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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A Ciência Constrói Atletas - Fisiologia


A CIÊNCIA CONSTRÓI ATLETAS - Fisiologia



A corrida atrás de medalhas leva esportistas aos laboratórios. Fisiologia do esforço, biomecânica, psicologia, tudo vale na luta por centímetros ou décimos de segundo

A garota espevitada com jeito de moleque só queria saber de jogar handebol, pois adorava marcar gols. Nem mesmo o grupo de pesquisadores que apareceu em seu colégio, e descobriu uma força fenomenal nas suas pernas de 12 anos, a fez mudar de idéia. Handebol, diziam eles, era um desperdício de talento, já que a potência privilegiada daquelas pernas faria da garota uma ótima velocista ou jogadora de basquete. A paixão por marcar gols, no entanto, falava mais alto do que uma cesta. Foram necessários muitos conselhos de uma grande jogadora de basquete da época, Norma de Oliveira, a Norminha, para que a menina enfim resolvesse se aventurar em jumps e bandejas. O basquete brasileiro ganhou assim Hortência, uma das maiores jogadoras que já pisaram quadras em todo o mundo. 

Assim como pode descobrir, entre meninos e meninas  aparentemente iguais, quem deles tem corpo e jeito para se transformar num grande atleta, a ciência do esporte evolui a cada dia na arte de lapidá-los. Se o extraordinário negro americano Jesse Owens conquistou quatro medalhas na Olimpíada de Berlim, em 1936, na casa e na cara de Adolf Hitler, o fez simplesmente graças a seus músculos e talento. Às vésperas do Pan-Americano em Cuba e das Olimpíadas de Barcelona 92, os atletas, para subir ao podium, não dependiam apenas de exaustivos treinamentos dirigidos por seus técnicos, mas de minuciosos testes conduzidos por cientistas. É um trabalho requintado, a ponto de se prever como as fibras musculares irão conseguir energia em cada etapa de uma prova, ou em que segundo exato o atleta ficará cansado. O objetivo é sempre um só - rendimento máximo. Antes de se construir um ganhador de medalhas, porém, é preciso saber garimpar a melhor matéria-prima.O Brasil, um país de poucos campeões olímpicos ao longo de sua história, tem um trabalho um tanto artesanal para detectar talentos para o esporte. Um deles foi elaborado pela equipe do Centro de Estudos e Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul (SP), o Celafiscs. Há dezesseis anos, o Celafiscs vem aplicando a estratégia Z, um modelo matemático que compara os dados de 15 000 pessoas de ambos os sexos e diversas faixas etárias aos de atletas de elite. É possível perceber, assim, o que um atleta tem que nós não temos. Com base nesses números, sabe-se por exemplo quanto um jogador de vôlei como Xandó salta acima da média da população. "Se um garoto de 14 anos tiver uma impulsão proporcionalmente tão boa, em relação aos outros da sua idade, é provável que se torne um bom jogador de vôlei", diz o médico esportivo Victor Matsudo, diretor do Celafiscs. É claro que boas pernas não bastam para prever que um garoto será um atleta de alto nível. Outras variáveis pesam, como coordenação motora, velocidade e até vontade treinar.As características corporais são tão importantes que, conhecendo-se quais são elas, é possível farejar um campeão. Foi o caso do judoca Aurélio Miguel, medalha de ouro na Olimpíada de Seul em 88. Aurélio possui não só uma circunferência de braço excepcional, como parece óbvio para um judoca, mas também um ótimo fôlego, que fez a diferença não tão óbvia a seu favor na final. "Esse é o segredo de Aurélio Miguel", revela Victor Matsudo. "Embora as lutas de judô durem só cinco minutos, ele lutou quatro vezes naquela noite em que ganhou a medalha. Vence a final quem tem resistência para chegar à última luta em condições físicas quase tão boas quanto as da primeira"Detalhes como esse são a diferença entre o campeão e o vice. Para poder conhecer o organismo de um atleta e saber onde ele deve ser trabalhado, fisiologistas se valem de uma parafernália de laboratório com a qual desvendam a intimidade de um corpo em movimento. Um organismo nunca está em estado normal quando corre, pula, luta ou salta, já que todo exercício físico é uma sobrecarga ao corpo, provocando alterações bioquímicas, cardiorrespiratórias e musculares. Essas alterações fisiológicas indicam que a questão prioritária do corpo é obter energia para conseguir se manter em esforço.Se um atleta se cansa antes de a prova ou de o jogo terminar, os fisiologistas do esforço, analisando tais alterações, determinam com alto grau de precisão a causa da fadiga em hora imprópria. O corpo vai buscar essa energia em três fontes. A primeira é usada apenas em casos de emergência, porque dura pouco e vem das moléculas de ATP armazenadas nas células. O ATP é uma espécie de bateria que está ali justamente para liberar energia rapidinho. Todo mundo usa ATP quando, sentado, levanta-se e começa a andar. Nos primeiros dois ou três segundos, o corpo usa o ATP armazenado, depois parte para a segunda forma de obtenção de energia, a transformação da glicose presente no sangue e nos músculos em mais ATP. Um   velocista como Carl Lewis, na competição dos 100 metros rasos, que dura menos de 10 segundos para quem chega na frente, não tem tempo sequer para transformar a glicose.Se em lugar de Carl Lewis estiver na pista o brasileiro Joaquim Cruz, especialista na prova dos 800 metros, seu corpo vai, depois dos momentos iniciais, entrar no terceiro jeito de conseguir força para continuar correndo. O método agora é decompor combustíveis energéticos, como gorduras, carboidratos e proteínas, para ter como resultado gás carbônico, água e principalmente energia. Para que esse processo aconteça, é necessária a presença do oxigênio, que vai "queimar" os combustíveis.O cenário dessa reação é a mitocôndria, uma organela em formato de feijão que existe às centenas em cada célula e faz o papel de uma usina. Enquanto o atleta respira fundo e suas células consomem oxigênio, ele está na chamda atividade física aeróbia. "Essa é a forma mais eficiente de um corpo conseguir energia, pois os músculos trabalham melhor e durante mais tempo", conta Carlos Eduardo Negrão, fisiologista da Escola de Educação Física da Universidade de São Paulo e integrante da Seleção brasileira de vôlei no inicio dos anos 70. 0 único inconveniente desse sistema é a semelhança com o carro a álcool: demora a esquentar. As usininhas celulares só começam a produzir energia a pleno vapor depois de alguns minutos do corpo em esforço.Porém, se por algum motivo o oxigênio inspirado pelo atleta não é suficiente para permitir a queima dos combustíveis, seu organismo apelará para a atividade anaeróbia. É a repetição do segundo estágio, quando a glicose é transformada em ATP, e é aqui que começam os problemas. Embora tenha a vantagem de proporcionar energia rapidamente, o que se torna necessário quando o corpo precisa de mais força do que as mitocôndrias são capazes de gerar, a atividade anaeróbia tem um efeito colateral - o ácido lático. Temida por atletas, técnicos e preparadores físicos, essa substância, sobra da decomposição da glicose, impede a contração muscular, provoca dores e, o que é pior, deixa o sangue ácido.Atrapalhando a produção de elementos bioquímicos que fazem cada fibra muscular se dobrar (por troca de cargas elétricas), e além disso irritando sensores nervosos da dor, o ácido lático leva o troco do corpo. O contra-ataque vem na forma de uma série de bicarbonatos, que o transformam em água e gás carbônico. Isso resolve o problema dos músculos, mas não o do sangue. Acontece que o gás carbônico continua a aumentar a acidez sanguínea, um verdadeiro desastre para o bom funcionamento das células, especialmente as nervosas. Tamanho seria o estrago provocado pelo sangue ácido, que existem células na carótida e na aorta, as duas maiores artérias do corpo humano, encarregadas exclusivamente de vigiar o seu pH (indicador de acidez).Assim, quando o sangue se torna ácido, essas sentinelas nervosas advertem o cérebro para tomar as devidas providências. "A respiração torna se então acelerada e o atleta fica ofegante", diz Negrão. "Mas isso não ocorre porque seus músculos pedem mais oxigênio, como pode parecer à primeira vista, e sim porque é necessário expulsar o excesso de gás carbônico", explica.Esse momento é flagrado em laboratório quando um atleta, pedalando ou correndo numa esteira rolante, é ligado a um aparelho computadorizado que desenha gráficos coloridos. Neles, Negrão acompanha alterações, como freqüência cardíaca, volume de ar respirado, consumo de oxigênio e volume de gás carbônico expirado. Esse aparelho - só existem dois no Brasil - revela particularidades fisiológicas impossíveis de ser detectadas sem ele. Às vezes, um atleta tem uma ventilação adequada, ou seja, respira um volume ideal de ar. "No entanto, ao calcular a pressão dentro dos pulmões, o aparelho indica se aquele atleta está levando para o sangue todo o oxigênio que inspirou", avalia Negrão. Mesmo que seu sangue  receba montes de oxigênio, ele tem ainda outro limite, conhecido como VO2, que determina o volume máximo desse gás que suas células conseguem transformar em energia.Em outro exame importante, uma única gota de sangue do atleta retirada do lóbulo da orelha ou da ponta do dedo, é colocada num aparelho que indica a quantidade de ácido lático. Somada essa informação aos dados do gráfico, sabe-se em que momento o atleta passou a recorrer ao processo anaeróbio, ou seja, cansou - e isso costuma acontecer um pouco antes de seu organismo alcançar o chamado limiar aeróbio, o consumo máximo de oxigênio. É nesse ponto do esforço que o atleta deve trabalhar durante os treinamentos. Se passar desse limite, seu corpo não agüentará; se ficar abaixo dele, pode gastar horas correndo nos treinos, mas sua condição física não sairá do lugar.No caminho que leva uma promessa de campeão até o podium, contudo, a evolução do preparo físico chega na melhor das hipóteses a 20%. Por isso, é inútil preparar um maratonista para disputar uma Olimpíada se o seu consumo máximo de oxigênio é 60 mililitros por quilo por minuto. O fisiologista Antonio Carlos Silva, da Escola Paulista de Medicina, que há quinze anos se dedica à avaliação de atletas, deparou com esse caso. "Um treinamento de êxito condicionaria aquele maratonista a consumir 72 mililitros por quilo por minuto, quando sabemos que um maratonista de nível internacional supera 75", lembra Silva. O brasileiro em questão estaria derrotado antes mesmo do tiro de largada.Nem sempre, porém, a capacidade de consumir oxigênio é o fator limitante da performance. Um atleta pode consumir mais oxigênio do que outro, mas. seu adversário talvez demore mais tempo para fabricar ácido lático, um freio para os músculos, que começa a ser liberado antes de o organismo esgotar suas possibilidades de buscar energia no oxigênio. Na arrancada final embora tenha menor capacidade aeróbia, o adversário tem menos acidez no sangue e está menos cansado- o que pode se traduzir em vitória. Por isso, o objetivo do treinamento pode ser empurrar o início da produção de ácido lático cada vez mais para perto da linha de chegada, se possível para além dela.Vários motivos podem atrasar a entrada do ácido lático na jogada. Parte do ácido é transformada nos próprios músculos em substâncias inofensivas. Esse processo pode ser acelerado por algumas enzimas, cuja produção será tanto maior quanto mais o músculo for requisitado. "Existem evidências, porém, de que a capacidade de gerar enzimas também é determinada geneticamente", observa Antonio Carlos Silva. Portanto, já do berço, algumas pessoas trazem essa marca de atleta. No treinamento, a repetição interminável de movimentos em determinados músculos tem no retardamento da produção de ácido lático a razão de ser. Numa tentativa de atender à demanda implacável, as mitocôndrias das células se multiplicam. Resultado: a capacidade de gerar energia com oxigênio aumenta. Como se não bastasse, doses cada vez maiores desse gás são servidas aos músculos. Isso porque o desenvolvimento muscular é acompanhado pelo crescimento de minúsculos vasos capilares, que levam sangue oxigenado a domicílio. Na comparação do fisiologista Silva, "é como se as fibras musculares ganhassem um sistema de transporte de entrega rápida". Além disso, o exercício constante amplia as câmaras do coração do esportista. Isso aumenta o que os cientistas chamam de déficit cardíaco, o volume de sangue bombeado pelo coração em cada batimento. No auge do esforço, a freqüência cardíaca de um atleta em relação a uma pessoa sedentária, do mesmo sexo e idade, deve ser muito parecida, mas o coração bem treinado empurra muito mais sangue de uma só vez. Moral da história: o músculo do atleta aproveita mais o oxigênio, que chega em quantidades maiores e num tempo menor.Retardar a produção do ácido lático, porém, não é a estratégia ideal para todas as modalidades esportivas. Isso é muito bem adequado às atividades que exigem resistência, chamadas aeróbicas, como as provas de fundo em atletismo, natação ou ciclismo, e as partidas de basquete, vôlei ou futebol. Nos músculos desses atletas predominam as fibras lentas, que se contraem sem muita força, mas agüentam um trabalho prolongado. Já provas anaeróbicas, como os 100 metros rasos e  saltos e arremessos no atletismo, ou ainda levantamento de peso, que exigem mais força do que movimento, dependem da capacidade dos músculos de estocar energia na forma de glicose. E ela o combustível preferido pelas fibras musculares rápidas, que se contraem com muita força, mas se cansam facilmente.Fica patente que os atletas são feitos sob medida para seu esporte. Enquanto os que precisam de resistência são preparados para chegar ao fim da prova ou do jogo antes que o cansaço os alcance, os que dependem da força são treinados para ganhar massa muscular, a fim de ter maior reserva de energia. Mas no esporte de alta performance, onde centímetros ou centésimos de segundo valem a vitória, os talentos naturais pouco valem se não forem levados ao limite pela ciência do esporte. Nem adianta apenas treinar, o que na opinião de Valdir Barbanti, professor da USP e preparador físico da Seleção brasileira de basquete, é simplesmente uma repetição dos movimentos certos. Se o atleta os fizer de forma errada, não evolui. 

