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terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Newton - gênio difícil

NEWTON: GÊNIO DIFÍCIL



Solitário, inseguro, rancoroso, o inglês Isaac Newton foi um cientista de talento excepcional, capaz de juntar numa só fórmula a queda de uma maçã e o movimento dos planetas.

O ano de 1666 foi fatídico para os ingleses. Em Londres, recém-saída da peste que matou 75 mil de seus 460 mil habitantes, um incêndio, iniciado numa padaria, se propagou durante quatro dias, consumindo mais de treze mil casas. Mas, na história da ciência, 1666 ficou conhecido como Annus Mirabilis - ano maravilhoso. E isso se deveu ao gênio de uma só pessoa: Isaac Newton. Com a Universidade de Cambridge fechada devido aos temores de contágio, Newton, então com apenas 24 anos, se refugiou no campo, na casa da mãe no lugarejo de Woolsthorpe, onde nascera.
No ambiente pacato da aldeia, ao passar em revista os conhecimentos que havia adquirido na renomada universidade, realizou a maior proeza intelectual já alcançada por um cientista em qualquer época - algo que só teria paralelo no século XX, com as teorias de Albert Einstein. Pois, em seu refúgio campestre, o jovem Newton não só inventou o cálculo infinitesimal, de aplicação quase ilimitada nos mais diferentes ramos da ciência, como também lançou os fundamentos da ótica moderna, com um estudo sobre a luz e as cores e, principalmente, esboçou sua maior contribuição ao conhecimento humano - a Teoria da Gravitação Universal. Muito tempo depois, ele mesmo explicaria a descoberta da gravitação com uma anedota que ficou famosa.
Estava sentado uma noite ao ar livre, quando viu uma maçã cair. No mesmo instante, a Lua se levantava no firmamento. Uma pergunta atravessou sua mente como um relâmpago: a força que faz a maçã cair não seria a mesma que mantém a Lua em órbita ao redor da Terra? A questão possuía um alcance incrível: durante séculos, sob o domínio das idéias de Aristóteles (384-322 a.C.), acreditava-se que a Física terrestre e a Física celeste nada tinham em comum.
Mergulhou então em profundos raciocínios: se a força de atração da Terra atuava sobre a Lua, o que mantinha os planetas em órbita deveria ser uma força do mesmo tipo, exercida pelo Sol. E essa força seria tanto mais fraca quanto mais distante o planeta estivesse do Sol. Partindo das leis sobre o movimento planetário, estabelecidas décadas antes pelo astrônomo e matemático alemão Johanes Kepler , Newton calculou que a força de atração varia de acordo com o inverso do quadrado da distância.
Estava apenas a um passo da Lei da Gravitação Universal. A maçã, que os ingleses tanto apreciam para fazer tortas, havia permitido a Newton mudar a concepção do Universo, mas, ao contrário da lenda, não tinha caído sobre sua cabeça.
O que havia na cabeça de Newton além da formidável intuição, era uma senhora neurose, resultado de uma infância que parecia conspiração do destino. Para começar, nasceu (no dia de Natal de 1642) prematuro, minúsculo e fraco. Ninguém acreditava que pudesse sobreviver ao primeiro dia: viveu 84 anos. Além disso, órfão de pai: o sitiante Isaac Newton, de quem herdou o nome, morrera três meses antes. Quando não havia ainda completado 3 anos, a mãe, Hannah, se casou de novo, com o pastor protestante Barnabas Smith. Este a levou para morar numa cidadezinha próxima de Woolsthorpe e exigiu que Isaac fosse deixado com a avó.
Newton odiaria esse padrasto a vida inteira. Certa vez, ameaçou queimá-lo. E certamente projetou o ódio em todos os rivais. Brutal complexo de inferioridade e aguda sensação de insegurança o acompanhariam até o fim. Foi aluno medíocre, até que uma violenta briga com um colega ativou nele algum secreto talento que o transformou no primeiro da classe. Tímido e isolado, possuía, porém, excepcional habilidade para inventar e construir brinquedos mecânicos, como relógios e moinhos de vento. Se dependesse da mãe, que enviuvara de novo, Isaac trocaria os livros pela administração da propriedade que ela herdara do marido pastor. Mas o diretor da escola insistiu com Hannah para que deixasse o moço estudar.
Assim, em junho de 1661, com 19 anos, entrou no Trinity College, da Universidade de Cambridge. Como estudante, primeiro, e logo como professor, continuava a ser uma figura excêntrica. Cabelos emaranhados, meias caindo nos calcanhares, era o tipo do gênio amalucado - distraído a ponto de se sentar à mesa do refeitório e esquecer de comer. Puritano, abstêmio, solitário, sua vida se passava entre as salas da universidade. A idade não o modificaria muito: é quase certo que tenha morrido virgem.
Mas a timidez no relacionamento humano era compensada por uma incrível vontade de saber. Para sorte de Newton, a grande revolução científica do século XVII já estava bastante adiantada quando chegou a Cambridge. Ele afirmaria mais tarde: se havia enxergado longe, era porque pudera se apoiar nos ombros de gigantes. Esses gigantes da revolução científica eram Johannes Kepler (1571-1630), o físico italiano (1564-1642) e o filósofo e matemático francês René Descartes (1596-1650).
De Kepler, Newton herdou uma decisiva revisão do sistema concebido pelo polonês Nicolau Copérnico (1473-1543), o primeiro a formular, ainda como hipótese matemática, a teoria do movimento dos planetas ao redor do Sol - que estaria no centro do Universo. De Galileu , recebeu uma nova formulação da ciência da Mecânica, baseada no princípio da inércia. De Descartes, a concepção mecanicista do mundo - a visão da natureza como uma grande máquina, que funcionaria para sempre com base apenas no movimento de suas partes. Descartes deu ainda a Newton outro legado formidável: a Geometria Analítica, novo ramo da Matemática que permitia resolver problemas, até então insolúveis, pelos métodos algébricos.
Com base em Kepler, Galileu e Descartes, o jovem Newton pôde fazer uma crítica da ciência grega que ainda era ensinada na universidade e anotou em latim num de seus cadernos: "Amicus Plato, amicus Aristoteles, magis amica veritas" (Platão é amigo, Aristóteles é amigo, mas amiga maior é a verdade). Três outras influências marcaram a formação de seu pensamento: o filósofo francês Pierre Gassendi, o químico inglês Robert Boyle e o filósofo também inglês Henry More. Gassendi havia ressuscitado a idéia grega de que a matéria se compunha de átomos - e isso seria um ingrediente decisivo na receita newtoniana da natureza. Boyle forneceu-lhe a base para sua considerável obra em Química. More, finalmente, abriu-lhe a porta para o mundo do hermetismo, da tradição mágica e da alquimia. O fundador da ciência racional moderna era, também, um amante do oculto.
