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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Cientistas confirmam um novo estado da matéria - Os cristais do tempo


Cientistas confirmam um novo estado da matéria - Os cristais do tempo


Pesquisadores da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, conseguiram fazer um modelo para reproduzir um novo tipo de matéria, os chamados cristais do tempo.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Frio pra caramba: cientistas estão perto de atingir o zero absoluto


Frio pra caramba: cientistas estão perto de atingir o zero absoluto


Segundo as leis da termodinâmica, o zero absoluto (0 Kelvin ou -273,15 graus Celsius) é impossível de ser alcançado. Porém, cientistas do Instituto Nazionale di Fisica Nucleare (INFN) na Itália conseguiram algo próximo do impossível: resfriar um objeto, com massa e volume relativamente grandes, quase ao 0 K. O objeto em questão é um cubo de cobre com 1 metro cúbico. Ele foi congelado a ponto de chegar a uma temperatura de 6 milikelvin, ou -273,144 graus Celsius. Esse é o maior objeto, em massa e volume, a chegar tão perto do zero absoluto.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Depois do Quark Top. Para onde vai a Física ? - Física

DEPOIS DO QUARK TOP. PARA ONDE VAI A FÍSICA? - Física


Numa fantástica trombada subatômica dentro de um acelerador de laboratório, despontou o que todos procuravam: o quark top, a última das partículas fundamentais da matéria. O desafio foi vencido. E agora?

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Material impossível é descoberto por acidente


Material impossível é descoberto por acidente


Sabe quando um grupo de cientistas esquece alguns elementos químicos reagindo? Pois é, isso não é uma notícia muito comum, certo? Mas o ocorrido é verdadeiro e se deu em Uppsala, na Suécia. Esse descuido acabou resultando na solução de um problema químico centenário, produzindo um novo material batizado de Upsalite, com ótimas propriedades de ligação de água.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

A Face Oculta do Caos - Física



A FACE OCULTA DO CAOS - Física



Um grupo de jovens pesquisadores rebeldes arma-se de equações e computadores para desencadear a revolução científica que vê um dos mais estranhos segredos do mundo material: existe ordem onde menos poderia parecer. Como uma torneira que pinga.