É por esse motivo que há cerca de trinta anos se desenvolve outra forma de trabalhar esportistas de alto nível, a biomecânica. Ao contrário da fisiologia, que investiga as mudanças por dentro do corpo, a biomecânica se preocupa com os aspectos externos, ou os movimentos e comportamento dos músculos durante uma competição. O ponto de partida é a antropometria, um cálculo da massa corporal segundo um modelo matemático que serve para determinar, entre outros parâmetros, o centro de gravidade do corpo - um dado fundamental quando se estuda movimento. 

Mais complicada é a eletromiografia, uma técnica que permite ao pesquisador da biomecânica saber quais os músculos ativos em cada passo de um atleta. Como o músculo se contrai por troca de cargas elétricas, é possível saber se ele está em repouso ou fazendo força com o eletromiógrafo, um aparelho ligado ao corpo que capta a freqüência desse sinal elétrico. O eletromiógrafo envia o sinal a um computador e tem-se como resultado um gráfico com linhas semelhantes ao de um eletrocardiograma.Fundador do recém-criado laboratório de biomecânica da Educação Física da USP, o professor Alberto Carlos Amadio exemplifica a aplicação da eletromiografia ao estudo do salto triplo: "Sabendo quais músculos das pernas um triplista ganhador de medalhas usa em cada fase do salto, e quais ele deixa inativos, temos um modelo da ação dos músculos num salto ideal". Um atleta que aparentemente faz o movimento certo, mas deixa contraídos músculos que deveria relaxar, ou vice-versa, é flagrado em erro por esse método.A terceira área da biomecânica é a dinamometria, o estudo das forças de reação do solo ao impacto do corpo. Ela é medida pela plataforma de força, uma placa de aço sustentada por quatro pequenos aparelhos sensíveis a pressão. Ligada também a um computador, a plataforma dá os gráficos de três forças toda vez que alguém pisa ali: vertical, para baixo; horizontal, no sentido do movimento; transversal, lateralmente ao movimento. Por fim, a cinemetria analisa a posição das partes do corpo no espaço. Isso é feito com câmaras de vídeo ou filme, que registram imagens posteriormente digitalizadas e passadas a um computador.A rotina de treinos e competições sobrecarrega não só o físico de um atleta, mas também sua cabeça. O preparo psicológico, por isso, cada vez mais decide o jogo a favor de quem o tem. Ele se resume a características psicofisiológicas treináveis como músculos: atenção, concentração, percepção, memória, pensamento, sentimentos e emoção. As técnicas são variadas, desde pedir a um jogador de tênis que fixe o olhar numa bolinha por cinco minutos, até criar num jogador o hábito de visualizar a partida desde o dia anterior para entrar na quadra psicologicamente "aquecido"."A preparação psicológica é tão importante quanto a física", garante a psicóloga Regina Brandão, coordenadora do setor de psicologia do Celafiscs. "Nenhum atleta perde condicionamento físico de repente - somente a variável psicológica afeta a performance de um dia para o outro", constata. Numa Olimpíada, em que os competidores disputam várias provas eliminatórias e depois as finais, a cabeça precisa estar em ordem todo o tempo, por vários dias. Não é à toa que a normalmente inabalável frieza dos atletas soviéticos e dos países do Leste europeu os levou muitas vezes ao topo do podium - a tradição da psicologia aplicada ao esporte, na União Soviética. é centenária.Nenhum adversário conseguiu derrotar os gélidos atletas da antiga Cortina de Ferro como seu próprio destino histérico, o fim dos governos socialistas. "Quando ruiu o sistema político, ruiu o sistema científico-esportivo sustentado por ele", analisa Alberto Carlos Amadio, que estudou por cinco anos na Universidade de Colônia, na Alemanha. O modelo mais eficiente de fabricação de medalhistas de ouro foi levado a cabo pela ex-Alemanha Oriental com o Instituto de Leipzig, uma fábrica de esportistas finamente talhados por mais de 600 pesquisadores, que hoje está às moscas. "Com o fim da guerra fria entre Ocidente e Oriente, as perguntas que se fazem agora são: para onde vai o esporte de alto nÍvel, e para que somar medalhas numa Olimpíada?", especula Amadio.