Quando a Universidade de Cambridge foi fechada, devido à peste, Newton já havia recebido o grau de bacharel. Reaberta dois anos depois, ele ganhou a condição de fellow, que lhe permitia continuar os estudos à custa da universidade. Mais dois anos, e o catedrático de Matemática Isaac Barrow, que estava abandonando o magistério, indicou-o para sucedê-lo. Newton escolheu como tema inicial do curso seus estudos sobre a luz e as cores. De 1670 a 1672, suas palestras forneceriam material para o livro I de Ótica. O centro de sua contribuição era uma nova teoria das cores.
Baseado nela, concluiu que a distorção cromática produzida pelas lentes convencionais era inevitável; para eliminar essa perturbação das observações astronômicas, construiu o primeiro telescópio por reflexão. Esse foi seu passaporte para o fechado clube dos grandes cientistas da época - a Royal Society, a mais prestigiosa entidade científica da Inglaterra e da Europa. Em 1671, Newton foi eleito membro. Era o início da consagração. Mas havia uma pedra no meio do caminho. Seu nome: Robert Hooke, um dos mais brilhantes cientistas ingleses e líder da Royal Society.
Ao contrário de Newton, Hooke acreditava que a luz era uma onda que se propagava no éter - substância sutilíssima que preencheria todo o Universo. A ciência atual acabaria dando razão aos dois: embora a hipótese do éter universal tenha sido derrubada, sabe-se hoje que a luz realmente se comporta ora como se fosse formada por partículas ora como onda (SUPERINTERESSANTE n.º 3). Mas, na segunda metade do século XVII, as diferenças científicas entre Hooke e Newton transformaram-se em interminável desavença pessoal.
A culpa, sem dúvida, foi do suscetível Newton: o contraponto do complexo de inferioridade era uma certeza intelectual que não admitia a menor contestação. Quase um ano depois da crítica de Hooke, ele continuava tão abalado que mergulhou em virtual isolamento. Quando, finalmente, em 1675, resolveu publicar o livro II de Ótica, jesuítas ingleses de Liège, na Bélgica, acusaram-no de erro nas experiências. A polêmica durou até 1678, quando Newton chegou ao completo esgotamento nervoso. Nos seis anos seguintes, ele fugiria a qualquer tipo de contato intelectual.
Nesse período, entregou-se ao hermetismo. Sua biblioteca particular continha mais de cem tratados sobre alquimia, muitos copiados a mão por ele. Seu forno de alquimista para experiências com metais permaneceu aceso meses a fio. Sob a influência da chamada "arte de transmutação dos metais", também sua concepção da natureza se transmudou. Antes, a idéia de que a matéria pode exercer ação a distância, como nos fenômenos eletrostáticos e gravitacionais, lhe era inaceitável: devia haver mecanismos invisíveis operando no éter.
Agora, questões enigmáticas, como o fato de certas substâncias químicas reagirem entre si e outras não, o levaram a imaginar um princípio secreto regendo as simpatias e as antipatias entre as substâncias. Parece incrível, mas a Teoria da Gravitação Universal, coluna mestra da Física moderna, é descendente direta da filosofia hermética. Para Newton, estas eram correções inevitáveis no pensamento mecanicista, única forma de dar à natureza um tratamento matemático exato: as atrações à distância eram rigorosamente quantitativos.
Em agosto de 1684, uma visita do astrônomo Edmond Halley tirou Newton da concha em que se fechara. Halley, cujo nome seria dado a um cometa, era uma espécie de fiel escudeiro de Newton. Soubera que este havia resolvido o problema da explicação física dos movimentos planetários: foi cobrar a demonstração. Newton prometeu atender. Da promessa resultou, quase três anos depois, a obra fundamental da ciência moderna: Philosophiae Naturalis Principia Mathematica (Princípios matemáticos da Filosofia natural).
Com a primeira edição de quatrocentos exemplares, financiada pelo próprio Halley, os Principia, como a obra ficou conhecida, projetaram imediatamente o nome de Newton. Os jovens cientistas fizeram dele o seu modelo. Newton, de seu lado, sentia-se bem nessa companhia - particularmente, na companhia de Fatio de Duillier, matemático suíço residente em Londres. Depois da relação com a mãe, a amizade com Fatio foi sua mais profunda experiência afetiva. Sob a influência da fama e do amigo, começou a abandonar a solidão.
Protestante fervoroso, participou da resistência da Universidade de Cambridge à tentativa do rei James II de torná-la católica. Depois da revolução incruenta de 1688, que derrubou James do poder, foi eleito representante da Universidade na conferência de Londres, que estabeleceu o acordo entre os revolucionários vitoriosos. Isto lhe deu oportunidade de travar relações com os notáveis do país - entre eles, o filósofo John Locke. A vida intensa da capital o atraiu. Tanto que fez gestões junto ao político Charles Montague, futuro Lord Halifax, para arranjar emprego ali. Em 1696, Montague conseguiu-lhe a nomeação para a diretoria da Casa da Moeda.
Mudou-se finalmente para Londres. Fatio havia voltado para a Suíça, apesar dos protestos de Newton, que se oferecera até para sustentá-lo na Inglaterra. Londres era o encerramento de sua atividade científica criadora. Suas preocupações intelectuais se voltavam para outra direção. Tentou provar que as passagens bíblicas sobre a Santíssima Trindade eram corrupções tardias do texto original. Dedicou um livro à interpretação das profecias de Daniel e do Apocalipse de São João. Mergulhou num estudo exaustivo e infecundo sobre a cronologia das antigas civilizações.
Como diretor e, depois, presidente da Casa da Moeda, recebia um polpudo salário anual de 2 mil libras, o que o transformou rapidamente num homem rico. Poderia contentar-se em ser um marajá da administração inglesa. Mas não sossegou: voltou sua raiva contra os falsificadores de dinheiro, levando vários à forca. Em 1703, foi eleito presidente da Royal Society, que dirigiria como ditador até o final da vida. Seus últimos anos foram dedicados a uma nova briga - desta vez, com um adversário à altura: o filósofo e matemático alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716). Motivo: a prioridade na invenção do cálculo infinitesimal.
Na verdade, Newton foi o inventor, e Leibniz o primeiro a publicar a invenção. Mas a polêmica era boa demais para ser deixada de lado com argumentos razoáveis. Newton redigiu pessoalmente a maior parte dos artigos em sua defesa assinados por seus partidários. Como presidente da Royal Society, nomeou um comitê "imparcial" para investigar o caso, enquanto secretamente escrevia o relatório oficial com as conclusões desse mesmo comitê. Nem a morte de Leibniz o acalmou: qualquer artigo, sobre qualquer assunto, continuava a ser uma boa oportunidade para espinafrar o filósofo alemão. Somente sua própria morte, em 20 de março de 1727, pôs fim à pendenga. E pensar que dessa mente conturbada nasceu a mais prodigiosa obra científica já produzida por um homem em todos os tempos.

