terça-feira, 20 de novembro de 2018

Clara dos Anjos - Parte 3 de 3 - Lima Barreto

Clara dos Anjos - Parte 3 de 3 - Lima Barreto




Dirigiu-se para o quarto da filha, que tinha o queixo amarrado num lenço dobrado, e perguntou:
-- Que houve, Clarinha?
-- Nada. Tenho aqui um dente furado, que me dói de quando em quando. Hoje 
doeu-me mais fortemente, gemi e tive que me deitar. Felizmente o remédio que Dona 
Margarida me deu, fez passar a dor, mas tenho o queixo inchado...



-- Não é nada?
-- Penso que sim -- disse Clara, e acrescentou: -- olhe, papai, não pude passar a limpo 
a música.
-- Não faz mal, eu mesmo passo.
Depois ajuntou, voltando-se para a mulher:
-- É preciso levar essa menina ao dentista, Engrácia, enquanto está no começo.
-- Dentistas! Deus me livre! 
-- Por quê, mulher de Deus?
-- Porque é casa de perdição, Quincas.
-- Qual perdição, qual nada. Perde-se quem quer ou quem já está perdido.
-- Você que a leve, Quincas. Não posso sair todo o dia... Você sabe que não posso 
andar muito...
-- Eu não posso, pois tenho de ir para o serviço.
Pôs-se a pensar, olhando a filha deitada, com os doces olhos a interrogar o pai, 
quando lhe surgiu um pensamento:
-- Vou chamar o Meneses. Ele não é formado, mas tem prática e pode certamente 
fazer o que se trata. Que acha, Engrácia?
-- Acho bom, se ele vier em casa.
-- Ele virá, pela manhã. Almoçará com vocês e dar-lhe-ei alguma coisa.   
-- Você quer, Clara? -- perguntou o pai.
-- Aceito e acho bom. Não é preciso sair e mamãe não se incomoda.
Foi assim que Meneses entrou a tratar dos dentes de Clara, fato de que tão 
oportunamente Cassi tivera notícias pelo doutor Praxedes, no Méier. Para o velho doutor 
Meneses foi uma salvação, porquanto, embora trabalhasse, não era pago ou o era mal e 
irregularmente. Com o carteiro, as coisas se passavam de outra forma; e, além disso, almoçaria 
todo o dia -- vantagem que não era de desprezar.
Sabendo que Meneses estava todos os dias com Clara, Cassi, que havia resolvido pôr 
cerco à rapariga, tratou de aproveitar o estado de miséria, de abatimento moral em que estava 
o velho dentista, para realizar os seus inconfessáveis fins. Encomendou-lhe aqueles versos que 
deviam ser feitos por Flores e deu-lhe dinheiro, já prevendo que Meneses gastá-lo-ia e não 
obteria os versos. Tudo isto aconteceu; mas Meneses, quando, no dia seguinte, se lembrou da 
recusa de Flores e de ter gasto o dinheiro, não achou outro alvitre senão ele mesmo fazer os 
versos. Ficou o dia inteiro a martelar, a riscar, a emendar e, ao fim do domingo, tinha feito 
algumas quadras com mais ou menos sentido. Nunca, a bem dizer, fizera versos: mas, tendo 
corrido montes e vales, lidara com poetas e tinha o ouvido educado. De resto, escolhera o 
metro popular, a quadra de sete sílabas; e tanto fez que, pela tardinha, a poesia estava pronta, e 
o pobre velho ficou muito contente consigo mesmo, como se tivesse feito obra de vulto. Bebeu 
bastante e dormiu satisfeito. Havia cumprido a sua palavra de qualquer forma. Se os versos 
não eram de Leonardo Flores, eram dele. Não seriam tão bons; mas, pelo menos, desculpariam 
o gasto dos cinco mil-réis, que lhe remordia a consciência.
Na segunda-feira, à noite, depois de ter andado por toda a parte, com a sua velha 
mala de ferros de cirurgião-dentista, Meneses foi se postar no botequim do Fagundes. 
Sentou-se, como de hábito, na última mesa, aos fundos, encostada à parede, com um jornal 
debaixo dos olhos e um cálice de parati na frente. Ele bebia aos goles, à vista de todos, sem 
vexame algum. Fazia-lhe mal, como mal faz a todo mundo; mas era solicitado a beber para se 


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atordoar, para não se recordar, para não estar só com o seu passado, para afugentar o terror que 
a vida lhe inspirava, na miséria, quase indigência em que se achava, naquela idade avançada de 
mais de setenta anos, alquebrado, doente, sem uma amizade forte, sem um parente que o 
amparasse, sem uma pensão qualquer.
Cassi foi encontrá-lo engolfado na leitura do jornal:
-- Pensei -- disse ao sentar-se -- que o doutor se havia esquecido.
Meneses, descansando o modesto pince-nez em cima da mesa, onde já havia posto o 
jornal, respondeu:
-- Qual o quê! Sou homem de palavra... Demais, o senhor me havia dado o dinheiro, 
e, assim, o trato ficava mais sagrado.
Cassi tinha uma grande dificuldade em ser amável, tornar a entonação de voz 
conveniente, adaptar o olhar a ela, ajeitar adrede os músculos da face...
Não era capaz disso quando sincero, que fará quando falso! Todo ele era rude, 
metálico, grosseiro e áspero. Enfim, fez o que pôde e disse:
-- Por isso, não, doutor! Eu não me lembrava de tal fato! Aquilo foi para uns 
beberiques... Arranjou?
-- Arranjei; mas não com o Leonardo.
-- Ele não quis ou... 
-- Não; estava bom. Como já lhe disse em certa ocasião, Flores é por demais 
orgulhoso, quando se trata de versos dele; e, ao falar-lhe no "negócio", deitou-me um discurso 
enorme, dizendo que era isto e aquilo, tinha feito tais e quais coisas e, por fim, que não vendia 
versos.
-- Nem dados?
-- Não lhe propus; mas estou certo que não daria. Pelo que disse, os versos que lhe 
saíam da cachola eram dele e só dele.
-- E com quem arranjou?
-- Fi-los, eu mesmo, Não serão...
-- Vamos ver, doutor.
Meneses puxou, de dentro da algibeira do interior do fraque cinzento, um volumoso 
embrulho de papéis sebosos, procurou o que continha os versos, pôs o pince-nez e disse:
-- Vou lê-los, para o senhor compreender melhor. A minha letra é muito ruim.
-- Leia, doutor.
Meneses concertou os óculos, experimentou uma melhor posição para receber a luz e 
começou:

   A minha Querida pena
   Nas grades de uma prisão, 
   Mas o Amor lhe ordena
   Sossego no coração.

O velho dentista ambulante, afinal, acabou e olhou interrogativamente o menestrel. 
Tinha este tomado um ar grotesco de entendido e olhava vago, simulando que ajustava 
pensamentos. Após ter Meneses perguntado o que achava dos versos, o manhoso violeiro 
disse:
-- Não era bem isto que eu queria. Os versos, porém, não estão maus, antes são bons. 
Serve até para modinha... O doutor não sabe quem faça música para modinhas?
-- Conheço o Joaquim dos Anjos.          
-- Ah! É verdade! Como há de ser? -- perguntou Cassi, simulando embaraço.
-- O senhor não se dá com ele? 
-- Dou-me; mas não tenho muita intimidade. Se fosse por intermédio da filha? Por 


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que o doutor não pede?
-- Posso pedir a ela; mas o padrinho -- não sei por quê -- não gosta do senhor. Se ele 
sabe...
Meneses arrependeu-se de ter avançado tanto, mas a sua vontade já era tão fraca que 
não soube, nem procurou meios e modos de fugir às conseqüências de sua confidência. Cassi 
aproveitou-se das aberturas do velho e disse:
-- Sei; mas escrevo uma carta à Dona Clara a fim de que ela evite a má vontade do 
padrinho e que se saiba ser a modinha... 
Meneses não pôde reprimir um movimento de espanto.
-- Não tenha susto, doutor; absolutamente não malicie no que vou fazer. A carta será 
lida pelo senhor.
Meneses ficou mais seguro de si e continuou a beber com vontade, enquanto Cassi 
contava-lhe os seus ganhos extraordinários no cangueiro, jogo suburbano.
-- Olhe, doutor -- rematou ele --, quando precisar de algum, é só pedir.
O dentista já estava muito adiantado na embriaguez; e, ao ouvir aquilo, olhou, 
desejoso e mendicante, para o violeiro, que se apressou em ir ao seu encontro:
-- Quanto precisa, doutor?
-- Dois mil-réis, só.
-- Não -- disse Cassi, tirando um maço de notas da carteira --, leve cinco; e não se 
esqueça de estar aqui, amanhã, às sete horas. Preciso da música para breve.
Meneses foi para a casa, sem pensar no que havia prometido; e, como guiado por 
instinto, subiu e desceu morros, tomou atalhos e acabou se deitando muito naturalmente no 
seu miserável canapé. Não quis comer; a embriaguez lhe havia tomado inteiramente. 
Despertou, no dia seguinte, sem saber o que tinha feito, nas últimas horas em que estivera fora. 
Lembrava-se vagamente que parara no botequim habitual. Tendo saído para fora de casa, a fim 
de lavar o rosto e satisfazer as exigências do organismo, quando voltou, já encontrou sua irmã 
de pé a lhe dizer, como quase todas as manhãs:
-- Não temos nada em casa, Juca.
Meneses não sabia se tinha ou deixava de ter dinheiro. Por desencargo de 
consciência, foi esgravatar as algibeiras. Encontrou um níquel de cruzado e pensou: "Bem! 
Para o café e o açúcar, já temos". Continuou a procurar, achou, dobradinha, no fundo de um 
bolso, uma nota de cinco mil-réis. Espantou-se. Quem lha teria dado? Cogitou, forçou a 
memória, enquanto a irmã resmungava:
-- Juca, você não ouviu o que eu disse?
-- Ouvi; espera, que estou procurando o "cobre".
Tanto forçou a memória, tanto combinou as vagas recordações, que toda a sua 
entrevista com Cassi foi recordada. Teve vontade de rasgar a nota, de dizer que não faria o 
prometido; mas já estava sem força moral, temia tudo, temia o menor sopro, o mais inocente 
farfalhar de uma árvore. Toda a criação estava contra ele, conjugava-se para perdê-lo -- que 
podia fazer contra tudo e contra todos? E a miséria? E a fome? Se se revoltasse, que seria dele, 
sem futuro, sem emprego, sem amigos, sem parentes, doente? Era bem triste o seu destino... 
Onde estava a sua mecânica? Onde estava a sua engenharia? Amontoara livros e notas pueris, 
e nada fizera. Levara bem cinqüenta anos, isto é, desde que saíra da casa dos pais, a viver uma 
vida vagabunda de ciganos, sem nunca se entregar seriamente a uma única profissão, 
experimentando hoje esta, amanhã aquela. De que lhe valera isto? De nada. Estava ali, no fim 
da vida, obrigado a prestar-se a papéis que, aos dezesseis anos, talvez não se sujeitasse, para 
disfarçadamente esmolar o que comer com os seus parentes. Teve vontade de chorar, mas a 
irmã gritou-lhe do quintal:
-- Achaste o dinheiro?
-- Achei.


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Respondeu assim, numa palavra, e deitou bem meio copo da aguardente, que sorveu 
toda quase de um só trago.
Meneses pensou ainda nos seus setenta anos desamparados, estéreis, e teve infinita 
dor de si mesmo, da miséria do seu fim. Que resolver sobre o caso de Cassi e da carta? 
Sacudiu os ombros e pensou de si para si: Que hei de fazer? As coisas me levaram a isso e...
      Cassi veio ao botequim, munido da carta, que leu, conforme prometera a Meneses. 
Desgostoso, com aquele mau travo na consciência, o pobre dentista ambulante procurava, 
durante o dia, beber a mais não poder. Tinha chegado cedo em casa de Joaquim e, tendo-o 
ainda encontrado, pedira-lhe dinheiro. Almoçou, saiu e foi bebendo daí em diante em todo o 
botequim por que passava. Ao chegar à casa do Fagundes, tinha lá uma carta de um cliente. 
Abriu-a; mandava-lhe dez mil-réis, por conta de cinqüenta que lhe devia. Deu cinco mil-réis ao 
caixeiro, para guardar, e foi para a cidade. Aí não teve medida. Todos lhe pagavam, de forma 
que, ao se encontrar com o Cassi, não dava mostras, mas estava completamente sem 
discernimento.  
O violeiro leu o que quis, fechou a carta e deu-a ao pobre velho. A sua resolução já 
estava tomada. Havia forçosamente de se entregar à sorte, aos caprichos da corrente da 
miséria, de dor, de humilhação que o arrastava. Ela o havia levado até ali; era inútil resistir. 
Entregou a carta a Clara. No dia seguinte, recebeu a resposta. Entregou-a a Cassi. Assim, 
durante um mês e tanto, ele foi o intermediário da correspondência dos dois. Já não tinha um 
movimento de revolta; resignara-se àquele ignóbil papel como a uma fatalidade que o destino 
lhe impusesse. Contra a força não há resistência, pensou ele; o mais sábio era submeter-se. Não 
esperava mais que Cassi lhe oferecesse dinheiro, pedia-o. No começo, o violeiro foi 
satisfazendo inteiramente os pedidos; depois, fazia-o pela metade; por fim, dizia que não tinha 
dinheiro e não lhe dava nada.
Meneses, porém, continuava passivamente a desempenhar o seu indigno papel. Se 
não o achava decente, conformava-se diante da sua atroz e irremediável miséria. Não se 
julgava mais um homem...
Clara recebia aquelas cartas com uma emoção de quem recebe mensagens divinas. 
Entretanto, eram pessimamente escritas, a ponto de não serem, às vezes, entendidas, tão 
caprichosa era a ortografia delas. A filha do carteiro não via nada disso; esquecera-se até das 
más ausências que faziam do namorado. Para ela, ele era o modelo do cavalheirismo e da 
lealdade. Estava sempre a sonhar com ele, com aquele Cassi da viola, Passava da alegria para o 
choro. A mãe notava-lhe essas alternativas de humor e fazia-lhe perguntas. Ela as respondia, 
malcriadamente, desabridamente. Relaxava o serviço ou não o fazia. Quase sempre, 
esquecia-se disso ou daquilo. Engrácia comunicou isto tudo ao marido. Joaquim disse então:
-- É verdade, Engrácia. Essa menina tem alguma coisa... Antigamente, as suas cópias 
de música eram limpas e certas; agora, não. Vêm cheias de raspagens, erradas, borradas... Que 
terá ela? Vou levá-la a um médico -- que achas?
-- Talvez faça bem.
Daí a dias, Joaquim faltou à repartição e levou a filha ao doutor. Este a examinou e 
disse ao pai:
-- Sua filha nada tem. São coisas da idade e do sexo... De distrações, passeios, 
convivência -- é o que ela precisa... Em todo o caso vou receitar...
Joaquim fez a necessária comunicação à mulher, que ficou de se entender com Dona 
Margarida, para fazer-se acompanhar da filha, sempre que tivesse de sair, ir a lojas, etc. Ele 
mesmo, Joaquim, levou-a no próximo domingo, a passear em Niterói.
O mar não fez bem à menina. Se a sua alma estava cheia de vago e de impalpável, 
com a vista do mar ficou absorta no infinito, no ilimitado do Universo.
De volta, chorou toda a noite sem saber por quê. Amanheceu de olheiras roxas, corpo 
mole, aborrecida de tudo e de todos. A vida lhe sabia a amargo. Ela não via como se a podia 