Santa Cruz era o mais novo campus da Universidade da Califórnia, esculpido num cenário de livro de histórias, uma hora ao Sul de São Francisco. As pessoas às vezes diziam que mais parecia uma reserva florestal do que uma faculdade. Os prédios ficavam aninhados entre sequóias e, bem no espírito da década de 60, seus planejadores fizeram questão de conservar todas as árvores. Como outros departamentos, o de Física teve de ser criado do nada, começando com um corpo docente de aproximadamente quinze físicos, todos muito ativos e, na memória, jovens. Sua diversidade de interesses convinha a um corpo de aluno brilhantes e inconformistas. Pelo menos os professores pensavam assim. No final da década de 70, o departamento deparou-se com uma míni-revolução, um levante entre os estudantes graduados. O que estes queriam aprender ninguém podia ensinar - uma disciplina recém-criada e mal definida chamada caos. Dez anos depois, o caos tornou-se um dos campos da ciência que mais rápido cresce, oferecendo uma nova maneira de encontrar ordem que aparentemente não têm ordem alguma. Médicos descobrem uma ordem surpreendente na fatal desordem capaz de vencer o coração humano, um tremor espasmódico que é a causa primeira de uma morte súbita e inexplicável. Economistas estão desencavando velhas cotações de bolsas de valores para tentar um novo tipo de análise. Percepções que começaram com Física e Matemática puras remeteram diretamente ao mundo natural - as formas das nuvens, o comportamento dos relâmpagos, o entrelaçamento microscópico dos vasos sanguíneos, a aglomeração galáctica de estrelas. Cientistas estão encontrando padrões universais no comportamento do tempo, no comportamento dos carros congestionando vias expressas, no comportamento do petróleo fluindo nos oleodutos subterrâneos. A nova ciência começou a modificar a maneira pela qual executivos tomam decisões sobre seguros, a maneira pela qual astrônomos olham o sistema solar, a maneira pela qual teóricos políticos falam das tensões que levam a conflitos armados.
Novas idéias podem ser difíceis de ser concebidas e a inexperiente ciência do caos colidiu com algumas tradições firmemente enraizadas - por exemplo, a crença de que sistemas simples devem produzir comportamento simples e ordenados. Quando um punhado de estudantes da Santa Cruz se enredou nos primeiros fios enovelados da nova ciência, perceberam-se totalmente sozinhos. Fora dali, em diversos laboratórios e departamentos de Física, alguns cientistas apaixonadamente iconoclastas estavam criando uma nova disciplina. Um meteorologista, Eduardo Lorenz, tinha descoberto um formato misterioso, mais tarde denominado estranho atrator, que iluminava a caótica imprevisibilidade do tempo que faz na terra.
Um matemático, Benoit Mandelbrot, havia descoberto uma família de padrões que se tornou o fundamento da Geometria fractal. Um físico, Mitchell Feigenbaum, descobria ligações insuspeitadas entre famílias inteiras dos sistemas caóticos, desenvolvendo uma teoria que relacionaria fluidos turbulentos a circuitos eletrônicos flutuantes aos ritmos da própria vida. Todos eles estavam reexaminando muitos sistemas físicos aparentemente fortuitos ou caóticos, descobrindo novas maneiras de formular equações para descrevê-los e daí usando computadores para criar padrões visuais a partir das equações - padrões que não eram óbvios de nenhum outro modo. 
Os estudantes, que apenas se iniciavam nessas descobertas instigantes, não sabiam como proceder. A educação de um físico depende do sistema de orientadores e orientados. Um bom orientador ajuda seu aluno a escolher problemas administráveis e fecundos. Se o relacionamento der certo, a influência do professor ajudará o estudante a conseguir emprego. Mas em 1977 não havia orientadores na área do caos. Não havia aulas de caos, nem manuais sobre caos, nem sequer uma publicação dedicada ao caos. Os estudantes tinham de inventar eles próprios o campo de estudos - e, ao fazê-lo, eles conseguiram desenvolver o assunto para todo o mundo.
Em Santa Cruz, o caos começou com um estudante barbudo, natural de Boston e formado pela Universidade de Harvard, chamado Robert Stetson Shaw, que em 1977 estava para completar 31 anos. Isso fazia dele praticamente o mais velho da turma. Sua carreira em Harvard havia sido interrompida diversas vezes, primeiro pelo serviço militar, depois pela decisão de viver numa comunidade e ainda por outras experiências improvisadas. Shaw era quieto, tímido, mas de forte presença. Ele estava a poucos meses de completar sua tese de doutorado em supercondutividade, então um assunto respeitável, embora de certa forma estagnado.
Ninguém estava particularmente preocupado com o fato de ele perder seu tempo lá embaixo no prédio de Física brincando com um computador analógico. Na evolução dos computadores, os analógicos representavam um beco sem saída. Computadores digitais, construídos a partir de circuitos que podiam ser ligados ou desligados, zero ou um, sim ou não, davam respostas precisas às perguntas feitas pelos programadores. Computadores analógicos, por sua própria concepção, eram muito vagos.
Em sua estrutura não havia interruptores do tipo sim-não, mas circuitos eletrônicos como resistências e condensadores, facilmente reconhecidos por qualquer pessoa que tivesse lidado com rádios, antes que a miniaturização de aparelhos eletrônicos solid-state impedisse que amadores desmontassem tais equipamentos. O computador analógico de Santa Cruz era uma coisa pesada e empoeirada, com um painel de madeira na fachada, como aqueles usados antigamente em mesas telefônicas. Programar um computador analógico era questão de conectar e desconectar fios. Ao conceber diversas combinações de circuitos, um programador simula sistemas de equações de modo a fazê-los adaptar-se perfeitamente a problemas de engenharia. Digamos que alguém queira projetar uma suspensão de automóvel capaz de proporcionar a viagem mais suave possível. Um condensador substitui a mola, indutores representam a massa e assim por diante. Obtém-se um modelo feito de metal e elétrons, bastante rápido e - o que é melhor - facilmente ajustável . Simplesmente girando-se botões, pode-se tornar as molas mais fortes ou a fricção mais fraca. E podem-se observar os resultados sob a forma de um osciloscópio.
Um belo dia, um amigo astrofísico, William Burke, entregou a Shaw uma folha de papel com três equações rabiscadas e pediu-lhe que as colocasse em seu computador. As equações pareciam simples. Edward Lorenz as havia escolhido como um método despojado para calcular um processo conhecido em Meteorologia, os movimentos ascendentes e descendentes do ar ou da água, chamado convecção. Shaw levou apenas poucas horas para conectar os fios adequados e ajustar os botões. Alguns minutos mais tarde, ele viu aparecer na tela um padrão peculiar, cambiante e infinitamente complicado - e soube então que nunca terminaria sua tese sobre supercondutividade.
A tela de Shaw proporcionava uma maneira de criar diagramas abstratos de comportamento dinâmico de longo prazo de qualquer sistema físico - uma bolinha de gude imóvel no fundo de um buraco, um relógio de pêndulo balançando monotonamente ou o tumulto imprevisível do tempo na Terra. Para a bolinha de gude em repouso, o diagrama seria simplesmente um ponto. Para um sistema periodicamente cíclico como o relógio de pêndulo, o diagrama teria a forma de uma lançada. Para o sistema enganadoramente simples das três equações da convecção, o diagrama era algo completamente diferente. Esse sistema de fluidos ascendentes e descendentes comportava-se caoticamente como a própria atmosfera, um sistema muito mais complicado, embora relacionado a ele. Um sistema caótico nunca se repete de uma maneira periódica e o diagrama que Shaw começava a estudar nunca girava em torno de si do mesmo modo.
Em vez disso, tinha uma forma intricada e recorrente, uma espécie de dupla espiral, enrolando-se primeiro numa direção, depois em outra. Shaw sabia que Edward Lorenz, do MIT (Massachusetts Institute of Technology), havia descoberto esse tipo de padrão em 1963. Lorenz reconheceu sua importância quando tentava fazer previsões do tempo no computador. Mas a natureza caótica do atrator significa que previsões de longo prazo seriam impossíveis.
Ao mesmo tempo, o estranho atrator revelava padrões inesperados. Era sinônimo de desordem e imprevisibilidade mas, ainda assim, significava um novo tipo de ordem no tumulto. Dois cientistas franceses, David Roelle e Floris Takens, mais tarde dariam a esses padrões seu nome provocativo: estranhos atratores. Shaw conhecia a nova linguagem da geometria fractal. No entanto, muito tempo havia passado antes que ele, assim como outros envolvidos em trabalhos do mesmo gênero, reconhecesse que a forma diante de seus olhos era um fractal, o que significa que revelava novas complexidades em escalas cada vez menores.
Assim, ele passou várias noites no laboratório observando o ponto verde do osciloscópio percorrendo a tela, traçando sem parar seu roteiro caótico e nunca exatamente no mesmo modo. O percurso da forma permaneceu na retina, oscilante e vibrante, diferente de qualquer objeto que Shaw conhecera em suas pesquisas. Parecia ter vida própria. Prendia a mente como uma chama que se move em padrões que nunca se repetem. Em criança, Shaw tinha tido ilusões a respeito do que seria a ciência - uma disparada romântica ao desconhecido. Isso, finalmente, era alguma coisa à altura de suas ilusões. E ele estava atraindo atenções. Ocorre que a entrada do Departamento de Física era bem do outro lado do corredor e muita gente passava por ali. 
Um dos que começaram a aparecer por lá foi Ralph Abraham, professor de Matemática. "Tudo o que tem a fazer é colocar suas mãos nesses botões e, de repente, estará explorando esse novo mundo no qual você é um dos primeiros viajantes e nem vai querer subir para tomar um pouco de ar", diz Abraham. "Shaw teve a experiência espontânea em que apenas um pouco de exploração revela todos os segredos". Logo Shaw começou a ter colegas. Doyne Farmer, natural do Novo México, alto, magro, cabelos cor de areia, tornou-se o porta -voz mais articulado do grupo que veio a se autodenominar Coletivo dos Sistemas Dinâmicos (outros, às vezes, chamavam-no Os Conspiradores do Caos).
Em 1977, Doyne tinha 24 anos, era todo energia e entusiasmo, uma máquina de idéias. O membro mais jovem do grupo era James Crutchfield, pequeno e atarracado, um estilista do windsurf e, o que era mais importante para o coletivo, um mestre nato em computação. Norman Packard, amigo de infância de Farmer, criado na mesma cidade de Silver City, no Novo México, chegara a Santa Cruz naquele outono, bem quando Farmer começava um ano de licença, disposto a dedicar toda sua energia ao plano de aplicar as leis do movimento ao jogo da roleta
O empreendimento da roleta era tão sério quanto forçado. Durante mais de uma década Farmer e Packard, junto com um grupo mutável de colegas físicos e alguns curiosos adotaram-no. Eles calcularam inclinações e trajetórias, escreveram e reescreveram programas, adaptaram computadores especiais nos sapatos e fizeram nervosas incursões a cassinos. Deve ser dito que o projeto proporcionou um treinamento incomum em análises rápidas de sistemas dinâmicos, mas fez pouco para tranqüilizar os professores de física de Santa Cruz. Tampouco eles entenderam por que Shaw abandonara sua tese sobre supercondutividade.
Por mais que estivesse entediado, raciocinavam, ele sempre poderia passar correndo pelas formalidades, acabar seu doutorado e entrar no mundo real. Quanto ao caos, havia questões de adequação acadêmica. Ninguém em Santa Cruz estava qualificado para supervisionar um curso neste campo-sem nome. E certamente não havia empregos para graduados com este tipo de especialidade. Mesmo assim, o coletivo tomou forma. Quando alguns equipamentos eletrônicos começaram a desaparecer de noite, tornou-se aconselhável procurá-los no antigo laboratório de Shaw, de Física de baixas temperaturas. Tracejadores de gráficos, conversores e filtros eletrônicos começaram a se acumular. Um grupo de físicos de partículas que trabalhava no mesmo corredor tinha um pequeno computador digital destinado ao ferro-velho. Foi parar no laboratório de Shaw.
A atabalhoada sensibilidade do grupo ajudava muito. Shaw tinha crescido brincando com engenhocas eletrônicas. Packard consertava aparelhos de TV. Crutchfield pertencia à primeira geração de matemáticos que considerava a lógica dos computadores uma linguagem natural. O prédio de Física em si era como o de qualquer lugar, com pisos de cimento e paredes sempre pedindo uma nova demão de pintura, mas a sala ocupada pelo grupo do caos criou sua própria atmosfera, com pilhas de escritos, fotografias de nativos do Taiti nas paredes e, como não poderia deixar de ser, impressos de computadores de estranhos atratores.
Praticamente a qualquer hora um visitante podia ver membros do grupo reorganizando circuitos, arrancando fios remendados, discutindo sobre consciência ou evolução, ajustando o painel de um osciloscópio, ou apenas observando um brilhante ponto verde traçar uma curva de luz, sua órbita vibrando e agitada como algo vivo. A educação tradicional na dinâmica dos sistemas físicos nunca revelara o potencial de tal complexidade porque se concentrava em sistemas lineares. Um sistema linear obedece às leis da proporção - quanto mais depressa se vai, mais longe se chega. A linearidade torna os cálculos fáceis ou, ao menos, manejáveis. Infelizmente, a maioria dos sistemas do mundo real não é linear.
Eles contêm uma certa torção, como a fricção, que não varia puramente como uma função de outras variáveis. A não-linearidade exigia cálculos mais difíceis. Era a mosca na sopa previsível da Mecânica clássica. Poucos consideraram a não-linearidade uma força criativa; mas foi a não-linearidade que criou os padrões misteriosamente belos dos estranhos atratores. "Não-linear era uma palavra que você só encontrava no final do livro", diz Farmer. "Um estudante de Física fazia um curso de Matemática e o último capítulo tratava de equações não-lineares. Geralmente essa parte era deixada de lado." Shaw e seus colegas tiveram de canalizar seu entusiasmo natural para um programa científico. Eles precisavam fazer perguntas que pudessem ser respondidas e que valessem a pena ser respondidas. Eles buscaram meios de interligar teoria e pesquisa - aí, pensavam, estava o vazio a ser preenchido. Antes mesmo de começar, foram obrigados a aprender o que era sabido e o que não era, e isso em si foi um desafio formidável.
Eles não tinham noção disso, mas seus problemas simbolizavam as barreiras que os pioneiros em caos enfrentavam nas mais diversas instituições - um punhado de pesquisadores, normalmente trabalhando por conta própria, receosos de discutir suas idéias não ortodoxas com os colegas. Os estudantes de Santa Cruz eram impedidos pela tendência de avançar aos poucos em ciência, particularmente quando um novo tema se atravessava em subdisciplinas estabelecidas. Freqüentemente, eles não tinham idéia se estavam em território novo ou conhecido e, na verdade, parte de seu trabalho seguia paralelo a descobertas feitas por matemáticos soviéticos. Logo perceberam que muitos tipos de questões poderiam ser levantados sobre os possíveis comportamentos de sistemas físicos simples e os estranhos atratores que eles produziam. Quais as suas formas características? O que a Geometria revelava sobre a física dos sistemas físicos correlatos? Um físico sempre quer calcular medidas. O que havia para ser medido nessas fantasmagóricas imagens em movimento?