O que eles têm

As diferenças entre um brasileiro comum, um maratonista e um velocista
Esse é o perfil de aptidão física de brasileiros do sexo masculino entre 20 e 22 anos de idade. Se fossem atletas dos Estados Unidos, tudo seria diferente. Os americanos pesam em média 72,62 quilos; a balança chega a apontar 83,97 quilos no caso dos velocistas, e isso pode ser uma vantagem, pois a modalidade exige uma grande massa muscular. Já o maratonista americano pesa apenas 61,27 quilos em média, quase dois quilos a menos que o brasileiro. Outro ponto para os corredores dos  Estados Unidos: na maratona, os mais leves costumam chegar primeiro.Brasileiro médio peso: 63,74 quilos altura: 1,70 metro média das dobras cutâneas (gordura): \7,61 centímetros consumo máximo de oxigênio 44,58 ml/kg/min potência anaeróbia: 261,.97 metros potência das pernas (impulsão vertical): 33,13 centímetros, pressão manual: 73,73 quilos velocidade (50 metros): 7s64 volume máximo de sangue bombeado: 20 litros por minuto freqüência cardíaca no repouso: 70 batimentos por minuto    Maratonista médio peso: 63,05 quilos altura: 1,74 metro média das dobras cutâneas 5,61 consumo máximo de oxigênio: 77,26 ml/kg/minpotência  anaeróbia: 304,08 metros potência das pernas: 37 centímetros pressão manual 46,43 qullos velocidade (50 metros): 7s26 volume máximo sangue bombeado: 35 litros por minuto freqüência cardíaca no repouso: 45 batimentos por minuto    Velocista médiopeso: 67.64 quilosaltura: 1,75 metromedia das dobras cutâneas: 5,79 centímetrosconsumo máximo de oxigênio: 59,41 ml/kg/ minpotência anaeróbia: 324,11 metrospotência das pernas: 37,65 centímetrospressão manual: 50 quilosvelocidade (50 metros): 6s64volume máximo de sangue bombeado: 25 litros por minutofreqüência cardíaca no repouso: 55 batimentos por minuto



Ao alcance dos mortais

Fabricar superatletas não é a única missão dos laboratórios de fisiologia do esforço. Ao trabalhar também com quem só se mexe por esporte os cientistas estabelecem parâmetros de atividade física para pessoas tão diferentes como crianças, idosos, mulheres grávidas, diabéticos. "Ginástica não faz bem da mesma maneira para todo mundo", adverte o fisiologista Antonio Carlos Silva. Assim como os atletas, cidadãos comuns, quando treinam menos do que o ideal, não têm benefício algum.Porém, ao fazer esforço demais, o atleta costuma parar por causa do cansaço, que literalmente trava seus músculos. "Quem não tem o mesmo preparo físico talvez não sinta nada ao cometer excessos, mas seu organismo sempre sofre algum dano", comenta Silva. Por isso, os mesmos exames realizados nos superatletas são repetidos em gente normal, para também se conhecer entre essas pessoas os limites individuais de esforço. Isso fornece subsídios a médicos e professores de educação física para que não exijam de cada pessoa mais - ou menos - do que seu organismo pode suportar. 


100 METROS

Recorde atual: 9s92 (Seul, 24/9/88)Limite estimado: 9s58Recordista: Carl Lewis (Estados Unidos)
Avanços tecnológicos, como tênis mais leves, contribuem para superar marcas em modalidades que exigem velocidade. Apesar disso, a grande responsabilidade de recordes está nas pernas dos atletas. Além de possuírem uma proporção maior de fibras musculares rápidas, velocistas devem ter passada larga. Atletas pernaltas devem quebrar o recorde atual em alguns décimos de segundo.


SALTO EM ALTURA

Recorde atual 2,44 m (San Juan, 29/7/89)
Limite estimado 2,72 mRecordista: Javier Soto Mayor (Cuba)
Um excelente salto em altura é uma mistura de força, destreza e estatura. Vários recordes têm sido quebrados porque os atletas são cada vez mais técnicos e mais altos. No entanto, a força das pernas não tem acompanhado esse crescimento. Se os futuros atletas, além de mais altos, também tiverem pernas mais robustas, o recorde atual poderá ser superado em até 13 centímetros. 

SALTO EM DISTÂNCIA
Recorde atual8,90 m (Cidade do México, 18/10/68)Limite estimado10,32 mRecordista: Bob Beamon (EUA)No salto em distancia, quanto mais alto você salta, mais tempo você fica no ar; quanto mais veloz é a decolagem, maior é a distância que se percorre antes de tocar o pé no solo. Atletas mais velozes terão mais facilidade para combinar esses fatores e conseguir ângulo ideal, repetindo - ou superando - o espetáculo de Bob Beamon.



400 METROS NADO LIVRE FEMININO

Recorde atual4min03s85 (Seul, 22/9/88)
Limite estimado: nenhum
Recordista: Janet Evans (EUA)
Poucas provas têm mostrado tanto progresso quanto as de natação feminina. O número de nadadoras de elite cresce, O treinamento é mais aperfeiçoado e surgem novidades, como piscinas que diminuem a formação de ondas. Pela performance das atuais nadadoras, há quem acredite que, no futuro, elas irão superar os recordes masculinos.



SALTO COM VARA

Recorde atual: 6,06 m (Nice, 10/7/88)
Limite estimado: 7,82 m
Recordista: Sergei Bubka (URSS)
O aparecimento de varas de fibra de vidro, substituindo as de alumínio e bambu, fez a curva de recordes ascender drasticamente. Afinal, a vara de fibra de vidro é como uma catapulta, que aproveita a energia do atleta, enquanto ele corre, e o impulsiona para cima. Mas alguma energia se perde em vibração - o atleta que evitar essa dispersão pulará mais alto. 




terça-feira, 30 de outubro de 2012

Sakharov - dos Átomos aos homens


SAKHAROV - DOS ÁTOMOS AOS HOMENS



O cientista soviético que encarnou a consciência moral de seu país, na defesa dos direitos humanos, foi também um mestre da Física. Ele antecipou em um quarto de século as mais avançadas teorias sobre a matéria e o Universo.

A coragem política e a integridade do físico soviético Andrei Sakharov, falecido no fim do ano passado fizeram dele o campeão da luta pelos direitos humanos em seu país. A tenacidade com que resistiu a toda sorte de provações, como os sete anos de confinamento numa cidade proibida a estrangeiros, a 400 quilômetros de Moscou, ajudou a transformá-lo numa das mais respeitadas autoridades morais do mundo contemporâneo. Paradoxalmente, o renome do ativista e pensador ainda hoje impede que se enxergue o gênio científico, à altura dos maiores criadores do século. Seu feito mais divulgado foi o de ter resolvido um formidável problema de ordem prática - projetar a bomba de hidrogênio soviética. Mas as páginas menos conhecidas da obra de Sakharov incluem investigações de grande originalidade, relacionadas com a origem da matéria e do Universo.

Formuladas inicialmente há 25 anos, suas idéias acabaram antecipando teorias as mais avançadas, como as que se propõem a unificar as forças fundamentais da natureza-o Santo Graal das pesquisas de ponta em Física. Além disso, foi o precursor dos reatores de fusão nuclear. Sua primeira proeza teórica foi explicar, em 1966, por que não existem estrelas e planetas de antimatéria. Uma espécie de antípoda dos átomos comuns, a antimatéria já era produzida com certa facilidade nos laboratórios - por que então não se podia encontrá-la na natureza? Sakharov sugeriu que, num passado remotíssimo, matéria e antimatéria se aniquilaram mutuamente na que terá sido a maior hecatombe da história universal. A antimatéria foi consumida por completo desaparecendo do Cosmo. Restou um espantoso, embora ínfimo, resíduo de matéria comum, equivalente a 0,5 bilionésimo da massa original do Universo. Todas as galáxias, estrelas e planetas existentes, sustentou Sakharov, teriam sido recicladas a partir desse resíduo primordial. Mas e esse misterioso resíduo, por que sobreviveu? Porque, antes do holocausto cósmico, respondeu o físico, matéria e antimatéria sofreram a ação de um processo que os cientistas não haviam concebido-a desintegração dos prótons, com a diferença de que os prótons de antimatéria se desintegravam um nada mais depressa do que os de matéria. Resultado: em dado instante da gênese do Universo, pressupôs Sakharov a partir de cálculos de apropriada complexidade, para cada bilhão 3 de antiprótons havia um bilhão e um; próton. Hoje, os físicos estão convencidos de que as coisas realmente se passaram assim. Um dos motivos pelos quais esse trabalho de gigante permaneceu à sombra foram as muitas atribulações da vida do cientista.