Assim na Terra como no céu.

Como qualquer história inglesa que se preze, também esta envolveu uma aposta. Cenário: uma taberna londrina, próxima à Royal Society. Época: 1684. Animada pelo álcool, uma discussão se instala entre três celebridades: o astrônomo Edmond Halley; o então presidente da Royal Society, Robert Hooke; e o ilustre arquiteto Christopher Wren. O assunto, como convém a intelectuais desse porte, é o movimento dos planetas ao redor do Sol.
Halley diz que se pode calcular a força que mantém os planetas em órbita. Ela variaria com o inverso do quadrado da distância que os separa do Sol. Hooke argumenta que, se isso for verdade, será preciso demonstrar, a partir daí, todas as leis sobre o movimento planetário, descobertas por Kepler - algo que ele próprio está certo de poder fazer. Wren propõe então: quem resolver o problema receberá um prêmio simbólico de 40 shillings. A disputa estimula Halley a viajar a Cambridge, à procura do solitário Isaac Newton. Qual não é sua surpresa quando Newton lhe diz que, realmente, já havia considerado a possibilidade de que a força de atração variasse segundo o inverso do quadrado da distância.
A partir dessa hipótese, acrescenta, era possível deduzir matematicamente as órbitas dos planetas, estabelecidas por Kepler. E mais: tinha certeza disso porque fizera pessoalmente os cálculos, uns vinte anos antes, durante a peste de Londres; mas depois se desinteressara do assunto. A insistência de Halley o convenceu a retomar o estudo. Durante três anos, Newton trabalhou nas idéias esboçadas naquele "ano maravilhoso" de sua juventude. Quando finalmente publica suas conclusões, em 1687, está criada uma nova Física, simples e coerente. Sua base são as três leis sobre o movimento dos corpos, apresentadas no livro I dos Principia.
Em linguagem atual, elas podem ser assim redigidas: 1) A menos que atue uma força externa, qualquer corpo tende a manter-se indefinidamente em repouso ou em movimento retilíneo e uniforme (princípio da inércia); 2) caso uma força externa atue a aceleração que o corpo recebe é proporcional à intensidade da força (princípio fundamental da dinâmica); 3) toda vez que um corpo recebe de outro uma força, ele também exerce sobre este uma força de mesma intensidade e direção, mas de sentido contrário (princípio da ação e reação).
A partir dessas três leis, Newton calculou a força centrípeta (de fora para dentro) necessária para fazer um corpo transformar seu movimento retilíneo e uniforme em movimento circular. Depois chegou à sua famosa Lei da Gravitação Universal: cada partícula de matéria do Universo atrai qualquer outra com uma força proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância que as separa. Não se sabe se Newton recebeu os 40 shillings de Wren, mas seus Principia se tornaram o paradigma da Física clássica.
Quando a sonda espacial norte-americana Voyager abandona o sistema solar e, sem nenhuma propulsão, continua a se deslocar no espaço, é o princípio da inércia que está sendo mais uma vez confirmado. Quando, milhões de vezes todos os dias, os motoristas aceleram seus carros, a relação entre a força produzida pelo motor e a aceleração do veículo é governada pelo princípio fundamental da dinâmica. Quando um nadador, ao atravessar uma piscina, empurra com os braços e pernas a água para trás e recebe da água a força equivalente que o impulsiona, é o princípio da ação e reação que está em jogo. Depois de Einstein e da Mecânica Quântica, a Física de Newton já não explica o Universo. Mas explica uma infinidade de fenômenos comuns do mundo cotidiano.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Big Bang - O Tempo Começa