Shaw e os outros tentaram isolar as qualidades especiais que tornavam os estranhos atratores tão encantadores. A imprevisibilidade era uma delas - mas onde encontrar os calibres para medir tal qualidade? A essa altura, o coletivo reunia-se com freqüência em um velho casarão não longe da praia. Nele se amontoavam móveis de segunda mão e equipamentos de computador destinados ao problema da roleta e à pesquisa dos estranhos atratores. Convivendo com esses estranhos atratores dia e noite, os jovens físicos começaram a reconhecê-los (ou a pensar que o faziam) nos fenômenos que sacudiam, batiam e oscilavam na vida cotidiana. Eles tinham de jogar esse jogo. Perguntavam-se: onde fica o mais próximo estranho atrator? Estaria no pára-choque barulhento do carro? Na bandeira tremulando a esmo na brisa? Numa folha que flutuava? "Você não enxerga algo até descobrir a metáfora correta que lhe faz percebê-lo", diz Shaw. Não tardou que seu amigo astrofísico Burke ficasse perfeitamente convencido de que o velocímetro de seu carro oscilava do modo não-linear típico do estranho atrator.
Shaw, ocupando-se de um projeto experimental que iria mantê-lo entretido por anos, adotou um sistema dinâmico tão caseiro quanto algum físico pudesse imaginar: uma torneira pingando. Como gerador de organização, uma torneira pingando oferece pouco para se trabalhar. Mas, para um investigador iniciante do caos, a torneira pingando provou ter certas vantagens. Todo mundo tem dela uma imagem mental. O fluxo de dados é o mais unidimensional possível: uma batida ritmada de pontos isolados mensuráveis no tempo. Nenhuma dessas qualidades poderia ser encontrada em sistemas que o grupo de Santa Cruz iria explorar mais tarde - o sistema imunológico humano, por exemplo, ou o perturbador efeito da interação de feixes que prejudicava inexplicavelmente o desempenho de partículas em colisão do Acelerador Linear de Stanford, ao norte de Santa Cruz.
Na torneira pingando, tudo que existe é a solitária linha de dados. E não é nem uma variação contínua de velocidade ou temperatura - apenas uma lista dos tempos de gotejamento. Os pingos podem ser regulares. Ou, como qualquer um descobre ao ajustar uma torneira, podem tornar-se irregulares e aparentemente imprevisíveis. Solicitado a organizar um ataque a um sistema como esse, um físico tradicional começaria por montar um modelo físico o mais completo possível. Os processos que norteiam a formação e a ruptura das gotas são compreensíveis, ainda que não sejam tão simples como possam parecer. Uma variável importante é o ritmo do fluxo. (Este deve ser lento, comparado à maioria dos sistemas hidrodinâmicos. Normalmente, Shaw observava o ritmo de uma a dez gotas por segundo.) Outras variáveis incluem a viscosidade do fluxo e a tensão de superfície.
Uma gota de água pendendo de uma torneira, à espera do momento de se romper, assume uma forma tridimensional complicada e apenas o cálculo dessa forma era, como diz Shaw, "o estado de arte em matéria de cálculo por computador". Uma gota enchendo-se de água é como um pequeno saco elástico de tensão superficial, oscilando para lá e para cá, aumentando a massa e expandindo as paredes até a ruptura.
Um físico que tentasse construir um modelo completo do problema da gota, formulando um conjunto de equações para depois tentar resolvê-las, acabaria no mato sem cachorro. Uma alternativa seria esquecer a Física e observar apenas os dados, como se estivessem saindo de uma caixa-preta. Dada uma lista de números representando intervalos entre as gotas, será que um especialista em dinâmica caótica encontraria algo útil para dizer? Na verdade, como foi comprovado mais tarde, podem-se conceber métodos para organizar esses dados dentro da Física e esses métodos se mostraram decisivos no que diz respeito à aplicação do caos a problemas do mundo real. Shaw começou a meio caminho entre esses dois extremos, fazendo uma espécie de caricatura de um modelo físico completo. Ele fez um resumo rudimentar da Física das gotas, imaginando um peso que pendesse de uma mola. O peso aumenta constantemente. A mola estica e o peso desce cada vez mais. A certa altura, uma porção do peso se rompe. A quantidade que se desprendesse, Shaw supôs arbitrariamente, dependeria apenas da velocidade da queda do peso descendente quando atingisse o ponto de ruptura.
Então, naturalmente, o peso restante voltaria para a posição anterior, como fazem as molas, com oscilações que estudantes aprendem a delinear usando equações normais. A característica interessante do modelo - a única característica interessante - era a torção não-linear que possibilita o comportamento caótico. O tempo preciso de uma gota dependia do ritmo do fluxo, é claro, mas dependia também de como a elasticidade desse saco de tensão superficial interagia com o peso que aumentava constantemente. Se uma gota iniciasse sua vida já em queda, ela se romperia mais cedo. Se acaso se formasse quando sua superfície inferior estivesse subindo, poderia encher-se com um pouco mais de água antes de romper-se.
Será que o modelo de Shaw geraria tanta complexidade como uma torneira de verdade? E essa complexidade seria da mesma espécie? Shaw instalou-se em um laboratório no prédio de Física, com uma grande tina de plástico de água sobre a cabeça. Quando uma gota caía, interrompia um feixe de luz e na sala ao lado um microcomputador marcava o tempo. Enquanto isso, Shaw fazia suas equações e operava o computador analógico, produzindo uma torrente de dados imaginários, muito parecidos às gotas da torneira real. Mas, para ir além, Shaw necessitava de um modo de colher dados puros de qualquer experiência e trabalhar com equações e estranhos atratores que pudessem revelar padrões ocultos.
Com um sistema mais complicado,uma variável poderia ser graficamente relacionada a outra, correlacionando mudanças na temperatura ou na velocidade com o passar do tempo. Mas a torneira pingando proporcionava apenas uma série de tempos. Shaw tentou, então, uma técnica desenvolvida pelo grupo de Santa Cruz, que foi talvez sua contribuição prática mais esperta e duradoura ao progresso do caos - um método de reconstruir um estranho atrator invisível que poderia ser aplicado a qualquer série de dados. Para os dados da torneira pingando, Shaw construiu um gráfico no qual o eixo horizontal representava um intervalo de tempo entre duas gotas e o eixo vertical representava o intervalo de tempo entre as duas seguintes.
Se entre a gota número um e a gota número dois decorressem 150 milésimos de segundo, e depois 150 milésimos de segundo decorressem entre a gota número dois e a gota número três, ele marcava um ponto na posição 150-150. Era tudo que havia a fazer. Se o gotejamento fosse regular, o gráfico seria apropriadamente inerte. Cada ponto cairia no mesmo lugar. O gráfico seria um simples ponto. Ou quase - na verdade, a primeira diferença entre a torneira pingando no computador e a torneira real era que esta estava sujeita a distúrbios, ou "ruído", sendo extremamente sensível. Shaw acabou fazendo a maior parte de seu trabalho à noite, quando o tráfego de pessoas no corredor era mínimo. O barulho significava que, em vez do simples ponto previsto pela teoria, ele veria uma mancha ligeiramente indistinta.
A medida que o fluxo aumentasse, o sistema passaria por uma mudança repentina nas suas características. Então as gotas cairiam em pares repetidos.Um intervalo poderia ser de 150 milésimos de segundo e o próximo, de 80. Assim, o gráfico mostraria duas manchas indistintas, uma centrada em 150-80 e outra em 80-150 e assim por diante. O verdadeiro teste ocorreu no momento em que o padrão se tornou caótico, quando o ritmo do fluxo foi novamente modificado. Se fosse mesmo fortuito, haveria pontos dispersos por todo o gráfico. Mas, se um estranho atrator estivesse oculto nos dados, poderia se revelar como um padrão vago mas perceptível.
Muitas vezes acontecia serem necessárias três dimensões para se ver a estrutura; mas isso não era problema. Em vez de assinalar cada intervalo em relação ao próximo, os cientistas assinalavam cada intervalo em relação a cada um dos dois subseqüentes. Era um truque, um artifício. Normalmente, um gráfico tridimensional requer o conhecimento de três variáveis independentes em um sistema. O truque possibilitava três variáveis pelo preço de uma. Refletiu a crença desses cientistas de que a ordem está tão profundamente contida na aparente desordem que encontraria um modo de se expressar, mesmo a pesquisadores que não soubessem quais variáveis físicas medir.
No caso da torneira de Shaw, as imagens ilustram o fato. Em três dimensões, sobretudo, os padrões apareciam como rastros de fumaça saindo de um avião, desses que escrevem no céu, descontrolado. Shaw poderia combinar sinais gráficos dos dados experimentais com os dados produzidos pelo modelo computadorizado, sendo a principal diferença o fato de os dados reais aparecerem sempre mais indistintos, manchados pelo ruído. Mas a estrutura era inconfundível. A medida que os meses passavam, a transição de rebeldes para físicos era lenta. De vez em quando, sentados em um café ou trabalhando em seu laboratório, um ou outro estudante tinha de conter o espanto que sua fantasia científica ainda não tinha eliminado. "Meu Deus, ainda estamos fazendo isso e ainda faz sentido", dizia Crutchfield. "Ainda estamos aqui: Até onde isso irá?"
A maioria dos professores de Física viu-se numa posição difícil. "Não tínhamos orientador, ninguém para nos dizer o que fazer", diz Shaw. "Durante anos ficamos numa situação à parte e isso persiste até hoje. Nunca tivemos recursos financeiros em Santa Cruz. Cada um de nós trabalhou períodos consideráveis sem receber nada e o tempo todo era uma operação de fundo de quintal, sem orientação intelectual ou de qualquer outro tipo." Cada membro do coletivo era chamado de lado de tempos em tempos para conversas francas. Eles eram advertidos de que, mesmo se de alguma forma fosse encontrada uma maneira de justificar um doutorado, ninguém seria capaz de ajudar os estudantes a conseguir um emprego em um campo inexistente.
Isso podia ser uma moda passageira, diziam os professores, e depois como é que vocês vão ficar? Na verdade, fora do abrigo de sequóias nas colinas de Santa Cruz, o caos estava criando seu próprio estabelecimento científico e o Coletivo dos Sistemas Dinâmicos deveria se juntar a ele. O ponto de inflexão foi uma aparição surpresa em um encontro sobre Física de matéria condensada realizado em Laguna Beach em 1978. O coletivo não fora convidado, mas apareceu assim mesmo, amontoando-se na caminhonete Ford 1959 de Shaw, apelidada por eles "Sonho Cremoso". Por via das dúvidas, o grupo levou equipamentos, incluindo um enorme monitor de TV e um videoteipe. Quando um orador convidado cancelou sua presença à última hora, Shaw avançou e tomou seu lugar.
A ocasião foi perfeita. O caos já ostentava a fama de ser mencionado a meia voz, mas poucos dos físicos presentes à conferência sabiam do que se tratava. Shaw começou então explicando os diferentes tipos de atratores, dos comuns aos estranhos; a princípio, os estados inertes (quando tudo fica imóvel); depois, ciclos periódicos (quando tudo oscila); e, por fim, estranhos atratores caóticos (o restante). Ele demonstrou sua teoria com gráficos computadorizados em videoteipe. ("Os meios audiovisuais nos deram uma vantagem", diz Shaw. "Podíamos hipnotizá-los com flashes de luz.") Ele ilustrou o atrator de Lorenz e a torneira que pinga. A palestra foi um triunfo popular e vários professores de Santa Cruz estavam no auditório, vendo o caos pela primeira vez através dos olhos de seus colegas.
Mas o coletivo não podia durar para sempre. Quanto mais se aproximava do mundo real da ciência, mais perto da separação se encontrava. Seus membros começaram a pensar no futuro individual e passaram a colaborar com físicos e matemáticos estabelecidos em outros lugares. Tendo aprendido a procurar estranhos atratores em bandeiras tremulantes e em velocímetros defeituosos, os cientistas fizeram questão de detectar os sintomas do caos em toda a Física atual. Peculiaridades outrora desprezadas como ruído - flutuações surpreendentes, regularidades misturadas a irregularidades - eram explicadas agora nos termos da nova ciência. Tais efeitos pipocaram de repente em escritos a respeito de tudo, desde lasers até circuitos eletrônicos.
Quando o coletivo se dissolveu - seus membros se dirigindo às mais importantes instituições de Física, do Laboratório Nacional de Los Álamos ao Instituto de Estudos Avançados de Princeton e à Universidade da Califórnia em Berkeley -, alguns professores de Santa Cruz também já haviam aderido ao caos. Eles estavam se associando a um movimento: químicos, ecologistas, economistas, climatologistas tentam atualmente reconstruir estranhos atratores a partir de dados brutos, assim como Shaw fizera em seus estudos com a torneira gotejante.
Especialistas em finanças usam as técnicas desenvolvidas pelo grupo de Santa Cruz para analisar décadas de cotações diárias de bolsas de valores,buscando padrões que acreditam existir ali. Muitos fisiólogos acreditam agora que o caos proporciona um modo de prever - e talvez de tratar  - ritmos irregulares no processo que governa a vida, desde a respiração até os batimentos cardíacos e até a função do cérebro. No MIT, médicos comparam eletrocardiogramas humanos com dados de um modelo de computador de contrações cardíacas caóticas, numa tentativa de prever com bastante antecedência quando o órgão sofrerá um espasmo fatal.
Ecologistas usam a Matemática do caos para descobrir como, na ausência de mudanças ambientais fortuitas, populações de espécies podem crescer ou diminuir desordenadamente por conta própria. Packard estuda a tendência de processos caóticos de criar padrões complexos em fenômenos como flocos de neve, cuja forma delicada incorpora uma mistura de estabilidade e instabilidade que só agora começa a ser compreendida. Ele e Farmer utilizam a Física dos sistemas dinâmicos para estudar o sistema imunológico humano, com seus bilhões de componentes e sua capacidade de aprender, memorizar e reconhecer padrões. Para esses cientistas e seus colegas, o caos tornou-se um conjunto de instrumentos capaz de elucidar fatos aparentemente casuais.
Mas é também uma série de atitudes em relação à complexidade - uma nova maneira de ver. Eles sentem que estão revertendo uma tendência científica de analisar sistemas em termos de suas partes constituintes - quarks, cromossomos ou nêutrons. "A tendência científica, particularmente em Física, tem sido pelo reducionismo, uma constante fragmentação das coisas em minúsculos pedacinhos", diz Farmer. "O que as pessoas estão finalmente percebendo é que esse processo é um beco sem saída. Os cientistas estão muito mais interessados na idéia de que o todo pode ser maior que a soma da partes." 