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adoçar. Ao mesmo tempo, lembrava-se de Cassi e enchia-se de esperanças. Saiu com Dona 
Margarida. A alemã, muito mais sagaz que seus pais, adivinhou o seu mal e pô-la em confissão 
com habilidade. Tanto fez, que Clara lhe disse francamente a origem dos seus males.
-- Mas este sujeito é um tipo indigno.
-- Não, para mim. Estou crente que...
-- Dizem tão mal dele...
-- É porque ele se deixou apanhar, enquanto outros há por aí que... Ele confessa que 
está arrependido do que fez, e agora quer se empregar e casar-se comigo.
Dona Margarida olhou firmemente para a moça, cravou bem os seus olhos 
perquiridores nos da rapariga; e fez de si para si:
-- Será possível?
Apressou-se a contar a confissão de Clara à mãe. Engrácia odiava Cassi. Se, algum 
dia, tinha tido um sentimento forte, era esse de ódio ao violeiro. Não sabia bem como 
justificá-lo; mas tinha-lhe uma raiva, uma gana de morte. Quando Dona Margarida lhe narrou a 
confidência da filha, ela teve uma crise surda de rancor. Já não era só contra ele, mas contra a 
filha, que ela criara com tantos carinhos, tantos cuidados, para, afinal, vir a se "embeiçar"" por 
aquele borra-botas, amaldiçoado por todos, até pelo próprio pai. Serenou e tomou a resolução 
de contar o fato, por sua vez, a Joaquim, antes que aquele perverso de modinheiro não lhes 
pespegasse alguma das dele.
Joaquim recebeu a notícia sem demonstrar espanto. Não gostava também de Cassi. 
Era, para ele, homem morigerado e trabalhador, um capadócio, um desclassificado, réu de 
policia, muitas vezes, de quem tanto mal se dizia; mas, se ele quisesse casar com a filha, apesar 
de todos os seus maus precedentes, não se oporia. Iria falar-lhe? Ou chamá-lo-ia em casa? Não 
seria melhor esperar?  
Pensou e tomou o alvitre de pedir a opinião do compadre Marramaque. O antigo 
contínuo tinha um grande ascendente moral e intelectual sobre o ânimo do carteiro, que o 
obedecia cegamente. Tratou, portanto, de pedir-lhe conselho.
Naquele domingo, a partida de solo tinha se adiantado pela noite afora. Deviam ser 
onze horas quando resolveram a "dar com o basta". Jogavam na sala de jantar, onde se 
encontravam, além dele, Joaquim,  Marramaque, Lafões e Dona Engrácia também. Clara já se 
recolhera ao quarto. Parecendo-lhe que a filha dormia, Joaquim resolveu decidir a coisa. Expôs 
primeiramente o estado nervoso da filha, os passos que tinha dado para tratá-la e chegou ao 
ponto agudo da questão. Por aí, Marramaque ergueu-se furioso:
-- Pois, então, você, compadre, quer meter semelhante pústula dentro de sua casa? 
Você não sabe quem é este Cassi? Se o pai não quer saber dele, é porque boa coisa ele não é. 
Ele não só desonra a família dos outros, como envergonha a própria. As irmãs, que são moças 
distintas, já podiam estar bem casadas; mas ninguém quer ser cunhado de Cassi. Ele se diz 
sempre correspondido, que se quer casar, etc., para dar o bote. Quando fica satisfeito, 
escorrega pelas malhas da justiça e da polícia, e ri-se das pobrezinhas que atirou à desgraça. 
Você não vê que, se ele se quisesse casar, não escolheria Clara, uma mulatinha pobre, filha de 
um simples carteiro? Sou teu amigo, Joaquim...
-- É o que eu penso também -- fez Dona Engrácia. -- Ele pode achar muitas em 
melhores condições...
Clara, que ouvia tudo, chorando em silêncio, quis protestar e citar exemplos em 
contrário, que conhecia, mas se conteve.      
Joaquim, que escutara calado a fala apaixonada do compadre, observou:
-- Acho que você tem razão; mas, qual o remédio?
-- É continuar... Como é que minha afilhada recebeu recados dele, 
comadre? -- perguntou Marramaque a Dona Engrácia.
-- Ela diz que foi uma amiga que lhe trouxe -- respondeu a mulher do carteiro.


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-- Fresca amiga! -- comentou rindo-se Marramaque. -- O que há a fazer, Joaquim, é 
continuar no que está e fazer que ele saiba que você não vê com bons olhos a insistência dele 
junto à filha.
-- Se ele teimar? -- perguntou Engrácia.
-- Publica-se nos jornais aquele folheto que recebi, vai-se à policia, desmoraliza-se o 
tipo de uma vez; e ele que faça o que quiser.
Todos calaram-se. Lafões não precisou fazer isto, porque se havia mantido até então 
calado. O carteiro voltou-se para ele e perguntou-lhe:
-- Que diz a isto, Lafões?
-- Isso... isso é matéria delicada. Não sou da família e, por isso, não me julgo com o 
direito...
-- Eu também não sou -- acudiu Marramaque. -- Estou só dando com franqueza uma 
opinião que me pediram; mas certo de que, Joaquim, se você permitir que esse tal sujeito entre 
aqui, eu, apesar do muito que devo a você, não ponho mais os meus pés na sua casa.
Levantou-se, tomou a bengala e saiu mergulhado na treva da noite, que estava bem 
escura, quase sem estrelas, caminhando devagar, no seu passo de capenga, até à sua modesta 
casa, onde chegou sem temor e tranqüilo de consciência.
Clara não pôde conciliar o sono. As idéias mais absurdas lhe passavam pela cabeça. 
Pensou em fugir, em ir ter com Cassi, em matar-se... Enchia-se de raiva contra o padrinho. Por 
fim, resolveu relatar, por carta, tudo o que se passou ao namorado. Saiu do quarto, logo que 
percebeu que o pai já tinha ido para a repartição; tomou naturalmente a bênção à mãe, lavou-se 
e serviu-se do café matinal. Como não tivessem vindo as "compras", disse à mãe que ia copiar 
música, enquanto as esperava. Era um pretexto. O que ela escreveu, foi uma longa carta, 
narrando o que ouvira naquela noite a respeito dela e dele. Antes de Meneses começar a cuidar 
dos dentes, ela lhe fizera entrega da missiva, que o pobre velho, cheio de amargura, logo 
meteu na algibeira. Para que viver tanto? -- pensou ele, limpando os ferros numa toalha de 
alvura imaculada.
Inteirado do que acontecera, vendo os seus planos fracassarem por causa daquele 
"João Minhoca" e, ainda mais, com a ameaça de ver toda a sua escandalosa vida publicada nos 
jornais -- Cassi encheu-se de fúria má e, na maior fúria, tomou a firme resolução de remover 
aquele trambolho de "aleijado", que estava sempre estragando os seus planos, com os      
quais até já tinha gasto bastante dinheiro. Não subiam as despesas a mais de cinqüenta 
mil-réis...
O seu furor foi grande; tanto que, ao ler, em voz baixa, a carta, ao lado de Meneses, 
no botequim, este lhe notou a profunda alteração de fisionomia que, subitamente, a leitura lhe 
havia produzido. Os seus olhos chamejavam, os dentes estavam rilhados e toda a sua natureza 
baixa, feroz e grosseira se revelava, num ríctus horrível.  
Pagou alguma coisa que beber a Meneses e despediu-se, sem dizer mais nada.
Meneses continuou a sorver os seus consoladores "calistos" e a perguntar de si para 
si:    
-- Que há? Que haverá? Que haveria?
O que havia, era simples: Cassi premeditava simplesmente, friamente, cruelmente, o 
assassinato de Marramaque. Quando ele falou a respeito a Arnaldo, limitou-se a dizer: "Vamos 
dar-lhe uma surra." "Por quê?" perguntou o outro, Ele respondeu: "Esse velho está abusando 
de ser aleijado, para me insultar. Merece uma surra". Não iam sová-lo, sabiam os dois 
desalmados; iam matá-lo...
Era sábado, dia em que Marramaque se demorava mais na venda do "Seu" 
Nascimento. Chovia e a noite viera logo fechada e escura. Grossas nuvens negras pairavam 
baixo. As luzernas de gás, tangidas pelo vento, mal iluminavam aquelas torvas ruas dos 
subúrbios, cheias de árvores aos lados e moitas intrincadas de arbustos. Marramaque, vindo da 


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repartição, deixara-se ficar até às oito, na venda. Por essa hora, despediu-se e tomou o 
caminho de casa. Para se ir ter a ela, por ali, preconiza-se, entre outras, uma rua já quase 
completamente edificada, que terminava numa ladeira deserta. De um lado, o esquerdo, havia 
um terreno baldio, cheio de moitas altas; do direito, grandes árvores dos fundos de uma 
chácara, cuja frente era na rua paralela. Além de deserto, esse trecho era por demais sombrio, 
sobretudo em noites como aquela.
Marramaque, debaixo de chuviscos teimosos, embrulhado numa capa de borracha, 
subiu a ladeira, para depois descer o barranco e, finalmente, chegar à casa. Quando estava no 
alto da pequena elevação, dois sujeitos tomaram-lhe a frente e disseram-lhe: "Capenga, você 
vai apanhar, para não se meter onde não é chamado". Não teve tempo de dizer coisa alguma. 
Os dois descarregaram-lhe os cacetes em cima, pela cabeça, por todo o corpo; e o pobre 
Marramaque, logo à primeira paulada, caiu sobre um lado, arfando, mas já sem fala. 
Malharam-no ainda com toda a força e raiva, sem dó nem piedade; e fugiram, quando lhes 
pareceu momento azado.
No dia seguinte, ao passarem os primeiros transeuntes, ele estava morto. E, assim, 
morreu o pobre e corajoso Antônio da Silva Marramaque, que, aos dezoito anos, no fundo de 
um "armazém" da roça, sonhara as glórias de Casimiro de Abreu e acabara contínuo de 
secretaria, e assassinado, devido à grandeza do seu caráter e à sua coragem moral. Não fez 
versos ou os fez maus; mas, ao seu jeito, foi um herói e um poeta... Que Deus o recompense!

          IX

Um crime, revestido das circunstâncias misteriosas e da atrocidade de que se revestiu 
o assassinato de Marramaque, faz sempre trabalhar todas as imaginações de uma cidade. Um 
homicídio banal em que se conheceu a causa, o autor, capturado ou não, e outros pormenores, 
deixa de oferecer interesse, para ser um acontecimento banal da vida urbana, fatal a ela, como 
os nascimentos, os desastres e os enterros; mas o assassinato de um pobre velho, aleijado, 
inofensivo, pobre, a pauladas, faz parecer a toda a gente que há, soltos e esbarrando conosco 
nas ruas, nas praças, nos bondes, nas lojas, nos trens, matadores, que só o são por prazer de 
matar, sem nenhum interesse e sem nenhuma causa. Então, todos acrescentam, aos inúmeros e 
insidiosos inimigos que tem a nossa vida, mais este do assassínio por divertimento, por 
passatempo, por esporte.
Um ou muitos, seja em que número forem, é sempre uma ameaça que paira sobre 
cada um de nós, zombando da mais ostensiva pobreza e não tendo em consideração a pacatez 
mais pusilânime.
Marramaque não era rico nem andava com jóias, sendo certo que não podia trazer 
consigo muito dinheiro. O móvel do crime, portanto, não seria o roubo. Ao contrário, o exame 
minucioso nos bolsos das vestes, com que fora encontrado o seu cadáver, não denunciou 
nenhuma tentativa de saque. O pouco dinheiro que tinha -- três mil e tanto -- estava intacto; 
uma carteira, encontrada numa das algibeiras interiores do dólmã, continha unicamente papéis. 
Quando foi assassinado, vestia a farda de contínuo: dólmã azul-marinho e calças da mesma 
cor. Tinha, por baixo do dólmã, um comum colete preto, onde trazia um relógio de prata, preso 
numa antiga corrente de ouro, feita de diversos trancelins de ouro, reunidos por argolas 
também desse metal, com um remate, em forma de estribo, cujo pedal era uma pedra negra. 
Pois bem: nem mesmo esta peça, de algum valor, foi-lhe roubada. Posta de lado a hipótese de 
roubo, qual poderia ter sido o móvel do crime? Amores, conquistas? O estado de saúde, a sua 
semi-invalidez logo afastavam tal hipótese. Política, questões de família -- nada disso 
explicava o crime. Só na perversidade, na vontade de matar, por parte de alguém 
extremamente mau e sedento de sangue, encontrar-se-ia a causa. Seria isso? -- perguntavam 
todos.


