12/05/09 - 19h35 - Atualizado em 12/05/09 - 19h35
Pessoas se enxergam como mais morais do que realmente são
Experimentos mostram que autoimagem das pessoas é otimista.
Psicólogos tentam compreender o fenômeno.
A maioria das pessoas é inflexível: elas nunca fariam. Nunca. Nunca infligiriam dor deliberadamente em outra pessoa, apenas para obter informações. Nunca inflariam artificialmente o valor de algum bem financeiro, simplesmente para obter vantagens sobre a ignorância de outros. E, certamente, nunca, nunca se tornariam um aproveitador e aceitariam uma ajuda financeira do governo.
Elas falam apenas por si próprias, é claro. Quanto aos outros, bem, assista ao jornal: banqueiros duvidosos, interrogadores selvagens e aproveitadores estão por toda parte.
“Lembro-me de achar que eu simplesmente era melhor que as outras pessoas, que eu nunca comprometeria meus princípios”, disse Jordan LaBouff, 25, estudante de graduação do Texas, recordando uma confrontação pública que ele e outros estudantes tiveram com administradores da universidade há muitos anos.
“Bem, eles me deram este prêmio – a administração me deu – e eu jurei que nunca aceitaria nada deles. Mas obviamente lá estava eu, em cima do palco, aceitando-o.”
Nos últimos anos, psicólogos sociais começaram a estudar o que chamam de efeito mais-sagrado-que-vós. Eles há muito sabem que as pessoas tendem a ser otimistas demais a respeito de suas próprias habilidades e sucessos – com o objetivo de superestimar sua colocação na sala de aula, sua disciplina, sua sinceridade.
Todavia, essa propensão ao auto-orgulho pode ser ainda mais forte quando se trata de julgamento moral. Ela é capaz de influenciar fortemente no quanto as pessoas julgam as ações dos outros – e até mesmo as próprias ações. Cultura, crença religiosa e experiência ajudam a moldar o senso de postura moral de uma pessoa em relação aos outros, dizem os psicólogos. Novas pesquisas estão ajudando a esclarecer quando esses sentimentos de superioridade são úteis e quando são autodestrutivos.
Dois lados da moeda
“A mensagem neste trabalho não é que você deva se livrar da indignação moral; mas algumas vezes isso é apropriado”, disse David Dunning, um psicólogo social da Universidade Cornell em Ithaca, Nova York. “Porém, o ponto é que diversos tipos de comportamento são conduzidos muito mais pela situação do que pela força da personalidade. O que outra pessoa fez naquela situação é um aviso muito forte do que você mesmo faria.”
Uma forma de testar se outras pessoas honram suas virtuosas auto-imagens é armar para elas. Em um estudo, por exemplo, 251 estudantes da Cornell estimaram a chance de comprarem um narciso no Daffodil Days, um evento de quatro dias no campus para apoiar a American Cancer Society. Como se esperava, 83% previram que comprariam ao menos uma flor, enquanto apenas 56% de seus colegas o fariam.
Cinco semanas depois, durante o evento, os pesquisadores descobriram que apenas 43% daqueles estudantes acabaram comprando um narciso. Em outros experimentos, pesquisadores descobriram que as pessoas superestimam de maneira parecida sua disposição em fazer o considerado moralmente correto, seja doar à caridade, votar ou ajudar um estranho. No fim, suas previsões menos generosas a respeito do comportamento dos colegas tendem a ser bastante precisas – tanto para eles quanto para os outros do estudo.
“O abismo entre como eu acho que me comportarei e como eu realmente me comporto é uma função do quão bem eu simulo a situação, e nossas simulações são guiadas por nossas intenções”, disse Nicholas Epley, psicólogo da Universidade de Chicago e co-autor, ao lado de Dunning, em muitas dessas experiências.
“O problema com essas avaliações é que nós superestimamos como teríamos nos comportado”, explicou Epley. “Também jogamos toda crise ou escândalo na falha de caráter – sabe, se nós simplesmente demitirmos todos os banqueiros imorais e substituí-los por outros com moral, resolveremos o problema”.
Em experimentos e na vida, o efeito mais-sagrado-que-vós diminui rapidamente quando as pessoas realmente passaram pela experiência julgada: práticas contábeis duvidosas parecerão menos sombrias para pessoas que já enfrentaram uma empresa entrando em falência. O efeito é, aparentemente, menos pronunciado em culturas que enfatizam a interdependência sobre as realizações individuais, como China e Espanha.
A religião é uma prática capaz de abrandar potencialmente os sentimentos de superioridade moral. Todas as grandes crenças destacam o valor de ser humilde e os riscos do excesso de confiança. “Na humildade, considere as pessoas como melhores do que você mesmo”, aconselha o apóstolo Paulo em sua epístola aos Filipenses.
Ainda assim, para algumas pessoas, a religião parece amplificar o instinto de se sentir como um símbolo moral. Num estudo de 2002, pesquisadores da Universidade Baylor, no Texas, e da Uiversidade Simpson, na Califórnia, avaliaram o comprometimento religioso de 249 estudantes, 80% dos quais membros de uma igreja.
Os pesquisadores, comandados por Wade C. Rowatt da Baylor, descobriram que os estudantes desse grupo altamente religioso se consideravam, na média, quase duas vezes mais aptos que seus colegas ao aderir a mandamentos bíblicos como “Ame seu próximo como a si mesmo”.
O estudo também descobriu que os estudantes mais estritamente fundamentalistas estavam na faixa mais alta da escala.
“Isso me lembra um de meus adesivos de para-choques prediletos”, disse o Dr. Epley, de Chicago. “’Jesus te ama, mas eu sou seu favorito’”.
Por tudo isso, um sentimento permanente de superioridade moral é intrínseco ao que alguns psicólogos chamam de auto-aperfeiçoamento. Os chamados auto-aperfeiçoadores se consideram abençoados, altamente apreciados pelos outros, uma revelação por cima de todos. Algumas vezes isso acontece, sugerem alguns estudos – especialmente em crises de vida ou morte como o 11 de setembro e a guerra na Bósnia.
“Auto-aperfeiçoadores se saem muito bem, no quadro geral, em medições de saúde mental nessas situações”, disse George Bonanno, psicólogo da Universidade Columbia.
Todavia, na ruína mundana e no fluxo da vida, um senso inflado de virtude pessoal também pode ser um campo minado. “Um corretor de ações confiante demais tende a obter um pior desempenho; as pessoas compram títulos demais em academias” disse Dunning, da Cornell. “Na esfera econômica, os resultados não são muito bons”.
Não esqueça que andar com sapatos de plataforma moral torna muito mais difícil se levantar quando você cai.
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