BIG BANG - O Tempo Começa



Antes de mais nada, preciso fazer uma confissão: o texto ainda nem começou e já há duas informações nesta página que não são verdadeiras. A primeira está no título. Na verdade, o Universo não surgiu em uma grande explosão - pelo menos não da forma como uma bomba explodiria. O termo big-bang ("grande explosão", em inglês) foi escolhido como a mais simples definição do modelo científico que afirma que, há bilhões de anos, todo o Universo estava concentrado em um espaço tão exíguo que faria qualquer partícula parecer gigantesca. De um início muito mais quente que o inferno e incrivelmente mais apertado que um ônibus às 6 da tarde, o cosmo passou a se expandir e a esfriar rapidamente. Essa "explosão" - desculpe, leitor, vamos ser obrigados a continuar usando essa expressão - teria ocorrido em todos os pontos do Universo ao mesmo tempo. O segundo erro é ainda mais grave: nenhum cientista é capaz de dizer o que existia antes do big- bang. Pode até ser que realmente não houvesse nada, mas não é impossível que existisse alguma coisa. O fato é que essa questão ainda desafia as mentes mais brilhantes do planeta. Para chegar até aqui, a astronomia precisou de milênios de pesquisa e perspicácia. Mas, nos bastidores, a história de uma das maiores teorias de todos os tempos também traz relatos de intriga, vaidade, fugas espetaculares, bobagens. E um anão. Vire a página e volte no tempo.



100% periferia

Para conhecer a história completa do big-bang, é preciso voltar ao século 4 a.C. Isso porque o primeiro passo em direção a ele foi dado por um filósofo grego, Aristarco, que propôs uma idéia ousada: a Terra não seria o centro do Universo, mas giraria em torno do Sol. O modelo foi considerado ridículo e ficou esquecido por 2 mil anos, até que um polonês atrevido escreveu Sobre as Revoluções das Esferas Celestes. Nicolau Copérnico, o autor do tratado, voltou-se contra a teoria dominante do grego Ptolomeu, segundo a qual a Terra estaria no centro de tudo. A obra de Copérnico saiu em 1543 - e só então ele percebeu uma terrível traição. No prefácio, escrito sem o seu consentimento, sua teoria era apresentada como "não necessariamente verdadeira nem ao menos provável" e a hipótese de que o Sol estava no centro do Universo era considerada "absurda". A punhalada só foi possível porque, durante a impressão do livro, ele estava de cama se recuperando de uma hemorragia. Morreu no dia em que recebeu a edição.

Ao longo das décadas seguintes, na Dinamarca, um astrônomo chamado Tycho Brahe havia ganho tanta reputação que o rei Frederico II deu a ele uma ilha e dinheiro para construir um observatório. Apesar das lunetas, a especialidade da ilha eram as festas. Pessoas importantes eram convidadas para cerimônias animadíssimas, que contavam com a presença de Jeep, um anão que fazia as vezes de bobo da corte. Em 1588, com a morte do rei, Brahe perdeu seus privilégios. Acabou tendo de abandonar o castelo (e a badalação) e migrou para Praga, onde conheceu o alemão Johannes Kepler. Era uma dupla perfeita: Brahe fazia as mais precisas observações da época. E Kepler, que seria o melhor intérprete desses dados, descobriu três coisas fundamentais: os planetas não se movem em círculos, mas em elipses; a velocidade desses planetas varia continuamente e o Sol não está exatamente no centro dessas órbitas. A suspeita se confirmou com as pesquisas do italiano Galileu Galilei, um católico devoto que tirou proveito das recém-inventadas lunetas. Ele percebeu que havia luas em torno de Júpiter, o que era uma prova incontestável de que a Terra não era o centro do Universo. Acabou condenado pela Inquisição à prisão domiciliar.



Contra Einstein

Antes de se tornar o mais famoso físico de sua época - e uma referência para os séculos seguintes -, o inglês Isaac Newton teve uma infância conturbada. Seu pai havia morrido três meses antes do seu nascimento. A mãe se casou com um homem mais velho, que não permitiu que o garoto Isaac morasse com eles. Abandonado, Newton se tornou um homem amargo e às vezes cruel - a ponto de, quando se tornou inspetor da Casa da Moeda britânica, mandar enforcar e esquartejar os falsificadores que tiveram o azar de passar pela sua frente. Mesmo assim, construiu as fundações de uma nova ciência. A sua lei da gravidade, de 1666, ensina que todo objeto no Universo atrai outro objeto. "O poder da fórmula é resumir tudo o que Copérnico, Kepler e Galileu vinham tentando explicar sobre o sistema solar", escreveu o inglês Simon Singh em Big Bang, um livro que descreve a história dessa explosão (e que inspirou grande parte desta matéria). Ou seja, uma maçã cai no chão não porque se dirige ao centro do Universo, mas porque a Terra e a maçã têm massa. Assim, a lei explicava, por exemplo, por que os planetas fazem uma órbita elíptica em torno do Sol - o que havia sido demonstrado por Kepler.