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A noticia do crime logo se espalhou pelo subúrbio inteiro, apesar de ser domingo o 
dia em que foi descoberto. A deformidade de Marramaque fazia-o notado e conhecido, de 
forma que, por toda a parte, se comentava o assassínio. A polícia tomou as providências de 
hábito; mas só iniciou as pesquisas no dia seguinte. Todos que estiveram na venda foram 
ouvidos; mas pouco, nada adiantaram. Nem o podiam fazer. Marramaque, em lá chegando, a 
chuva tinha cessado. Era sábado, e todos os habitués do armazém do "Seu" Nascimento lá 
estavam, inclusive Meneses, que se mostrava palrador e prazenteiro. Discutia-se 
despreocupadamente, e até Meneses causou grande hilaridade, quando explicou a sua teoria 
transcendente sobre o "ovo de Colombo". No correr da discussão, alguém dissera:
-- Isto é ovo de Colombo.
Parece que foi Marramaque a dizer, e Alípio aproveitou o ensejo, para perguntar:
-- Que diabo quer dizer esta história de "ovo de Colombo", na qual todo o mundo 
fala e não sei o que é?
Entre os circunstantes estava o Senhor Monção, caixeiro-vendedor da grande casa de 
cereais Belmiro, Bernardes & Cia., que tinha suas luzes e gostava de palestrar, para descansar 
da afanosa lida de estar a "tocar realejo" aos varejistas, oferecendo-lhes feijão, arroz, milho, e 
por bom preço.
Era um moço português, simpático, de bom porte e bem-educado. Tinha grande 
liberdade na roda e não houve nenhum espanto quando interveio:
-- Pois não sabes, Alípio, o que é o "ovo de Colombo"?
-- Não, "Seu" Mindela.
-- É simples. No meio dos sábios espanhóis, depois da primeira viagem à América, 
Colombo, vendo o seu trabalho criticado e tido como fácil pelos sabichões de Castela, 
desafiou-os a pôr um ovo em pé.
-- Eles puseram? -- perguntou Alípio.
Meneses apressou-se:
-- Não puseram; mas Colombo pôs.
-- Como? -- indagou Alípio.
Meneses explicou, tomando a palavra de Mindela, com todo o seu açodamento de 
sábio:
-- Colombo, dando um movimento de rotação conveniente e um de translação 
adequado, dissolveu a gema do centro do ovo, para a base, trazendo, para a parte inferior do 
ovo, o centro de gravidade, de forma que o pôde pôr em pé.
Todos se entreolharam e viram o absurdo da explicação de Meneses. Ninguém se 
animava a contestar, mas Marramaque, tomando a dianteira de Mindela, que ia falar, saltou 
logo, em tom de gracejo:
-- Qual, "Seu" Meneses! Esta história de translação, de rotação, de centro de 
gravidade, é bobagem; o que...
-- Bobagem, Marramaque? Isto é mecânica transcendente, como é a questão do gato 
cair sempre sobre as patas, atirado que seja, do alto para baixo, em qualquer posição.
Marramaque foi-lhe ao encontro, sem pestanejar:
-- Nós não temos nada com gato. Ovo se parece tanto com gato como um espeto. 
Bolas, "Seu" Meneses! 
Todos os circunstantes riram-se a mais não poder; Meneses pôs-se a cofiar a longa e 
abundante barba branca, lamentando-se da sua derrota em mecânica e tudo. De repente, 
cobrou coragem e desafiou o contínuo:
-- Quero ver, Marramaque, como é que você explica ter Colombo posto o ovo em pé?
-- Muito simplesmente, Meneses. Vou contar a história como a li:
"Num banquete, procuravam os nobres de Espanha rebaixar o mérito da descoberta de 
Colombo, e dizia um: 'As Índias já lá estavam e, se o senhor não as descobrisse, qualquer um 


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outro as descobriria'. Colombo, sem responder, pediu um ovo; trouxeram-lhe e ele desafiou a 
que alguém o pusesse de pé, 'Impossível!' -- bradaram. Então, o navegador tomou o ovo, bateu 
com ele, quebrando ligeiramente a mais rombuda das extremidades, e fê-lo ficar de pé. 'Ora, 
isto também eu faria!...' -- replicaram. 'Sim, depois que me viram fazer. É simples, mas é 
preciso pensar no caso, e achar o meio"'. Está ai como foi a coisa. Não tem nada de gravidade, 
nem de rotação, nem de translação, nem de constelação, nem de repulsão -- nada tem em "ão", 
Meneses!
De novo a gargalhada foi geral e prolongada; e Meneses, muito encafifado, 
limitou-se a dizer:
-- Isto não é científico; é uma explicação jocosa de anedota de almanaque. Podia 
demonstrar a minha interpretação com o auxílio do cálculo, mas não é conveniente aqui... fica 
para outra ocasião.
Assim, sem outra preocupação, naquela tarde tempestuosa, conversaram na venda, 
enquanto Marramaque estivera e mesmo depois da sua saída. É óbvio que nenhuma das 
pessoas que lá estavam poderia adivinhar o que lhe ia acontecer pelo caminho. Chuviscava 
teimosamente, mas não havia o que se chama de chuva torrencial, quando o pobre continuo se 
despediu. É verdade que a noite estava pavorosa de escuridão, e ameaçadoras nuvens 
pairavam baixo, ainda mais carregando de treva a atmosfera e ofuscando os lampiões, cuja luz 
oscilava sob o açoite de um vento constante e cortante. Não se via, como é costume dizer-se, 
um palmo diante do nariz. À polícia, pareceu que aquele misterioso assassínio, sem causa 
presumível, nascera de um segredo que só ele, Marramaque, podia revelar e, talvez, os seus 
papéis íntimos o revelassem. Resolveram, então, as autoridades perquiri-los, à cata de uma 
pista.
Morava Marramaque com uma tia materna, pouco mais moça que ele, tendo dois 
filhos homens, de doze e dez anos. Após ter enviuvado na roça, com alguma coisa, tomou o 
alvitre de comprar aquela casa e convidar o sobrinho, para lhe fazer companhia e encaminhar a 
educação e a instrução dos filhos, e ajudá-la também.
A sua casa era inteiramente o contrário da de Meneses. Estava sempre limpa, móveis 
em ordem, completamente cercada, o jardinzinho da frente bem tratado. Helena, a tia de 
Marramaque, era muito metódica e econômica, de forma que a vida doméstica do sobrinho era 
regular e plácida. Ela costurava para os arsenais do governo e, com o que Marramaque lhe 
dava dos seus exíguos vencimentos, a vida deles corria sem contratempos. Não eram difíceis 
as suas comunicações com as estações da Central, quando feitas pelo bonde de Inhaúma, que 
passava na esquina; e, se o continuo, na noite fatídica do assassínio, tomava aqueles atalhos e 
subidas, sempre que passava pela venda do Nascimento ou ia à casa do Joaquim, procurava 
aquele caminho mais curto. Helena vivia para os filhos; raras vezes, a não ser para regularizar 
as suas costuras, saia, indo uma ou outra vez à casa do carteiro, onde se aborrecia com o gênio 
taciturno de Engrácia. Foi ela quem assistiu desenterrar, do fundo de baús e gavetas, as 
recordações do seu pobre sobrinho.
As autoridades policiais pediram delicadamente autorização; e o delegado em pessoa 
foi examinar os papéis do infeliz contínuo. Não encontrou coisa de valia. Havia no seu arquivo 
cartas de família, bilhetes de amigos, rascunhos de versos, entre os quais um de Raul Braga, de 
quem Marramaque fora amigo, e o célebre caderno sobre Cassi, que o delegado tinha também 
um exemplar. A não ser esses papéis sem importância, encontraram um caderno de versos, 
pronto a ir para o prelo, de autoria de Marramaque, intitulado --  Boninas e 
Sensitivas -- versos ingênuos de um homem bom e honesto que não é poeta. Deram também 
com um retrato de mulher feita, numa pose popular, com o braço esquerdo descansando sobre 
uma coluna e tendo um leque enorme, pendente do direito, caindo ao longo do corpo. Era uma 
mulher bonita, de trinta anos, sadia e forte. Nas costas havia esta dedicatória:  "Ao meu 
Antônio, a Eponina.  25-12-92". Mais abaixo, com letra de Marramaque, existiam estas 


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observações: "Amor tudo vence; não pode vencer as obrigações de lealdade que devem 
sempre existir nas amizades perfeitas. Adeus!"
Quem seria? Os policiais indagaram; mas Dona Helena não lhes pôde explicar. 
Naquela data, ela nem casada era ainda; seu sobrinho já tinha vindo para o Rio. Quem seria?
Enfim, nada encontraram, e o crime foi sendo esquecido. Só duas pessoas podiam 
pôr as autoridades na pista verdadeira; eram Clara e Meneses.
Clara, logo que soube do assassínio do padrinho, ficou fora de si. Lembrou-se das 
ameaças veladas que Cassi fazia ao padrinho, nas cartas que lhe escrevia; lembrou-se também 
da carta em que ela narrava ao namorado a atitude de Marramaque, quando o pai falou ao 
compadre na necessidade de ter um franco entendimento com o violeiro. Por aí e por outras 
pequenas circunstâncias, atribuía a Cassi o assassinato do padrinho e como que se julgava 
também sua cúmplice. Veio-lhe um medo daquele cantador meloso, dengoso, apesar de seu 
mau olhar de folhas-de-flandres; e, num relâmpago, viu bem quanto de fingido e falso podiam 
conter as suas cartas ternas e cheias de protestos de boas intenções e de amor sincero e 
honesto.
Imediatamente, porém, explicou esse seu ato de desvario criminoso como um 
esporádico ato de loucura, provocado pelo amor que tinha a ela. Era um obstáculo e.. 
Agradava-lhe a interpretação. Não tardariam, entretanto, a se explicar de viva voz, porque ela 
havia consentido afinal em conversar com ele na grade de casa, depois que seus pais se 
recolhessem. Então, nessa ocasião, ela avaliaria o grau de certeza de suas suspeitas. Meneses 
tinha levado uma carta dela nesse sentido; mas, tendo ficado atrapalhada por sentir a 
aproximação da mãe, não pôde, Clara, fechar a missiva convenientemente. Aberta, a moça, 
para não ser pilhada, passou-a precipitadamente ao velho, que assim a guardou jubilosamente. 
Quando se lhe ofereceu momento azado, leu-a.
Como toda a mulher sem instrução, Clara pegou na pena e não tinha vontade de a 
largar. Contava detalhes, repisava juras e pedia juramentos. Um destes era o de que ele a 
respeitaria sempre; e, se não fizesse isso, romperia as relações com ele. Estava disposta a 
esperá-lo, às dez horas, na grade, daí a oito dias, e isso o fazia, porque "Seu" Meneses tinha 
dado o serviço dos dentes por terminado.
De fato, Meneses, aborrecido com aquele negócio de cartas e com o desdém com que 
Cassi o tratava, ademais da ignóbil farsa que se prestava, resolveu dar por findo o trabalho. A 
leitura da carta não lhe causou nenhuma estranheza; ele já esperava por este fim. Estava 
forrado de uma indiferença de vencido. Sentiu-se de mãos e pés atados, para ter qualquer 
movimento de censura ou de conselho. É que ainda não lhe tinha chegado aos ouvidos a 
notícia do bárbaro assassínio de Marramaque. Quando, porém, veio a saber, teve uma forte 
vergonha do seu procedimento, da sua covardia. Compreendeu que aquelas meias-palavras de 
Cassi sobre Marramaque, aquele ríctus horrendo que vira certa vez, ao se falar do contínuo, lhe 
desfigurar a face, eram os pródromos do assassínio do bondoso velho que o violeiro 
premeditava. O infeliz Meneses passou o dia todo e a noite inteira voltado para dentro de si 
mesmo. Não sabia mais chorar, mas o seu remorso era intenso. Ele se julgava também cúmplice 
daquele desalmado. Por que calara o que sabia? Por que se acovardara a ponto de servir de 
medianeiro? Oh! Ele não era mais homem, não tinha mais dignidade!
Cassi, entretanto, não demonstrou o menor abalo. Leu as notícias dos jornais, as 
objurgatórias contra os assassinos de que estavam cheios; ouviu as maldições de todos, nos 
cafés, nos bondes, em todas as conversas e por toda a parte; mas nenhum arrependimento 
sentia. Só lhe faltava o orgulho íntimo de ter efetuado tão rara proeza, para ser completa a sua 
inumanidade e o seu abjeto sossego íntimo. Não tinha orgulho, mas havia nele como que alívio 
de se ver livre daquela espécie de duende, de fantasma, que vivia a persegui-lo.
Com Arnaldo, já não acontecia o mesmo. Passado o fato, com a leitura dos jornais, 
com as censuras amargas que via em todas as bocas, até nas daqueles afeitos ao crime, o sócio 