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A estranha família do Átomo - Física

A ESTRANHA FAMÍLIA DO ÁTOMO



No passado, era só ele. Depois, vieram os elétrons, prótons e nêutrons. Hoje, fala-se de misteriosas partículas como os quarks, léptons e bósons. Quanto mais se pesquisa a intimidade da matéria, mais surpresas aparecem.

"Três quarks para Muster Mark": a frase é do Finnegans wake, o último e praticamente ilegível livro do romancista irlandês James Joyce (1882-1941). Quark é o nome de um tipo de queijo, mas no livro o significado da expressão permanece obscuro. Graças ao humor do físico americano Murray Gell-Mann, no entanto, a palavra acabou entrando para o vocabulário científico. Gell-Mann havia percebido em 1964 que muita coisa do comportamento de partículas como os prótons e nêutrons, que formam os núcleos dos átomos, poderia ser explicada se elas fossem constituídas de partículas ainda menores. Como estas seriam três para cada próton ou nêutron, ele tomou emprestada a palavra de Joyce e as chamou quarks. Conscientes de que estavam entrando num mundo teórico muito diferente da realidade macroscópica com a qual se convive todos os dias, os físicos deram aos três quarks os nomes de up (para cima). down (para baixo) e strange (estranho). Logo. o elenco dos quarks foi ampliado de três para seis, com a inclusão do charm (charme), bottom (fundo) e top (topo). Esses nomes designam os seis "sabores" com que os quarks aparecem. Cada "sabor", por sua vez, apresenta-se em três "cores" diferentes: vermelho, verde e azul. Esses sabores e cores, evidentemente, não têm nada a ver com as cores e sabores do mundo cotidiano. Indicam apenas propriedades atribuídas aos quarks pela teoria. Nenhum quark livre foi até agora encontrado nas experiências de laboratório. É que, caso existam de verdade, as forças que os mantêm agregados seriam tão poderosas que tornariam praticamente impossível arrancá-los dali. O que a ciência pode afirmar com razoável segurança é que, sejam formados por quarks ou não, partículas como os prótons e nêutrons devem possuir algum tipo de estrutura interna. Eles não são, juntamente com os elétrons a última fronteira da realidade, os tijolos básicos de que todo o Universo seria formado. Essas idéias são relativamente novas. Até o final do século XIX, o próprio átomo, cujo conceito fora herdado da antiga filosofia grega, ainda era pensado como indivisível. A descoberta do elétron pelo físico inglês Joseph Thomson, em 1897, junto com a descoberta da radiatividade pelo físico francês Henri Becquerel, em 1896, forçaram uma revisão radical da velha idéia. Verificou-se que os átomos de substâncias como o urânio emitiam diferentes tipos de radiação e se transformavam em substâncias completamente diferentes. Foram identificados três tipos de radiação, que receberam os nomes de alfa, beta e gama. Constatou-se que os raios alfa eram, na verdade, partículas positivamente carregadas - que hoje se sabe serem constituídas por dois prótons e dois nêutrons, como os núcleos dos átomos de hélio. Os raios beta são, por sua vez, elétrons de alta energia. E os raios gama, radiação eletromagnética semelhante a luz, mas de comprimento de onda muito menor. Ora, pensaram os físicos, por que não utilizar essas partículas de dimensões subatômicas emitidas pelas substâncias radiativas para inspecionar a constituição interna do próprio átomo? Foram idéias mais ou menos como essa que em 1911 levaram o físico inglês Ernest Rutherford a uma conclusão surpreendente: a maior parte do volume do átomo era, na realidade, ocupada pelo vazio; uma minúscula região no centro do átomo o núcleo, positivamente carregado, concentrava quase toda a massa atômica; em torno dele, como os planetas em redor do Sol, moviam-se os elétrons, de carga negativa; a atração elétrica entre as cargas opostas é que manteria os elétrons em suas órbitas, assim como a atração gravitacional mantém os planetas girando em volta do Sol. Para se ter uma idéia de como os átomos são pequenos, escreveu o físico austríaco-americano Fritjot Capra, imaginemos uma laranja que tenha o tamanho da Terra; os átomos da laranja teriam, então, o tamanho de cerejas. No entanto, mesmo num átomo do tamanho de uma cereja, o núcleo atômico continuaria invisível: para que se pudesse enxergá-lo, o átomo teria de ter não mais as dimensões de uma cereja, e sim da maior abóbada do mundo, a da catedral de São Pedro, em Roma. Num átomo de tal envergadura, o núcleo teria o tamanho de um grão de sal. Embora sua representação gráfica tenha permanecido como uma espécie de símbolo do átomo, o modelo planetário de Rutherford não perdurou. Seu principal defeito é que, de acordo com a teoria clássica da Eletrodinâmica, os elétrons em movimento deveriam emitir radiação eletromagnética e essa emissão ocorreria à custa da diminuição de sua energia de movimento, ou energia cinética. Movendo-se cada vez mais devagar, os elétrons seriam progressivamente atraídos pelos núcleos, até se chocar com eles. Mas isso simplesmente não ocorre. Esse foi apenas o primeiro de uma série de paradoxos que os átomos apresentaram aos homens interessados em compreendê-los. Os físicos porém, não se desesperaram e acabaram realizando uma revolução científica, com a criação, na década de 20, da Teoria Quântica.
O primeiro a ultrapassar as fronteiras do mundo atômico com as novas ferramentas quânticas foi Niels Bohr, em 1913. Ele montou um modelo para explicar o mais simples dos átomos, o do hidrogênio que tem apenas um próton no núcleo e um elétron girando ao redor dele. Nesse modelo há um número preciso de camadas, dispostas concentricamente em torno do núcleo, nas quais o elétron pode se mover sem emitir radiação. Essas camadas correspondem aos diferentes níveis de energia que podem ser assumidos pelo elétron. Como a energia tem uma natureza descontínua, cada camada é separada da seguinte por uma zona que não pode ser transitada pelo elétron. A Teoria Quântica concentrou-se de início no estudo da distribuição e do comportamento dos elétrons no interior do átomo. O núcleo atômico continuava um território obscuro. Deduziu-se que deveria haver em seu interior, além do próton, outro tipo de partículas de massa próxima à do próton, mas desprovida de carga elétrica. A existência do nêutron foi efetivamente confirmada em laboratório, em 1932. Como o núcleo podia manter, porém, sua coesão, sem se estilhaçar por força da repulsão elétrica entre os prótons? A atração gravitacional entre as partes do núcleo é insuficiente para contrabalançar a intensa rejeição elétrica entre as cargas de mesmo sinal. A hipótese de que o nêutron pudesse funcionar como uma espécie de cimento mostrou-se inconsistente. A solução de mais esse enigma apresentou-se com a descoberta da força nuclear forte. Essa força tem características estranhas. Como o nome indica, é de fato muito poderosa, mas só atua a distâncias extremamente pequenas - da ordem de duas a três vezes o diâmetro das próprias partículas nucleares. A essa distância ela é atrativa; a distâncias ainda menores torna-se fortemente repulsiva: desse modo, tanto impede que o núcleo estoure devido à repulsão elétrica, como que os prótons e nêutrons se esmaguem uns aos outros. Sob o efeito da força nuclear forte, a matéria existente no núcleo atômico apresenta-se incrivelmente compacta. Para se ter uma idéia, se todo o corpo humano fosse comprimido à densidade nuclear, não ocuparia mais espaço do que a cabeça de um alfinete. Uma concentração assim tão densa pode dar a impressão de que as partículas no interior do núcleo se encontram imobilizadas. Completamente falso: as partículas, quando confinadas a uma pequena região do espaço, tendem a um movimento frenético. Os elétrons, em seus orbitais, atingem a velocidade de 960 quilômetros por segundo; os prótons, confinados num volume muitíssimo menor, alcançam a estonteante velocidade de 64 mil quilômetros por segundo. Prótons e nêutrons, como se viu, seriam formados de partículas ainda menores. Nessa busca da fronteira final do átomo, uma das dificuldades está em que, ao contrário do que especulavam os antigos filósofos gregos - e ao contrário também do senso comum -, não se pode dividir e subdividir a matéria até chegar à menor fração possível. O método adotado nas modernas pesquisas consiste em acelerar as partículas subatômicas por meio de poderosíssimos campos eletromagnéticos e fazê-las estilhaçar de encontro a outras partículas. No entanto, os estilhaços resultantes da colisão não são menores do que as partículas originais. Isso porque grande parte da energia de movimento (ou energia cinética) adquirida pelas partículas no interior dos aceleradores transforma-se em massa quando elas se chocam. Esse fenômeno de conversão de energia em massa e de massa em energia foi previsto na Teoria da Relatividade de Einstein. O resultado é que, fazendo as partículas colidir, é possível dividir indefinidamente a matéria - mas jamais se chega a pedaços menores. Pela natureza das partículas resultantes do choque, porém é possível saber muita coisa sobre a estrutura das partículas originais. A teoria dos quarks foi montada com base nesse tipo de investigação. Os quarks não podiam ser encontrados diretamente, mas os prótons e nêutrons se comportavam nas experiências como se fossem constituídos por três quarks cada. Para toda uma corrente da Física, os quarks poderiam ser alguns dos tão procurados tijolos básicos do Universo. Só que, no caso, não um tipo único de tijolo, mas uma família deles - pois os quarks se apresentariam em seis tipos diferentes. As partículas formadas pelos quarks são aquelas entre as quais atua a força nuclear forte - ou, para usar um vocabulário mais moderno, aquelas que participam da interação forte. Elas são conhecidas coletivamente como hádrons. Assim como os prótons e os nêutrons, os hádrons possuem três quarks cada um - os bárions. Outros, mais leves, formados por um quark e um antiquark, são chamados mésons. Ao lado dos quarks, haveria outra família de tijolos básicos, também integrada por seis indivíduos. São os léptons, dos quais o mais conhecido é o velho e bom elétron. Ao contrário dos hádrons, os léptons não participam da interação forte, mas de outro tipo de interação, que recebeu o nome de fraca. Forte, fraca, eletromagnética e gravitacional: são estas as quatro forças conhecidas no Universo. O fato de serem agora chamadas interações se deve à descoberta de que resultam, na verdade, de uma troca de partículas entre as partículas: os prótons e nêutrons permaneceriam tão fortemente aglutinados no núcleo atômico porque estariam constantemente trocando partículas entre si. A partícula que trocam, responsável pela interação forte, recebeu apropriadamente o nome de glúon, derivado do inglês glue, que quer dizer cola. Partículas como os glúons, ou os fótons (responsáveis pela interação eletromagnética), formariam uma terceira e última família de tijolos elementares, a dos bósons, também em número de seis. Quarks, léptons e bósons - três famílias de seis elementos cada, comporiam o simétrico elenco com o qual todo o drama do Universo seria encenado. O modelo é tentador, mas os físicos são uma platéia exigente e inquieta. Eles se perguntam se os quarks seriam partículas realmente elementares, isto é, unidades mínimas desprovidas de estrutura interna. O fato de se manterem tão fortemente aglutinados no interior dos hádrons indica que, entre eles, devem agir forças extremamente poderosas. Ora, as forças são trocas de partículas. Nesse caso, se trocam partículas entre si, os quarks devem apresentar algum tipo de estrutura; portanto, seriam constituídos de componentes ainda menores. A coisa parece não ter fim. Para uma corrente minoritária, mas importante da Física, essas e outras dificuldades não decorrem de uma perfídia da realidade, mas de uma atitude equivocada do cientista diante dessa mesma realidade. Segundo essa linha, a idéia de um Cosmo constituído de componentes fundamentais isolados deveria ser definitivamente superada. Em lugar de um gigantesco conjunto de minúsculas bolinhas de gude com existência autônoma, existiria uma grande teia de acontecimentos relacionados entre si. Nenhuma das propriedades de qualquer parte dessa teia seria fundamental; todas decorreriam das propriedades das outras partes; as interrelações entre essas diversas partes é que determinariam a estrutura da teia como um todo. Para esses físicos, os paradoxos do modelo quark deixariam a ciência numa situação muito parecida com a dos tempos heróicos do desenvolvimento da teoria atômica, quando os impasses das concepções clássicas levaram à criação da Mecânica Quântica. Uma nova revolução científica, de alcance talvez ainda maior, estaria em gestação.

O empurra-empurra nuclear

Os núcleos dos átomos se mantêm estruturados graças à forca nuclear forte. Se ela deixasse de existir, os núcleos explodiriam devido à repulsão eletromagnética entre os prótons. Quando estes estão a uma distância equivalente ao diâmetro do núcleo (10-3 cm), a força nuclear de atração entre eles é 40 vezes maior do que a força de repulsão eletromagnética. Basta que a distância aumente quatro vezes, porém, para que as duas forças se equilibrem. Se aumentar 100 vezes, a repulsão eletromagnética ficará 1 milhão de vezes maior do que a atração exercida pela força nuclear.