Desde o nascimento, em 1921, quatro anos depois do terremoto da Revolução comunista, Sakharov cresceu numa cidade, Moscou, onde se respirava uma atmosfera de constante agitação, com todas as tragédias e as esperanças que tais acontecimentos suscitam. Filho de uma bem-sucedida família kulturny, como dizem os russos de pessoas que apreciam a cultura, passou a infância, em clima de relativa tranqüilidade para a época e recebeu uma sólida formação básica. Aos 4 anos, já tentava ler por conta própria, mas só foi freqüentar a escola aos 12. Aprendia em casa com a ajuda do pai, Dimitri, professor de Física e autor de livros didáticos e de divulgação científica, e da mãe, Ekaterina, professora universitária de Ginástica.

O jovem Andrei lia-lia muito. Desde Os três mosqueteiros, de Alexandre Dumas, a Fausto, de Goethe e a Hamlet, de Shakespeare. Mas gostava especialmente da ficção científica de Júlio Verne, da qual diria mais tarde tratar-se de "um tributo ao engenho humano e ao poder da ciência". Esses anos felizes desabaram com a Segunda Guerra Mundial. Recém-formado, já casado (com a química Klava Vikhereva) e pai de Tânia, sua primeira filha-o casal teve outra menina e um menino-, sofreu com a fome que devastava o país invadido em 1941. Não tinha sequer residência certa: os bombardeios alemães haviam destruído a casa onde ainda vivia com os pais. A própria Universidade de Moscou, onde obtivera o diploma de físico em 1942, teve de ser evacuada e transferida para Ashkhabad, capital da desértica, remota República Turcomana, na Ásia Central.

A carreira de Sakharov começaria bem longe dos meios acadêmicos. Seus talentos seriam aproveitados (escassamente) numa metalúrgica militar em Ulianovsk, às margens do Rio Volga, a quase 1000 quilômetros de Moscou. "Trabalhávamos em dois turnos de onze horas diárias, sete dias por semana", conta Sakharov em suas memórias, publicadas há poucos meses. Embora tivesse formalmente as funções de engenheiro, nos primeiros meses o físico exerceu uma variedade de tarefas, desde lenhador a chefe de turma na linha de produção. Mesmo assim, sonhava com altas Matemáticas. Enquanto picava repolho, por exemplo, imaginava uma lei capaz de dar conta da forma das fatias cortadas. À noite, sacrificava o pouco tempo de descanso para estudar Física teórica. Querendo exercitar o espírito  inventivo naquelas duras condições, acabou criando quatro novos aparelhos destinados a aprimorar o controle de qualidade na metalúrgica.

Alto, magro, sempre curvado, o que o fazia parecer mais velho, sabia ser educado e paciente apesar das ásperas circunstâncias. Dessa experiência provavelmente reteve um hábito "que me ajudava a pensar", como explicaria: lavar a própria louça depois das refeições, algo que, na radicalmente machista sociedade soviética, ainda é tarefa exclusiva de mulher, mesmo que ela ostente mais títulos acadêmicos que o marido. Passado algum tempo, Sakharov recebeu uma tarefa mais adequada às suas aptidões: pesquisador no laboratório da fábrica. Ali conheceu a mulher com quem voltaria casado a Moscou em 1944. Mas só começou a melhorar de vida cerca de dois anos mais tarde, quando conseguiu um lugar no Instituto de Física da Academia de Ciências, uma das importantes instituições soviéticas de pesquisa. Ali, há trinta anos, antes de qualquer outro país, começou-se a investigar o laser.

Sakharov pôde, finalmente, estabelecer residência e dedicar-se a estudos de alto nível. Ainda estava dando os primeiros passos nesse novo patamar quando o físico Igor Tamm (Prêmio Nobel em 1958 por sua teoria sobre um novo tipo de radiação, descoberta, por sinal, na URSS) convidou-o a trabalhar no projeto da bomba de hidrogênio. À medida que se ampliava a guerra fria entre Estados Unidos e União Soviética, Washington e Moscou aceleravam as pesquisas com armas nucleares. Quatro anos depois das bombas A que os americanos lançaram sobre o Japão em 1945, os soviéticos testaram com êxito um artefato semelhante. Mas o alvo das duas superpotências era já mais ambicioso: a bomba H.

A corrida armamentista acabou sendo decisiva para a trajetória de Sakharov-primeiro, como cientista, depois, como dissidente. Ele passou quase vinte anos praticamente confinado numa instalação secreta, embora próxima da capital, muitas vezes isolado da própria família. Sua tarefa era digna dos cérebros mais bem dotados: decifrar os enigmas da fusão termonuclear, a fonte de energia das estrelas-e também das bombas de hidrogênio. Ele estava, portanto, junto do primeiríssimo time científico da URSS, no qual se destacavam pesquisadores como o astrofísico Iacov Zeldovich.

Milhares de vezes mais violenta, a fusão é o oposto da fusão, cujo domínio tornou possível tanto a bomba A como as usinas nucleares para a produção de eletricidade. Nestas, quebram-se átomos pesados, como os de urânio, para aproveitar a energia que os mantinha unidos. Durante a fusão, ocorre o contrário: dois átomos leves, como os de hidrogênio, são comprimidos até seus núcleos se fundirem num só. O processo é mais violento porque os átomos resistem à fusão e, quando cedem, libertam vastas quantidades de energia.

Sabe-se pouco do projeto da bomba H soviética. Mas tem-se como certo que a chave para o seu funcionamento foi uma descoberta de Sakharov, ainda em 1948, até hoje mantida em segredo. Segundo ele mesmo relataria, sem entrar em detalhes, em poucos dias "a misteriosa fonte de energia das estrelas estava ao alcance das minhas mãos". Seu papel crucial na operação foi atestado pelas congratulações especiais que recebeu do governo soviético no mesmo dia em que a bomba explodiu, 12 de agosto de 1953. (A primeira bomba H americana havia sido detonada em novembro de 1952.) Alguns meses depois, com a idade de 32 anos, tornou-se o mais jovem membro do Olimpo intelectual do país-a Academia de Ciências da União Soviética. Nem esta, nem outras honrarias, porém, perturbaram seu modo de ser. Continuou a vestir-se modestamente e até o fim da vida habitou em Moscou um pequeno apartamento de dois quartos, um dos quais usava como escritório. O governo deu-lhe de presente uma dacha (casa de campo) e pagou-lhe altos salários. No fim dos anos 60, seu saldo bancário equivalia a 150 000 dólares-uma fortuna, para a época e para o país. Doou tudo a instituições de pesquisa e tratamento de câncer em seguida à morte prematura da mulher, com menos de 50 anos, vítima da doença.

Havia enfrentado a tarefa de fazer a bomba com o genuíno entusiasmo de um cientista diante dos desafios da natureza. Não era para menos. A física das explosões nucleares era vista então, como um paraíso para os teóricos. Ela Ihes permitiria, pela primeira vez, equacionar o comportamento da matéria quando sua temperatura alcança milhões de graus centígrados. Além da bomba, os fenômenos nesse campo levariam também aos primeiros reatores de fusão. Eldorado das fontes de energia do futuro, essas máquinas, seguras e limpas, consumiriam o combustível mais abundante do planeta-a água. Todos os três modelos em desenvolvimento no mundo foram sugeridos em primeiro lugar por Sakharov, no início dos anos 50. O problema desses projetos consiste em forçar os átomos a se unir. Nas estrelas, o próprio peso das camadas externas esmaga a matéria subjacente até ocorrer a fusão. Como alternativa, o cientista inventou uma espécie de torniquete magnético de nome tokamak (sigla em russo de "câmara magnética toroidal" ). A idéia básica do físico era privar os átomos dos seus elétrons para torná-los suscetíveis à ação de grandes ímãs. Estes poderiam então confiná- los num espaço cada vez mais apertado de modo a obrigar seus núcleos à fusão.

O tokamak dominou largamente as pesquisas na áreas em muitos países. A Universidade de São Paulo, por exemplo, tem um desses equipamentos. Mas os dois outros sistemas imaginados por Sakharov também se difundiram amplamente nos últimos anos. Um deles lança mão de raios laser para comprimir os átomos. O outro emprega a fusão a frio, mas é diferente das propostas que têm provocado intensa polêmica-e muitos narizes torcidos-nesse campo: sugere substituir os elétrons dos átomos por uma partícula semelhante, porém mais exótica e mais pesada, chamada múon. Em combinação com o trítio e o deutério, átomos semelhante aos do hidrogênio, o múon forma um átomo 200 vezes menor que os originais. Dessa maneira, aproxima os núcleos atômicos e tende a propiciar a fusão sem necessidade de pressões e temperaturas elevadas. Esse trabalho revelou o empenho de Sakharov em desviar a energia nuclear das aplicações puramente militares. O cientista preocupara-se desde o início com os resíduos tóxicos das bombas-a poeira radioativa que deixava à superfície do planeta um persistente legado de morte. Cedo ou tarde, segundo as suas contas, 10 000 pessoas morreriam em decorrência de uma explosão de um artefato de 1 megaton, equivalente a 1 milhão de toneladas de dinamite. Como o poder total das bombas detonadas até 1957 já alcançava 50 megatons, 500 000 pessoas estavam seriamente ameaçadas. Moscou alardeava a possibilidade de construir bombas de 100 megatons cada e Washington certamente não ficaria atrás. Obstinadamente. como seria a marca de seu comportamento nos embates futuros. Sakharov enfrentou de peito aberto a resistência dos próprios pares e dos dirigentes soviéticos, convencidos de que só uma nítida superioridade nuclear dissuadiria os americanos de atacar a URSS. Menos testes e sempre subterrâneos-eis a palavra de ordem do cientista.