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de Cassi, se não viu remorsos, começou a ter susto. Não pôde reprimir o impulso que o levou a 
ver o cadáver. Estavam os restos de Marramaque quase tal e qual como foram encontrados. Os 
médicos ainda não haviam praticado a autópsia. A cabeça partida, os olhos fora das órbitas, 
todo o rosto coberto de uma lama sangrenta, o braço semiparalítico, partido, as roupas, 
ensopadas de lama e sangue... Era horrível! No necrotério, acotovelava-se uma multidão, e 
todos, em voz baixa, cobriam de baldões, de injúrias, de pragas, os malvados que tinham 
levado a efeito tão estranho e inconcebível crime... Um crioulo, muito negro, forte, com 
grandes "peitorais" salientes, dizia bem alto do lado de fora:
-- Eu não sou santo... Já fiz das minhas... Conheço a "chac'ra"; mas Deus me castigue, 
me ponha um raio em cima, e faça apodrecer em vida, se eu fosse capaz de fazer tão porco 
"trabalho"... Os que o fizeram, nem esfolados vivos pagariam... Para que mataram esse pobre 
velho?
Arnaldo voltou do depósito fúnebre apreensivo. Não havia nele, a bem dizer, 
arrependimento. O que ele sentia era medo de ser descoberto, de pegar cadeia trinta anos a fio, 
porque não podia ser mais. Chegou aos subúrbios apavorado; e, quando topou com Cassi, 
disse, com olhar desvairado:
-- Chi, Cassi! O "homem" estava horrível...
O violeiro virou-se para ele, olhou-o firme com seu olhar fosco e falou-lhe com 
energia e fogo nos olhos:
-- Cala-te, miserável! Queres pôr tudo a perder...
Conquanto temesse as fúrias do seu companheiro e cúmplice, não lhe passava o terror 
de ser descoberto pela polícia. Deu em beber; Cassi vigiava-o com medo que ele "desse com a 
língua nos dentes". Não o deixava só, quando estava em "rodas".
Nos botequins, não entrava um freguês, que Arnaldo não examinasse 
meticulosamente, cautelosamente, com o rabo dos olhos. Às vezes, não se continha e 
apontava: 
-- Cassi, aquele é agente do décimo oitavo...
O modinheiro, em voz baixa, mas com autoridade, repreendia-o:
-- Estás doido! Queres nos pôr no "x", pelo resto da vida.
No começo, Cassi teve medo que a embriaguez o fizesse denunciá-los; mas, bem 
cedo, percebeu que a sua bebedeira tomava uma feição choramingas, efusiva, dava para 
abraçar todos e, com voz de mágoa íntima, repetia de onde em onde, sem nada entender do 
que se dizia ao redor: "Eu não sou mau..." "Eu sou um bom rapaz..." "Nunca fiz mal a 
ninguém", etc.
Então, Zezé Mateus, também já muito bêbedo, derreado completamente na cadeira, 
com os olhos divergentes e vidrados, babando-se todo e gaguejando, retrucava: "Meu querido 
Arn... ar... ar... Arnaldo, você é uma... pomba sem... sem fel". Em seguida, depois de limpar a 
baba com o lenço: "Quem foi que... que disse que... você é... é mau?" E acrescentava: "Traga... 
Traga este su... su... sujeito aqui que... que eu parto a cara dele".
Arnaldo, por aí, levantava-se comovido e abraçava Zezé Mateus, que se mantinha na 
cadeira, e, com dificuldade, erguia os braços, a fim de cingir o camarada.
Repetiam daí a pouco a cena, com pequenas variantes, debaixo dos motejos forçados 
de Cassi, a quem tais espetáculos não deixavam de fazer mal. Os outros companheiros riam-se 
a bom rir, sem nada suspeitar.
Entretanto, o violeiro não se fiava muito que Arnaldo sempre procedesse assim. A 
embriaguez -- ele sabia -- é caprichosa, ora dá para isto, ora dá para aquilo, podia aparecer 
qualquer coisa a respeito do crime e era preciso que ele, Cassi, tomasse as suas precauções. A 
entrevista com Clara estava marcada para o fim da semana. Tinha de ir; tinha que dar fim 
"naquilo", que tanto trabalho lhe dera e estava dando. Antes de tudo, porém, era preciso estar 
preparado para o que desse e viesse. Não contava mais com a proteção; Barcelos não valia 


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nada e só prestava pequenos serviços em vésperas de eleição. Quando elas estavam distantes, 
fiava com má cara um cálice de cachaça... Era preciso ter tudo pronto para fugir do Rio de 
Janeiro, ao primeiro sinal de alarme, tanto mais que sabia, por indiscrições de Meneses, que as 
ouvira na venda do "Seu" Nascimento, que o marido de Nair -- aquela moça que ele 
desencaminhara e a mãe, por isso, se suicidara -- estava disposto a persegui-lo, como já o 
perseguia, com os famosos cadernos, mas mais eficazmente, desde que se metesse em 
"alguma". Considerou bem que as coisas agora seriam mais difíceis; e as pedras que semeara 

no 
caminho, começavam a erguer-se para lapidá-lo.
Tomou a extrema resolução de vender os galos de briga. O dinheiro que apurasse, 
depositaria na Caixa Econômica, para tê-lo sempre à mão, quando fosse necessário fugir. A 
mãe, vendo carroças chegarem à porta e as gaiolas e capoeiras saírem, a fim de tomarem lugar 
nos transportes, foi indagar-lhe o que havia:
-- Nada, mamãe. Vou para fora, trabalhar...
-- Para onde, Cassi?
-- Vou para Mato Grosso, empregar-me na construção de uma estrada de ferro.
-- Como trabalhador de picareta, meu filho?
-- Não, mamãe, vou ser chefe de turma e praticar nos instrumentos, até conseguir ser 
seccionista.
Dona Salustiana assim mesmo não ficou contente. Ela conhecia a ignorância do filho, 
a sua inferioridade mental e a sua incapacidade para aplicar-se a alguma coisa que demandasse 
o menor esforço intelectual; viu bem, portanto, que, numa construção de estrada de ferro, ele 
só podia ser simples trabalhador braçal, pegar na foice e roçar, no machado e derrubar, na 
picareta e cavar, mais nada! Voltou chorando para onde estavam as filhas:
-- Você não sabe, Catarina? Você não sabe, Irene, de uma coisa? Ai! Meu Deus!
-- Que é, mamãe? -- perguntou Catarina.
-- Que há, mamãe? -- indagou Irene.
-- Minhas filhas, vocês não sabem que desgraça para a família, Cassi...
-- Que houve? -- assustou-se Catarina.
-- Cassi está doido e quer nos envergonhar a todos nós, o meu avô que foi cônsul da 
Inglaterra... Ah! Se ele ressuscitasse -- que vexame não passaria!
-- Que é que Cassi vai fazer? -- fez Irene com calma.
-- Vai ser trabalhador de enxada, numa estrada de ferro de Mato Grosso.
Irene, que era severa e nunca perdoaria ao irmão as maliciosas perguntas que as 
colegas da escola lhe faziam, vexando-a bastante, quando acontecia aparecer o nome dele nos 
jornais, nas suas habituais cavalarias -- observou:
-- Que tem isso, mamãe! Ele tem saúde, ao invés de andar por ai a fazer das suas, a 
nos envergonhar por toda a parte, é melhor que ele trabalhe para ver se toma caminho.
Dona Salustiana olhou espantada para a filha e disse cheia de mágoa:
-- É que você não é mãe; mas, em breve, você será, então...
Catarina obtemperou:
-- Mamãe, eu não acho motivo para lástima. O que é de todo reprovável, é que ele 
leve toda a vida a que está levando... O melhor é aventurar...
O pai veio a saber da resolução do filho, sobre quem não punha os olhos, havia dois 
anos. Não conteve a sua alegria e exclamou: 
-- Que se vá! Que vá para o diabo! Já é tempo!
Depois acrescentou:
-- Vocês vão ver que ele fez uma das suas; vai fugir e deixar-nos vexados, senão 
atrapalhados. Seja tudo pelo amor de Deus! Que se vá e nos deixe em paz.
Vendidos os galos, galinhas, frangos e pintos, apurou quinhentos mil-réis, que se 
dispôs a depositar na Caixa Econômica, logo no dia seguinte ao do recebimento.


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Nesse dia, despertou cedo, banhou-se cuidadosamente, escolheu bem a roupa branca, 
viu bem se a meia não estava furada, escovou o terno cintado e cuidadosamente, meteu mão à 
obra de vestir-se com apuro, para vir à "cidade". Raramente, vinha ao centro. Quando muito, 
descia até o campo de Sant'Ana e daí não passava. Não gostava mesmo do centro. Implicava 
com aqueles elegantes que se postavam nas esquinas e nas calçadas. Achava-os ridículos, 
exibindo luxo de bengalas, anéis e pulseiras de relógio. É verdade, pensava consigo, que ele 
usava tudo aquilo; mas era com modéstia, não se exibia. Recordava que não tinha poses, mas, 
mesmo que as tivesse, não se daria a tal ridículo... Essa sua filosofia sobre a elegância, de 
elegante suburbano, ele aplicava às moças. Quanto dengue! Para que aqueles passos 
estudados? Aqueles modos de dizer adeus?
Achava tudo ridículo, exagerado, copiado, mas não sabia bem de que modelo. O 
que, de fato, sentia não era isso que expunha aos amigos ou às belezas suburbanas que, 
porventura, reqüestasse. O que ele sentia diante daquilo tudo, daquelas maneiras, daqueles 
ademanes, daquelas conversas que não entendia, era a sua ignorância, a sua grosseria nativa, a 
sua falta de educação e de gosto. O seu ódio, então, ia forte para os poetas e jornalistas, 
sobretudo, para estes. Não perdoava as descalçadeiras, os deboches que lhe passavam, quando 
tinham de denunciar alguma das suas ignóbeis proezas. Uns sujos! -- dizia -- ; uns 
malandros! -- continuava -- que querem ditar moral. O seu primeiro ímpeto, quando lia notícias 
a seu respeito, era atirar-se contra um deles, naturalmente o que lhe parecesse mais fraco; e 
desancá-lo de pancadas. Sustinha, porém, o ímpeto, porque sabia, se tal fizesse, estaria 
perdido. A guerra seria sem tréguas, e "novos e velhos" da sua interminável conta sairiam à luz. 
Secretamente, tinha um respeito pela cidade, respeito de suburbano genuíno que ele era, 
mal-educado, bronco e analfabeto.
Mal tomou o café matinal, concertou ainda a gravata e pôs-se na rua. Era cedo, mas 
temia pelo dinheiro que tinha na algibeira. Não queria que ninguém soubesse da existência de 
avultada quantia em seu poder e, muito menos, que premeditava fugir. Embarcou no primeiro 
trem; e, esgueirando-se pela Central, conseguiu não encontrar conhecido que lhe fizesse 
perguntas indiscretas.
Cassi Jones, sem mais percalços, se viu lançado em pleno Campo de Sant'Ana, no 
meio da multidão que jorrava das portas da Central, cheia da honesta pressa de quem vai 
trabalhar. A sua sensação era que estava numa cidade estranha. No subúrbio, tinha os seus 
ódios e os seus amores; no subúrbio tinha os seus companheiros, e a sua fama de violeiro 
percorria todo ele, e, em qualquer parte, era apontado; no subúrbio, enfim, ele tinha 
personalidade, era bem Cassi Jones de Azevedo; mas, ali, sobretudo do Campo de Sant'Ana 
para baixo, o que era ele? Não era nada. Onde acabavam os trilhos da Central, acabava a sua 
fama e o seu valimento; a sua fanfarronice evaporava-se, e representava-se a si mesmo como 
esmagado por aqueles "caras" todos, que nem olhavam. Fosse no Riachuelo, fosse na Piedade, 
fosse em Rio das Pedras, sempre encontrava um conhecido, pelo menos, simplesmente de 
vista; mas, no meio da cidade, se topava com uma cara já vista, num grupo da rua do Ouvidor 
ou da venida, era de um suburbano que não lhe merecia nenhuma importância. Como é que ali, 
naquelas ruas elegantes, tal tipo, tão mal vestido, era festejado, enquanto ele, Cassi, passava 
despercebido? Atinava com a resposta, mas não queria responder a si mesmo. Mal a 
formulava, apressava-se em pensar noutra coisa.
Na "cidade", como se diz, ele percebia toda a sua inferioridade de inteligência, de 
educação; a sua rusticidade, diante daqueles rapazes a conversar sobre coisas de que ele não 
entendia e a trocar pilhérias; em face da sofreguidão com que liam os placards dos jornais, 
tratando de assuntos cuja importância ele não avaliava, Cassi vexava-se de não suportar a 
leitura; comparando o desembaraço com que os fregueses pediam bebidas variadas e 
esquisitas, lembrava-se que nem mesmo o nome delas sabia pronunciar; olhando aquelas 
senhoras e moças que lhe pareciam rainhas e princesas, tal e qual o bárbaro que viu, no Senado 