Bons tempos aqueles

A idéia era simples e parecia consistente: se a matéria podia ser dividida em pedaços cada vez menores, devia haver um ponto em que se chegasse à mínima fração possível. Foi assim que os antigos filósofos gregos conceberam os átomo (indivisíveis). A doutrina deve ter-se originado por volta do século V a.C. e seus principais representantes foram Leucipo e Demócrito. Do primeiro quase nada se sabe. O segundo, discípulo daquele, nasceu na Trácia, em torno do ano 460 a.C. Dono de uma curiosidade enciclopédica, realizou observações nos terrenos da Zoologia e da Botânica e escreveu vários tratados, dos quais só restaram fragmentos. Além de indivisíveis, os átomos de Demócrito eram também invisíveis, devido a sua pequena massa, e só se distinguiam uns dos outros por seu tamanho e por sua forma. As diferentes formas é que davam às diversas substâncias suas propriedades. Os líquidos, por exemplo, deviam sua fluidez ao fato de serem constituídos por átomos esféricos, que deslizavam perfeitamente uns sobre os outros. O atomismo foi das primeiras tentativas de descobrir uma explicação racional para a multiplicidade de seres da natureza. Abandonada durante a Idade Média cristã, a idéia foi preservada, no mundo muçulmano. O poeta místico persa do século XIII Djalal ud-Din Rumi chegou a afirmar que os átomos eram divisíveis - 700 anos antes da moderna Física. O século XVII assistiu a uma retomada do interesse pelos átomos; o principal representante do atomismo dessa época foi Pierre Gassendi ( 1592-1655), professor no Collège Royal, de Paris. Ele procurou sintetizar a filosofia dos antigos gregos com o cristianismo. No século XIX, a partir das teorias sobre gases do inglês John Dalton e do italiano Amedeo Avogadro, o atomismo deixou o limbo da Filosofia para entrar no terreno da ciência.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Essa onda pegou - A Matéria.

ESSA ONDA PEGOU - A Matéria



No mundo infinitamente pequeno dos átomos, as coisas acontecem de um modo que nada tem a ver com a realidade que conhecemos. A teoria quântica imagina, por exemplo, que a matéria se comporta como uma onda.

De que são feitos nossos corpos? E o mundo em que vivemos? De átomos, todos sabem. Mas nem todos sabem que o conceito de átomo com que trabalham os cientistas de hoje tem muito pouco a ver com os duros e indivisíveis grãos de matéria imaginados pelos filósofos da velha Grécia. A nova visão do átomo é basicamente fruto de uma teoria - a Mecânica Quântica - que, a partir dos anos 20, bombardeou algumas das idéias mais consolidadas da Física.
Nesse estranho mundo, o senso comum não é uma bússola confiável. Alguns componentes do átomo, por exemplo, ora se comportam como partículas, feito bolinha de gude, ora como ondas, iguais às que se produzem na superfície da água. O caminho percorrido pela nova teoria é tão fascinante quanto suas próprias afirmações.
Por que os números e os ponteiros de certos relógios brilham no escuro? A pergunta parece banal. A resposta, entretanto, pode ser o ponto de partida para uma viagem à natureza íntima da matéria que constitui o Universo. O relógio brilha por causa de um fenômeno conhecido desde o começo do século - a radiatividade. Os átomos pesados e instáveis de elementos químicos como o rádio e o urânio emitem partículas carregadas de alta energia. Essas partículas foram batizadas com o nome de radiação alfa.
O descobridor das partículas alfa, o físico neozelandês radicado na Inglaterra Ernest Rutherford (1871-1937), teve certo dia a idéia de utilizar essas ínfimas partículas, menores que um átomo, para estudar os segredos do próprio átomo.
Isso lhe permitiu, de saída, uma descoberta sensacional: a de que, ao contrário do que se pensava, os minúsculos átomos são constituídos de imensos espaços vazios; a maior parte da massa atômica se concentra num núcleo central, de carga elétrica positiva; ao redor desse núcleo e a determinada distância dele ficam os elétrons, de carga negativa. Essa descoberta permitiu a Rutheford comparar os átomos ao sistema solar: o núcleo seria o Sol e os elétrons, movendo-se em órbitas precisas ao seu redor, seriam os planetas.
Esse modelo esbarrava, porém, numa séria dificuldade: é que, de acordo com a teoria clássica, ao se moverem ao redor do núcleo, os elétrons deveriam perder continuamente parte de sua energia, transformada em radiação eletromagnética. O resultado disso seria nada menos que uma tragédia: literalmente, o fim do mundo. Pois, à medida que fossem perdendo energia, os elétrons passariam a circular em órbitas cada vez mais próximas do núcleo, até finalmente chocar-se com ele. Assim, se a comparação de Rutherford fosse correta, todo átomo deveria desabar sobre si mesmo. Para felicidade geral do Universo, não é isso o que acontece: os elétrons mantêm-se em movimento sem nenhuma perda de energia.
O primeiro a querer explicar esse fenômeno que violava as leis da Física conhecida no começo do século foi o dinamarquês Niels Bohr (1885-1962) Após visitar Rutherford em Manchester, na Inglaterra, em 1912, Bohr conseguiu deduzir uma fórmula para determinar os diferentes níveis de energia que poderiam ser ocupados pelo elétron no mais simples dos átomos, o do hidrogênio, que tem um só próton no núcleo e um só elétron em volta dele.
Esses níveis seguem uma regra básica: a diferença entre um e outro é sempre um múltiplo inteiro de um valor constante; pode ser igual a duas, três ou sete vezes esse valor, mas jamais será igual à metade, um terço ou um sétimo, por exemplo (veja o quadro da página ao lado.
Isso significa que o elétron tem um comportamento surpreendente: quando o átomo recebe do exterior um acréscimo de energia - dado, por exemplo, por um raio de luz-, o elétron salta de um nível energético para outro mais alto, sem passar por nenhum espaço intermediário. É como se ele simplesmente desaparecesse de um nível para aparecer instantaneamente em outro nível de maior energia. Passado um tempo imprevisível, o elétron salta de volta ao nível anterior e o átomo reenvia ao exterior a energia excedente. Tudo isso intrigava os físicos: por que diabos, eles ficaram se perguntando, apenas determinados níveis de energia são permitidos aos elétrons e os níveis intermediários lhes são interditados?
Doze anos depois da descoberta de De Bohr, em 1924, um jovem físico e aristocrata francês, Louis de Broglie, que ganharia o prêmio Nobel de Física de 1929, propôs uma resposta audaciosa para o enigma. Einstein havia demonstrado que a luz, que sempre fora concebida como uma onda, se comportava às vezes como um jorro de partículas-ou fótons. De Broglie fez então o raciocínio inverso: se assim é, por que o elétron. concebido como uma partícula. não poderia se comportar como uma onda? Ele deduziu, então, uma fórmula simples para calcular o comprimento de onda do elétron quanto maior a quantidade de movimento do elétron, mais curto o seu comprimento de onda.
A hipótese de De Broglie fornecia uma explicação confortável para a pergunta que intrigava os físicos: por que os elétrons podiam ocupar apenas determinados níveis de energia no átomo de Bohr? Pois, se o elétron pode ser pensado como uma onda, ele se comporta, quando confinado no interior do átomo, como uma onda estacionária, isto é, que se propaga num meio limitado, como ocorre com as ondas produzidas na água de um tanque quando atiramos nela uma pedra.
Essa onda se propaga até as bordas do tanque e então, ao ser refletida, volta sobre si mesma. Se os picos da onda inicial e da onda refletida coincidem, eles se reforçam; porém, se os picos da onda inicial coincidem com os vales da onda refletida, eles se anulam. O mesmo ocorreria com o elétron confinado, pensou De Broglie: os níveis de energia permitidos no modelo de Bohr correspondem às regiões em que os picos se somam. Essas regiões ocorrem sempre em distâncias que correspondem a um número inteiro de vezes o comprimento de onda.
O que De Broglie formulou como pura hipótese matemática teve importantes conseqüências na investigação da estrutura do átomo. O físico austríaco Erwin Schrödinger (1887-1961) deduziu, a partir da hipótese de De Broglie, uma equação de onda que logo se transformaria numa das fórmulas mais usadas em toda a Física Schrödinger estava firmemente convencido de que a onda proposta por De Broglie para explicar o elétron não era apenas uma simples analogia matemática, mas uma realidade física.
Mais tarde, o físico alemão Max Born (1882-1970) deu uma passo além: demonstrou que a equação de Schrödinger poderia ser utilizada mesmo que o elétron fosse concebido como uma partícula. Bastava pensar a onda que ele descreve, não como uma onda material, como a que se forma no tanque de água, mas como uma onda de probabilidade: ela nos informaria em que pontos do espaço ao redor do núcleo seria possível encontrar o elétron e, mais ainda, em quais dos pontos possíveis a presença do elétron seria mais provável.
Pensar no elétron como uma onda, semelhante às que se formam na água, pode parecer uma idéia extremamente ousada e revolucionária. Entretanto na história da Física do século XX, seu papel foi essencialmente conservador. Ao formular sua célebre equação, o que Schrödinger tinha em mente era salvar as boas e velhas idéias da Física clássica, ameaçadas pelo insólito comportamento do elétron, que fazia coisas tão impensáveis quanto desaparecer de uma órbita para aparecer na órbita seguinte sem passar pelo espaço intermediário. E, pior ainda, fazia isso mais rápido que um relâmpago, contrariando assim a Teoria da Relatividade de Einstein, segundo a qual nenhum corpo pode se deslocar no Universo com velocidade superior à da luz.
Em 1925, o físico alemão Werner Heisenberg (1901-1976) havia proposto uma explicação do comportamento dos elétrons que evitava estabelecer qualquer analogia com os conceitos herdados de nosso mundo macroscópico, como partícula ou onda. A teoria de Heisenberg-logo seguida por Paul Dirac, na Inglaterra, e Max Born, na Alemanha-tinha, porém, um caráter altamente abstrato e exigia um tratamento matemático extremamente complicado.
Já a teoria apresentada por Schrödiner no ano seguinte, ao assumir como verdade física a hipótese da natureza ondulatória do elétron proposta por De Broglie, partia de idéias muito familiares aos cientistas da década de 20.
O próprio Schrödinger perceberia mais tarde que, embora partissem de pressupostos diferentes, as duas interpretações chegavam a equações absolutamente equivalentes. Era como se a realidade respondesse da mesma maneira, não importando a forma como a pergunta fosse feita. Conceitos como partículas e ondas são analogias talvez necessárias para se imaginar o mundo do átomo; mas é preciso ter claro que não são mais do que analogias. Como afirma o físico inglês John Gribbin, autor do livro À procura do gato de Schrödinger, "os átomos se parecem com átomos, e nada mais".
A dualidade da matéria, que ora se comporta como partícula ora como onda, cria situações inimagináveis ao nosso senso comum. Um efeito quase fantasmagórico é o que ocorre, por exemplo, na própria emissão daquelas partículas alfa descobertas por Rutherford. As partículas alfa estão longe de ter um nível de energia suficiente para ultrapassar o poderosíssimo campo de força que mantém os núcleos atômicos coesos: sua emissão, portanto, seria simplesmente impossível nos termos na Física clássica. Mas o caráter de onda de que também as partículas alfa são dotadas possibilita a passagem. O fenômeno, que ocorre com outras partículas subatômicas, como o elétron, é conhecido como efeito túnel e só pode ser explicado a partir da Mecânica Quântica.
Esses fatos todos parecem paradoxais porque nosso senso comum foi formado a partir de experiências cotidianas que não têm nada a ver com a realidade existente na escala do átomo. Conceitos como partícula e onda, tomados de empréstimo ao arsenal de idéias derivadas de experiências macroscópicas, permitem apenas uma explicação muito imperfeita do menos que microscópico mundo subatômico. A rigor, um elétron não é nem uma partícula nem uma onda, mas um outro nível de realidade, cujo comportamento às vezes pode ser associado ao de uma partícula e às vezes ao de uma onda.
A precariedade dos conhecimentos sobre o mundo subatômico não impede, porém, que tiremos bom proveito deles. Uma das aplicações tecnológicas do efeito túnel ocorre com o microscópio eletrônico, que substitui com grande vantagem os microscópios óticos. Nestes, os raios de luz são aproveitados através de lentes. Nos outros, feixes de elétrons são aproveitados através de campos eletromagnéticos. Como o comprimento das ondas eletrônicas é muito menor que o das ondas luminosas, o microscópio eletrônico acaba tendo um grau de definição muito maior que o dos microscópios óticos.
Será que a natureza ondulatória da matéria se restringe ao mundo subatômico? Aparentemente, não. Ela já foi verificada também em relação a átomos completos. em princípio, não é fora de propósito dizer que todos os corpos do Universo têm uma onda associada: isso vale para os seres vivos como para os planetas, estrelas, galáxias e o Universo inteiro. Por que então não se pode perceber a onda de um homem ou de um planeta? O motivo é simples. O comprimento de onda diminui à medida que a quantidade de movimento do corpo aumenta. E esta depende não apenas da velocidade do corpo, mas também de sua massa. Como a massa de um corpo humano para não falar na de um planeta -é fantasticamente superior à de um elétron, o comprimento da onda associada ao homem é tão pequeno que escapa à detecção mais acurada.