Cada vez mais atritado com o Kremlin, deixou de trabalhar com os militares e voltou ao Instituto de Física, em 1965. Logo em seguida à morte da mulher, em 1968, ligou-se à médica de origem judaica Elena Bonner, uma experiente ativista em favor dos direitos civis. A despeito da viagem sem volta que tinha começado a empreender ao território da política, Sakharov aprofundou sem cessar a investigação do mundo físico. Havia iniciado pela fusão, que se passa no interior dos núcleos atômicos, em espaços da ordem de 1 quadrilionésimo de milímetro. Mais tarde, pesquisou a desintegração do próton, que ocorre numa escala um bilhão de vezes menor que a do núcleo atômico-algo que se pode expressar em fórmulas, mas está definitivamente fora do alcance da compreensão humana e, na natureza, só poderia ser observado na explosão primordial que deu origem ao Universo.

A partir de 1975, passou a perseguir um objetivo ainda mais ambicioso: reescrever as equações de Einstein sobre a gravitação. Sakharov sugeriu serem elas conseqüência dos pressupostos da Física Quântica-uma idéia que traumatizaria o velho Einstein, para quem, como se sabe, a gravitação era o fenômeno fundamental do comportamento da matéria. A empreitada de Sakharov se assemelhou ao esforço teórico do físico inglês Stephen Hawking em relação aos buracos negros-ambos radicados na fronteira mais avançada do conhecimento humano sobre o Universo. As elocubrações de Sakharov prometiam resultados cada vez mais estimulantes. Mas ele não teve tempo de alcançar esse objetivo que a outros poderia parecer tão inacessível a ponto de fazê-los arrepiar carreira a meio caminho. Aos 68 anos, foi impedido de avançar: o coração o matou durante o sono na noite de 14 dezembro de 1989.

O que mais surpreende no percurso político de Andrei Dimitrievich Sakharov não é a transformação do criador da bomba H soviética, portador da condecoração de Herói do Trabalho Socialista, em inimigo do regime. O que chama a atenção são os longos anos durante os quais, mesmo sem ter sido membro do Partido Comunista, ele deu o melhor de si ao sistema que viria a abominar. "Eu estava a par dos crimes horríveis que se cometeram", admitiria. Três tios e um primo do cientista morreram, em circunstâncias diversas, enquanto estavam presos por alegados delitos políticos. Apesar de tudo, como reconheceria honestamente, "eu me dava por satisfeito absorvendo a ideologia comunista sem questioná-la". Um ano antes de ser convidado a participar do projeto da bomba, a KGB, a polícia secreta soviética, quis que sua mulher espionasse o que ele fazia. Tendo ela se recusado, o casal foi expulso do apartamento onde morava.

Tais partículas de terror policial não diminuíram porém o entusiasmo com que aceitou a empreitada. Sakharov era movido na época por vastas emoções e pensamentos imperfeitos: a oportunidade de escalar o Everest da nova Física atômica, a convicção de que as armas termonucleares iriam assegurar a paz no mundo, o orgulho nacionalista de estar engajado num combate científico com os Estados Unidos-em suma, a mentalidade típica da guerra fria, a que tampouco estiveram imunes muitos cientistas americanos. Talvez por isso guardasse para si fosse lá o que Ihe pudessem provocar os fatos da vida na URSS daqueles anos de stalinismo, desde a obrigação de submeter à censura prévia artigos para publicações científicas até algo incomparavelmente pior-os trabalhos forçados.

Com efeito, a "Instalação", o conjunto secreto de laboratórios, campos de provas e alojamentos onde trabalharia dezoito anos na pesquisa de armas nucleares, tinha sido construída por presos de um campo vizinho. "Todas as manhãs, longas colunas cinzentas de homens vestindo jaquetas forradas, cães de guarda nos calcanhares, passavam por nossas janelas", conta em suas memórias. Não obstante, quando Stálin morreu, em 1953, Sakharov escreveu à mulher: "Estou sob o impacto da morte de um grande homem. Penso na sua humanidade". O cientista iria se envergonhar dessas palavras, porém jamais conseguiria explicá-las satisfatoriamente a si mesmo. As primeiras sementes de descontentamento foram plantadas por seus conhecimentos científicos sobre os efeitos da radioatividade e pela consciência moral que o problema Ihe despertava. Cada vez mais contrário aos testes atômicos na atmosfera, suas opiniões levaram-no a um curso de colisão com o governo soviético. Em 1961, por exemplo, ouviu do líder Nikita Kruschev, numa solenidade, que estava "enfiando o nariz onde não devia". Desde então, embora nada Ihe sucedesse pessoalmente, sua distância do regime só faria aumentar-dessa vez por outros motivos. De um lado, sob Leonid Brejnev, o Kremlin voltou a tratar com dureza os intelectuais dissidentes. De outro, o cientista passara a encarar o mundo com novos olhos.

O resultado foi o manifesto Reflexões sobre o progresso, a coexistência pacífica e a liberdade intelectual, escrito nos primeiros meses de 1968. Logo publicado no exterior, o texto faria Sakharov famoso internacionalmente e representaria o penúltimo passo da caminhada rumo à ruptura com o sistema. Nele, condenou a intolerância e o dogmatismo, advogou a democracia e o pluralismo político. O documento não poderia ter sido mais pertinente: a 21 de agosto daquele ano, tropas soviéticas entraram em Praga para depor o governo que tentava implantar na Checoslováquia o "socialismo de face humana". Era o que faltava para Sakharov, definitivamente desiludido, voltar-se plenamente à causa dos direitos humanos -e pagar caro por isso.

A passagem do campo da reflexão política para a ação em defesa dos perseguidos do regime foi franqueada também por seu convívio com a militante Elena Bonner, com quem se casaria em 1972. As pressões sobre o cientista-ativista cresceriam na mesma medida de seu engajamento. Em 1975, contemplado com o Prêmio Nobel da Paz, proibiram-no de ir a Oslo, na Noruega, para receber a honraria, entregue afinal a Elena. O pior, no entanto, estava por vir: a invasão do Afeganistão em fins de 1979, inaugurou o mais sofrido período de sua vida, que incluiria até duas greves de fome. Despojado de seus títulos, Sakharov foi confinado em 1980 na cidade de Górki. Ali ficou até a antevéspera de Natal de 1986, sempre sob estrita vigilância da KGB que fazia o possível para infernizar-lhe a vida, a ponto de roubar (mais de uma vez) os manuscritos de suas memórias. Foi Gorbachev quem acabou com o exílio do casal. "Volte a seu trabalho patriótico", instou o dirigente soviético, ao telefonar a Sakharov para informá-lo de que podia regressar a Moscou.

Embora manifestasse apoio às reformas da perestroika e considerasse Gorbachev um "líder inteligente", tinha uma noção diferente deste do que deveria ser um trabalho patriótico. Na URSS e no exterior, seus pronunciamentos contra o regime soviético não se alteraram. Eleito para o Congresso dos Deputados do Povo, em 1988, juntou-se ao time de parlamentares que, sob a inócua designação de Grupo Inter-regional, formou-se com a intenção de ser o embrião de um novo partido, tornando-se seu principal membro. Sakharov, sabe-se, era muito mais do que isso. E a simples verdade é que sua morte empobreceu, além da ciência, a vida política na União Soviética.

A crise chega à ciência

O sistema científico que produziu um Andrei Sakharov coexiste com um paradoxo que pode ser apresentado em números como convém ao assunto. De cada quatro cientistas do mundo, por exemplo, um é soviético. Mas os americanos ficaram com 137 dos 370 prêmios Nobel já conferidos; os soviéticos, com apenas dez. Proporcionalmente às respectivas populações, no entanto, a URSS diploma todo ano duas vezes mais universitários do que os Estados Unidos. É claro que só a quantidade de troféus não mede o valor real do saber produzido num pais, assim como o grande número de pesquisadores não é em si sinônimo de boa pesquisa.

No passado, o peso da ciência soviética era maior-outra face do mesmo paradoxo. Nas décadas de 30 e 40, apesar do terror stalinista e do horror da guerra, os soviéticos foram os primeiros a estudar a fonte de energia das estrelas; a origem dos átomos químicos durante o nascimento do Universo; os raios laser; os reatores de fusão nuclear; a ação da eletricidade nos metais, base para a futura invenção do computador; e o fenômeno da supercondutividade, que permite transmitir corrente elétrica sem perda de energia. Pesquisas de vanguarda foram conduzidas por cientistas de renome mundial do quilate do físico Lev Landau, falecido em 1968, do químico Nicolai Semenov ou do matemático Izrail Gelfand.