[Linha 3350 de 4046 - Parte 3 de 3]


de Roma, só reis, sentia-se humilde; enfim, todo aquele conjunto de coisas finas, atitudes 
apuradas, de hábitos de polidez e urbanidade, de franqueza no gastar, reduziam-lhe a 
personalidade de medíocre suburbano, de vagabundo doméstico, a quase coisa alguma.
Saltando na Central, não procurou bonde. Engolfou-se num filete de multidão que se 
alastrava em direitura à Prefeitura e marchou a pé até o "centro". Desde o largo do Rossio, foi 
parando diante das montras. Demorava-se a ver jóias através de fortes vidros que as protegiam 
contra a cobiça alheia. Mirava anéis e relógios, braceletes e brincos, mais àqueles do que a 
estes, porquanto não lhe brotava no coração nenhuma necessidade de dar presentes às amadas. 
Tão caros, não valia a pena!... Uma bengala de junco, esquinada, com castão de ouro, tentou-o. 
Os quinhentos mil-réis que tinha na algibeira murmuraram-lhe alguma coisa ao ouvido. 
Prontamente repudia a tentação; precisava estar seguro...
Entrou pela rua Sete de Setembro e, daí em diante, foi admirando as roupas 
feitas -- por toda a longa fachada do Parc Royal, foi parando diante das vitrines, onde havia 
roupas e outras peças de vestuário, para homens. Viu fraques, viu suspensórios, viu ligas, viu 
colarinhos, viu camisas... Que coisas lindas!
Tomou a rua do Ouvidor e foi descendo, sempre parando em frente das casas que 
tinham artigos para homens. Por desfastio, desviou-se a olhar as vitrines de uma livraria. 
Olhou-lhe também o interior. Livros de alto a baixo. Para que tantos livros? Aquilo tudo só 
seria para fazer doidos. Ele tinha livros, na verdade; mas eram alguns, livros de amor... Que 
livros, meu Deus! Teve vontade de tomar café; hesitou um pouco! Mas, afinal, animou-se. 
Estava quase na hora. A Caixa Econômica não tardaria em abrir-se. Lá chegando, teve que 
aguardar a abertura da porta. Já havia gente à espera. Olhou-a de relance. Fisionomias 
diferentes de trato e de cor: velhas de mantilha, moças de peito deprimido, barbudos 
portugueses de duros trabalhos, rostos de caixeiros, de condutores de bonde, de garçons de 
hotel e de botequim, mãos queimadas de cozinheiras de todas as cores, dedos engelhados de 
humildes lavadeiras -- todo um mundo de gente pobre ia ali depositar as economias que tanto 
lhes devia ter custado a realizar, ou retirá-las, para acorrer a qualquer drama das suas 
necessitadas vidas. Aborreceu-se com aquele contato...
Penetrando no saguão, pôs-se a ler os cartazes onde estavam as disposições legais 
que interessavam ao público. Diabo! A providência não lhe servia... Para confirmar, dirigiu-se 
a um empregado num  guichet, que tinha ao alto este letreiro: "Informações". Não lhe servia 
absolutamente. Para retirar mais de duzentos mil-réis, tinha que avisar previamente. Não; não 
depositaria. O dinheiro devia estar sempre ao alcance da mão... Saiu e, a fim de não ser visto 
por algum conhecido, procurou alcançar o largo de São Francisco, atravessando aqueles velhos 
becos imundos que se originam da rua da Misericórdia e vão morrer na rua Dom Manuel e 
largo do Moura. Penetrou naquela vetusta parte da cidade, hoje povoada de lôbregas 
hospedarias, mas que já passou por sua época de relativo realce e brilho. Os botequins e tascas 
estavam povoados do que há de mais sórdido na nossa população. Aqueles becos escuros, 
guarnecidos, de um e outro lado, por altos sobrados, de cujas janelas pendiam peças de roupa 
a enxugar, mal varridos, pouco transitados, formavam uma estranha cidade a parte, onde se 
iam refugiar homens e mulheres que haviam caído na mais baixa degradação e jaziam no 
último degrau da sociedade. Escondiam, na sombra daquelas betesgas coloniais, nas alcovas 
sem luz daqueles sobrados, nos fundos caliginosos das sórdidas tavernas daquele tristonho 
quarteirão, a sua miséria, o seu opróbrio, a sua infinita infelicidade de deserdados de tudo 
deste mundo. Entre os homens, porém, ainda havia alguns com ocupação definida; marítimos, 
carregadores, soldados; mas as mulheres que ali se viam, haviam caído irremissivelmente na 
última degradação. Sujas, cabelos por pentear, descalças, umas, de chinelos e tamancos, 
outras. Todas metiam mais pena que desejo. Como em toda e qualquer seção da nossa 
sociedade, aquele agrupamento de miseráveis era bem um índice dela. Havia negras, brancas, 
mulatas, caboclas, todas niveladas pelo mesmo relaxamento e pelo seu triste fado.


[Linha 3400 de 4046 - Parte 3 de 3]


Cassi Jones ia atravessando aquele bairro singular e escuro, quando, do fundo de 
uma tasca, lhe gritaram:
-- Olá! Olá! "Seu" Cassi! Ó "Seu" Cassi!
Insensivelmente, ele parou, para verificar quem o chamava. De dentro da taverna, 
com passo apressado, veio ao seu encontro uma negra suja, carapinha desgrenhada, com um 
caco de pente atravessado no alto da cabeça, calçando umas remendadas chinelas de tapete. 
Estava meio embriagada. Cassi espantou-se com aquele conhecimento; fazendo um ar de 
contrariedade, perguntou amuado:
-- Que é que você quer?
A negra, bamboleando, pôs as mãos nas cadeiras e fez com olhar      
de desafio:
-- Então, você não me conhece mais, "seu canaia"? Então você não "si" lembra da 
Inês, aquela crioulinha que sua mãe criou e você...
Lembrou-se, então, Cassi, de quem se tratava. Era a sua primeira vítima, que sua mãe, 
sem nenhuma consideração, tinha expulsado de casa em adiantado estado de gravidez. 
Reconhecendo-a e se lembrando disso, Cassi quis fugir. A rapariga pegou-o pelo braço:
-- Não fuja, não, "seu" patife! Você tem que "ouvi" uma "pouca" mas de "sustança".
A esse tempo, já os freqüentadores habituais do lugar tinham acorrido das tascas e 
hospedarias e formavam roda, em torno dos dois. Havia homens e mulheres, que perguntavam:
-- O que há, Inês?
-- O que te fez esse moço?
Cassi estava atarantado no meio daquelas caras antipáticas de sujeitos afeitos a brigas 
e assassinatos. Quis falar:
-- Eu não conheço essa mulher. Juro...
-- "Muié", não! -- fez a tal Inês, gingando. -- Quando você "mi" fazia "festa", "mi" 
beijava e "mi" abraçava, eu não era "muié", era outra coisa, seu "cosa" ruim!
Um negro esguio, de olhar afoito, com um ar decidido de capoeira, interveio:
-- Mas, Inês, quem é afinal esse moço? 
-- É o "home qui mi" fez mal; que "mi" desonrou, "mi pois" nesta "disgraça".
-- Eu! -- exclamou Cassi.     
-- Sim! Você "memo", "seu" caradura! "Mi alembro" bem... Foi até no quarto de sua 
mãe... Estava arrumando a casa.
Uma outra mulher, mas esta branca, com uns lindos cabelos castanhos, em que se 
viam lêndeas, comentou:
-- É sempre assim. Esses "nhonhôs gostosos" desgraçam a gente, deixam a gente com 
o filho e vão-se. A mulher que se fomente... Malvados!
Cassi ouvia tudo isso sem saber que alvitre tornar. Estava amarelo e olhava, por baixo 
das pálpebras, todas as faces daquele ajuntamento. Esperava a policia, um socorro qualquer. A 
preta continuava:
-- Você sabe onde "tá" teu "fio"? "Tá" na detenção, fique você sabendo, "Si" meteu 
com ladrão, é "pivete" e foi "pra chac'ra". Eis aí que você fez, "seu marvado", "home 
mardiçoado". Pior do que você só aquela galinha-d'angola de "tua" mãe, "seu" sem-vergonha!
Cassi fez um movimento de repulsa e que a rapariga não perdeu.
-- "Oie" -- disse ela, para os circunstantes -- ; ele diz que não é o tal. Agora "memo se 
acusou-se", quando chamei a ratazana da mãe dele de galinha-d'angola... É uma "marvada", 
essa mãe dele -- uma "véia" cheia de "imposão" de inglês. Inglês, que inglês....
Soltou uma inconveniência, acompanhada de um gesto despudorado, provocando 
uma gargalhada gerai. Cassi continuava mudo, transido de medo; e a pobre desclassificada 
emendava:
-- "Tu" é "mao" mas tua mãe é pior. Quando ela descobriu "qui" eu "tava" com "fio" 


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na barriga, "mi pois" pela porta afora, sem pena, sem dó "di" eu não "tê pronde í". E o "fio" era 
neto dela e ela "mi" tinha criado... Vim da roça... Ah! Meu Deus! Se não fosse uma amiga, 
tinha posto o "fio" fora, na rua, que era serviço... Deus perdoe a "tua" mãe o que "mi" fez "í" a 
meu "fio", "fio" deste "qui taí", também, Deus lhe perdoe!
E a pobre negra abaixou-se para apanhar a barra da saia enlameada, a fim de enxugar 
as lágrimas com que chorava o seu triste destino, talvez mais que o dela, o do seu miserável 
filho, que, antes dos dez anos, já travara conhecimento com a Casa de Detenção...
Graças à intervenção do dono da tasca, que tinha com o guarda de ronda o 
compromisso de manter a ordem no "reduto", o ajuntamento se desfez, e Cassi pôde continuar 
seu caminho, Por despedida, porém, ainda levou uma surriada das mulheres, que o 
descompunham em baixo calão, enquanto Inês imprecava:
-- "Marvado"! Desgraçado! Caradura! Hás de "mi pagá", "seu canaia"!
Logo que se viu livre do perigo, Cassi respirou, compôs a fisionomia, apalpou o 
dinheiro na algibeira e fez de si para si:
-- Acontece cada uma! Para que havia de dar esta negra... Felizmente, foi em lugar 
que ninguém me conhece; se fosse em outro qualquer -- que escândalo! Os jornais noticiariam 
e... Não passo mais por ali e ela que fosse para o diabo! ... Fico com o dinheiro em casa.
Nenhum pensamento lhe atravessou a cabeça, considerando que um seu filho, o 
primeiro, já conhecia a detenção...

         X

Clara dos Anjos, meio debruçada na janela do seu quarto, olhava as árvores imotas, 
mergulhadas na sombra da noite, e contemplava o céu profundamente estrelado. Esperava.
Fazia uma linda noite sem luar; era silenciosa e augusta. As árvores erguiam-se hirtas 
e se recortavam na sombra, como desenhadas. Nem uma aragem corria; mas estava fresco. Não 
se ouvia a mínima bulha natural. Nem o estridular de um grilo; nem o piar de uma coruja. A 
noite quieta e misteriosa parecia aguardar quem a interrogasse e fosse buscar no seu sossego 
paz para o coração.
Clara contemplava o céu negro, picado de estrelas, que palpitavam. A treva não era 
total, por causa da poeira luminosa que peneirava das alturas. Ela, daquela janela, que dava 
para os fundos de sua casa, abrangia uma grande parte da abóbada celeste. Não conhecia o 
nome daquelas jóias do céu, das quais só distinguia o Cruzeiro do Sul. Correu com o 
pensamento errante toda a extensão da parte do céu que avistava. Voltou ao Cruzeiro, em 
cujas proximidades, pela primeira vez, reparou que havia uma mancha negra, de um negro 
profundo e homogêneo de carvão vegetal. Perguntou de si para si:
-- Então, no céu, também se encontram manchas?
Essa descoberta, ela a combinou com o transe por que passara. Não lhe tardaram a vir 
lágrimas; e, suspirando, pensou de si para si:
-- Que será de mim, meu Deus?
Se "ele" a abandonasse, ela estava completamente desmoralizada, sem esperança de 
remissão, de salvação, de resgate... Moça, na flor da idade, cheia de vida, seria como aquele 
céu belo, sedutoramente iluminado pelas estrelas, que também tinha ao lado de tanta beleza, 
de tanta luz, de não sabia que sublime poesia, aquela mancha negra como carvão. Cassi a teria 
de fato abandonado? Ela não podia crer, embora há quase dez dias não a viesse ver. Se ele a 
abandonasse -- o que seria dela? Veio-lhe então perguntar a si mesma como se entregou. Como 
foi que ela se deixou perder definitivamente?
Clara não podia bem apanhar todas as fases dessa queda; ela se lembrava de poucas e 
sem nitidez apreciável. Tudo foi num galope para a desgraça... Em começo, a primeira 
impressão simpática, os gemidos do violão, os seus repinicados, seguidos dos requebros dos 


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olhares do tocador, que os exagerava e punha neles não sei que chama estranha, doce e, ao 
mesmo tempo, quente. Impressionara-se muito com isso, tão preparada já estava para os efeitos 
do instrumento. Depois, aquela oposição de todos, aquele falar continuo nele, para dizer mal, 
tanto da parte do padrinho, como da parte da mãe e de Dona Margarida. Essa insistência em 
denegri-lo fizeram que ela representasse, dentro de si mesma, Cassi, como um homem 
excepcional, que causava inveja a todos, pelas suas qualidades de bravura, pela sua habilidade 
no canto e na viola. Não acreditava no que diziam dele... Pareceu-lhe, na primeira vez que o 
viu, tão modesto, tão reservado de modas, tão delicado, que não podia ser o que diziam. 
Quando conversou com ele, meses depois, pela primeira vez, no gradil de sua casa, mais esse 
retrato se firmou; as suas conversas eram tão inocentes e honestas, falando sempre em 
empregar-se e casar-se com ela; removendo as objeções e dúvidas que ela punha quanto à 
viabilidade do casamento deles, com segurança e franqueza; contrapondo, para mostrar a sua 
possibilidade, à cor dela, além da grande paixão que nutria, a sua pobreza, a oposição dos pais, 
a sua falta de posição, de saber -- o que não permitia a ele aspirar a grandes casamentos 
vistosos, com mulher mais bem-educada do que ele, mais instruída...
O seu ideal era Clara, pobre, meiga, simples, modesta, boa dona-de-casa, econômica 
que seria, para o pouco que ele poderia vir a ganhar... De dia para dia, ele ganhava mais 
fortemente a confiança da rapariga. Ela se convencia e sonhava a toda hora com aquela "casa 
branca da serra", onde iria aninhar o seu amor por Cassi. Indagava, em todas as entrevistas, 
dos passos que ele dava para obter emprego, colocação; e ele, com blandícia, com afagos, 
dizia-lhe com açúcar nas palavras:
-- Sossega, filhinha querida! Roma não se fez num dia... É preciso esperar... Falei ao 
doutor Brotero, que me deu uma recomendação para o Senador Carvalhais. Procurei este e ele 
me disse que, para o cais do Porto, não podia arranjar... Tinha pedido muito e muito; estava 
"queimado", como se diz.
Ouvindo tudo isto, Clara sentia-se desfazer, ao calor, à meiguice, ao entono amoroso 
daquela voz. Era mesmo um bom, um sincero, um namorado, mais que isto, um noivo -- esse 
Cassi.
-- Por que você não me "pede" a papai? -- perguntou-lhe um dia.
Cassi, sem hesitação, com o mais convincente tom de franqueza, respondeu:
-- Não posso ainda, meu bem. Seus pais... É verdade que seu padrinho não existe 
mais...
A estas palavras, Clara estremeceu e olhou-o medrosa; ele, porém, não percebeu o 
movimento da rapariga, como ainda não tinha notado as suspeitas que ela tinha, de quando em 
quando, da intervenção dele no assassinato do padrinho. No começo, Clara quase ficara certa 
de que ele estava metido no crime; mas, quando, daí a dias, conversou com ele, fosse a 
emoção da primeira entrevista, fosse a ternura com que a cobria e se expandia por ele todo, ela 
afastou a convicção e perdeu o terror que ele começara a lhe inspirar. A sua débil inteligência, 
a sua falta de experiência e conhecimento da vida, aliado tudo isto à forte inclinação que tinha 
e não sopitava pelo violeiro, agiram sobre a sua consciência, de forma a inocentar, a seus olhos, 
o tocador de violão, no caso da morte misteriosa do padrinho. Entretanto, de quando em 
quando, lá lhe vinha uma suspeita, mas ele era tão bom...
Cassi, sem hesitação, respondeu-lhe à pergunta, no mais persuasivo tom de 
franqueza:
-- Não posso ainda, meu bem. Seus pais... É verdade que seu padrinho não existe 
mais; mas Dona Engrácia não me suporta. Além disso, essa Dona Margarida também não me 
traga... Que estranho o que se passou com ela e Timbó...
-- Você por que anda com ele, Cassi?
-- Que hei de fazer? Ele não me faz e não me fez mal; procura-me e não posso correr 
com ele. É por isso.