O gato morto-vivo

Pegue um gato, um frasco de veneno-cianureto de potássio, por exemplo-, um martelo, um contador Geiger usado para medir radiatividade e, por fim, uma certa quantidade de material radiativo. Coloque tudo isso numa caixa e feche. Agora imagine: quando o material radiativo emitir uma partícula alfa, o contador Geiger registrará o fato e acionará um mecanismo que fará o martelo quebrar o vidro de cianureto. Resultado: o gato morre. Não há nenhuma lei da Física que informe o momento exato em que a partícula vai ser emitida. Imagine então que a probabilidade do material emitir a partícula em qualquer momento seja exatamente 50 por cento. O que estará acontecendo com o gato?

Se a partícula foi emitida, o contador registrou, o martelo quebrou o frasco e o gato morreu. Se a partícula não foi emitida, nada disso aconteceu e o gato deve estar pensando: "Que mal eu fiz para me enfiarem dentro desta caixa?" Um cientista, do lado de fora, não tem como saber se ocorreu uma situação ou outra. Enquanto não abrir a caixa, não poderá dizer se o gato está vivo ou morto. É como se ele estivesse num absurdo estado intermediário entre a vida e a morte.

Essa experiência - evidentemente uma experiência mental- foi proposta pelo físico Schrödinger para ironizar a idéia de indeterminação que Impregna todos os poros da Mecânica Quântica. Para ele, era evidente que o gato ou estava vivo ou estava morto, embora o cientista não pudesse saber a verdade. Da mesma forma-pensava Schrödinger -, é evidente que o elétron ou seria uma partícula ou uma onda, não as duas coisas ao mesmo tempo. Infelizmente para o físico, o mundo das partículas sub atômicas provou ser bem menos compreensível pelo senso comum que o mundo dos gatos. As sucessivas interpretações da Mecânica Quântica viriam mostrar, com clareza cada vez maior, que a dualidade partícula-onda e todo o indeterminismo da nova teoria decorrem não da ignorância do observador, como na experiência do gato, mas da própria natureza dos fenômenos observados.



A luz em pacotes

A mecânica Quântica só se desenvolveu graças a uma descoberta-chave feita em 1900 pelo físico alemão Max Planck (1858-1947). Ele constatou que qualquer tipo de radiação - a luz, por exemplo-só pode ser emitida, transmitida e absorvida em quantidades discretas de energia. Isso significa que o fluxo de energia é formado por uma quantidade de pequenos pacotes indivisíveis de energia - os quanta (plural de quantum). A energia de cada quantum é igual à freqüência da radiação multiplicada por um valor constante, chamado constante de Planck e representado nas fórmulas pela letra h.

A descoberta de Planck permitiu que em 1905 Albert Einstein explicasse o efeito fotoelétrico, que intrigava os físicos da época. Esse efeito ocorre quando uma placa de metal recebe luz e emite elétrons, como se a força da luz expulsasse parte dos elétrons existentes nos átomos de metal. Einstein mostrou que o fenômeno só podia ser explicado se se pensasse a luz não como uma onda contínua, como a considerava a Física clássica, mas como um jorro de partículas-os fótons-, o que estava de acordo com a natureza quântica da energia descoberta por Planck.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Emoção em Moléculas - Pensamento positivo

EMOÇÃO EM MOLÉCULAS - Pensamento Positivo



Três pessoas ficam presas num elevador. Uma delas tem um chilique. A segunda parece sob controle, mas sofre um ataque de ansiedade logo após ser resgatada. A terceira permanece calma durante todo o episódio. A diferença no comportamento delas é a avaliação interna que fazem desse evento estressante. Segundo estudos sobre a relação entre psicologia e biologia, como os feitos pelo Instituto de Medicina para o Corpo-Mente da Universidade Harvard, o problema aí não é o estresse, mas a resposta que se dá a ele.

A medicina "corpo-mente" ensina que a chave está na resposta de relaxamento. O estímulo de determinadas emoções pode inundar as células de hormônios e neurotransmissores que permitem relaxar diante de situações estressantes. Esse é um dos pilares da biopsicologia, que alia abordagens científicas, como a psiconeuroimunologia, a conceitos orientais, como a medicina ayurvédica. "Está tudo em nossas mentes", diz a antropóloga, doutora em psicologia e monja Susan Andrews, autora de Stress a Seu Favor (Ágora). Desde 1992 ela vive no Parque Ecológico Visão Futuro, ecovila fundada por ela em Porangaba, São Paulo.

O que é biopsicologia, afinal?

É um termo usado por cientistas para definir o estudo científico da biologia do comportamento e processos mentais. Refere-se ao inextricável relacionamento entre psicologia e biologia, que é chamado de medicina corpo-mente, ou psiconeuroimunologia. É a confirmação do que diz a neurologista Candace Pert: cada mudança de humor é acompanhada por uma cachoeira de "moléculas de emoção" - hormônios e neurotransmissores - que flui através do corpo, afetando todas as células. Cada célula humana contém cerca de 1 milhão de receptores para receber essas substâncias bioquímicas. Assim, quando estamos tristes, nosso fígado está triste, nossa pele está triste.

Como essas moléculas nos afetam?

Praticamente tudo no corpo é regulado pelos hormônios. Eles estão entre os mais poderosos agentes biológicos, influenciando, por exemplo, nossa resposta ao estresse. Cardiologistas pensavam que as pessoas mais propensas a sofrer ataque cardíaco - as com personalidade "tipo A" - fossem apressadas, altamente competitivas e hostis. Recentemente percebeu-se que o problema não é tanto o estilo de vida acelerado ou a ambição compulsiva, mas a hostilidade. As pessoas que respondem a chefes prepotentes ou engarrafamentos no trânsito com irritabilidade - que vivem dizendo "Ai, que saco!" - secretam até 40 vezes mais cortisol das glândulas supra-renais.

Qual é o problema com o cortisol?

Em excesso, é tóxico para o organismo. Assim, pessoas do "tipo A" são cinco vezes mais propensas a sofrer doenças e morrer cedo do que as "tipo B", que têm mais cabeça fria.

Qual a influência dos hormônios de estresse sobre os processos mentais?

A secreção excessiva de cortisol também afeta a nossa cognição - literalmente mata as células cerebrais no hipocampo, a região do cérebro responsável pela memória. É por isso que mais e mais pessoas estão perdendo a memória - esquecendo onde puseram as chaves do carro, ou fazendo listas para lembrar o que têm de fazer, e depois esquecendo onde deixaram as listas. Pesquisas na Universidade de Michigan demonstraram que o declínio da memória entre jovens de 30 a 40 anos hoje em dia é o mesmo dos idosos de 70 a 80 anos. Estamos nos tornando como o paciente que se queixou ao seu médico: "Doutor, estou perdendo minha memória!" O doutor então perguntou: "Perdendo sua memória? Há quanto tempo?" O paciente respondeu: "Há quanto tempo o quê, doutor?"

A depressão tem base biológica?

Cada emoção tem um componente biológico. Quando vemos uma pessoa deprimida numa cadeira, quase incapaz de se mover, tendemos a pensar que ela está sem energia. Pelo contrário, ela está como uma mola retesada: secretando desenfreadamente elevados níveis de cortisol, sinal de que está lutando uma exaustiva batalha mental - tudo dentro de si. Como a escola freudiana descreve, depressão é "agressão voltada para dentro".

É possível retardar o envelhecimento com o uso de hormônios?

Estrelas de Hollywood tomam hormônios para manter a vitalidade. Mas, como endocrinologistas advertem, não existe almoço grátis. O aumento não natural de hormônios pode produzir danosos efeitos colaterais. Temos dentro de nós uma sofisticada farmacopéia. Podemos naturalmente estimular o corpo a melhorar sua produção de hormônios, sem risco para a saúde.

Como podemos produzir hormônios intencionalmente?

O objetivo da biopsicologia é otimizar a secreção hormonal. Assim como as emoções negativas são acompanhadas por uma sopa bioquímica tóxica, as positivas mobilizam um prazeroso coquetel de hormônios e neurotransmissores benéficos para a saúde. Estudos demonstram que um dos mais importantes fatores na saúde e longevidade não é exercício, alimentação ou estilo de vida, mas nossa resposta à pergunta: "Você tem alguém na sua vida que realmente o ame? E quem você realmente ame?" Aqueles que respondem "não" têm risco até cinco vezes maior de morte prematura que os que respondem "sim". A mensagem dessas pesquisas: o amor realmente conta.

Qual molécula de emoção está ligada ao amor e à afeição?

Uma é a ocitocina, estimulada em todos durante relações afetivas e nas mulheres durante a amamentação. Ela tem poderosos efeitos antiestresse: reduz o nível de cortisol e a pressão arterial. Por isso, o apoio social é tão importante na resistência ao estresse e à saúde. Mas estamos nos tornando cada vez mais desconectados. Sofremos do que psicólogos chamam de "síndrome das metrópoles": uma sensação de estar sozinho em meio à multidão. A tecnologia acabou com distâncias, mas foi incapaz de nos aproximar. Como diz o Dalai Lama, "compaixão e amor não são supérfluos. São fundamentais para a sobrevivência da nossa espécie".

E como se faz isso, na prática?