Atualmente, os mais conhecidos pesquisadores soviéticos são homens já de alguma idade. O próprio Sakharov foi um exemplo disso, assim como o seu amigo, Iacov Zeldovich, um dos grandes mestres da Astrofísica, e o físico Piotr Kapitsa, um dos criadores dos veículos espaciais soviéticos. A URSS ficou nitidamente atrás do Japão e dos Estados Unidos em áreas criticas de ciência e tecnologia como Informática, Telecomunicações e Engenharia Genética. A perda de vigor da ciência soviética acabaria espelhando a crise geral do país-algo que Sakharov não se cansou de denunciar.

Uma pessoa obsessiva

Por José Goldemberg

Tive o primeiro contato pessoal com Andrei Sakharov em janeiro de 1988, em Moscou, durante a instalação do Comitê para a Segurança e o Desenvolvimento Mundial, integrado por cientistas de vários países. Aguardei o encontro com emoção, mas minhas relações com ele foram sempre muito difíceis. Um grande cientista, Sakharov era também um homem obsessivo. Dentro do comitê, por exemplo, preocupava-se o tempo todo com os direitos civis do povo armênio. Mas não achava igualmente importante defender os direitos civis dos povos da América Central. Também fiquei chocado com sua posição em favor de Edward Teller, que dirigiu a construção da bomba de hidrogênio americana, nos anos 50. Na época, Teller enfrentou a oposição de Robert Oppenheimer, que propunha retardar ar a produção da bomba H. Sakharov acreditava que Oppenheimer estava errado. Mas, para derrotá-lo, Teller denunciou-o como comunista numa época de caça às bruxas nos Estados Unidos. Uma atitude indefensável, na minha opinião.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Newton - gênio difícil

NEWTON: GÊNIO DIFÍCIL



Solitário, inseguro, rancoroso, o inglês Isaac Newton foi um cientista de talento excepcional, capaz de juntar numa só fórmula a queda de uma maçã e o movimento dos planetas.

O ano de 1666 foi fatídico para os ingleses. Em Londres, recém-saída da peste que matou 75 mil de seus 460 mil habitantes, um incêndio, iniciado numa padaria, se propagou durante quatro dias, consumindo mais de treze mil casas. Mas, na história da ciência, 1666 ficou conhecido como Annus Mirabilis - ano maravilhoso. E isso se deveu ao gênio de uma só pessoa: Isaac Newton. Com a Universidade de Cambridge fechada devido aos temores de contágio, Newton, então com apenas 24 anos, se refugiou no campo, na casa da mãe no lugarejo de Woolsthorpe, onde nascera.
No ambiente pacato da aldeia, ao passar em revista os conhecimentos que havia adquirido na renomada universidade, realizou a maior proeza intelectual já alcançada por um cientista em qualquer época - algo que só teria paralelo no século XX, com as teorias de Albert Einstein. Pois, em seu refúgio campestre, o jovem Newton não só inventou o cálculo infinitesimal, de aplicação quase ilimitada nos mais diferentes ramos da ciência, como também lançou os fundamentos da ótica moderna, com um estudo sobre a luz e as cores e, principalmente, esboçou sua maior contribuição ao conhecimento humano - a Teoria da Gravitação Universal. Muito tempo depois, ele mesmo explicaria a descoberta da gravitação com uma anedota que ficou famosa.
Estava sentado uma noite ao ar livre, quando viu uma maçã cair. No mesmo instante, a Lua se levantava no firmamento. Uma pergunta atravessou sua mente como um relâmpago: a força que faz a maçã cair não seria a mesma que mantém a Lua em órbita ao redor da Terra? A questão possuía um alcance incrível: durante séculos, sob o domínio das idéias de Aristóteles (384-322 a.C.), acreditava-se que a Física terrestre e a Física celeste nada tinham em comum.
Mergulhou então em profundos raciocínios: se a força de atração da Terra atuava sobre a Lua, o que mantinha os planetas em órbita deveria ser uma força do mesmo tipo, exercida pelo Sol. E essa força seria tanto mais fraca quanto mais distante o planeta estivesse do Sol. Partindo das leis sobre o movimento planetário, estabelecidas décadas antes pelo astrônomo e matemático alemão Johanes Kepler , Newton calculou que a força de atração varia de acordo com o inverso do quadrado da distância.
Estava apenas a um passo da Lei da Gravitação Universal. A maçã, que os ingleses tanto apreciam para fazer tortas, havia permitido a Newton mudar a concepção do Universo, mas, ao contrário da lenda, não tinha caído sobre sua cabeça.
O que havia na cabeça de Newton além da formidável intuição, era uma senhora neurose, resultado de uma infância que parecia conspiração do destino. Para começar, nasceu (no dia de Natal de 1642) prematuro, minúsculo e fraco. Ninguém acreditava que pudesse sobreviver ao primeiro dia: viveu 84 anos. Além disso, órfão de pai: o sitiante Isaac Newton, de quem herdou o nome, morrera três meses antes. Quando não havia ainda completado 3 anos, a mãe, Hannah, se casou de novo, com o pastor protestante Barnabas Smith. Este a levou para morar numa cidadezinha próxima de Woolsthorpe e exigiu que Isaac fosse deixado com a avó.
Newton odiaria esse padrasto a vida inteira. Certa vez, ameaçou queimá-lo. E certamente projetou o ódio em todos os rivais. Brutal complexo de inferioridade e aguda sensação de insegurança o acompanhariam até o fim. Foi aluno medíocre, até que uma violenta briga com um colega ativou nele algum secreto talento que o transformou no primeiro da classe. Tímido e isolado, possuía, porém, excepcional habilidade para inventar e construir brinquedos mecânicos, como relógios e moinhos de vento. Se dependesse da mãe, que enviuvara de novo, Isaac trocaria os livros pela administração da propriedade que ela herdara do marido pastor. Mas o diretor da escola insistiu com Hannah para que deixasse o moço estudar.
Assim, em junho de 1661, com 19 anos, entrou no Trinity College, da Universidade de Cambridge. Como estudante, primeiro, e logo como professor, continuava a ser uma figura excêntrica. Cabelos emaranhados, meias caindo nos calcanhares, era o tipo do gênio amalucado - distraído a ponto de se sentar à mesa do refeitório e esquecer de comer. Puritano, abstêmio, solitário, sua vida se passava entre as salas da universidade. A idade não o modificaria muito: é quase certo que tenha morrido virgem.
Mas a timidez no relacionamento humano era compensada por uma incrível vontade de saber. Para sorte de Newton, a grande revolução científica do século XVII já estava bastante adiantada quando chegou a Cambridge. Ele afirmaria mais tarde: se havia enxergado longe, era porque pudera se apoiar nos ombros de gigantes. Esses gigantes da revolução científica eram Johannes Kepler (1571-1630), o físico italiano (1564-1642) e o filósofo e matemático francês René Descartes (1596-1650).
De Kepler, Newton herdou uma decisiva revisão do sistema concebido pelo polonês Nicolau Copérnico (1473-1543), o primeiro a formular, ainda como hipótese matemática, a teoria do movimento dos planetas ao redor do Sol - que estaria no centro do Universo. De Galileu , recebeu uma nova formulação da ciência da Mecânica, baseada no princípio da inércia. De Descartes, a concepção mecanicista do mundo - a visão da natureza como uma grande máquina, que funcionaria para sempre com base apenas no movimento de suas partes. Descartes deu ainda a Newton outro legado formidável: a Geometria Analítica, novo ramo da Matemática que permitia resolver problemas, até então insolúveis, pelos métodos algébricos.
Com base em Kepler, Galileu e Descartes, o jovem Newton pôde fazer uma crítica da ciência grega que ainda era ensinada na universidade e anotou em latim num de seus cadernos: "Amicus Plato, amicus Aristoteles, magis amica veritas" (Platão é amigo, Aristóteles é amigo, mas amiga maior é a verdade). Três outras influências marcaram a formação de seu pensamento: o filósofo francês Pierre Gassendi, o químico inglês Robert Boyle e o filósofo também inglês Henry More. Gassendi havia ressuscitado a idéia grega de que a matéria se compunha de átomos - e isso seria um ingrediente decisivo na receita newtoniana da natureza. Boyle forneceu-lhe a base para sua considerável obra em Química. More, finalmente, abriu-lhe a porta para o mundo do hermetismo, da tradição mágica e da alquimia. O fundador da ciência racional moderna era, também, um amante do oculto.
Quando a Universidade de Cambridge foi fechada, devido à peste, Newton já havia recebido o grau de bacharel. Reaberta dois anos depois, ele ganhou a condição de fellow, que lhe permitia continuar os estudos à custa da universidade. Mais dois anos, e o catedrático de Matemática Isaac Barrow, que estava abandonando o magistério, indicou-o para sucedê-lo. Newton escolheu como tema inicial do curso seus estudos sobre a luz e as cores. De 1670 a 1672, suas palestras forneceriam material para o livro I de Ótica. O centro de sua contribuição era uma nova teoria das cores.
Baseado nela, concluiu que a distorção cromática produzida pelas lentes convencionais era inevitável; para eliminar essa perturbação das observações astronômicas, construiu o primeiro telescópio por reflexão. Esse foi seu passaporte para o fechado clube dos grandes cientistas da época - a Royal Society, a mais prestigiosa entidade científica da Inglaterra e da Europa. Em 1671, Newton foi eleito membro. Era o início da consagração. Mas havia uma pedra no meio do caminho. Seu nome: Robert Hooke, um dos mais brilhantes cientistas ingleses e líder da Royal Society.
Ao contrário de Newton, Hooke acreditava que a luz era uma onda que se propagava no éter - substância sutilíssima que preencheria todo o Universo. A ciência atual acabaria dando razão aos dois: embora a hipótese do éter universal tenha sido derrubada, sabe-se hoje que a luz realmente se comporta ora como se fosse formada por partículas ora como onda (SUPERINTERESSANTE n.º 3). Mas, na segunda metade do século XVII, as diferenças científicas entre Hooke e Newton transformaram-se em interminável desavença pessoal.
A culpa, sem dúvida, foi do suscetível Newton: o contraponto do complexo de inferioridade era uma certeza intelectual que não admitia a menor contestação. Quase um ano depois da crítica de Hooke, ele continuava tão abalado que mergulhou em virtual isolamento. Quando, finalmente, em 1675, resolveu publicar o livro II de Ótica, jesuítas ingleses de Liège, na Bélgica, acusaram-no de erro nas experiências. A polêmica durou até 1678, quando Newton chegou ao completo esgotamento nervoso. Nos seis anos seguintes, ele fugiria a qualquer tipo de contato intelectual.
Nesse período, entregou-se ao hermetismo. Sua biblioteca particular continha mais de cem tratados sobre alquimia, muitos copiados a mão por ele. Seu forno de alquimista para experiências com metais permaneceu aceso meses a fio. Sob a influência da chamada "arte de transmutação dos metais", também sua concepção da natureza se transmudou. Antes, a idéia de que a matéria pode exercer ação a distância, como nos fenômenos eletrostáticos e gravitacionais, lhe era inaceitável: devia haver mecanismos invisíveis operando no éter.
Agora, questões enigmáticas, como o fato de certas substâncias químicas reagirem entre si e outras não, o levaram a imaginar um princípio secreto regendo as simpatias e as antipatias entre as substâncias. Parece incrível, mas a Teoria da Gravitação Universal, coluna mestra da Física moderna, é descendente direta da filosofia hermética. Para Newton, estas eram correções inevitáveis no pensamento mecanicista, única forma de dar à natureza um tratamento matemático exato: as atrações à distância eram rigorosamente quantitativos.
Em agosto de 1684, uma visita do astrônomo Edmond Halley tirou Newton da concha em que se fechara. Halley, cujo nome seria dado a um cometa, era uma espécie de fiel escudeiro de Newton. Soubera que este havia resolvido o problema da explicação física dos movimentos planetários: foi cobrar a demonstração. Newton prometeu atender. Da promessa resultou, quase três anos depois, a obra fundamental da ciência moderna: Philosophiae Naturalis Principia Mathematica (Princípios matemáticos da Filosofia natural).
Com a primeira edição de quatrocentos exemplares, financiada pelo próprio Halley, os Principia, como a obra ficou conhecida, projetaram imediatamente o nome de Newton. Os jovens cientistas fizeram dele o seu modelo. Newton, de seu lado, sentia-se bem nessa companhia - particularmente, na companhia de Fatio de Duillier, matemático suíço residente em Londres. Depois da relação com a mãe, a amizade com Fatio foi sua mais profunda experiência afetiva. Sob a influência da fama e do amigo, começou a abandonar a solidão.
Protestante fervoroso, participou da resistência da Universidade de Cambridge à tentativa do rei James II de torná-la católica. Depois da revolução incruenta de 1688, que derrubou James do poder, foi eleito representante da Universidade na conferência de Londres, que estabeleceu o acordo entre os revolucionários vitoriosos. Isto lhe deu oportunidade de travar relações com os notáveis do país - entre eles, o filósofo John Locke. A vida intensa da capital o atraiu. Tanto que fez gestões junto ao político Charles Montague, futuro Lord Halifax, para arranjar emprego ali. Em 1696, Montague conseguiu-lhe a nomeação para a diretoria da Casa da Moeda.
Mudou-se finalmente para Londres. Fatio havia voltado para a Suíça, apesar dos protestos de Newton, que se oferecera até para sustentá-lo na Inglaterra. Londres era o encerramento de sua atividade científica criadora. Suas preocupações intelectuais se voltavam para outra direção. Tentou provar que as passagens bíblicas sobre a Santíssima Trindade eram corrupções tardias do texto original. Dedicou um livro à interpretação das profecias de Daniel e do Apocalipse de São João. Mergulhou num estudo exaustivo e infecundo sobre a cronologia das antigas civilizações.
Como diretor e, depois, presidente da Casa da Moeda, recebia um polpudo salário anual de 2 mil libras, o que o transformou rapidamente num homem rico. Poderia contentar-se em ser um marajá da administração inglesa. Mas não sossegou: voltou sua raiva contra os falsificadores de dinheiro, levando vários à forca. Em 1703, foi eleito presidente da Royal Society, que dirigiria como ditador até o final da vida. Seus últimos anos foram dedicados a uma nova briga - desta vez, com um adversário à altura: o filósofo e matemático alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716). Motivo: a prioridade na invenção do cálculo infinitesimal.
Na verdade, Newton foi o inventor, e Leibniz o primeiro a publicar a invenção. Mas a polêmica era boa demais para ser deixada de lado com argumentos razoáveis. Newton redigiu pessoalmente a maior parte dos artigos em sua defesa assinados por seus partidários. Como presidente da Royal Society, nomeou um comitê "imparcial" para investigar o caso, enquanto secretamente escrevia o relatório oficial com as conclusões desse mesmo comitê. Nem a morte de Leibniz o acalmou: qualquer artigo, sobre qualquer assunto, continuava a ser uma boa oportunidade para espinafrar o filósofo alemão. Somente sua própria morte, em 20 de março de 1727, pôs fim à pendenga. E pensar que dessa mente conturbada nasceu a mais prodigiosa obra científica já produzida por um homem em todos os tempos.