[Linha 3550 de 4046 - Parte 3 de 3]


-- Mas é só por isso que você não me pede? Por causa da implicância que têm com 
você? Por isso só, não!
-- Não é só por isso. É porque estou ainda desempregado. Se eu estivesse empregado, 
desarmava todos; e -- fique você certa -- logo que me empregue, peço-te em casamento.
Recordando-se disso, Clara, mais uma vez, contemplou o céu profusamente 
estrelado; mas, logo, deu com a mancha de alcatrão e ficou triste.
Rememorando conversas e fatos, ela punha todo o esforço em analisar o sentimento, 
sem compreender o ato seu que permitiu Cassi penetrar no seu quarto, alta noite, sob o 
pretexto de que precisava se abrigar da chuva torrencial prestes a cair. Ela não sabia 
decompô-lo, não sabia compreendê-lo. Lembrando-se, parecia-lhe que, no momento, lhe dera 
não sei que torpor de vontade, de ânimo, como que ela deixou de ser ela mesma, para ser uma 
coisa, uma boneca nas mãos dele, Cerrou-se-lhe uma neblina nos olhos, veio-lhe um 
esquecimento de tudo, agruparam-se-lhe as lembranças e as recordações e toda ela se sentiu 
sair fora de si, ficar mais leve, aligeirada não sabia de quê; e, insensivelmente, sem brutalidade, 
nem violência de espécie alguma, ele a tomou para si, tomou a sua única riqueza, perdendo-a 
para toda a vida e vexando-a, dai em diante, perante todos, sem esperança de reabilitação.
Pôs-se a chorar silenciosamente. No seio da noite, um apito de locomotiva ecoou 
como um gemido; as árvores como que estremeceram; por sobre um capinzal próximo, um 
pirilampo emitia a sua luz de prata azulada; por cima da casa, morcegos silenciosos 
esvoaçavam; ao longe, as montanhas tinham aspectos sinistros, de gigantes negros que 
montavam sentinela; tudo era silêncio, e, em vão, ela apurava o ouvido e reforçava o seu poder 
de visão, para ver se daquele mistério todo saía qualquer resposta sobre o seu destino -- ou se 
via o caminho para a sua salvação...
Olhou ainda o céu, recamado de estrelas, que não se cansavam de brilhar. Procurou o 
Cruzeiro, rogou um instante a Deus que a perdoasse e a salvasse. Andou com o olhar no céu, 
um pouco além; lá estava a indelével mancha de carvão...
"Ele" não vinha; os galos começavam a cantar. Fechou a janela chorando e chorando 
foi se deitar. Custou a conciliar o sono; e a visão ameaçadora da descoberta, por parte dos 
seus, da sua falta, passou-lhe pelos olhos e aterrou-a como um duende, um fantasma.
Em casa e fora, ainda ninguém suspeitava. Os sintomas de gravidez, por ora, não se 
faziam sentir. É verdade que tinha náuseas, enjôos, sem causa nem motivo; mas ela 
dissimulava-os tão bem, que sua mãe nada percebia.
Dona Engrácia mesmo era de seu natural pouco sagaz e tinha grande confiança na 
vigilância que exercia sobre a filha. Joaquim, nos dias úteis, mal via a filha, pela manhã, ao sair, 
e à noite, quando voltava do serviço.
A morte desgraçada do seu compadre Marramaque o fizera triste, verdadeiramente 
triste e acabrunhado. A sua amizade era velha, e ele devia favores inolvidáveis ao pobre 
contínuo. Fora ele quem aperfeiçoara o pouco que ele, Joaquim, sabia, para ser carteiro. 
Devia-lhe esse serviço espontâneo. Mais de uma vez, arranjara-lhe recomendações para 
promoções, de modo que o que era, devia de alguma sorte a Marramaque. As partidas de solo, 
aos domingos, não se realizavam mais. Lafões tinha sido transferido para os mananciais. O 
sagaz minhoto farejava que aquele negócio de Cassi desandaria em desgraça. Ele não a podia 
impedir, mas não a queria assistir, tanto mais que se sentia arrependido de ter apresentado o 
modinheiro em casa do carteiro. Enganou-o, o malandro! Fizera-o de boa fé...
O único que aparecia ainda, era Meneses. Estava, porém, amalucado, monomaníaco. 
Fugia de todas as conversas e teimava em expor o seu sistema de carro motor, sem rodas, 
absolutamente sem rodas. Uma grande descoberta! -- arrematava ele.
-- A roda, meu caro Joaquim, é um atraso das nossas máquinas. No seu acionamento, 
devido ao atrito dos eixos nos mancais e outros meios de transmissão da força, perde-se muito 
do efeito útil desta, proveniente das resistências passivas. Se nós, para nos movermos; se um 


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cavalo, um elefante e todos os animais empregassem rodas para se deslocarem de um ponto 
para outro, a força que despenderiam seria muitas vezes maior do que a de que efetivamente 
dispõem. Suprimo as rodas da minha "Andotiva" (é assim que o meu aparelho se chama) e 
imito o meio de locomoverse dos animais terrestres. Tenho hesitado entre os reptis e os 
mamíferos; mas vou tornar por modelo estes. Com juntas, jogos combinados de cadeias de 
distensão e contração, como as nossas cadeiras de molas, obterei uma máquina que, com o 
mesmo custo de força e combustível que uma locomotiva comum, produzirá o dobro do 
rendimento útil que esta produz.
Joaquim, ouvindo tudo isto, bocejava; Meneses, inteiramente engolfado no seu sonho 
mecânico, não percebia que estava enfadando o amigo. Falava, falava sobre a sua 
sonhada -- "Andotiva" -- e bebia parati.
Às vezes, jantava com o carteiro e família; mas, na mesa, pouco se dirigia à Clara. 
Tinha medo que, conversando, traísse o segredo que existia entre ambos.
O velho dentista, mesmo, havia deixado de ver Cassi, e este, por sua vez, evitava-o, 
temendo que Meneses percebesse os seus propósitos de fuga e contasse a todos, levantando 
suspeitas em Clara.
Outras vezes, o velho dentista ia procurar Leonardo Flores, para conversar e mesmo 
jantar com ele. Flores não passava verdadeiramente necessidade. Com a sua aposentadoria e o 
auxilio que os filhos lhe prestavam, sempre tinha o que comer sem se queixar da fome.
A sua casa, graças à dedicação da mulher, vivia em ordem. Ele não se intrometia em 
nada da economia do lar. Os seus próprios vencimentos de aposentado, ele ia recebê-los, ou 
ela, e os entregava intactos. Roupa, jornais, fumo, parati -- tudo ela comprava e lhe dava. Em 
começo, a boa da Dona Castorina quis ver se suprimia a cachaça; mas viu que era pior. Ele caía 
num abatimento, numa apatia de coisa morta. Resolveu fazer mais este sacrifício ao seu triste 
casamento: dar cachaça ao marido, Quando ele queria sair, ela lhe dava níqueis para a sua 
predileta bebida.
As visitas de Meneses eram particularmente agradáveis à mulher de Flores, porque 
não só distraía o marido, como lhe tirava a vontade de sair.
Flores tinha épocas em que não se movia de casa, senão a muito custo, para ir ao 
Tesouro receber a sua pensão; mas tinha outra em que se lhe tomava inteiramente o delírio 
ambulatório. Dona Castorina, embora compreendendo que o marido não podia ficar sempre 
retido em  casa, procurava evitar que ele saísse, devido aos desatinos que praticava. Lá vinha,
porém, um dia que...
Quando Meneses ia, aos domingos, procurá-lo, Flores recebia-o com um 
grandiloqüente palavreado heráldico e fidalgo; mas ele dizia com grande melancolia, com uma 
mágoa que bem sabia não ter remédio:
-- Só tu me procuras, Meneses! Os outros me abandonaram... Ah! A Poesia! Ela me 
tem dado bons momentos, mas me fez ir longe demais no meu grande serviço...
Punham-se a bebericar e, quando já estavam um tanto "esquentados", cada um dava 
para a sua mania. Meneses explicava a mecânica sutil da sua "Andotiva"; e Leonardo Flores 
recitava o seu último soneto, que, embora desconexo, ainda tinha música, uma imponderável 
nostalgia de coisas entrevistas em sonho, uma obsessão de perfume, que constituíam os 
característicos de sua poética.
De repente, Meneses punha-se a roncar no sofá, e Leonardo, saindo do seu mundo 
sonoro de versos e rimas, punha-se de pé e, contemplando o camarada, com os braços 
cruzados, limitava-se a dizer:
-- Imbecil! Dorme imbecil! Filisteu! Burguês!
E voltava a fazer versos, a que era como que forçado até à hora do jantar. Por essa 
ocasião, despertava Meneses aos berros e debaixo de descomposturas e injúrias poéticas.
O jantar, conforme o hábito das nossas pequenas famílias, nos domingos, era posto à 


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mesa, mais cedo, constituindo o que se chama o "ajantarado". Assim se usava na casa de 
Flores; mas, em geral, era servido tarde, quase à hora do jantar habitual. A refeição não corria 
alegre. Meneses tinha a sua mania; Flores a dele; e ambos, durante ela, entregavam-se às suas 
extravagâncias, falando de coisas que os outros não entendiam. Meneses era calmo; mas o seu 
amigo comia fazendo esgares, soltando rugidos, cofiando a barba, ainda negra, que terminava 
num cavaignac pontiagudo.
Dona Castorina, a mulher de Flores, de vez em vez, repreendia-o como a um filho 
menor:
-- Come com modos, Flores! Você parece uma criança.
Raramente acontecia estar presente um dos filhos. Andavam pelo football e a mãe 
lhes reservava o jantar. Se acontecia o contrário, o rebento do poeta olhava o pai sem nenhuma 
expressão, sem ânimo de aconselhá-lo e sem insensibilidade para rir. A loucura de Flores era 
curiosa. Não só ela se manifestava com intermitências de grandes intervalos, como também as 
havia num curto espaço de um dia. O álcool tinha contribuído para ela; mas, sem ele, a sua 
alienação mental ter-se-ia manifestado, cedo ou tarde. Todos os que o conheceram moço, 
sabiam-no de sobra possuidor de diátese da loucura. Os seus tics, os seus caprichos, a sua 
exaltação e outros sintomas confusamente percebidos levavam os seus íntimos a temerem 
sempre pela sua integridade mental. A tudo isso, ele juntava, ainda por cima, álcoois fortes, 
que sempre tomou; whisky, genebra, gim, rum, parati -- para se compreender a natureza da 
insânia de Flores.
Certa vez, após o jantar, tomando café no jardinzinho de sua casa, que ele mesmo 
cuidava com rara dedicação, de surpreender no seu estado -- Leonardo olhou o céu e gritou 
para Meneses, descansando a xícara sobre uma cadeira ao lado:
-- Meneses! Vê só tu como esta tarde está linda! Não é só o ouro e a púrpura do 
crepúsculo que vêm; não é só o azul-ferrete dos morros que, com o aproximar-se a noite, se vai 
enegrecendo aos poucos... Há mais, caro Meneses; há verde no céu, um verde imaterial que 
não é o do mar, que não é o das árvores, que não é o da esmeralda, que não é o dos olhos de 
Minerva -- é um verde celestial, diferente de todos aqueles que nós habitualmente vemos... 
Vamos sair, vamos gozar a natureza!
-- Deixa-te disso, Flores. Daqui mesmo, nós vemos...
-- Idiota! Não és um artista... Se não me acompanhas, saio só!...
Dona Castorina interveio naturalmente:
-- Para que vais sair, Leonardo? Estás tão bem aqui com o "Seu" Meneses... Precisas 
de repouso, descanso...
-- Mulher! Sabes quem eu sou? -- fez Flores, com o seu modo habitual de cruzar os 
braços e enterrar o queixo no peito, quando falava com solenidade.
-- Sei muito bem. És Leonardo Flores, meu marido -- respondeu-lhe a mulher, 
sorrindo.
-- Não sou só isso. Sou mais! -- insistiu Flores, carrancudo.
-- O que és, então? -- perguntou-lhe Dona Castorina.
-- Sou um poeta!
Dizendo isto, entrou pela sala adentro e encaminhou-se para o quarto e dormir.
-- Onde vais? -- indagou-lhe a mulher.   
-- Vou me vestir; quero ver este crepúsculo de pedraria, de metais caros, de sonhos e 
de quimeras. Sou um poeta, mulher!
Dona Castorina já sabia que, quando lhe dava essa fúria de sair, era pior contrariá-lo. 
Nada disse ao marido e foi pedir a Meneses que o acompanhasse. O velho dentista não se 
sentia bem; o seu desejo era descansar; mas, à vista do pedido de Dona Castorina, não teve 
outro remédio senão acompanhar o camarada. Andaram a pé por toda a parte, bebendo sempre 
onde encontravam lugar propício; Meneses, arrastando o passo; e Flores, dilatando as narinas, 


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fazendo horríveis contrações com o rosto, alisando o cavaignac e dizendo:
-- Que beleza! Que beleza! Quero respirar, cheirar, absorver todo o perfume desse 
divino crepúsculo... Não fora a natureza, os céus, os pássaros, as águas múrmuras, como 
poderíamos viver?
Depois de uma pausa, acrescentou desolado:
-- A vida é tão banal, tão chata... Nós somos também natureza; mas do que nos vale 
isto? Há os burgueses e os regulamentos que nos abafam...
Já tinha anoitecido de todo. Leonardo Flores não dava mostras de querer voltar para 
casa; Meneses arrastava o passo a muito custo. Iam atravessando um trecho deserto de rua, 
quando o velho dentista disse para o amigo:
-- Leonardo, estou com as pernas que não posso. Vamos descansar um pouco.
-- Onde?
-- Sentados na relva, um pouco longe da estrada, ali, atrás daquela moita... Estou que 
não posso, meu caro.
Os dois abandonaram o caminho público e procuraram a tal moita. Meneses, com 
muita dificuldade, sentou-se; mas Leonardo foi logo se deitando. Tinham bebido muito, e a 
embriaguez lhes chegava. Leonardo ainda pôde dizer, olhando as estrelas que começavam a 
brilhar:
-- Como é belo o céu! Lá não haverá por certo ministros, nem congresso, nem 
presidentes... Que bom será!
O dentista não se demorou muito tempo sentado; deitou-se logo; e Leonardo, mal 
dissera aquelas palavras, ferrou no sono. Dormiram afinal, na relva, com os olhos voltados para 
o céu estrelado... 