As descobertas permitiam que os cientistas entendessem o funcionamento de quase todas as estrelas que conseguiam ver na época, mas não dava a mínima pista de onde saiu aquilo tudo. Um grande passo nessa direção veio em 1915, quando o alemão Albert Einstein, então já famoso e acostumado a revolucionar a física, resolveu mudar tudo de novo e apresentou sua teoria da relatividade geral. No centro dela estava a noção de que tanto o tempo como o espaço são flexíveis e deformáveis por fatores como velocidade, energia e gravidade. Só tinha um problema: como o Universo era molengão e as estrelas se atraíam, todo o espaço já deveria ter se curvado e desabado sobre si mesmo. A idéia parecia ridícula. "Einstein tinha idéias em cosmologia completamente reacionárias. Era um homem do século 19, quando todos achavam que o Universo tinha um fim e estava parado desde sempre", diz o físico Mário Novello, presidente do Instituto Nacional de Cosmologia, Relatividade e Astrofísica. Einstein elaborou então o que ele mesmo depois considerou a maior bobagem de sua carreira: alterou as equações para que elas se encaixassem na sua visão de um Universo que não cresce nem diminui.

O problema é que essa limitação de Einstein dificultou a vida dos outros. Dois estudiosos - o russo Alexander Friedmann e o belga George Lemaître - acharam uma solução para o impasse: se o Universo estivesse se expandindo, é possível que ele nunca entrasse em colapso. A gravidade de tudo o que existe não conseguiria fazê-lo se curvar porque o Cosmos esticaria e se manteria estável. Mas quando Friedmann foi buscar a benção de Einstein, este lhe disse que a idéia parecia "suspeita".

Lemaître - que conseguia levar duas profissões aparentemente antagônicas de padre e cosmologista - insistiu, até porque suas idéias tinham um tempero a mais. Ele não só estava convicto de que a teoria de Einstein implicaria um Universo em expansão como acreditava em um "momento da criação". Tudo teria começado em uma região pequena e compacta que "explodiu" e cresceu. Ele chegou até a cunhar a expressão "átomo primordial" para descrever a provável aparência do Universo em seu começo, que seria "um hoje sem ontem". Mas o belga não teve mais sucesso do que Friedmann ao buscar o apoio de Einstein - já então capaz de construir e destruir reputações no meio científico. Em 1927, ouviu deste um veredicto nada animador: "Seus cálculos estão corretos, mas a sua física é abominável". A teoria teria de esperar mais alguns anos antes que fosse aceita - inclusive por Einstein.



Tudo expande

O começo do século 20 foi marcado não apenas pelo surgimento da relatividade, mas também pela construção de telescópios grandes e modernos. O americano Edwin Hubble foi o nome mais conhecido dessa safra de observadores. Em 1923, trabalhando no Observatório de Monte Wilson, na Califórnia, Estados Unidos, ele identificou uma cefeida (um tipo de estrela) em uma nebulosa e mostrou que ela estaria localizada muito longe da Via Láctea. Isso provou que não habitamos a única galáxia do Universo. Mas o passo mais importante começou a ser dado em 1929, quando Hubble percebeu que as estrelas mais afastadas da Terra são aquelas que estão se afastando mais rapidamente. O Universo estaria, portanto, se expandindo. Hubble, no entanto, deixou claro que o problema dele era coletar os dados - e nunca se propôs a teorizar sobre isso. Ele preferia os holofotes de jornais e TVs, pois agora também era uma celebridade.

Com a prova de que o Universo estava se expandindo nas mãos, o trabalho dos teóricos passou a ser "retroceder no tempo" para tentar descobrir como exatamente chegamos até aqui. O ucraniano George Gamow era uma das figuras centrais dessa "arqueologia do cosmos", mas a interferência política dos governantes soviéticos nas pesquisas científicas fez com que ele e a mulher resolvessem fugir de seu país. Depois de duas tentativas fracassadas - na primeira, pretendiam atravessar o Mar Negro em um caiaque - eles finalmente conseguiram e, em 1940, chegaram aos Estados Unidos. Interessado em pesquisar a física das partículas, o ucraniano percebeu que ali não havia mais ninguém estudando o tema seriamente - só depois soube que todos os outros cérebros da área haviam sido cooptados para o Projeto Manhattan, que levaria à construção da bomba atômica americana. Junto com seus colegas Ralph Alpher e Robert Herman, Gamow constatou que os primeiros momentos do Universo seriam tão quentes que quebrariam qualquer átomo e transformariam tudo em uma sopa de prótons, nêutrons e elétrons (as menores partículas conhecidas até então). E, quando ele esfriasse, essas partículas formariam apenas os menores átomos possíveis, os de hidrogênio e hélio - o que explicava por que esses elementos hoje compõem 99,9% de toda a matéria que vemos no Universo. Eles também previram que 300 mil anos depois da explosão teria havido a liberação de uma enorme quantidade de luz que faria um "eco luminoso" no Universo. E isso poderia ser percebido hoje.