Nossos corpos e mentes são como ruas de mão dupla. Podemos afetar o corpo através da mente, e vice-versa. Somente abordagens mentais ou cognitivas serão ineficazes se o sistema endócrino estiver um pandemônio. Há métodos antigos para mudar nossa bioquímica e equilibrar emoções. Fazem parte das técnicas que ensinamos no Programa Transforma do Instituto Visão Futuro, que equilibram as glândulas endócrinas e transformam sentimentos negativos - raiva, ódio, medo - em atitudes positivas, como otimismo, entusiasmo e compaixão. Inclui posturas físicas que massageiam glândulas endócrinas, visualizações, técnicas de respiração, relaxamento, meditação e nutrição. Estamos treinando facilitadores pelo Brasil para ensinar técnicas que chamamos de "Spa em Casa" - 15 minutos por dia de otimização hormonal que transforma a vida das pessoas.

Que conselho prático a biopsicologia nos dá para o cotidiano?
Faça breves pausas durante o dia para respirar lenta e profundamente através do diafragma. Faça isso também quando lidar com pessoas irritantes ou negativas e se esforce para abrir o coração e manter a mente positiva. Lembre-se: simplesmente olhar para a foto de uma pessoa que você ama ajuda a diminuir os hormônios do estresse. Coloque em prática o que um estudo feito por uma seguradora americana comprovou: quando uma mulher beija seu marido antes que ele parta para o trabalho de manhã, a expectativa de vida dele aumenta cinco anos. A dela também.

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sábado, 13 de novembro de 2010

Vidro - Material Incrivel

Vidro - Material Incrivel



No século 16, as pinturas passaram a retratar o mundo de maneira fiel. Em grande parte da Europa, e principalmente na Itália, quadros até então cheios de símbolos e imagens achatadas deram lugar a figuras reais com informações confiáveis sobre espaço, luminosidade e perspectiva. Foi uma revolução para a cultura humana que deu origem ao Renascimento e precipitou o desmoronamento da ordem social medieval, mas por trás dessa enorme ruptura histórica está uma invenção banal: o espelho. Um dos mestres da época, Leonardo da Vinci, sempre comparava a figura da tela com aquela refletida em um vidro metalizado. Esse macete se espalhou por diversos artistas e se cristalizou em um movimento que valorizava o real e o humano em vez do divino. Graças ao vidro, o Renascimento mudou o mundo.

Não foi a primeira vez que o vidro causou revoluções. Sem ele, a trajetória da humanidade - e especialmente a do Ocidente - seria totalmente diferente. "Algumas substâncias, como madeira, bambu, pedra e argila, podem substituir esse material em algumas situações. Mas o vidro combina diversos usos práticos com a capacidade de aumentar nosso sentido mais potente, a visão, e nosso órgão mais formidável, o cérebro", dizem o antropólogo Alan Macfarlane e o historiador Gerry Martin no livro Glass - A World History ("Vidro - Uma História do Mundo", sem versão em português).

Pense na vida sem lâmpadas. Se o vidro não existisse, seria impossível produzir luz artificial, tornando tochas e velas indispensáveis. Não haveria espelhos, aparelhos de TV, computadores, rádios, máquinas fotográficas, óculos e lentes de contato. Carros, trens, helicópteros e aviões não poderiam circular, pois as janelas protegem pilotos e passageiros sem atrapalhar sua visão. Talvez esses veículos não fossem nem inventados. Se você gosta das tecnologias e confortos do mundo moderno, agradeça ao vidro mais perto de você. Grande parte do nosso conhecimento do Universo precisou de lentes e lâminas. Os microscópios possibilitaram o desenvolvimento da medicina, a criação de remédios, os estudos sobre vírus e bactérias e a descoberta do DNA. Nos telescópios, as mesmas lentes foram responsáveis pelo entendimento do espaço, destacando planetas e galáxias invisíveis a olho nu.

A humanidade está mergulhada na utilização do vidro, essencial à arte, à tecnologia, à ciência e ao nosso bem-estar. Usamos esse material com tanta freqüência em nosso dia-a-dia que nem o percebemos - ele se torna, digamos, invisível. Para ter noção de sua grandeza é necessário deixar de olhar o que está atrás de cada lâmina e focar toda sua atenção nela mesma, por mais difícil que isso possa parecer.

Fogueira das novidades
É impressionante que tanta coisa tenha sido feita com um material que, em última análise, não passa de areia. Esquente os grãos a mais de mil graus centígrados e eles viram um líquido que, ao esfriar, se solidifica como vidro. Dependendo da fôrma em que você a colocar, essa sopa de areia se transforma em coisas tão diferentes quanto um vaso, uns óculos ou uma janela. Essa receita básica se sofisticou com o tempo e passou a incluir outros elementos, dando origem a milhares de tipos de vidro. Para aumentar a resistência, mudar de cor ou facilitar a produção, passou-se a acrescentar substâncias como soda cáustica, urânio, cal, alumínio ou chumbo. No entanto, algumas dessas impurezas correm o risco de escurecer o vidro - apenas o material em estado puro é transparente.

Ninguém sabe direito como é que a humanidade descobriu essa nova substância. Uma das hipóteses mais aceitas fala que foi há 4 mil anos, em fogueiras feitas sobre solo arenoso que, queimado, dava origem ao líquido. Nas regiões onde a descoberta aconteceu - pelas redondezas do Oriente Médio, provavelmente Egito e Mesopotâmia - a intenção dos descobridores obviamente não era estudar microorganismos ou observar planetas. Eles o usavam principalmente para criar objetos decorativos, como vasos e potes. Mesmo assim, os objetos envidraçados viraram moda e se espalharam por todo o Mediterrâneo entre 1500 e 100 a.C. Foi nessa época que muitos novos objetos e técnicas de fabricação de vidro se desenvolveram.

Por volta de 2 d.C., a história do vidro cruzou com a de um personagem histórico mais conhecido: o Império Romano. Viciados nesse material, eles abusavam dele em vitrais, lentes, espelhos, na decoração de interiores e, é claro, em taças transparentes para beber o tão apreciado vinho. Os romanos criaram a base para o mundo envidraçado em que vivemos hoje e espalharam a matéria por toda a Europa.

O Ocidente passou a viver entre belos potes, vasos e janelas, mas, convenhamos, essas não são coisas capazes de mudar o rumo de civilizações. Quando o vidro iria mostrar a que veio? Uma primeira revolução aconteceu em 1285, no norte da Itália, época em que surgiram os primeiros óculos da história. As milhares de pessoas que dependem deles para ler este texto sabem que essa novidade sem dúvida mudou o mundo. Não demorou muito: ela logo se espalhou pela Europa e foi capaz de prolongar a vida profissional de trabalhadores em 15 anos ou mais. Uma prova do poder de fogo do apetrecho veio em 1445, com a invenção da prensa de Gutenberg: as publicações passaram a ter um padrão pequeno de letras e a venda de óculos explodiu. Era só a primeira revolução feita pelo vidro.

Novos mundos
Nem todas as alternativas de vidro disponíveis hoje existiam há centenas de anos. Mesmo com recursos tão limitados, cientistas de diversas épocas viram no material uma ferramenta bastante útil para entender as leis da natureza. No final do século 16, havia um clima de curiosidade, de busca por respostas, uma crença de que leis da existência se escondiam em um universo invisível e o papel do homem era descobri-las. Para testar as novas idéias que surgiram, era preciso abrir as portas desses mundos escondidos, e a chave estava nos vidros - fossem eles de microscópios, telescópios ou simples frascos. Foi o berço da ciência como a conhecemos - o estudo do mundo por meio do tripé verificação, repetição e possibilidade de contestação. Tudo naquele estilo de quem só acredita vendo.

O vidro é essencial nos laboratórios. É fácil de limpar, selar, moldar, pode ser utilizado como isolante, condutor, é resistente a altas temperaturas e agüenta fortes pressões, como aquelas criadas pelo vácuo. E, é claro, é transparente. Outra vantagem no campo da ciência é a realização de experiências em frascos de vidro. "Salvo raras exceções, este material interfere pouco nas reações químicas, porque a força de união entre seus átomos é muito alta. Portanto, não contamina o que está dentro dele", diz o físico Walter Maigon Pontuschka, da USP.

Em meados do século 17, cientistas de várias partes da Europa começaram a combinar e aperfeiçoar lentes de aumento até chegar a algo bem parecido com os microscópios ópticos de hoje. Em 1665, na Inglaterra, o cientista Robert Hooke utilizou um desses instrumentos para observar pequenas cavidades em um pedaço de cortiça. Deu a elas o nome de células. Também analisou fósseis microscópicos a ponto de ter alguns dos primeiros indícios de que a evolução existia. Na mesma época, na Holanda, Antonie von Leeuwenhoek descobria bactérias e protozoários em qualquer objeto que colocasse embaixo de suas lentes. Esses instrumentos chegaram com poucas modificações até o século 20, quando deram origem a microscópios de elétrons e de tunelamento, capazes de estudar objetos pequenos como átomos.

A revolução causada pelo microscópio pode ser comparada às mudanças ocorridas com a invenção do telescópio, que também ocorreu no início do século 17. Trazer o distante para perto e revelar astros até então invisíveis criou a confiança de que o Universo possuía muitos fenômenos e verdades que se mal conheciam. A principal conseqüência dessa novidade, assim como daquela que revelou o mundo microscópico, foi a transformação dos conceitos e a crença de que nem sempre o óbvio é necessariamente o real.

Vida sem vidro
Mas será que muitas dessas evoluções não teriam ocorrido mesmo que nunca tivéssemos descoberto o vidro? Um bom retrato da importância do material está nos países que até o conheciam, mas não levavam seu uso a sério. No século 17, acessórios feitos com essa matéria foram levados para civilizações islâmicas, Índia, Japão e China, mas não fizeram sucesso. Isso porque nesses locais valorizavam-se muito os objetos de argila e porcelana, produzidos com arte havia gerações. "Os orientais têm curiosidade sobre vidros e cristais europeus, mas não sentem falta deles, pois acreditam que sua porcelana seja de ótima qualidade. Ela agüenta líquidos com altas temperaturas, não transmite para as mãos o calor dos chás, tem muito brilho e é bastante resistente", escreveu Du Halde, um jesuíta francês que visitou a China no século 18.

Com tantas qualidades, mudar para quê? A resposta só veio tempos depois, quando a diferença entre regiões que utilizavam e não utilizavam o vidro pôde ser observada. Quando os jesuítas foram para a China, no século 17, serviram-se do material para impressionar os habitantes locais com seus conhecimentos sobre óptica, geometria e astronomia. Somente um século depois da chegada dos missionários, os orientais descobriram a importância de estudos que envolviam objetos transparentes. Com os japoneses a história foi idêntica. No século 18, eles redescobriram a matéria esquecida durante séculos e foram à loucura com os microscópios, ou mikorosukopyumu. "Cristais de sal têm forma hexagonal, enquanto a farinha é triangular. O mofo se parece com cogumelos e saquê é como água fervendo, cheio de bolhas em movimento", descreveu um japonês maravilhado com a visão do mundo micro, então já bastante explorado pelos europeus.