Assim na Terra como no céu.

Como qualquer história inglesa que se preze, também esta envolveu uma aposta. Cenário: uma taberna londrina, próxima à Royal Society. Época: 1684. Animada pelo álcool, uma discussão se instala entre três celebridades: o astrônomo Edmond Halley; o então presidente da Royal Society, Robert Hooke; e o ilustre arquiteto Christopher Wren. O assunto, como convém a intelectuais desse porte, é o movimento dos planetas ao redor do Sol.
Halley diz que se pode calcular a força que mantém os planetas em órbita. Ela variaria com o inverso do quadrado da distância que os separa do Sol. Hooke argumenta que, se isso for verdade, será preciso demonstrar, a partir daí, todas as leis sobre o movimento planetário, descobertas por Kepler - algo que ele próprio está certo de poder fazer. Wren propõe então: quem resolver o problema receberá um prêmio simbólico de 40 shillings. A disputa estimula Halley a viajar a Cambridge, à procura do solitário Isaac Newton. Qual não é sua surpresa quando Newton lhe diz que, realmente, já havia considerado a possibilidade de que a força de atração variasse segundo o inverso do quadrado da distância.
A partir dessa hipótese, acrescenta, era possível deduzir matematicamente as órbitas dos planetas, estabelecidas por Kepler. E mais: tinha certeza disso porque fizera pessoalmente os cálculos, uns vinte anos antes, durante a peste de Londres; mas depois se desinteressara do assunto. A insistência de Halley o convenceu a retomar o estudo. Durante três anos, Newton trabalhou nas idéias esboçadas naquele "ano maravilhoso" de sua juventude. Quando finalmente publica suas conclusões, em 1687, está criada uma nova Física, simples e coerente. Sua base são as três leis sobre o movimento dos corpos, apresentadas no livro I dos Principia.
Em linguagem atual, elas podem ser assim redigidas: 1) A menos que atue uma força externa, qualquer corpo tende a manter-se indefinidamente em repouso ou em movimento retilíneo e uniforme (princípio da inércia); 2) caso uma força externa atue a aceleração que o corpo recebe é proporcional à intensidade da força (princípio fundamental da dinâmica); 3) toda vez que um corpo recebe de outro uma força, ele também exerce sobre este uma força de mesma intensidade e direção, mas de sentido contrário (princípio da ação e reação).
A partir dessas três leis, Newton calculou a força centrípeta (de fora para dentro) necessária para fazer um corpo transformar seu movimento retilíneo e uniforme em movimento circular. Depois chegou à sua famosa Lei da Gravitação Universal: cada partícula de matéria do Universo atrai qualquer outra com uma força proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância que as separa. Não se sabe se Newton recebeu os 40 shillings de Wren, mas seus Principia se tornaram o paradigma da Física clássica.
Quando a sonda espacial norte-americana Voyager abandona o sistema solar e, sem nenhuma propulsão, continua a se deslocar no espaço, é o princípio da inércia que está sendo mais uma vez confirmado. Quando, milhões de vezes todos os dias, os motoristas aceleram seus carros, a relação entre a força produzida pelo motor e a aceleração do veículo é governada pelo princípio fundamental da dinâmica. Quando um nadador, ao atravessar uma piscina, empurra com os braços e pernas a água para trás e recebe da água a força equivalente que o impulsiona, é o princípio da ação e reação que está em jogo. Depois de Einstein e da Mecânica Quântica, a Física de Newton já não explica o Universo. Mas explica uma infinidade de fenômenos comuns do mundo cotidiano.

domingo, 9 de maio de 2010

Nerds vaidosos dão origem à tribo dos tecnossexuais

16/03/09 - 06h30 - Atualizado em 16/03/09 - 08h25

Nerds vaidosos dão origem à tribo dos tecnossexuais
Eles gostam de eletrônicos, redes sociais e de cuidar da aparência.
Fizemos raio-x do tecnossexual e propõe teste, para você saber se é um.