Foi então que o debate se acirrou. Para uns, o Universo estaria se expandindo a partir de um momento inicial e, para outros, ele era eterno e provavelmente infinito. Um dos maiores defensores da segunda hipótese, o inglês Fred Hoyle, chegou a dizer em um programa da Rádio BBC que não via "nenhuma boa razão para preferir essa idéia de big-bang". O intuito de Hoyle era ironizar, mas era a primeira vez que alguém usava esse termo para se referir à teoria - e o apelido pegou. Para o azar de Hoyle, "essa idéia de big- bang" só ganhou evidências a partir daí. Uma das principais descobertas foi feita por Arno Penzias e Robert Wilson, dos Laboratórios Bell, em meados dos anos 1960. Eles detectaram um ruído nos seus aparelhos de radioastronomia. Como isso não os deixava trabalhar, eles foram atrás da razão. Acabaram descobrindo que se tratava da radiação cósmica de fundo - o "eco" do big-bang previsto por Gamow. "A confirmação dessa radiação deu credibilidade ao modelo. Desde então, ele tem sido refinado com inúmeras observações", diz o físico brasileiro Marcelo Gleiser, do Dartmouth College, Estados Unidos.



E antes?

As teorias sobre a gravidade não bastavam para ir além das descobertas de Gamow. O início do Universo seria tão quente e pequeno que, para entendê-lo, era necessário usar os conhecimentos da mecânica quântica, que descreve o comportamento das coisas nessa escala. À medida que os cientistas descobriam quarks, léptons, mésons e um enorme número de partículas subatômicas, novos elementos foram encaixados no retrato do início de tudo. Hoje, os cientistas acreditam ter esclarecido como era o Universo até 10-43 segundos depois do big-bang (isso significa o número 1 colocado 43 casas depois da vírgula, ou um tempo tão pequeno que nem vale a pena tentar visualizar). A situação se complica mais cada vez que alguém traz novas evidências. No final dos anos 1990, por exemplo, descobriu-se que o Universo não só aumenta, como está acelerando. Alguma força - até agora chamada de "energia escura" - está empurrando o cosmo, mas ninguém sabe muito bem o que é, nem o que ela fez desde o big-bang. O retrato atual que os pesquisadores têm do passado e do futuro do Universo é o que aparece no quadro acima.
O grande mistério agora é outro: o que havia antes do big-bang? "Para Einstein, só existia o nada. Mas, segundo a mecânica quântica, é possível criar novos espaços-tempos. Isso significa que pode ter havido alguma coisa", diz o físico Élcio Abdalla, da USP. Nesse ponto, a discussão começa a tornar-se cada vez menos científica e parece até voltar a um estágio anterior aos gregos, quando os mitos explicavam todo o Universo. Para a ciência deste começo de século 21, parece um fim de linha. Mas esses obstáculos são sempre provisórios. Ninguém pode afirmar com certeza que o modelo do big-bang - apesar de ser incrivelmente preciso na descrição do que aconteceu com o cosmo - nunca será superado.


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segunda-feira, 18 de abril de 2011

Corra para não cair - A Gravidade

CORRA PARA NÃO CAIR - A Gravidade



Basta olhar para baixo, de um lugar alto e sem proteção, para ver a razão: o pânico que paralisa a mente e gela o corpo numa hora dessa mostra que você pode não saber direito o que é a gravidade, mas tem perfeita noção de seu significado essencial.

A vertigem é a primeira lição sobre a mais corriqueira e decisiva força do Universo, além de ser, atualmente, um dos dois ou três assuntos mais importantes da ciência: a gravidade.

Sentir vertigem à beira do abismo não é vergonha. O medo é real e, segundo os astrônomos, vai muito além de uma queda até o chão - ele alcança as estrelas, estremece as galáxias e, no final das contas, ameaça engolir o cosmo inteiro. Estamos sempre caindo, porque a gravidade não é exatamente uma força como estamos acostumados a pensar: é um eterno tombo para um único ponto. Para onde, é difícil saber. No caso da Terra, é fácil - tudo cai para o centro exato do planeta. Aliás, a Terra é uma bola justamente por isso: toda a sua massa converge para o centro e se aperta por igual em torno desse ponto, formando uma esfera no espaço.

Mas, quando se pensa no Universo, a resposta não é tão simples. Como todos os corpos celestes se atraem sempre, podem se amontoar em uma única massa descomunal. A atração final se tornaria tão grande que a esfera esmagaria a si mesma e continuaria encolhendo para o resto da eternidade. Ninguém sabe direito aonde isso iria dar.

O que os planetas geralmente fazem para adiar o tombo é fugir da trajetória de queda. Veja, por exemplo, a Lua, que está caindo para o centro da Terra. Ela hoje está a salvo por que gira - ou seja, dribla, sem parar, a atração fatal. Mas só está a salvo assim: se parasse, seria tombo na certa. E por aí vai: a Terra também corre em volta do Sol e o Sol corre em volta do centro da Via Láctea, que por sua vez rodopia num carrossel de galáxias vizinhas no nosso canto do Universo. A correria é o que estabelece o equilíbrio precário do mundo diante da gravidade, que o físico americano Freeman Dyson, um dos maiores divulgadores da ciência da atualidade, já comparou a uma ladeira que é adrenalina pura - você simplesmente não tem onde se segurar.