A falta de óculos também pode ter influenciado a cultura desses dois últimos países, onde os habitantes têm dificuldades para enxergar longas distâncias, principalmente por uma questão genética. No caso do Japão, essa característica deu origem ao kabuki, teatro que enfatiza a interpretação corporal (o rosto dos atores é pintado com expressões fixas), algo fácil de ser identificado de longe. Já na China, a pintura típica tem seu fundo sempre borrado, sem definição exata, como a visão de um míope.
Essas histórias ficam ainda mais impressionantes quando lembramos que, até a Idade Média, o mundo árabe e o asiático estavam muito à frente da atrasada Europa. O livro de Macfarlane e Martin dá a entender que o vidro tenha muito da responsabilidade pela ultrapassagem tecnológica do Ocidente sobre o Oriente - um fenômeno histórico que se prolonga até hoje. O final da história é que, depois de usar o vidro para conquistar o mundo, o Ocidente criou formas de substituí-lo em muitos casos por outros materiais, como o plástico. Ê, ingratidão!

terça-feira, 9 de novembro de 2010

De que somos feitos ?

DE QUE SOMOS FEITOS ?



Se um dia alguém lhe pedir para construir um planeta como a Terra, vai aqui uma dica: o segredo de toda receita, como qualquer químico ou dona-de-casa pode lhe dizer, é escolher bem os ingredientes. Cumpra direitinho esse estágio e o resto vai ser só aquele trabalho besta de bater a massa e deixá-la descansar por alguns bilhões de anos. O esforço de construir um planeta fica restrito a apenas uma pergunta: "Que diabos de ingredientes eu uso para cozinhar a Terra?"

A resposta depende da época em que você nasceu. O primeiro a tentar solucionar o problema foi o filósofo grego Empédocles (490 a 430 a.C.). Para ele, era possível construir tudo o que existe na Terra com apenas quatro elementos: ar, água, fogo e terra. De acordo com a concentração de cada um na mistura, dava para fazer coisas tão diferentes como a rocha, a madeira, o vapor ou o barro. Para haver o equilíbrio e a vida continuar a existir, tais substâncias estariam sujeitas à ação de dois princípios: amor e ódio. Os dois se comportariam como as forças responsáveis por organizar e harmonizar as quatro partes essenciais, ora misturando, ora separando cada uma delas. Pronto, estava explicado o mundo.

Era uma idéia tão engenhosa que foi aceita pelas mentes mais afiadas da Grécia, entre elas a de Aristóteles (384 a 322 a.C.), que aprimorou o sistema. Para ele, amor e ódio não só misturavam os elementos como podiam transformar um em outro. Cada um dos ingredientes básicos tinha uma temperatura e uma umidade (veja ilustração ao lado) e era só mudar essas propriedades que os elementos se transformavam. Esfriando o ar, por exemplo, consegue-se água; molhando o fogo surge o ar, e assim por diante. Essa possibilidade deu origem ao sonho de encontrar a "pedra filosofal", capaz de fazer qualquer metal virar ouro. Os chamados alquimistas se esforçavam, sempre sem sucesso, para chegar lá.

Essa história - e como a química evoluiu a partir dela - é o tema do livro The Ingredients ("Os Ingredientes", ainda não traduzido), do jornalista inglês Philip Ball. Hoje se sabe que as experiências de Aristóteles nada mais faziam que trocar o estado físico da matéria. Terra era o nome dado para todos os sólidos (desde a areia até as lanças de metal), ar batizava os gases e água identificava os líquidos. Era só resfriar o vapor e transformá-lo em líquido que ele virava outro "elemento" - mesmo que tudo não passasse de água. O problema era o fogo, um fenômeno esquisito em que partículas ficavam se movimentando, excitadas pelo calor. Os antigos pensadores perceberam essa particularidade e conviveram com ela. Mas nunca a entenderam.

BRINCANDO COM FOGO
Os mistérios do fogo tiveram que esperar até o século 17 para ganharem uma explicação - mesmo assim, bastante peculiar. Nessa época, imaginou-se que as chamas não seriam um elemento em si, mas sim uma essência inflamável contida em praticamente todas as substâncias - chamada de flogístico -, que poderia ser liberada com o fornecimento de calor. Essa teoria mudou para sempre a história da química, principalmente porque nem todos concordaram em diminuir para três a lista de ingredientes no mundo. Um dos céticos era o pastor inglês Joseph Priestley (1733-1804). Ele descobriu que, com o aquecimento do óxido de mercúrio, havia liberação de um gás especial (na verdade, oxigênio) em cuja presença era possível produzir fogo com chamas muito mais intensas. Segundo a ciência da época, isso era um problema: o fogo estava aumentando quando o flogístico já havia sido consumido. O pastor denominou esse no gás de "ar sem flogístico" e, em estudos seguintes, notou que ele possuía propriedades milagrosas, capazes até mesmo de prolongar a vida. Um ratinho, colocado em uma caixa lacrada cheia do intrigante gás, sobrevivia por mais tempo que outro roedor envolto em ar comum.

Quatro anos depois, em 1778,0 químico francês Antoine Lavoisier interpretou essas observações como indícios de que esse gás era um novo elemento e batizou-o de oxigênio. A teoria do flogístico veio abaixo. Até então, acreditava-se que uma substância queimando dentro de um recipiente fechado se apagasse uma hora porque o ar ficava saturado de flogístico. Já a nova teoria propunha que o oxigênio era consumido durante a combustão, de modo que a queima terminava quando o ar ficava pobre desse gás. A compreensão mais exata do processo de queima permitiu ainda a Lavoisier identificar os três estados físicos da matéria: sólido, líquido e gasoso. Com isso, foi possível distinguir as variações de cada substância. Era o fim definitivo das confusões que descabelaram os velhos pesquisadores - água, gelo e vapor passaram a ser simplesmente água.

Daí para uma nova definição dos ingredientes do Universo foi um pulo. "Elemento é qualquer substância que não pode ser dividida em componentes mais simples a partir de reações químicas", afirmou Lavoisier, que listou 33 deles. Nem todos estavam corretos - constavam da lista a luz, o calor e a lima, hoje conhecida como óxido de cálcio, um composto resultante da combinação entre cálcio e oxigênio.

A partir desse momento, tudo era uma questão de saber se o elemento se apresentava em sua versão mais simples. Se ele pudesse ser dividido em duas coisas diferentes, é porque não era ainda o ingrediente básico. Em 1800, já se conheciam mais de 36 elementos e a tendência era que essa lista aumentasse rapidamente. Conscientes disso, os químicos passaram a ter a preocupação de criar uma maneira fácil de representar e organizar esse monte de substâncias.

O pontapé inicial foi dado por John Dalton. Ele comparou a mesma quantidade dos 36 elementos e viu quais eram mais pesados. Dividiu então os elementos tendo por base o peso, associando um desenho para cada um deles. O resultado foi um painel confuso, formado por três dúzias de símbolos esféricos. Uma solução mais prática veio do sueco Jons Jacob Berzelius em 1811. Ele propôs que cada elemento fosse representado pela inicial do nome em latim e, em caso de coincidência, pelas duas primeiras letras. Assim, oxigênio virou O e carbono passou a ser C, enquanto o cobalto tomou-se Co.

O próximo passo seria separar os elementos em grupos, de acordo com alguns critérios. O primeiro deles, proposto por Lavoisier, era dividir as substâncias em gases, não-metais, metais e "terrenos", que incluíam a lima. Dezenas de outras tentativas se seguiram até a elaboração do modelo mais aceitável, que se tornaria a base para a tabela periódica atual. O pai dessa nova disposição foi o russo Dmitri Mendeleyev (1834-1907). Ele bolou um arranjo em que os elementos apareciam identificados pelo esquema de Berzelius e dispostos em colunas verticais (a disposição horizontal era mais comum na época). Também estavam divididos por propriedades físicas e químicas e em ordem crescente de peso. Mendeleyev teve até o cuidado de deixar lacunas na tabela, para elementos a serem descobertos (e que de fato o foram). O resultado final foi a primeira versão da tabela que aparece acima.

Essa representação ganhou força com a descoberta de partículas ainda menores que os átomos. Descobriram-se prótons - partículas de carga positiva no núcleo do átomo - e nêutrons - sem carga elétrica mas capazes de aumentar o peso do núcleo. Por fim, existem pedaços minúsculos de matéria girando em volta disso tudo, os elétrons, que têm carga negativa. A diferença entre os elementos está no número de prótons que possuem. Com essa descoberta, pode-se contar o número de ingredientes do Universo: 92. Junte todos os itens da tabela acima até chegar ao urânio e você terá material para construir um planetinha bacana.

FAZENDO OURO
Não era só na química primitiva de Aristóteles que um elemento podia se transformar em outro. Milênios depois, os cientistas observaram em laboratório uma série de metamorfoses misteriosas. Um punhado de átomos de tório, por exemplo, podia começar a emitir outro elemento, o radônio, mesmo que este não estivesse ali originalmente. Como pode?

Para chegar à resposta, os cientistas precisaram conhecer as misteriosas substâncias emitidas por alguns elementos (que hoje conhecemos como radiativos"). Essas partículas - chamadas de alfa e beta - conseguem aumentar ou diminuir o número de prótons no átomo. Aprenda a lidar com elas e será possível transformar um elemento em outro. O tórío (com 90 prótons), por exemplo, emite partículas alfa até ficar com apenas 86 prótons e, assim, virar radônio.

A descoberta reviveu o sonho dos alquimistas - produzir ouro a partir de metais comuns. Os químicos tentaram até conseguir, o que ocorreu em 1941, ao extraírem um próton do núcleo de mercúrio e transformarem o metal em ouro. Só que a experiência não era tão simples, o que acabou com o sonho de riqueza instantânea desses desbravadores. A tecnologia permitia, no entanto, aumentar a tabela. Os cientistas conheciam agora os ingredientes do Universo, mas, como qualquer químico ou dona-de-casa pode lhe dizer, ater-se à receita original é coisa de principiante. A lista, na verdade, não tem fim: sempre é possível colocar um próton a mais no núcleo e conseguir um novo componente da tabela periódica. Um átomo de urânio com um próton a mais vira um netúnio, uma substância que ninguém nunca havia visto, mas que poderia ser feita em laboratório. Desde então, o grupo formado por elementos artificiais não parou de crescer, em parte graças à variedade de reações nucleares que os cientistas descobriram.

Foi possível, por exemplo, somar dois átomos e criar os maiores elementos que aparecem na tabela periódica, alguns com mais de 110 prótons. Não é uma tarefa fácil. Essa reação, a fusão de átomos, envolve energias altíssimas e técnicas que ainda precisam ser aprimoradas. Para piorar, os átomos mais pesados emitem radiação e se transformam em outros mais leves em milésimos de segundo, dificultando a observação. Encontrar um jeito fácil de somar os átomos, no entanto, é um dos grandes sonhos dos cientistas. Esse truque é tão poderoso que está nele a fonte de energia do Sol, onde 600 bilhões de toneladas de hidrogênio são fundidas a cada segundo e transformadas em hélio, em uma temperatura que alcança 10 milhões de graus centígrados.
Até hoje, os químicos conseguiram produzir e observar 116 elementos. E provável que, no futuro, essas pesquisas levem não só a mais substâncias como a uma compreensão melhor a respeito daquelas que já conhecemos. Não é pouca coisa. O nível atômico abriga as maiores energias que o homem conhece e, por conseqüência, as maiores oportunidades. Se desvendarmos os quebra-cabeças escondidos na tabela periódica, poderemos até, quem sabe, descobrir uma receita para construir novos planetas. Mas não é preciso sonhar tanto: mudar a Terra já seria um tremendo avanço.