quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Em nome da Ciência - Beagle

BEAGLE: EM NOME DA CIÊNCIA



Costuma-se dizer que as viagens ampliam os horizontes, mas a expedição de Charles Darwin ao redor do mundo fez mais do que isso. Um jovem naturalista amador tornou-se um investigador seguro e respeitado pela comunidade científica. Cinco anos de pesquisas permitiram-lhe criar a teoria sobre a origem e a evolução das espécies, pilar do pensamento contemporâneo.

Quando foi indicado como pesquisador do Beagle, Charles Darwin era um jovem de 22 anos, formado em Teologia. A viagem representou uma oportunidade única de adiar o início de sua carreira como clérigo, para se dedicar de corpo e alma a sua verdadeira vocação: a investigação científica. O veleiro deixou a Inglaterra em dezembro de 1831 e dois meses mais tarde lançou ferros em Salvador. Na capital baiana, e depois no Rio de Janeiro, Darwin ficou fascinado com as orquídeas e outras espécies da Mata Atlântica. Coletados pelo jovem naturalista, os vegetais e animais obtidos durante a viagem seriam periodicamente enviados a cientistas na Inglaterra.

Se a natureza era fonte de encantamento, Darwin viu com reservas outros aspectos do país. Ele era contrário à escravidão. Além disso, a atitude displicente dos brasileiros o exasperava. Em seu livro sobre a viagem do Beagle, ele conta que, nas vendas do interior, que servem refeições aos viajantes, é preciso esperar horas pelo alimento. Quem reclama é expulso de estômago vazio.

Em julho de 1832, o Beagle atracou na capital uruguaia. Até maio de 1834, o veleiro permaneceria no sul do continente, basicamente realizando levantamentos cartográficos. Darwin aproveitou a longa estadia para realizar excursões terrestres, nas quais entrou em contato com os gaúchos uruguaios e argentinos e com fósseis. Os primeiros a ser desenterrados, na região argentina de Bahía Blanca, foram ossos fossilizados de pelo menos três megatérios, um tipo de preguiça gigante pré-histórica. Darwin registrou a descoberta dos restos de nove espécies de quadrúpedes, alguns do tamanho de elefantes. Esses fósseis provocaram uma série de reflexões: O que causava a extinção de uma espécie? Havia algum parentesco entre os animais desaparecidos e os existentes?

Seleção natural
Depois de enfrentar os perigos do estreito de Magalhães, o Beagle passou a navegar pelo Pacífi-co. Em setembro de 1835, chegou às ilhas Galápa-gos, berço de espécies só encontradas ali, como as tartarugas gigantes e os iguanas marinhos e terrestres. Darwin escreveu que as Galápagos remetem "ao mistério dos mistérios - o aparecimento inicial de novos seres sobre a Terra". E registrou "a característica mais notável na história natural desse arquipélago, ou seja, que as diferentes ilhas são habitadas em larga medida por diferentes conjuntos de seres". Esse aspecto surgiu numa conversa com o representante britânico na região. O cônsul informou que podia dizer de qual ilha vinha cada exemplar de tartaruga e explicou que as carapaças diferiam em altura, cor e espessura. Além disso, elas tinham tamanhos diferentes e pescoços e pernas mais longos ou mais curtos.

As pesquisas de Darwin confirmaram essas afirmações. Ele também verificou que as dimensões e o formato do bico de certas aves variavam em cada ilha, de acordo com o tipo de alimento. Mais tarde, ele explicaria pelo mecanismo de seleção natural a diferenciação das espécies: os indivíduos bem-sucedidos na luta pela sobrevivência tendem a deixar mais descendentes.

Em novembro de 1835, o navio alcançou o Taiti, onde Darwin encontrou um objeto de pesquisa bem mais convencional: a formação dos corais. Ele contestou as teorias em vigor, de que os corais se formavam na borda de vulcões submarinos. Suas observações mostraram que eles eram construídos por seres vivos (os pólipos) sobre suportes encontrados em limites precisos de profundidade e podiam se estender por milhares de quilômetros. Era a primeira vez que ele assumia plenamente a condição de investigador científico seguro de suas convicções, capaz de propor alternativas às opiniões consagradas.
O Beagle atracou na Inglaterra, em outubro de 1836, e uma série de surpresas agradáveis aguardava o jovem naturalista. Seu pai permitiu que ele seguisse a carreira científica, e a Universidade de Cambridge conferiu-lhe o grau de mestre. Darwin preparou-se para muitos anos de trabalho sobre a evolução de espécies. Amadurecidas ao longo de mais de duas décadas de pesquisa e reflexão, suas idéias sobre as transformações dos seres vivos seriam publicadas em 1859 no livro Origem das Espécies. Depois disso, a visão da humanidade sobre a vida no planeta nunca mais seria a mesma.