Descendo do céu para o solo, é a mesma situação. Os bebês descobrem o domínio da gravidade quando aprendem a andar, que é apenas uma outra forma de atrasar a queda universal. Só ficamos de pé enquanto temos músculos e ossos para resistir a ela - sem falar na comida e no ar, que constantemente repõem a força dos ossos e dos músculos. Se o combustível acaba, o corpo vai ao chão. O único jeito de escapar da queda é correr sem parar, no caso dos astros, ou nunca parar de comer, no caso dos seres vivos.

Qual será o fim desse jogo? Depende, diz Dyson. Uma das pesquisas mais importantes dos últimos anos é a que busca decidir se a estabilidade do cosmo persistirá para sempre ou se é provisória - se o Universo vai, afinal, cair em cima de si mesmo algum dia. Essa angústia persiste há décadas, e ainda não está, de maneira alguma, decidida.

A questão pode ser resumida a uma contagem trivial: se houver uma grande quantidade de energia gravitacional, a queda vencerá. Mais cedo ou mais tarde, todas as galáxias vão começar a despencar umas sobre as outras e a partir daí já não haverá meio de parar a concentração. É claro: quanto mais a gravidade se concentra, mais a queda se acentua. As galáxias vão se apertar, cada vez mais, num único volume de densidade altíssima, arrastando junto com ela as estrelas, os planetas e os seres vivos.

É isso o que se chama de buraco negro: um lugar onde a concentração da gravidade ficou tão grande que a queda não pode mais ser interrompida. O mais estranho nesses buracos é que eles são feitos de matéria em queda permanente para o centro deles. Vale a pena entender esse mistério: aqui na Terra, por exemplo, a gravidade é fraca e pode ser contida pelas forças químicas, ou seja, pelas forças elétricas e magnéticas que unem e sustentam átomos e moléculas. É a química que dá resistência às rochas e impede que elas caiam para o centro da Terra. De quebra, servem de apoio para os seres vivos também evitarem a queda. No caso do Sol, a situação é parecida, só que a força que "segura" a gravidade não é a eletricidade, mas a força nuclear - a energia que une os elementos no núcleo dos átomos.

O mistério dos buracos negros acontece quando a gravidade se torna tão intensa que já não pode ser contida por nenhuma outra força. Aí, a queda se torna permanente. Para ter uma idéia, se o peso do Sol fosse apenas 3,2 vezes maior do que é, ele viraria um buraco negro. Toda a sua massa despencaria para dentro de si mesma numa queda sem fim. A estrela desapareceria, deixando no lugar só uma esfera opaca, mais ou menos do tamanho da cidade de São Paulo. Não haveria superfície: seu volume serviria só para demarcar a distância a partir da qual o abismo se torna invencível. Nem a luz, que é a coisa mais rápida que existe, escaparia ao destino misterioso da queda.

Existe a possibilidade de o Universo inteiro se tornar um buraco negro no futuro distante, mas parece improvável. Primeiro, porque o cosmo está em expansão. As galáxias estão, visivelmente, se afastando umas das outras. Então, não estão se amontoando e, pelo menos por enquanto, não há risco de virarem buraco negro. Além disso, somando todo o conjunto das galáxias, parece haver muito pouca energia gravitacional no Universo todo.

A questão não está fechada porque tudo indica que as galáxias não são feitas apenas de objetos que brilham e que, por isso, podemos ver. Elas também incluem a chamada matéria escura - objetos que não podemos ver e não sabemos muito bem o que são. Talvez sejam buracos negros, que não deixam a luz escapar. Mas também podem ser estrelas pequenas, vinte vezes mais leves que o Sol. Com esse peso, não podem esmagar os átomos em seu interior e disparar as reações nucleares que criam a luz e fazem as estrelas reluzirem.

Outra alternativa são partículas atômicas como os neutrinos, incrivelmente leves, mas muito numerosas. Imagine, leitor: a cada segundo passam 60 bilhões de neutrinos em cada centímetro quadrado de sua pele.

Eles são produzidos pelo Sol e nessa conta estão incluídos apenas os que vêm na direção da Terra. Por aí se pode avaliar a vasta enxurrada de neutrinos vazando da superfície solar a cada segundo, em todas as direções. Agora, some todas as estrelas e entenda por que os neutrinos são os objetos mais abundantes do cosmo - excelentes candidatos a componentes da matéria escura.

Mas ainda não dá para ter certeza. Afinal, a matéria escura nunca pôde ser vista, detectada ou testada de qualquer maneira. Só se sabe que ela existe porque as galáxias estão girando mais depressa do que deveriam. Lembre-se: no espaço vazio, correr é única maneira de fugir da queda gravitacional. Se a Terra fosse mais pesada do que é, a Lua teria de correr mais para não cair.

Então, se as galáxias estão rodopiando muito depressa, é porque são muito pesadas, isto é, reúnem muita energia gravitacional. Mas de onde vem essa energia? Se dependesse só do peso das estrelas, as galáxias não precisariam correr tanto quanto estão correndo em torno do seu centro. E mais importante: quando se observam grandes grupos de galáxias, todas rodando em torno umas das outras, vê-se que a disparada é ainda maior do que a rotação das galáxias sozinhas, individualmente.

A matéria escura é pesquisada há quase meio século, e sua quantidade cresce à medida que se aprimoram as buscas. Hoje acredita-se que ela seja quase seis vezes mais abundante que toda a matéria brilhante do Universo. Para cada quilo de matéria visível, existem 5,75 quilos de matéria invisível.