Ele não sairá de casa -- onde tem um computador com disco rígido de 1 terabyte -- sem vestir boas roupas, passar perfume, arrumar o cabelo e pegar seu iPhone. O telefone da Apple, inclusive, está abarrotado de aplicativos que facilitam sua vida em situações como na hora de escolher um restaurante japonês. Esse mesmo aparelho, ou algum multimídia similar, também serve para ele se relacionar com amigos via redes sociais e twittar suas impressões daquela balada recém-inaugurada -- que cobra na entrada o equivalente a um plano de dados ilimitado para celulares 3G. Conheça o tecnossexual, um fã de tecnologia que se preocupa tanto com a aparência no mundo off-line quanto com a atualização constante de sua página no Facebook.

A palavra para designar essa tribo tornou-se “oficial” depois de ser divulgada há alguns anos, no Urban Dictionary, pelo consultor de mídia digital norte-americano Ricky Montalvo. No entanto, a popularização de gadgets (equipamentos eletrônicos) como o iPhone e outros aparelhos multimídia faz com que a definição se mantenha atual e ganhe ainda mais força.

Mesmo que você não conheça (ou seja) um tecnossexual “extremo”, como o descrito no início desta reportagem, é possível que já tenha deparado com pessoas que se encaixam em maior ou menor grau na descrição de Montalvo: “um narcisista que não ama apenas ele mesmo, mas também seu estilo de vida urbano e gadgets; um homem que está em contato com seu lado feminino e também aprecia eletrônicos como celulares, PDAs, computadores, software e a internet”. Faça o teste abaixo e descubra se você tem características tecnossexuais.

Atenta à tendência, a Calvin Klein chegou a registrar em 2006 a patente do termo “technosexual”, prevendo que essa seria uma palavra forte na publicidade voltada a americanos nascidos entre 1982 e 1995. Em 2007, a companhia manteve sua ligação com um termo anunciando o perfume CK in2u como a “primeira fragrância para a geração tecnossexual”.

Declarados

Foto: Arquivo pessoal Alvino diz que, ao contrário dos nerds, os tecnossexuais não se interessam só por tecnologia. (Foto: Arquivo pessoal) Alvino Aparecido Moreira Netto acredita se encaixar na definição de tecnossexual. “Me interesso por tecnologia e, entre passar janeiro na praia e na Campus Party, escolheria a segunda opção. Apesar de gostar de comprar roupas, não deixo de ter celular, laptop, iPod e afins: sempre as alternativas mais modernas e completas”, contou ao G1 o estudante de direito e de letras estrangeiras, que vive em Londrina (PR) e trabalha em um escritório de advocacia.

Aos 20 anos, ele também diz praticar triatlon todos os dias da semana e sair sempre com os amigos. Para ele, o tecnossexual é diferente dos geeks e nerds justamente porque o grupo dos vaidosos não se interessa apenas por tecnologia. Alvino não se incomoda com o rótulo e conta que já fez loucuras para se manter antenado: “quando morava fora do país, gastava horrores com aparelhos que levariam anos para chegar ao Brasil. E já pedi a um amigo que estava no Japão para trazer um celular moderníssimo”.



Roberto Vinicius Aghazarian, de 28 anos, também considera se encaixar parcialmente na tribo. Profissional da área de marketing, ele sempre gostou muito de eletrônicos, acompanha lançamentos de produtos e está sempre conectado à internet. “Só não me encaixo totalmente na definição, pois hoje já aprendi a ter discernimento para minhas prioridades”, afirmou ao G1. Para ele, o tecnossexual tem um apelo melhor que os nerds e geeks: a tribo “é mais social, atraente e nem por isso menos inteligente”.


Os dois não estão sozinhos. No site de relacionamentos Orkut, por exemplo, é possível encontrar grupos com dezenas de brasileiros (e também brasileiras, o que foge da descrição original do termo) que se declaram tecnossexuais. A descrição da maior dessas comunidades, encaixada na categoria “moda e beleza”, diz: “se você gosta de tecnologia e é bonito, cuida do corpo e da aparência, gosta de academia, MP3, internet, MSN, cuidado! Você é um tecnossexual. Essa coisa de metrossexual já era, é coisa do passado. Bem-vindo ao futuro”.




Comunidades no Orkut reúnem internautas que se consideram tecnossexuais. (Foto: Reprodução )

Casamento tecnossexual
Uma comunidade do Facebook aborda o assunto sob a ótica das mulheres casadas com esses fãs vaidosos de tecnologia. Joanna Wiebe, a norte-americana dona do grupo “I married a technosexual”, contou ao G1 que seu marido se encaixa nessa definição por estar sempre atualizado sobre as novidades tecnológicas.



“A melhor parte dessa história é que ele pode arrumar qualquer laptop, gravador digital de vídeos ou aparelho de som. A parte ruim é que ele não entende como outras pessoas não gostam tanto de tecnologia quanto ele. Além disso, na maioria das noites algum eletrônico, como laptop ou iPhone, vai para a cama com a gente”, afirmou Joanna, de 30 anos. Apesar do fanatismo, ela diz que consegue convencê-lo a largar o controle do Xbox quando quer sua companhia para fazer caminhadas.

Joanna admite que, às vezes, é difícil engolir a quantia gasta pelo cônjuge com novidades tecnológicas. E quando perguntada sobre a maior loucura que ele já fez em nome do amor pelos gadgets, ela lembra: “foi no lançamento do iPhone. Durante uma semana ele enfrentou filas em diversas lojas, mas quando chegava sua vez o produto já tinha acabado. Ele pegou fila até em Las Vegas, onde fomos passar as férias. Para mim foi engraçado, mas para ele foi frustrante”, diverte-se.




Comunidade no Facebook reúne mulheres casadas com tecnossexuais. (Foto: Reprodução )

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Músculos de astronautas envelhecem mais rápido

15/04/09 - 06h30 - Atualizado em 15/04/09 - 06h30

Músculos de astronautas envelhecem mais rápido no espaço
Ausência de gravidade prejudica tripulantes, segundo estudo.
Após seis meses, eles ficam com músculos iguais aos de alguém com 80 anos.




Foto: Nasa
Astronauta em caminhada espacial (Foto: Nasa) De acordo com uma nova análise, um astronauta jovem e saudável que permaneça durante seis meses na Estação Espacial Internacional provavelmente voltará à Terra com os músculos de um idoso de 80 anos.

O estudo, financiado pela Nasa e publicado na edição de abril do jornal especializado "The Journal of Applied Physiology", examinou nove astronautas russos e americanos que haviam passado cerca de seis meses na estação. Eles tiveram acesso a diversas máquinas para exercícios aeróbicos e de resistência, e, além disso, os membros da tripulação mantiveram anotações sobre seu tempo de exercícios.

Os pesquisadores mediram o volume de músculos da perna através de exames de ressonância magnética, além do desempenho muscular, desta vez utilizando dinamômetros, antes do lançamento. Eles repetiram os testes quando os astronautas retornaram. Os cientistas também fizeram biópsias do músculo da panturrilha antes e depois do período no espaço.

Usando anotações e vídeos, os pesquisadores estimaram que os astronautas realizaram, em média, o equivalente a 50 minutos de atividade aeróbica e 30 minutos de treinamento de resistência por dia. Claramente, isso não foi o bastante: no retorno à Terra, eles haviam perdido uma média de 13% de massa muscular e de 20 a 29% de desempenho dos músculos.

“Nós nos exercitamos simplesmente caminhando até a geladeira”, disse Scott Trappe, professor de ciência dos exercícios na Ball State University e principal autor do estudo. “Os astronautas não. Seus modos de exercício estão bem, mas eles precisam de equipamentos capazes de oferecer intensidades muito mais altas.”


PUBLICADOS BRASIL NO ORKUT

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