Nasce um cientista

1. Mata Atlântica
Em fevereiro de 1832, o Beagle chegou a Salvador. Nas vizinhanças da capital baiana, e depois no Rio de Janeiro, Darwin ficou fascinado com a exuberância da Mata Atlântica, suas orquídeas magníficas e uma profusão de insetos desconhecidos no Velho Mundo

2. Fósseis argentinos
Na Argentina, o cientista desenterrou fósseis de gigantescos quadrúpedes pré-históricos, entre os quais "partes de três cabeças de megatérios". Era uma descoberta sensacional: naquele momento, havia na Europa um só fóssil de megatério (num museu espanhol)

3. Estreito de Magalhães
No final de maio de 1834, o Beagle ingressou no estreito de Magalhães e iniciou a perigosa travessia. Em 10 de junho, o navio prosseguiu pelo canal Magdalen, que havia sido descoberto pouco tempo antes. No dia seguinte passou a navegar pelo oceano Pacífico

4. A vida em GalÁpagos
Darwin considerou as ilhas Galápagos um santuário de espécies únicas, como as tartarugas gigantes. Em cada ilha havia um tipo diferente de tartaruga: em seus relatos de viagem, ele conta que as da ilha Hood tinham carapaças altas "como uma sela espanhola"

5. Os corais do Taiti
Observando os corais do Taiti, o inglês contestou a teoria de que eles eram a ponta mais alta de vulcões submarinos. Pesquisas posteriores, na Austrália e em ilhas do Pacífico, comprovaram que as colônias de corais podem se estender por milhares de quilômetros

6. A volta para casa
Quando o Beagle chegou à África do Sul, Darwin soube que suas cartas sobre a geologia sul-americana haviam sido publicadas em livro na Inglaterra. Ele ainda tinha um diário de 770 páginas e cerca de 1750 páginas de notas sobre geologia e zoologia


Tartarugas de galápagos

No vulcão Darwin
As gigantescas tartarugas-de-galápagos (Geocheloni elephantopus) têm atualmente 11 subespécies. A microphyes é encontrada na Ilha Isabela, a maior do arquipélago, nas encostas meridionais e ocidentais do vulcão Darwin. Funcionários da Estação de Pesquisas Charles Darwin estão conseguindo recuperar a população, dizimada por baleeiros no século 19

George, o solitário
A mais famosa tartaruga das Galápagos é proveniente da ilha Pinta. Trata-se de um macho, conhecido como "Solitário George", último exemplar da subespécie abingdoni. Encontrado em 1971, George vive na Estação de Pesquisas Charles Darwin. Os cientistas procuram uma namorada para ele, mas George, até agora, não demonstrou interesse pelas candidatas

Escapando dos ratos
A Geocheloni elephantopus ephippium é proveniente da pequenina ilha Pinzón. A população diminuiu desde o final do século 19, por causa da chegada de ratos (trazidos por navios), que devoram os ovos e os filhotes. Hoje vivem no local cerca de 150 tartarugas adultas e mais de 200 jovens, nascidas na Estação de Pesquisas Charles Darwin

Em nome de Deus
Charles Darwin nasceu em 1809 na Inglaterra. O pai, médico, matriculou-o aos 16 anos na Faculdade de Medicina de Edimburgo (Escócia). Como ele não demonstrava inclinação para a carreira, foi estudar Teologia em Cambridge. Lá, ficou amigo do naturalista John Henslow. Foi ele quem indicou o jovem para integrar uma expedição de volta ao mundo, em 1831. Depois de cinco anos, Darwin virou cientista respeitado e com um livro publicado (Henslow editara suas cartas sobre a geologia sul-americana). Duas décadas mais tarde, lançou suas teorias sobre a origem e a evolução das espécies. Ao morrer, em 1882, já era um dos maiores cientistas do nosso tempo.

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