças e Tecnologia do Bank Street College for Education, em Nova York, que apresenta as ruínas dos maias. Combina filme, fotografia, áudio, gráficos e texto sobre as ruínas situadas no sul do México. O programa permite ao usuário caminhar pelas ruínas, parar na porta de um templo, chamar no vídeo um arqueólogo, se movimentar dentro de um museu e aprender sobre os maias. A idéia, segundo Kathleen Wilson, diretora do Centro, é combinar o realismo fotográfico do vídeo e a narrativa com a capacidade interativa do computador. O Palenque requer computadores compatíveis com o PC da IBM, um toca-discos a laser para ler e uma placa de vídeo interativa de 2 500 dólares. que permite ao usuário manipular imagens digitalizadas, sons, gráficos, texto e vídeo.
Mamíferos-desenvolvido pela IBM em cooperação com a National Geographic Society, o programa inclui 44 videoelips com documentários da National Geographic, mais de 700 fotografias, vocalizações de animais autênticas, mapas mostrando o habitat dos animais, descrições e um glossário dos termos empregados.
Michelangelo: Auto-retrato- possibilita ao usuário interagir com dados apresentados nos dois documentários, nas centenas de fotografias da pintura do artista, de esculturas e desenhos, dados históricos e leitura de suas cartas. Desenvolvido pela Voyager, o programa requer um Macintosh, um monitor e o sistema HyperCard para rodar. Depois de dar um click com o mouse na Capela Sistina, o usuário pode examinar cada painel do teto, ouvir a carta que o artista escreveu em março de 1518 sobre seus trabalhos na Basílica de São Pedro ou ver cenas de filme que fazem referência a seu trabalho.
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