        XI

Leonardo, já dia adiantado, veio a despertar naquele capinzal, atordoado, zonzo; e, 
ao dar com Meneses ao lado, procurou acordá-lo. Foi em vão; o velho estava morto. Um 
colapso cardíaco o tinha levado. Percebendo que o amigo tinha morrido, Leonardo ergueu-se, 
tirou-lhe o chapéu de perto da cabeça, pôs-lhe o rosto bem à mostra, com as suas brancas 
barbas veneráveis, e começou a exclamar:
-- Sol! Sol glorioso das auroras e das ressurreições! Sol divino que conténs todos nós, 
homens e plantas, bestas e gênios, insetos e vampiros, lesmas e belezas! Sol que tudo fecundas 
e transformas! Vem tu -- ó Sol! -- beijar esta augusta cabeça de imperador (apontava para 
Meneses hirto) que vai para sempre mergulhar na treva e só te verá de novo, quando for 
árvore, quando for arbusto, quando for pássaro e quando de novo voltar a ser homem. Beija-o 
ainda mais uma vez! Beija-o, porque ele te amou e muitas vezes voou para os espaços sidéreos, 
desejoso de ver o teu fulgor e morrer por tê-lo visto.
Não dera fé, Leonardo, que alguns transeuntes haviam parado, para ouvir as suas 
palavras e ver os seus estranhos trejeitos. Os mais curiosos se aproximaram e deram com 

aquele 
estranho e bizarro espetáculo de um homem, que parecia louco ou bêbedo, a pronunciar coisas 
incompreensíveis e a gesticular, diante de um pobre velho morto. Chamaram a polícia; e lá foi 
Leonardo, gesticulando e falando só, para a delegacia. Meneses tomou o caminho do 
necrotério, após fotografias e outras precauções policiais.
O primeiro movimento do policial que recebeu Leonardo, foi removê-lo incontinenti 
para o hospício ou lugar equivalente. Na verdade, o poeta não dizia coisa com coisa; nem 
mesmo quem era, informava. Muitos o conheciam de vista, mas, para essas pessoas, era 
simplesmente -- "o poeta", Em chegando Praxedes, as coisas mudaram. Tinha ele o hábito de ir 
de manhã às delegacias, ver se pegava algum biscate, alguma coisa. Indo, naquele dia, topou 
com Leonardo lá e soube que um velho, que bebia muito e costumava estar com ele, havia sido 


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encontrado morto junto a Flores e fora removido para a morgue. Viu logo que se tratava de 
Meneses. Muito prestável, obsequioso de gênio, Praxedes, para quem a polícia não tinha 
segredos, informou ao comissário quem era Leonardo e quem era Meneses. A autoridade 
policial encarregou-o de prevenir os parentes e amigos de ambos do que havia acontecido. 
Praxedes correu à casa de Joaquim dos Anjos, para desobrigar-se da missão. Foi recebido pela 
mulher e a filha.
-- Quincas não está ai -- disse-lhe Dona Engrácia. -- Ele saiu cedo...
-- O senhor pode telefonar para a Repartição dos Correios -- lembrou Clara.
-- Lembrei-me disso, mas não sabia a seção.
A filha disse-lhe e o doutor Praxedes, muito diplomaticamente, ergueu-se todo e, ao 
despedir-se das senhoras, desculpou-se:
-- Vossas Excelências hão de me perdoar. Não podia deixar de vir até aqui. Sabia de 
dois amigos íntimos do doutor Meneses; um era o Senhor Cassi, mas este está fora... 
Clara espantou-se:
-- Está fora!
-- Ué, Clara! -- fez Dona Engrácia, -- Que espanto!
-- Não, porque ainda há dias "Seu" Meneses disse a papai que estivera com ele -- fez 
Clara disfarçando.
-- Deve ser há algum tempo, minha senhora -- aventou Praxedes, com toda a 
delicadeza de voz; -- porque há bem quinze dias que embarcou para São Paulo, em Cascadura. 
Eu até me despedi dele...
Praxedes saía e Clara, logo que pôde, correu ao quarto para chorar. Estava 
irremediavelmente perdida; ele a abandonava de vez. Como havia de ser? Como havia de 
esconder a gravidez, que se ia mostrando aos poucos? Que fariam dela os seus pais? Era atroz 
o seu destino!
Todas essas perguntas, ela formulava e não lhes dava resposta. Cassi partira, fugira... 
Agora, é que percebia bem quem era o tal Cassi. O que os outros diziam dele era a pura 
verdade. A inocência dela, a sua simplicidade de vida, a sua boa fé, e o seu ardor juvenil 
tinham-na completamente cegado. Era mesmo o que diziam... Por que a escolhera? Porque era 
pobre e, além de pobre, mulata. Seu desgraçado padrinho tinha razão... Fora Cassi quem o 
matara.      
Ele contava, já não se dirá com o apoio, mas com a indiferença de todos pela sorte de 
uma pobre rapariga como ela. Devia ser assim, era a regra. Nessa indiferença, nessa frouxidão 
de persegui-lo, de castigá-lo convenientemente, é que ele adquiria coragem para fazer o que 
fazia. Além de tudo, era covarde. Não cedia ao impulso do seu desejo, de seu capricho, por 
uma moça qualquer. Catava com cuidado as vítimas entre as pobres raparigas que pouco ou 
nenhum mal lhe poderiam fazer, não só no que toca à ação das autoridades, como da dos pais 
e responsáveis.
Estava ai o seu forte; o mais eram acessórios de modinhas, de tocatas de violão, de 
cartas, de suspiros -- todo um arsenal de simulação amorosa, que ele, sem caráter e, por 
demais, cínico, sabia empregar, como ninguém.
Que havia de ser dela, agora, desonrada, vexada diante de todos, com aquela nódoa 
indelével na vida?
Sentia-se só, isolada, única na vida. Seus pais não a olhariam mais como a olhavam; 
seus conhecidos, quando soubessem, escarneceriam dela; e não haveria devasso por aí que a 
não perseguisse, na persuasão de que quem faz um cesto, faz um cento. Exposta a tudo, 
desconsiderada por todos, a sua vontade era de fugir, esconder-se. Mas, para onde? Com a sua 
inexperiência, com a sua mocidade, com a sua pobreza, ela iria atirar-se à voracidade sexual de 
uma porção de Cassis ou piores que ele, para acabar como aquela pobre rapariga, a quem 
chamavam de Mme. Bacamarte, suja, bebendo parati e roída por toda a sorte de moléstias 


[Linha 3800 de 4046 - Parte 3 de 3]


vergonhosas. 
Pensou em morrer; pensou em se matar; mas, por fim, chorou e rogou a Nossa 
Senhora que lhe desse coragem. Se pudesse esconder?... -- acudiu-lhe repentinamente este 
pensamento. Se pudesse "desfazê-lo"? Seria um crime, havia perigo de sua vida; mas era bom 
tentar. Quem lhe ensinaria o remédio? Correu o rol de suas poucas amigas; e só encontrou 
uma: Dona Margarida.
Nisto, sua mãe gritou-lhe do fundo da casa:
-- Clara, estás dormindo? Olha que estão batendo na porta.
-- Já vou, mamãe.
Era o estafeta dos telégrafos, que trazia um despacho do pai, comunicando que, 
devido a ter de fazer o enterro de Meneses, chegaria mais tarde, mas viria jantar.
Ela e a mãe não esperaram; jantaram antes. Clara, muito preocupada com o "remédio" 
que ia ver se Dona Margarida lhe arranjava; e Dona Engrácia, aborrecida com a morte de 
Meneses.
-- Pobre Meneses! -- dizia ela. -- Morrer assim, no mato! Por que ele não foi pra casa? 
Era bem velho, não era, Clara? 
-- Devia ter mais de setenta anos.     
-- Isto não quer dizer nada. Há quem dure mais... Você tem reparado, Clara, que, de 
uns tempos para cá, está nos acontecendo uma porção de coisas más?
-- Nem tantas! Duas só: a morte do padrinho e...
-- Você acha pouco e, ainda por cima, da forma que elas nos chegam! Deus nos 
proteja! Tenho para mim que alguma está para nos acontecer".
-- Qual, mamãe! Tudo isto é doloroso, mas são fatos que se dão...
-- Felizmente, esse azar de Cassi se foi. Que vá pro diabo que o carregue!
Clara teve vontade de chorar; mas conteve-se. Estava resolvida: amanhã, pediria um 
"abortivo" a Dona Margarida.
Joaquim dos Anjos chegou e narrou tudo o que acontecera com Meneses e Leonardo, 
Aquele, por não ter ninguém que lhe fizesse o enterro, ele o fizera; e Leonardo, logo que foi 
afastada a hipótese de crime e ficou sabido o seu estado mental, entregaram-no à mulher. Ao 
chegar em casa, acompanhado de Dona Castorina, foi que Flores caiu em si e teve consciência 
perfeita do fim do amigo. Estava lúcido, bom; estava o verdadeiro Leonardo, que chorou o 
falecimento do camarada, sem mescla de delírio, pressentindo que, nele, havia aviso do seu 
próximo fim.
Engrácia ouviu a narração de Quincas e, ingenuamente, perguntou-lhe:
-- Esse Leonardo é mesmo homem de inteligência, Quincas?
-- É, Engrácia. Por quê?
-- Por que ele então bebe tanto?
-- Quem sabe lá? Vício, hábito, capricho da sua natureza, desgostos, ninguém 
sabe! -- observou o marido.
-- Eu vejo tanto doutor por aí que não bebe.
-- Você pensa que todo doutor é inteligente, Engrácia?
-- Pensei.
Clara ficou admirada de que a opinião da mãe não fosse exata. Ela também, muito 
popular e estreita de idéia, admitia que toda a espécie de doutor fosse de sábios e inteligentes.
Joaquim, dizendo-se cansado, fora logo deitar-se; e, em seguida, a sua mulher e filha.
Em breve, tudo era silêncio na casa e na rua. Clara não esperava mais, com a janela 
semi-aberta, a visita do sedutor.  Havia se fatigado de aguardá-lo muitas noites seguidas; e, 
agora então, depois da informação de Praxedes, tinha perdido toda a esperança. Ele fugira, e 
ela ficara com o filho a gerar-se no ventre, para a sua vergonha e para tortura de seus pais. 
Imediatamente, o seu pensamento se encaminhou para o "remédio" que devia "desmanchá-lo", 