De acordo com o astrofísico Dave Spergel, da Universidade Princeton, nos Estados Unidos, a matéria escura continua a desafiar a ciência. Um grande pesquisador de planetas desgarrados, ele diz que nenhum tipo de matéria conhecida - sejam neutrinos ou buracos negros - passa ileso pelos testes que a ciência usa para identificar a massa fantasma das galáxias. Esses testes são indiretos e trabalhosos.

Já se supôs, por exemplo, que a matéria escura fosse composta de poeira interestelar. Como poeira nem sempre brilha, podia ser uma boa candidata. Mas os astrônomos avaliaram que a quantidade de poeira necessária para aumentar a rotação de uma galáxia na proporção que haviam observado era muito grande. Se a matéria escura fosse mesmo poeira, seu volume ofuscaria as estrelas - e isso não estava acontecendo. A teoria foi descartada.

Segundo Sperger, o mais provável, nesse momento, é que a matéria escura inclua objetos nunca vistos - especialmente certas partículas atômicas previstas apenas em teoria. Não foram, ainda, encontradas no laboratório. Uma dessas partículas é um tipo novo de neutrino bem mais pesado que seu primo comum. É uma possibilidade, mas não ajuda muito, pois não está certo se esse neutrino gordo existe mesmo.

Além disso, restam dois problemas a resolver. O primeiro é que, mesmo juntando toda a matéria escura e toda a matéria visível, ainda assim fica faltando muita energia gravitacional para "desequilibrar" o Universo e, um dia, transformá-lo num buraco negro. Essas duas formas de matéria somadas correspondem a apenas 27% do que seria necessário para que toda a matéria do cosmo começasse a se reunir. Para piorar, descobriu-se, em 1997, uma complicação ainda maior: a expansão cósmica está se acelerando.

Para ver por quê, basta voltar à metáfora da ladeira: a gravidade faz o cosmo parecer um buraco, mas a descoberta da expansão cósmica, em 1929, mostrou que a ladeira que leva ao fundo do buraco estica muito. Ou seja, as galáxias caem, mas, como a distância entre elas cresce, só se amontoarão se despencarem umas sobre as outras mais rápido que o aumento da distância. A grande novidade, em 1997, foi o anúncio de que a distância não está só crescendo: ela aumenta cada vez mais rápido.

Se isso se confirmar, está decidido: o Universo jamais se transformará num buraco negro e, para ser exato, nem é um buraco. É liso como a tampa de uma mesa (se é que dá para imaginar a tampa de uma mesa em três dimensões). A gravidade entorta o espaço, mas a aceleração cósmica compensa a curvatura de maneira automática. Com isso, a "ladeira" está sempre perfeitamente reta.

A tentação agora é dizer que está resolvida uma dúvida que começou com a própria descoberta da gravidade pelo físico inglês Isaac Newton, em 1686. Newton percebeu o futuro dilema: se a gravidade era sempre atrativa, o Universo acabaria amontoado num único ponto. Essa angústia da implosão cósmica hoje está superada, mas, mesmo assim, seria prematuro fazer afirmações categóricas sobre o destino do Universo. A verdade é que ninguém esperava a expansão - e muito menos a aceleração cósmica - e ninguém sabe exatamente qual é a sua causa. A matéria escura, seja lá o que for, continua sem explicação. E nenhum cientista sequer sabe dizer o que acontece dentro de um buraco negro.

Isso sugere que não está clara a queda de braço entre a gravidade, de um lado, e, de outro, as outras grandes forças do Universo: a eletromagnética e a nuclear. Einstein morreu acreditando numa idéia incrível, que continua a mobilizar muitos pesquisadores. Para eles, existe algum tipo de parentesco entre a gravidade e as outras forças do Universo. Elas parecem diferentes entre si, mas talvez isso seja apenas aparência. Os polvos, por exemplo, parecem diferentes das ostras, mas evoluíram da mesma espécie e são bem parecidos. As cascas agora ficam dentro do organismo dos polvos, e não por fora, como nas suas tias-avós. Por isso, ostras e polvos são ambos incluídos na família dos moluscos.

Os físicos aplicam esse mesmo tipo de comparação às forças, tentando mostrar que são apenas "espécies" distintas, ou variantes, de uma mesma força cósmica universal. Às vezes, essa força-mãe aparece de forma avassaladora, trilhões de vezes mais intensa que a gravitacional. É o caso das detonações atômicas, causadas pela força nuclear.

Se as outras forças forem primas da gravidade, deve haver uma fórmula só que calcule todas elas. O problema é que ainda não sabemos o parentesco entre a energia atômica e a gravitacional, então não podemos usar as equações da gravidade para calcular a energia de uma explosão. Ela tem de ser calculada por meio de fórmulas exclusivas. O mesmo vale para a eletricidade, que é cerca de 100 vezes mais intensa que a gravidade e também tem suas próprias fórmulas. Mas, se a idéia do parentesco der certo, ela também poderá ser calculada por uma fórmula geral das forças.

A caça a essa equação definitiva consome atualmente grande parte dos recursos financeiros da ciência e alguns dos cérebros mais badalados das universidades, como o físico inglês Stephen Hawking. Outro grupo importante são os responsáveis pelas chamadas teorias das cordas. Todos esses trabalhos são tentativas de unificar a gravidade, a eletricidade e a energia nuclear.
Talvez, quando terminarmos esse trabalho (se é que isso acontecerá algum dia), a ciência tenha uma explicação mais clara para a matéria escura, a aceleração cósmica e os buracos negros. Até lá, o jeito é agüentar a vertigem de não saber como o Universo irá acabar.