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antes que lhe descobrissem a falta. Tinha medo e tinha remorsos. Tinha medo de morrer e tinha 
remorsos de "assassinar" assim, friamente, um inocente. Mas... era preciso. Pôs-se a examinar o 
que lhe podia responder Dona Margarida. Pesou os prós e os contras; analisou bem o caráter 
da amiga russa-alemã; e, na calma do quarto, percebeu bem que não lhe daria nem indicaria o 
"remédio" criminoso. Margarida era uma mulher séria, rigorosa de vontade, visceralmente 
honesta, corajosa, e não haveria rogos nem choro que a fizessem contribuir para um crime de 
qualquer natureza. Então, como havia de ser? Examinou a lista das conhecidas, a ver se 
encontrava uma que lhe prestasse esse "serviço"... Não encontrou, e também eram tão poucas... 
Se tivesse dinheiro, com auxilio de Mme. Bacamarte... Acudiu-lhe então uma idéia. Ela 
ajudava Dona Margarida nos bordados e nas costuras, com o que já ganhava algum dinheiro. 
Não tinha nada a haver da amiga; mas bem lhe podia pedir emprestado, sob qualquer pretexto, 
uns vinte ou trinta mil-réis e pagá-los com trabalho. Qual seria o pretexto? Pensou, combinou 
mentiras; e, afinal, encontrou-o. Diria que era para comprar um presente destinado à mãe, cujo 
aniversário natalício estava a chegar. Sorriu de contentamento, quando organizou toda aquela 
mentiralhada. Julgava-se salva; mas, com o que ela não contava, era com a sagacidade da 
alemã.
Dona Margarida era mulher alta, forte, carnuda, com uma grande cabeça de traços 
enérgicos, olhos azuis e cabelos castanhos tirando para louro. Toda a sua vida era marcada pelo 
heroísmo e pela bondade. Embora nascida em outros climas e cercada de outra gente, o seu 
inconsciente misticismo humanitário, herança dos avós maternos, que andavam sempre às 
voltas com a polícia dos czares, fê-la logo se identificar com a estranha gente que aqui veio 
encontrar. Aprendeu-lhe a linguagem, com seus vícios e idiotismos, tomou-lhe os hábitos, 
apreciou-lhe as comidas, mas sem perder nada da tenacidade, do esprit de suite, da decidida 
coragem da sua origem. Gostava muito da família do carteiro; mas, no seu íntimo, julgava- os 
dóceis demais, como que passivos, mal armados para a luta entre os maus e contra as insídias 
da vida.
Quando Clara lhe falou no empréstimo ou adiantamento, ela se espantou. Nunca a 
filha do "correio" lhe havia feito semelhante pedido -- o que queria dizer aquilo? Não 
respondeu logo à solicitação e encarou firmemente, com o seu olhar translúcido e, no 
momento, duro, a filha do carteiro; e, por sua vez, indagou:
-- Para que você quer esse dinheiro, Clarinha?
A moça, não podendo suportar a mirada da alemã, abaixara os olhos; e, com voz 
sumida, explicou o suposto destino que ia dar à quantia pedida. Dona Margarida não 
acreditou; e, continuando com o olhar a sondar inquisitorialmente Clara, observou com energia 
maternal:
-- Clara, você não fala a verdade; você está escondendo alguma coisa.
A moça quis negar; mas Dona Margarida, pressentindo que ela ocultava alguma coisa 
de grave, cercou-a de perguntas; e Clara não teve outro remédio senão confessar tudo. Ela 
chorou, mas Dona Margarida, sem se deixar comover, durante toda a confissão, mais 
arrancada aos poucos do que mesmo narrada espontaneamente, foi pensando como agir. 
Encheu-se, Dona Margarida, de uma infinita pena daquela desgraçada rapariga, dos seus pais, 
e mais profunda se tornava a pena, quando antevia o horrível destino da pobre Clara; 
entretanto, não deu qualquer demonstração do que lhe ia n'alma.
Num dado momento, sem dar-lhe a mínima explicação, Dona Margarida ergueu-se e, 
dirigindo-se a Clara, ordenou imperiosamente:
-- Vamos falar à sua mãe.
A filha do carteiro, sem fazer a mínima objeção, obedeceu. Ao chegar à casa de 
Joaquim, Dona Engrácia estava no interior, inocentemente entregue aos seus afazeres 
domésticos. Entretanto, Dona Margarida chamou de parte a mãe de Clara e começou a 
narrar-lhe o que havia acontecido com a filha. Dona Engrácia não se pôde conter. Logo que 


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compreendeu a gravidade do fato, pôs-se a chorar copiosamente, a lastimar-se, a soluçar, 
dizendo entre um acesso de choro e outro:
-- Mas, Clara!... Clara, minha filha!... Meu Deus, meu Deus!
A filha aproximou-se chorando; ajoelhou-se, ajuntou as mãos, em postura de oração, 
aos pés da mãe e, soluçando, repetiu:
-- "Me perdoe", mamãe! "Me perdoe", pelo amor de Deus!
Dona Margarida, de pé, nada dizia e olhava com profunda e desmedida tristeza, que 
não se adivinhava na sua calma e na segurança do seu olhar, aquele quadro desolador do 
enxovalhamento de um pobre lar honesto.
Afinal, quando lhe pareceu que ambas estavam mais calmas, interveio:
-- Você sabe, Clara, onde mora a família desse sujeito?
Clara, ainda soluçando, respondeu:
-- Sei.
Dona Engrácia indagou:
-- Para quê?
Dona Margarida explicou que, antes de qualquer procedimento e mesmo de 
comunicar o fato a "Seu" Joaquim, era conveniente entender-se com a família de Cassi. Ela, 
Dona Margarida, iria imediatamente à casa dele, acompanhada de Clara. Mãe e filha 
concordaram; e Clara vestiu-se.
A residência dos pais de Cassi ficava num subúrbio tido como elegante, porque lá 
também há estas distinções. Certas estações são assim consideradas, e certas partes de 
determinadas estações gozam, às vezes, dessa consideração, embora em si não o sejam. O 
Méier, por exemplo, em si mesmo não é tido como chique; mas a Boca do Mato é ou foi; 
Cascadura não goza de grande reputação de fidalguia, nem de outra qualquer prosápia 
distinta; mas Jacarepaguá, a que ele serve, desfruta da mais subida consideração.
A casa da família do famoso violeiro não ficava nas ruas fronteiras à gare da Central; 
mas, numa transversal, cuidada, limpa e calçada a paralelepípedos. Nos subúrbios, há disso: ao 
lado de uma rua, quase oculta em seu cerrado matagal, topa-se uma catita, de ar urbano 
inteiramente. Indaga-se por que tal via pública mereceu tantos cuidados da edilidade, e os 
historiógrafos locais explicam: é porque nela, há anos, morou o deputado tal ou o ministro 
sicrano ou o intendente fulano.
Tinha boa aparência a residência da família do Senhor Azevedo; mas quem a 
observasse com cuidado, concluiria que a parte imponente dela, a parte da cimalha, sacadas 
gradeadas e compoteiras ao alto, era nova. De fato, quando o pai de Cassi a comprou, a casa 
era um simples e modesto chalet, mas, com o tempo, e com ser sua vagarosa, mas segura, 
prosperidade, pôde ir, também devagar, aumentando o imóvel, dando um aspecto de boa 
burguesia remediada. Na frente, não era alto; o terreno, porém, inclinava-se rapidamente para 
os fundos, de forma que, nessa parte, havia um porão razoável, onde, ultimamente, habitava 
Cassi. O puxado, na traseira da casa, também tinha porão, porém, com maus quartos, que eram 
ocupados pelas galinhas do filho e por coisas velhas ou sem préstimo, que a família refugava, 
sem querer pôr fora de todo.
Dona Margarida tocou a campainha com decisão e subiu a pequena escada que dava 
acesso à casa. Disse à criada que desejava falar à dona da casa. Dona Salustiana, que esperava 
tudo, menos aquela visita portadora de semelhante mensagem, não tardou em mandar entrar as 
duas mulheres. Ambas estavam bem vestidas e nada denunciava o que as trazia ali. Só Clara 
tinha os olhos vermelhos de chorar, mas passava despercebido. Chegou Dona Salustiana e 
cumprimentou-as com grandes mostras de si mesma. Dona Margarida, sem hesitação, contou o 
que havia. A mãe de Cassi, depois de ouvi-la, pensou um pouco e disse com ar um tanto 
irônico:
-- Que é que a senhora quer que eu faça?


[Linha 3950 de 4046 - Parte 3 de 3]


Até ali, Clara não dissera palavra; e Dona Salustiana, mesmo antes de saber que 
aquela moça era mais uma vítima da libidinagem do filho, quase não a olhava; e, se o fazia, era 
com evidente desdém. A moça foi notando isso e encheu-se de raiva, de rancor por aquela 
humilhação por que passava, além de tudo que sofria e havia ainda de sofrer.
Ao ouvir a pergunta de Dona Salustiana, não se pôde conter e respondeu como fora 
de si:
-- Que se case comigo.
Dona Salustiana ficou lívida; a intervenção da mulatinha a exasperou. Olhou-a cheia 
de malvadez e indignação, demorando o olhar propositadamente. Por fim, expectorou:
-- Que é que você diz, sua negra?
Dona Margarida, não dando tempo a que Clara repelisse o insulto, imediatamente, 
erguendo a voz, falou com energia sobranceira:
-- Clara tem razão. O que ela pede é justo; e fique a senhora sabendo que nós aqui 
estamos para pedir justiça e não para ouvir desaforos.
Dona Salustiana voltou-se para Dona Margarida e perguntou, pronunciando, 
devagar, as palavras, como para se dar importância:
-- Quem é a senhora, para falar alto em minha casa?
Dona Margarida não se intimidou:
-- Sou eu mesma, minha senhora; que, quando se decide a fazer uma coisa de justo, 
nada a atemoriza.
Foi calmamente que Dona Margarida falou; e, à vista dessa atitude, Dona Salustiana 
resolveu mudar de tática. Gritou para as filhas:
-- Catarina! Irene! Venham cá que esta mulher está me insultando.
As moças acudiram e, contemplando o ar enérgico da teuto-eslava e a figura 
lastimosa de Clara, compreenderam que Cassi estava no meio. Acalmaram a mãe e indagaram 
do sucedido; Dona Margarida explicou; mas, quando se falou em casamento de Cassi, Dona 
Salustiana prorrompeu:
-- Ora, vejam vocês, só! É possível? É possível admitir-se meu filho casado com 
esta...
As filhas intervieram:       
-- Que é isto, mamãe?
A velha continuou:
-- Casado com gente dessa laia... Qual!... Que diria meu avô, Lord Jones, que foi 
cônsul da Inglaterra em Santa Catarina -- que diria ele, se visse tal vergonha? Qual!
Parou um pouco de falar; e, após instantes, aduziu:
-- Engraçado, essas sujeitas! Queixam-se de que abusaram delas... É sempre a mesma 
cantiga... Por acaso, meu filho as amarra, as amordaça, as ameaça com faca e revólver? Não. A 
culpa é delas, só delas...
Dona Margarida ia perguntar: "Que decide, então?" -- quando se ouviram passos na 
escada. Era o dono da casa. Entrando e deparando-se-lhe aquele quadro, suspendeu os passos 
e parou no meio da sala.
Olhou tudo e todos e perguntou:
-- Que há?
"Papai" -- ia dizendo uma das filhas; -- mas sabendo, por aí, quem era aquele homem, 
Clara correu para ele, ajoelhou-se e implorou:
-- Tenha pena de mim, "Seu" Azevedo! Tenha pena de uma infeliz! Seu filho me 
desgraçou!
O velho Azevedo descansou os embrulhos, levantou a moça, fê-la sentar-se; e ele, 
sentando-se por sua vez, pôs-se a olhar, cheio de pena, o dorido rosto da rapariga. Todos os 
olhos se fixaram nele; ninguém respirava. Afinal, Azevedo falou:


[Linha 4000 de 4046 - Parte 3 de 3]


-- Minha filha, eu não te posso fazer nada. Não tenho nenhuma espécie de autoridade 
sobre "ele"... Já o amaldiçoei... Demais, "ele" fugiu e eu já esperava que essa fuga fosse para 
esconder mais alguma das suas ignóbeis perversidades... Tu, minha filha, te ajoelhaste diante 
de mim ainda agora. Era eu que devia ajoelhar-me diante de ti, para te pedir perdão por ter 
dado vida a esse bandido -- que é o meu filho... Eu, como pai, não o perdôo; mas peço que 
Deus me perdoe o crime de ser pai de tão horrível homem... Minha filha, tem dó de mim, deste 
pobre velho, deste amargurado pai, que há dez anos sofre as ignomínias que meu filho espalha 
por aí, mais do que ele... Não te posso fazer nada... Perdoa-me, minha filha! Cria teu filho e 
me procura se...
Não acabou a frase. A voz sumiu-se; ele descaiu o corpo sobre a cadeira e os olhos se 
foram tornando inchados.
As filhas acudiram, a mulher também; e uma daquelas, chorando, pediu à Clara e à 
Dona Margarida:
-- É favor, minhas senhoras; retirem-se, sim?
Na rua, Clara pensou em tudo aquilo, naquela dolorosa cena que tinha presenciado e 
no vexame que sofrera. Agora é que tinha a noção exata da sua situação na sociedade. Fora 
preciso ser ofendida irremediavelmente nos seus melindres de solteira, ouvir os desaforos da 
mãe do seu algoz, para se convencer de que ela não era uma moça como as outras; era muito 
menos no conceito de todos. Bem fazia adivinhar isso, seu padrinho! Coitado!...
A educação que recebera, de mimos e vigilâncias, era errônea. Ela devia ter 
aprendido da boca dos seus pais que a sua honestidade de moça e de mulher tinha todos por 
inimigos, mas isto ao vivo, com exemplos, claramente... O bonde vinha cheio. Olhou todos 
aqueles homens e mulheres... Não haveria um talvez, entre toda aquela gente de ambos os 
sexos, que não fosse indiferente à sua desgraça... Ora, uma mulatinha, filha de um carteiro! O 
que era preciso, tanto a ela como às suas iguais, era educar o caráter, revestir-se de vontade, 
como possuía essa varonil Dona Margarida, para se defender de Cassis e semelhantes, e 
bater-se contra todos os que se opusessem, por este ou aquele modo, contra a elevação dela, 
social e moralmente. Nada a fazia inferior às outras, senão o conceito geral e a covardia com 
que elas o admitiam...
Chegaram em casa; Joaquim ainda não tinha vindo. Dona Margarida relatou a 
entrevista, por entre o choro e os soluços da filha e da mãe.
Num dado momento, Clara ergueu-se da cadeira em que se sentara e abraçou muito 
fortemente sua mãe, dizendo, com um grande acento de desespero:
-- Mamãe! Mamãe!
-- Que é minha filha?
-- Nós não somos nada nesta vida.

Todos os Santos (Rio de Janeiro),
        dezembro de 1921 -- janeiro de 1922.


Fim - Fim - Fim

01 - Será que vai chover ? Meteorologia

02 - Machado encontrado na Austrália tem quase 50 mil anos

03 - Sexo Interplanetário - OVNI

04 - Conheça as seis galáxias mais estranhas do Universo

05 - Chineses fazem 'acupuntura' com abelhas para tratar artrite e câncer

06 - Decifrada última mensagem criptografada da Segunda Guerra Mundial

07 - Cada vez mais acelerado - O Tempo

08 - Humanos já consumiam mel 9.000 anos atrás, revelam vasos antigos

09 - Conheça a história do pior ataque de tubarões de todos os tempos

10 - Ônibus espacial Endeavour começa a ser exibido



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